Acórdão nº 11314/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 06 de Agosto de 2014

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução06 de Agosto de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

O Ministério da Administração Interna/Direcção Nacional da PSP, entidades com os sinais nos autos, inconformadas com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra dela vêm recorrer, concluindo como segue: 1. O Tribunal a quo decretou a providência cautelar de suspensão de eficácia do acto que determina a suspensão de funções e desarmamento de elemento policial, no âmbito do processo disciplinar n.9 2011LSB00290DIS.

  1. O ato administrativo suspenso pelo tribunal a quo foi praticado ao abrigo do exercício da actividade administrativa total mente vinculada à lei.

  2. De facto, o 1° Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa informou a PSP de decisão instrutória transitada em julgado, a qual pronunciou o ora Recorrido da prática de crimes com moldura penal superior a três anos.

  3. Perante este pressuposto de facto, a Administração limitou-se a aplicar a lei, a qual determina no n.9 1 do artigo 38.9 do Regulamento Disciplinar da PSP, aprovado pela Lei n.9 7/90, de 20 de fevereiro (RD/PSP), que «O despacho de pronúncia ou equivalente com trânsito em julgado em processo penal por infracção a que corresponda pena de prisão superior a três anos determina a suspensão de funções e a perda de um sexto do vencimento base até à decisão final absolutória, ainda que não transitada em julgado, ou até à decisão final condenatória.» (sublinhado e negrito nosso).

  4. No mesmo ato foi também determinado o desarmamento do ora Recorrido como medida cautelar, nos termos da ai. a) do nº 1 do artigo 74 do RD/PSP.

  5. Em 17 de fevereiro de 2014, o ora Recorrido requer a decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo, alegando, no mais, que o artigo 38.° do RD/PSP é inconstitucional por violar os princípios da adequação, da proporcionalidade e da presunção de inocência.

  6. Perante a providência requerida, a qual é conservatória, o Tribunal a quo, na fundamentação da sua decisão analisa se estão verificados os pressupostos para decretação da mesma, decidindo, e bem, não estar verificado o fumus bonis iuris de máxima intensidade, previsto na ai. a) do n.9 1 do artigo 120.9 do CPTA, o qual seria susceptível de permitir, respeitados que fossem os princípios do equilíbrio e da necessidade, previstos nos nºs 2 e 3 do artigo 120º9 do CPTA, o decretamento da providência requerida.

  7. Já quanto ao fumus non malus iuris, ínsito na segunda parte da ai. b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, o tribunal a quo entende que não é manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular no processo principal, na medida em que, e cita-se:"Já quanto ao fumus non malus iuris, à partida e sem prejuízo de posição eventualmente diversa, em sede da acção principal, considera haver alguma probabilidade (algum fumus boni iuris) de se reconhecer a sua ofensa, pelo artigo 38-1, do ED/PSP/90, na medida em que determina um efeito automático, tirado da circunstância de ser proferida decisão de pronúncia por crime punível com pena de prisão superior a 3 anos." 9. Verifica-se que, o juiz do tribunal a quo, ao invés de apreciar e decidir a questão da constitucionalidade da norma constante do nº 1 do artigo 38º do RD/PSP, ainda que de modo perfunctório, refere, apenas, que: "Porém, não se exclui que exista alguma possibilidade de a pretensão da desproporcionalidade vir a ser atendida." 10. Ora, em sede de fiscalização concreta e difusa da constitucionalidade de normas, cabe aos tribunais desaplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados - artigo 204.e da CRP, ainda que no âmbito dos processos cautelares, tal juízo sobre a inconstitucionalidade de normas seja um juízo perfunctório, dependente da decisão a proferir no processo principal.

  8. Caso haja esse juízo de inconstitucionalidade, poderá ser decretada determinada providência cautelar que vise suspender a eficácia de ato administrativo praticado ao abrigo de norma ordinária que o tribunal considere infringir norma ou princípio plasmado na CRP.

  9. Ademais, pode-se ainda dizer que o tribunal, onde tramite o processo cautelar, perante a convicção de que determinada norma, em que se fundamentou a prática do ato administrativo, é inconstitucional, deverá, nesses casos, decretar a providência nos termos da ai. a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA e não com fundamento na segunda parte da ai. b) do mesmo dipositivo legal, uma vez que a desaplicação da norma ordinária torna, necessariamente, o ato administrativo manifestamente ilegal.

  10. Assim sendo, não tendo o tribunal a quo decidido que a norma vertida no nº 1 do artigo 38º do RD/PSP viola regra ou princípio consignado na CRP (não basta considerar "existir alguma possibilidade”), não poderia a decisão recorrida alicerçar-se na violação do princípio constitucional da proporcionalidade para verificar preenchido o critério "fumus negativo" previsto na segunda parte da ai. b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA.

  11. Nesses termos, sempre se deveria considerar manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular no processo principal, na medida em que o ato administrativo que suspendeu o Recorrido de funções foi praticado ao abrigo de norma totalmente vinculativa para a Administração, não fornecendo a lei qualquer margem de discricionariedade na aplicação da mesma.

  12. A aplicação do nº 1 do artigo 38º do RD/PSP não carece de qualquer juízo valorativo a exercer por parte da Administração, pelo contrário, a decisão pela suspensão de funções é determinada por pressupostos totalmente vinculados à lei, não cabendo, verificados que estejam os pressupostos de facto previstos na lei, qualquer margem de discricionariedade administrativa.

  13. De qualquer modo, o problema da constitucionalidade de norma semelhante ao artigo 38º do RD/PSP já foi apreciada pelo Tribunal Constitucional, o qual concluiu por um juízo de não inconstitucionalidade - cfr.

    Ac. do Tribunal Constitucional nº 439/87, disponível em www.tribunalconstitucional.pt .

  14. Assim, e estando em causa uma providência conservatória, ao não se verificar o critério da ai. a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA e não sendo suficiente o critério previsto na primeira parte da ai. b) do mesmo artigo (periculum in mora), na medida em que o mesmo é cumulativo com o fumus non malus iurís, previsto na segunda parte da norma, o qual, como supra se demonstrou, não se verifica, a providência cautelar não deveria ter sido decretada.

  15. Nessa senda, deve merecer provimento o recurso ora interposto pelo Recorrente, o qual deve ser julgado procedente, revogando-se a decisão proferida pelo tribunal a quo e absolvendo-se o Recorrente do pedido, assim se fazendo a tão almejada Justiça.

    * O Recorrido contra-alegou, concluindo como segue: 1. A douta sentença não decretou a providência com base na ai. a) do nº l do artº 120º do CPTA, ou seja, com fundamento na existência do fumus boni iuris.

  16. ...

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