Acórdão nº 11251/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelCATARINA JARMELA
Data da Resolução11 de Setembro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

*I - RELATÓRIOO Ministério Público intentou no TAC de Lisboa, nos termos dos arts. 9º e 10º, da Lei 37/81, de 3 de Outubro (Lei da Nacionalidade), na redacção da Lei 2/2006, de 17/4, e dos arts. 56º e ss., do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo DL 237-A/2006, de 14/12, acção, com processo especial, de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa contra Luís ……………..

, casado, de nacionalidade venezuelana, no qual peticionou que se ordenasse o arquivamento do processo conducente ao registo de aquisição da nacionalidade portuguesa pelo réu, pendente na Conservatória dos Registos Centrais, por inexistência de ligação efectiva à comunidade portuguesa.

O réu deduziu contestação.

Por decisão de 31 de Janeiro de 2014 do referido tribunal foi julgada procedente a presente oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa por parte do réu, indeferindo-se a sua pretensão de aquisição da nacionalidade portuguesa.

Inconformado, o réu interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões: «(…)».

O recorrido contra-alegou pugnando pela manutenção do decidido.

As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento ao ter considerado como verificado o fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa previsto no art. 9º, al. a), da Lei da Nacionalidade, e no art. 56 n.º 2, al. a), do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (cfr. alegações de recurso e respectivas conclusões, supra transcritas).

II - FUNDAMENTAÇÃO Na sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos: «(…)».

Nos termos do art. 662º n.º 1, do CPC de 2013, ex vi art. 140º, do CPTA, adita-se a seguinte factualidade: F) Em 20 de Abril de 2006, em Buenos Aires, Argentina, nasceu Valeria …………………., filha de Deusa ……………….

e do requerido, à qual foi atribuída a nacionalidade portuguesa, conforme registo lavrado em 1.4.2009 (cfr. fls. 48).

  1. Em 5 de Dezembro de 2007, em Buenos Aires, Argentina, nasceu Alejandro …………….., filho de Deusa ……………..

    e do requerido, ao qual foi atribuída a nacionalidade portuguesa, conforme registo lavrado em 1.4.2009 (cfr. fls. 50).

  2. O requerido correspondeu-se com a Conservatória dos Registos Centrais através de mensagens de correio electrónico, escritas em língua portuguesa, enviadas em 7.12.2012, 26.12.2012, 27.12.2012 e 3.1.2013, nos termos constantes de fls. 57, 77, 79 e 89, respectivamente, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

    *Presente a factualidade antecedente, cumpre entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

    O TAC de Lisboa, por decisão de 31 de Janeiro de 2014, considerou como verificado o fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa previsto no art. 9º, al. a), da Lei da Nacionalidade, e no art. 56 n.º 2, al. a), do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, razão pela qual julgou procedente a presente acção.

    O recorrente defende que a decisão ora sindicada violou tais normativos legais, bem como o art. 57º n.º 1, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, por entender que ficou demonstrada a sua ligação efectiva à comunidade nacional. Argumenta ainda que tal decisão contraria os arts. 13º n.º 2 e 18º n.º 2, ambos da CRP.

    Passemos, então, à análise do acerto (ou não) da decisão judicial recorrida.

    Quanto à alegação de que esta viola os arts. 13º n.º 2 e 18º n.º 2, ambos da CRP, não se pode conhecer da mesma, dado que o recorrente não explicita a(s) razão(ões) pela(s) qual(is) ocorre tal violação, limitando-se a afirmar, conclusivamente, a existência dessa violação e a transcrever o conteúdo desses normativos constitucionais.

    Cumpre, então, conhecer da invocada violação do art. 9º, al. a), da Lei da Nacionalidade, e dos arts. 56 n.º 2, al. a), e 57º n.º 1, ambos do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, por parte da decisão recorrida.

    De acordo com o disposto no art. 3º n.º 1, da Lei da Nacionalidade (Lei 37/81, de 3 de Outubro, na redacção da Lei Orgânica 2/2006, de 17/4), “O estrangeiro casado há mais de três anos com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na constância do matrimónio.

    ” (cfr., em sentido idêntico, o art. 14º n.º 1, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo DL 237-A/2006, de 14/12), declaração que o réu, ora recorrido, prestou em 29.2.2012 (cfr. al. D), dos factos provados).

    Esta solução legal inspira-se na protecção do interesse da unidade da nacionalidade familiar.

    O legislador não impõe este princípio da unidade, mas é uma realidade em que se encontra interessado e que por isso promove ou facilita sempre que ela seja igualmente querida pelos interessados.

    Com efeito, o facto relevante para a aquisição da nacionalidade não é o casamento – o estabelecimento de uma relação familiar -, mas a declaração de vontade do estrangeiro que case com um nacional português – cfr., os citados arts. 3º, da Lei da Nacionalidade, e 14º n.º 1, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa. Como adverte Rui Manuel Moura Ramos, Do Direito Português da Nacionalidade, 1992, pág. 151, “o casamento não é mais do que um pressuposto de facto necessário dessa declaração mas não é ele o elemento determinante da aquisição”.

    Assim, no regime da nossa lei, a aquisição da nacionalidade portuguesa pode ter lugar desde que o estrangeiro casado há mais de três anos com nacional português declare, na constância do casamento, que pretende adquirir esta nacionalidade.

    Mas o efeito da aquisição da nacionalidade não se produz inelutavelmente pela simples verificação do facto constitutivo que a lei refere – a manifestação de vontade do interessado.

    De facto, importa também que ocorra uma condição negativa, ou seja, que não haja sido deduzida pelo Ministério Público oposição à aquisição da nacionalidade ou que, tendo-a sido, ela seja considerada judicialmente improcedente.

    A intencionalidade deste instituto é clara: visa evitar a penetração indesejada de elementos que não reúnam os requisitos considerados, por lei, necessários para aquisição da nacionalidade por efeito da vontade, ou seja, que o casamento não seja designadamente um simples meio para a aquisição da nacionalidade portuguesa.

    Estipula o art. 9º, da Lei da Nacionalidade (cfr.

    em sentido idêntico o art. 56º n.º 2, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo DL 237-A/2006), na redacção da Lei Orgânica 2/2006, de 17/4, que: “Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa: a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional; b) A condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo legal igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa; c) O exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro.”.

    O ora recorrido instaurou a presente acção de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa pelo ora recorrente por considerar que se verificava o fundamento inscrito na alínea a) deste art. 9º (e na al. a) do n.º 2 do art. 56º, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa). A decisão recorrida julgou procedente esta acção. O recorrente defende que a mesma viola precisamente tal normativo legal (e a al. a) do n.º 2 do art. 56º, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa), por entender que logrou provar a ligação efectiva à comunidade nacional.

    Vejamos, então, se existe tal violação.

    A mencionada “ligação efectiva à comunidade nacional” é verificada através de algumas circunstâncias objectivas que revelam um sentimento de pertença a essa comunidade, como é o caso, entre outras, da língua portuguesa falada em família ou entre amigos, das relações de amizade e profissionais com portugueses, do domicílio, dos hábitos sociais, das apetências culturais, da inserção económica, ou interesse pela história ou pela realidade presente do País.

    A este propósito alega o recorrente nomeadamente que tem várias amizades com cidadãos portugueses, convive diariamente com a música, língua e a realidade social portuguesas, defende a cultura portuguesa, ama o povo português e conhece Portugal.

    Verifica-se, no entanto, que o recorrente não logrou provar tais factos, já que não produziu qualquer prova quanto aos mesmos. Aliás, porque tais factos não foram provados pelo recorrente, a decisão sindicada não deu os mesmos como provados.

    No caso vertente, e com relevo, encontra-se provado que o recorrente está casado com cidadã portuguesa há mais de 14 anos, tem dois filhos em comum, os quais têm a nacionalidade portuguesa, conhece a língua portuguesa e, aquando da formulação do pedido de aquisição da nacionalidade portuguesa, declarou ter ligação efectiva à comunidade portuguesa...

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