Acórdão nº 05679/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 20 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelESPERANÇA MEALHA
Data da Resolução20 de Novembro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo, 2.º Juízo, do Tribunal Central Administrativo Sul I. Relatório O presente recurso jurisdicional, no qual é Recorrente Q……, SA, e Recorrido o MUNICÍPIO DE CASCAIS, vem interposto do despacho saneador-sentença, proferido pelo TAF de Sintra, em 03.072009, que, no âmbito de ação administrativa comum intentada pela aqui Recorrente e por Q……, SGPS, SA, contra o aqui Recorrido, decidiu julgar: - procedente a exceção de ilegitimidade ativa de Q……., SGPS, SA, absolvendo o R. da instância quanto ao pedido por esta formulado; - improcedente o erro no tipo e forma do processo; - corrigir o valor da causa para €30.000,01; - improcedente a ineptidão parcial da petição inicial, quanto ao 2º pedido; - improcedente a pretensão formulada nos autos pela A. Q……, SA.

A Recorrente conclui as suas alegações como se segue: “i. A sentença é ilegal, no que respeita à decisão sobre a matéria de facto, por não terem sido dados como provados factos que importam à discussão e à decisão da causa; ii. O Tribunal não deu como provado: (a) que o R. procedeu à construção (ainda que parcial) do passeio pedonal no troço de costa Guincho-Guia, na UOPG8 8 do POOC Sintra-Sado, antes da aprovação do Projecto de Requalificação previsto para a UOPG8; (b) que "Aos 23JUN06, o Senhor Vice-presidente da CMC licenciou o projecto de alteração/ampliação do antigo restaurante R……, sito no lugar da C……, na UOPG8 do POOC Sintra-Sado, pertencente à C…… -Sociedade ……., S.A.".

iii. A sentença enferma, pois, de ilegalidade no que respeita à decisão da matéria de facto, por violação, designadamente, do disposto no arts. 511°, 6590 e 660°, ambos do CPC.

iv. O Tribunal a quo fundamenta a sua decisão de indeferimento do primeiro pedido no facto de se tratar de área abrangida pelo Plano de Ordenamento da Orla Costeira Sintra-Sado (POOCSS, aprovado pela RCM n° 86/2003, de 25JUN), mais concretamente na UOPG8 - troço de costa Guincho-Guia, e ao abrigo do disposto nos arts. 74°, n°1, al. a), e 82° do Regulamento do POOCSS, do art. 03° do DL n° 380/99, e do art. 68°, al. a), do DL n° 555/99, por o R. estar impedido de licenciar até à aprovação do Projecto de Requalificação.

  1. Tal interpretação da lei é errada e não pode proceder, pois a restrição prevista no art.74° do Regulamento do POOCSS tem que ser qualificada como medida preventiva.

    vi. É juridicamente inaceitável e impossível a restrição indefinida de direitos.

    vii. Os casos de compressão de tais direitos apenas são admitidos temporariamente - e, ainda assim, sujeitos a indemnização (cfr. art.116° do citado DL n° 380/99, de 22SET (Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial - RJIGT, com redacção dada pelo DL n°46/09, de 20FEV).

    viii. E, ainda assim, tendo tal restrição que constar de norma expressa e inequívoca.

    ix. As medidas preventivas vêm previstas nos arts. 107° e ss. do RJIGT.

  2. As medidas preventivas têm um carácter temporário, a ser fixado no acto que as preveja, não podendo ser superior a 2 anos, prorrogável por mais um quando tal se mostre necessário, sendo que, se nada for estabelecido a esse respeito, vigoram por um ano prorrogável por seis meses.

    xi. As restrições preventivas previstas no art. 74° do Regulamento do POOCSS caducaram um ano após a sua entrada em vigor, i.e., 30JUN2004.

    xii. O que significa que, neste caso e desde essa data, o art. 74° do POOCSS não poderia justificar a recusa de emissão de licenças ou autorizações.

    xiii. Consequentemente, a sentença recorrida é ilegal por violação do art.º74° do Regulamento do POOCSS, dos arts.103°, e 107° e ss., do DL n° 380/99, e o art. 68°, al. a), do DL n° 555/99.

    xiv. Antes de mais, não tem o Tribunal a quo razão ao afirmar que a A. deveria ter ampliado a matéria de facto e que, por não tê-lo feito, sempre estaria impedido de conhecer da realidade actual.

    xv. O art. 663° do CPC, manda atender, na sentença, aos factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que se produzam posteriormente à proposição da acção, de modo a que a decisão corresponda à situação existente no momento do encerramento da discussão (n°1), e que são atendíveis os factos que, segundo o direito substantivo aplicável, tenham influência sobre a existência ou conteúdo da relação controvertida (n° 2).

    xvi. Tal como o Tribunal, sem que qualquer das Partes tivesse requerido a ampliação, entendeu dar como provados factos novos relativamente à data da entrada da acção em juízo - factos II) JJ) e KK).

    xvii. Assim, apesar de o Tribunal a quo não ter indeferido, aparentemente, o pedido com esse fundamento, sempre o mesmo seria ilegal por violação do artº663° do CPC.

    xviii. Há decisões contraditórias na sentença, pois se, por um lado, se afirma que "é possível conhecer neste despacho [saneador] do pedido formulado na acção, desde que para tanto o processo forneça todos os necessários elementos. / O que sucede e passamos a fazer, conhecendo de imediato a pretensão da Autora" (pág. 9 da sentença, in fine).

    xix. Por outro, o Tribunal a quo indefere o pedido da A. por considerar que não possui todos os elementos necessários para decidir do pedido de condenação do R. a licenciar os projectos.

    xx. A sentença é ainda ilegal pois que se, por um lado, nela se reconhece que a A. alegou, no art.38° da p.i., que se encontram emitidos todos os pareceres legalmente necessários, e o R. não infirmou tal alegação, o Tribunal deveria ter considerado provado que assim era ou, no mínimo, deveria ter pedido esclarecimentos ao R. quanto a tal circunstância.

    xxi. Não é pelo facto de se estar no âmbito de uma acção administrativa comum, à qual são subsidiariamente aplicáveis as regras do processo civil, que deixa de se aplicar o disposto nos arts. 2°, 3°, 8°, do CPTA, ou mesmo o disposto nos arts. 264°, 265° e 266° do CPC.

    xxii. Mesmo que se entenda existir uma causa de pedir mais abrangente do que se se tratasse de um pedido de intimação a proceder a licenciamento urbanístico, então carecia de ter trazido a juízo também a factualidade para aferir da verificação dos pressupostos jurídicos para condenação do réu a proferir acto de licenciamento/autorização, deveria o Tribunal a quo, mesmo estando no âmbito de uma acção administrativa comum, ter em consideração o disposto no art. 88° do CPTA e o art. 508° do CPC, formulando convite ao aperfeiçoamento do articulado.

    xxiii. Mesmo que o Tribunal entendesse não ter elementos e/ou poderes para condenar o R. a licenciar os projectos, deveria ter feito aquilo que afirmou poder fazer, que seria condenar o R. "a apreciar os processos camarários da Autora.".

    xxiv. A sentença recorrida é ilegal, por violação dos arts. 2°, 3°, 8° e 88°, do CPTA, e dos arts. 264°, 265°, 266°, 508° e 663° do CPC.

    xxv. A sentença é ilegal ao indeferir o segundo pedido de condenação, desde logo por contradição entre a matéria de facto e a decisão.

    xxvi. É próprio Tribunal que dá como provado que, a 23ABR e 28DEZ07, a A. interpelou o R. para cumprir o Contrato (factos Y) e EE)).

    xxvii. Se a A. interpela o R. para cumprir o Contrato, mesmo que o haja suspendido unilateralmente, significa que, estando o mesmo apenas suspenso e não resolvido, a A. fez com que o mesmo voltasse a produzir efeitos. O Contrato deixou, pois, de estar suspenso.

    xxviii. Estando o Contrato a produzir os seus efeitos, cabia ao R. dar cumprimento à suas obrigações contratuais, não se justificando o recurso à via expropriativa.

    xxix. Existe, pois, fundamento para que seja dado provimento ao 2° pedido de condenação formulado pela A.

    xxx. A sentença é ilegal por violação, designadamente, do disposto nos arts. 659° a 661°, do CPC.

    ” O Recorrido contra-alegou, concluindo o seguinte: “A. Carece totalmente de fundamento o Recurso interposto pela Autora-Recorrente contra a douta Sentença recorrida.

    1. Com efeito, inexiste qualquer erro da decisão recorrida quanto à matéria de facto, quer porque a matéria de facto a que alude a A. Recorrente, ou não foi alegada, aquela que o foi não foi admitida pelo R. Recorrido, e, em todos os casos, é factualidade irrelevante para a decisão da questão de direito trazida a juízo pela A. no seu petitório e causa de pedir respectiva.

    2. Por outro lado, a douta Sentença recorrida NÃO viola os art.°s 2°, 3°, 8°, 88° do CPTA nem os art.°s 264°, 265°, 266°, 508° e 663° do CPC...

    3. Inquinada estaria, isso sim, de violação de lei e de nulidade, se tivesse decidido como pretende a A. Recorrente no seu recurso... é que não só violaria o princípio do dispositivo, como violaria o princípio da preclusão, e incorreria em nulidade por conhecer de factos que lhe não era possível conhecer, e deferiria pedido que nenhuma parte lhe tinha formulado.

    4. A Sentença recorrida NÃO viola os art.°s 659° a 661° do CPC.

    5. Violá-los-ia, isso sim, se tivesse decidido como agora pretende a A. Recorrente, com a mesma consequência de nulidade atrás invocada.

      ” Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

      *II. Objeto do recurso O presente recurso tem por objeto apenas a parte do despacho sanenador-sentença recorrido que julgou improcedente o pedido da Autora de condenação do Município Recorrido a executar o contrato celebrado com a QM a 20.01.2006, licenciando/autorizando a execução dos projetos constantes dos processos camarários n.ºs U-….e U-….e a abster-se de expropriar as parcelas de terreno pertencentes à QM que sejam necessárias à execução do Passeio Pedonal Guia-Guincho enquanto não cumprir o citado contrato de 20.01.2006.

      As questões a decidir, tal como delimitadas pelas conclusões das alegações da Recorrente,são as seguintes: a) “Ilegalidade” da decisão sobre a matéria de facto; b) Ilegalidade do indeferimento do pedido de condenação do Município Recorrido a executar o contrato; c) Ilegalidade do indeferimento do pedido de intimação do Município Recorrido a abster-se de expropriar as parcelas de terreno pertencentes à A./Recorrente.

      *III. Factos A decisão recorrida considerou assente a seguinte factualidade:

    6. A Q….. é...

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