Acórdão nº 07945/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução16 de Outubro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul l – RELATÓRIO Mário ………… e Cristina ……., residentes na Urbanização …………., Lote 40 41, ……………., L……….., inconformados com a sentença nos autos proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que negou provimento ao recurso da decisão proferida pelo Senhor Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira em 4-12-2013, que determinou o acesso directo às suas contas e documentos bancários, com referência aos anos de 2010 e 2011, nos termos do disposto nos artigos 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 63.º-B da Lei Geral Tributária, dela interpuseram o presente recurso jurisdicional para o Supremo Tribunal Administrativo.

As alegações que apresentaram encontram-se sintetizadas (após convite nesse sentido formulado) nas seguintes conclusões: «1.

A Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que a decisão de levantamento bancário recorrida não padece de inconstitucionalidade por não concessão de direito de audição dos Recorrentes, previamente à sua prolação, em violação frontal do direito de audição prévia dos Recorrentes, exigido pelo disposto no artigo n°267°, n°5, da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), artº.100º, 101º, 102º e 103° do Código de Procedimento Administrativo (doravante CPA), artigo 60º da Lei Geral Tributária (doravante LGT).

  1. O artº 63º-B da LGT não contém actualmente disposição relativa à audiência dos interessados, previamente à decisão de derrogação do sigilo bancário, mas inexistem razões que justifiquem a sua dispensa, pelo que se deve considerar a manutenção da exigibilidade da mesma, sob pena de inconstitucionalidade da norma.

  2. A Sentença recorrida mas andou mal ao defender que a decisão recorrida era legal, apesar de não ter sido precedida de audição prévia, com fundamento na participação dos Recorrentes no procedimento de inspecção, pelos pedidos de apresentação de elementos da AT e pelas respostas aos mesmos.

  3. A decisão recorrida de derrogação do sigilo bancário apresenta fundamentos que não foram antes revelados no procedimento e em relação aos quais os Recorrentes nunca puderam pronunciar-se previamente à decisão, designadamente o constante do ponto L) do probatório, pois apenas na decisão recorrida é: (i) referido como a AT chegou à taxa de juro de 4%, partindo da evolução da EURIBOR, (ii) indicado o motivo pelo qual considerava que os elementos apresentados não permitiam aferir do declarado pelos Recorrentes e (iii) a analisada a transmissão e participações sociais pelos Recorrentes e indicados os factos apurados.

  4. Os Recorrentes pediram à AT que especificamente lhes fosse esclarecido como foi apurada a taxa de juro de 4%, conforme ponto K) do probatório, e não obtiveram resposta, vindo a justificação apenas na decisão recorrida.

  5. A decisão recorrida foi surpresa para os Recorrentes, que julgavam ter esclarecido o que lhes era legalmente exigido, conforme ponto K) do probatório.

  6. A necessidade de agilidade e celeridade da AT no controlo à fraude e evasão fiscal não são degradados pela concessão de direito de audição prévia aos contribuintes, nos procedimentos de prova, quando os mesmos sejam directamente lesivos de direitos dos contribuintes, como é o caso do direito à reserva da intimidade pessoal, afectado pela derrogação do sigilo bancário.

  7. No caso vertente a AT esteve 7 meses sem realizar qualquer diligência de prova e dava prazos de resposta de 10 dias aos Recorrentes para apresentação de elementos e esclarecimentos (probatório G), H) e J)), logo não eram 15 que iriam afectar o andamento do procedimento tributário, o que atesta, salvo o devido respeito, a irrazoabilidade até do julgamento da Sentença recorrida, com desrespeito pelas anteriormente referidas normas legais, o que deverá conduzir à respectiva anulação.

  8. A Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar verificados os requisitos legais para a decisão de levantamento do sigilo bancário, violando o disposto na al. c) do nº1 do artº63°-B e al. f) do nº1 do art 87°, ambos da LGT.

  9. O Director Geral da AT apenas poderá determinar a derrogação do sigilo bancário dos contribuintes quando, cumulativamente se verificar (i) a existência de indícios de acréscimo de património não justificado (ii) esse acréscimo seja superior a 100.000,00 €; (iii) falta de declaração de rendimentos, divergência não justificada do acréscimo de património com os rendimentos declarados.

  10. Ora, o raciocino Sentença recorrida padece de dois graves erros: (1) não compreende que os indícios se reportam à ausência de justificação ao invés de se reportarem às manifestações de fortuna; (2) escamoteia que o art. 63°-B n°1 al. e) da LGT remete de facto para o artº87° n°1 al. f) da LGT.

  11. Ao contrário do indicado pela Sentença recorrida a AT não prova, conforme lhe competia, nos termos do artº74° nº1 da LGT, a existência de indícios de acréscimo de património não justificado de valor superior a (euro) 100 000, pois os indícios de acréscimo de património alegados pela AT resultam de um mero juízo hipotético de capital investido em depósitos bancários pelos Recorrentes.

  12. A AT não apresenta indícios da existência de acréscimo de património não justificado, pois apenas apresenta como facto a variação de juros de depósitos bancários de 26.826,47€, em 2010, para 172.421,58€, em 2011, e esse rendimento variação não tem sequer que ser declarado.

  13. A Sentença recorrida incorre em erro de julgamento pois o disposto na al. c) do nº1 do artº63°-B e al. f) do n°1 do art.87°, ambos da LGT, não permite à AT exigir ao contribuinte que prove a origem de variações nos juros percepcionados, nem permite, pela variação dos juros, proceder ao levantamento do sigilo bancário, pois não se tratam de rendimentos sujeitos a declaração pelo contribuinte.

  14. Os juros bancários anuais não podem de per si ser considerados manifestação de fortuna, para efeitos de aplicação da al. f) do nº1 do art.87° da LGT, o mesmo parte do princípio da anualidade — fazendo corresponder património e rendimentos declarados no ano - porquanto juros percepcionados num ano nada têm obrigatoriamente com os rendimentos do ano, sendo que, normalmente até reportar-se-ão a rendimentos de anos anteriores.

  15. O indício de acréscimo de património não pode ser a variação de juros, pois os mesmos não têm que ser declarados e não têm que se reportar aos rendimentos do período, sendo que se fosse a mera variação de juros não faria sentido a AT especular o valor do capital investido com taxas de juros de 4%, bastaria a mera indicação do valor dos juros, em singelo.

  16. A AT sabe do pagamento aos Recorrentes em Julho de 2010 de 3.000.000,00 €, e de 1.500.000,00 em Janeiro de 2011, pelos cheques que lhes foram emitidos e descontados, logo prova-se que os Recorrentes receberam em 2010 até mais valor que o especulado pela AT, inexistindo falta de justificação para a variação de juros obtida.

  17. O acréscimo de património considerado pela AT e pela Sentença recorrida é o capital investido e o mesmo não foi provado, como exigem al. c) do nº1 do art.63°-B e al. f) do nº1 do art.87°, ambos da LGT, já que foi apresentado, como mera hipótese.

  18. Não existe base legal para a AT especular capital investido, através de juros percepcionados, sendo tal raciocínio violador do disposto no art.º55° da LGT, que sujeita a actividade da AT ao princípio da legalidade.

  19. O raciocínio de apuramento do valor do capital investido através da análise singela ao valor objectivo de juros, não é presuntivo, mas hipotético e ainda que fosse presumido, não poderia tal presunção ser considerada indício.

  20. Um aumento dos juros bancários recebidos não significa desde logo, à partida um aumento do capital investido.

  21. Um aumento dos juros recebidos pode ter várias causas: aumento das taxas de juro; diferente período de maturidade do depósito; alteração do depósito contratado; pagamento de juros postecipados; etc.

  22. A variação do valor absoluto de juros pagos não permite a conclusão, firme, segura e sólida de que houve aumento do capital investido.

  23. Se apenas se conhece o valor dos juros anuais, para se chegar ao capital investido é necessário atender a vários factores, tais como: taxa de juro, condições de determinação da taxa de juro (fixa, crescente, etc.), período de depósito do capital, momento da maturidade do depósito; condições do pagamento de juros (ex. postecipados, periódico, capitalizados, etc.); cumprimento do prazo e condições de depósito, para ter direito ao pagamento do valor de juro acordado juros; tipo de produto associado ao depósito bancário (cross selling, etc).

  24. Logo é impossível presumir capital só através do valor de juros, sendo no máximo possível formular uma hipótese de apuramento do capital investido, com a mesma validade de um número praticamente infinito de outras hipóteses, que têm a mesma probabilidade de verificação real.

  25. A AT utilizou de forma totalmente discricionária uma taxa de 4% para especular de forma aleatória o capital a partir dos juros, violando o princípio da legalidade, a que se encontra sujeita, nos termos do nº1 do artº55° da LGT.

  26. A taxa de juro ficcionada pela AT de 4% para não tem qualquer base factual, pois a EURIBOR não corresponde às taxas de juros praticadas pelas instituições bancárias para remuneração dos depósitos de particulares, já que a EURIBOR, segundo a definição do Banco de Portugal é a taxa de juro média, pela qual os "prime banks" emprestam dinheiro a outros "prime banks ".

  27. As EURIBOR tiveram flutuações enormes em 2010 e 2011, passando os máximos registados num ano de 1.546% para 2,201% e os mínimos de 0.336% para 0.552/, não se compreendendo porque motivo a AT apura uma taxa de 4%, sendo que as taxas médias de juros pagos pelos Bancos portugueses para novos depósitos com maturidade até 1 ano, praticamente todo o ano de 2010 ficaram abaixo de 1,91 e em 2011 estiveram sempre...

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