Acórdão nº 11062/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Julho de 2014
Magistrado Responsável | RUI PEREIRA |
Data da Resolução | 24 de Julho de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO António ……….
, militar da GNR, residente em …………, A-………………., intentou no TAC de Lisboa, previamente à instauração da acção de impugnação de acto administrativo, um PROCESSO CAUTELAR contra o Ministério da Administração Interna, no qual peticiona a suspensão de eficácia do despacho do Ministro da Administração Interna, proferido em 10-1-2013, que lhe aplicou a pena disciplinar de reforma compulsiva, bem como ordenou a sua imediata apresentação ao serviço.
Por sentença datada de 20-12-2013, a Senhora Juíza do TAC de Lisboa julgou procedente o processo cautelar e concedeu a providência requerida [cfr. fls. 237/267 dos autos].
Inconformado com o assim decidido, o Ministério da Administração Interna recorre para este TCA Sul, concluindo a sua alegação nos seguintes termos: “A) A sentença recorrida incorre em erro de julgamento no que tange ao requisito "periculum in mora", porquanto, B) A execução do acto a que se reporta a sentença não acarreta para o recorrido prejuízos irreparáveis, em virtude de tais prejuízos serem susceptíveis de ser reparados a posteriori, caso obtenha vencimento a sua pretensão no processo principal.
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Poderá, ainda, o recorrido dispor de outros rendimentos, para além da pensão de reforma e abono de família, que concorram para a satisfação dos encargos que assumiu e das necessidades básicas da sua família.
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Não está também o mesmo inibido de exercer outra actividade profissional remunerada, para além de o rendimento auferido a título de pensão de reforma [cerca de € 488,00/mês] ser idêntico ao da remuneração mínima garantida [RMMG] para 2014.
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Quanto ao requisito "fumus non malus iuris", são manifestamente improcedentes os vícios imputados à decisão punitiva pelo requerimento inicial, no que concerne à medida da pena, uma vez que está em causa no procedimento disciplinar a prática de actos por militar de Força de Segurança que consubstanciaram a condenação, por sentença transitada em julgado, por nove crimes de corrupção passiva para acto ilícito.
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À gravidade dos factos e qualidade do agente só poderia corresponder uma pena expulsiva.
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Os factos dados como provados são claramente subsumíveis à violação dos deveres de correcção e aprumo, não se verificando a alegada errada fundamentação dos deveres violados.
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A relação funcional ficou inviabilizada, dada a natureza e gravidade das infracções cometidas, o que não pode ser infirmado pela posição assumida por um único elemento da GNR, neste caso, superior hierárquico do arguido do processo disciplinar, o então Comandante do Destacamento de Trânsito de Torres Vedras, de que se valeu o requerimento inicial.
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Com efeito, está em causa organização de natureza militar e policial, que tem de reger-se por elevados padrões de exigência ética.
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Não se encontra também provada a violação do princípio da igualdade, por alegado tratamento diferenciado a outros arguidos. Acresce que, o que se apura no processo disciplinar, é a culpa em concreto, não tendo sustentação qualquer sujeição da decisão disciplinar a um critério de precedente.
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Nestes termos, verifica-se igualmente erro de julgamento na apreciação do requisito "fumus non malus iuris", porquanto é manifesta a improcedência da acção principal.
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A sentença recorrida padece ainda de erro de julgamento na ponderação de interesses a que alude o nº 2 do artigo 120º do CPTA.
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A continuidade ao serviço do arguido em procedimento disciplinar impôs-se à Instituição GNR até ao trânsito em julgado do processo-crime e à conclusão do processo disciplinar onde foi aplicada a pena de reforma compulsiva, pelo que não podem extrair-se conclusões da referida permanência em funções sem perturbações no serviço.
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Como bem refere a sentença recorrida, "[...] estamos perante uma conduta altamente reprovável e censurável [...]", pelo que o regresso ao serviço do militar após a aplicação de pena disciplinar redunda em grave prejuízo para o interesse público, traduzido em nefastos efeitos ao nível da disciplina e do espírito de corpo, princípios nobres e basilares de uma Força de Segurança, militarmente organizada e exigindo o máximo rigor na conduta dos seus elementos.
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Citando a sentença recorrida, conclui-se, que é "[...] vantajoso que desta força não façam parte elementos que hajam sido condenados em processo-crime e que tenham sido alvo de um processo disciplinar e da correspondente pena de reforma compulsiva", pelo que deverá prevalecer o interesse público.
” [cfr. fls. 362/365 dos autos].
O requerente contra-alegou, pugnando pelo improvimento do recurso e pela manutenção da decisão recorrida [cfr. fls. 312/319 dos autos].
Sem vistos, vêm os autos à conferência para julgamento.
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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A decisão recorrida considerou assente a seguinte factualidade: i.
O requerente é guarda da GNR desde 1993, do quadro de infantaria – cfr. folhas de matrícula constantes de fls. 172 e 235, do processo administrativo.
ii.
O Comandante do Grupo Regional de ………………., em 17-1-2003 – na sequência de despacho de 8-1-2003, do Comandante da Brigada ………………, exarado sob a informação de 2-1-2003 –, ordenou a instauração de processo disciplinar contra o ora requerente, já que no âmbito do processo de inquérito nº ………../01.9TALRS este estava indiciado na prática de crime de corrupção passiva para acto ilícito, previsto e punido pelo artigo 372º, nº 1 do Código Penal, ao qual foi atribuído o nº …/24/03 – cfr. fls. 1 a 3 do processo administrativo.
iii.
Em 7-2-2003, o instrutor do processo disciplinar nº ………/24/03 elaborou uma notificação dirigida ao requerente no sentido de lhe dar a conhecer que iniciou a respectiva instrução, a qual foi assinada pelo requerente em 18-2-2003 – cfr. fls. 74, dos autos em suporte de papel, e fls. 5, do processo administrativo.
iv.
Em 25-2-2003, o Comandante do Grupo Regional ………. de Santarém, em concordância com a proposta do instrutor, determinou, face à manifesta dificuldade na recolha da prova, a suspensão do processo disciplinar nº 04/24/03, nos termos do artigo 96º do Regulamento de Disciplina da Guarda Nacional Republicana [RDGNR] – cfr. fls. 7, 8, 10, 11 e 12, do processo administrativo.
v.
Em 3-11-2010, o Comandante do Comando Territorial de Lisboa, em concordância com a proposta do instrutor, determinou a suspensão do processo disciplinar nº 04/24/03, nos termos do artigo 96º do RDGNR, até que transitasse em julgado o acórdão do STJ que teve por base o processo-crime nº ………./01.9TALRS.Sl – cfr. fls. 190, do processo administrativo.
vi.
Em 31-3-2006, no âmbito do processo nº ………../01.9TALRS, foi proferido, pela 3ª Secção da 1ª Vara Criminal de Lisboa, o acórdão constante do CD de fls. 249, do processo administrativo – constituído por 1034 folhas –, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual condenou o ora requerente por catorze crimes de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelo artigo 372º, nº 1 do Cód. Penal, na pena única de 6 anos e 6 meses de prisão – absolvendo-o dos restantes crimes de que vinha acusado/pronunciado – e na pena acessória de proibição do exercício de função pública pelo período de 5 anos.
vii.
Em 8-7-2008 foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa – transitado em julgado em 11-5-2011 –, constante do CD de fls. 249, do processo administrativo – constituído por 1633 folhas –, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual julgou parcialmente procedente o recurso interposto pelo ora requerente do acórdão descrito em vi., nos seguintes termos: - absolvendo-o de cinco crimes de corrupção passiva para acto ilícito; - mantendo a condenação pela prática de nove crimes de corrupção passiva...
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