Acórdão nº 12302/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 31 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelCATARINA JARMELA
Data da Resolução31 de Julho de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

* I - RELATÓRIO Cláudio …………………… intentou no TAF de Loulé o presente processo cautelar contra o Ministério da Administração Interna, indicando como contra-interessada …………………….., Lda., e no qual formulou os seguintes pedidos: a) Convolação da presente providência em processo principal, com a consequente antecipação da apreciação da causa de pedir e dos pedidos formulados no âmbito do articulado principal junto; Caso assim não se entenda, b) Suspensão da eficácia do acto/decisão administrativa exarada pela entidade requerida em 30/09/2014, notificada no dia 03/10/2014, que determinou o cancelamento do cartão profissional de vigilante, n.º 82144, das especialidades de vigilante/segurança e assistente de recinto desportivo, atribuído ao requerente, permitindo-lhe a prossecução da sua actividade profissional enquanto não existe decisão principal.

Por decisão de 3 de Abril de 2015 do referido tribunal foi: - indeferido o pedido de antecipação do juízo sobre a causa principal; - julgado procedente o presente processo cautelar e, consequentemente, decretada a suspensão da eficácia do acto administrativo consubstanciado no despacho do Director-Nacional Adjunto da Polícia de Segurança Pública, datado de 26 de Setembro de 2014, que determinou o “cancelamento” do cartão profissional do requerente para o exercício da actividade de segurança privada.

Inconformada, a entidade requerida interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões: “1. A Lei n.° 34/2013 fixou, no seu artigo 22°, na parte que agora interessa, um regime mais apertado de incompatibilidades para o exercício da atividade de segurança privada, relativamente ao regime anterior, estabelecendo que o pessoal de vigilância deve preencher, permanente e cumulativamente com os demais, o requisito da alínea d) do seu n.° 1, em conjugação com o n.° 2, ou seja, "não ter sido condenado, por sentença transitada em julgado, pela prática de crime doloso previsto no Código Penal e demais legislação penal".

  1. Ao alargar o âmbito do requisito da inexistência de condenações para o exercício da actividade de segurança privada, de forma permanente, a todos os crimes dolosos (deixando apenas de fora os crimes por negligência), sem qualquer salvaguarda superveniente, a nova lei não permite a nenhum condenado por crime doloso, o exercício daquela actividade, não sendo relevante nem possível sequer a qualificação da conduta criminosa pela Administração.

  2. Releva-se na lei ordinária a função subsidiária e complementar da actividade das forças e serviços de segurança pública do Estado, requerendo-se que a segurança privada seja exercida, permanentemente, por pessoas de cadastro criminal sempre limpo, sobrepondo-se, aqui, o interesse coletivo aos interesses particulares de quem a pretenda exercer.

  3. Ao contrário do que refere a douta sentença recorrida, as normas contidas na alínea d) do n.º 1 do artigo 22°, por referência do seu n.º 2, da Lei n.º 34/2013, na interpretação e aplicação que dela fez o despacho sub iudicio, não são inconstitucionais, por violação do n.º 4 do artigo 30° da Constituição, em conjugação com a violação de princípio da proporcionalidade.

  4. O objetivo e o sentido das normas da alínea d) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 22° da Lei n.º 34/2013, estão claramente focados na circunstância de estarmos em presença de requisitos e incompatibilidades para o exercício da atividade de segurança privada, e não de efeitos automáticos da condenação que se possam simplesmente reconduzir a uma situação de perda de direitos profissionais.

  5. A Administração não goza do poder de valoração da conduta criminosa e é a lei que, segundo um critério apriorístico, equaciona, ela própria, a "idoneidade" do candidato ao exercício da atividade de segurança privada (no caso de acesso) ou da continuação da actividade exercício (em caso de renovação), excluindo "a contrario" do catálogo dos crimes, unicamente, os crimes praticados por negligência e, aqui está, concludentemente, a única faculdade deixada à Administração para balizar a proibição do excesso.

  6. Como não pode delimitar (a Administração), de entre os crimes dolosos, quais os crimes que, por esta ou aquela razão, se possam ou não considerar como obstando à violação do princípio da proporcionalidade, nem apreciar e valorar as condutas pelas quais houve condenação, porque a lei não o permite.

  7. Segundo a letra e o espírito da lei actual, estamos em presença de requisitos legais para o exercício de uma actividade que requer, como tantas outras, condições especiais para o seu exercício, sem que isso possa consubstanciar o efeito automático de uma condenação eventualmente violadora do princípio constitucional da proporcionalidade, na vertente da proibição do excesso, e sem que tal possa ser qualificado como restrição de direitos profissionais objetivos ou subjetivos, em abstrato ou em concreto, em função dos bens jurídicos a proteger.

  8. Por outro lado, o legislador pretendeu também aplicar o novo regime a todas as renovações dos cartões profissionais, estabelecendo que a renovação depende da verificação, à data do pedido, dos requisitos exigidos para a sua concessão (art.º 52º), o que afasta, salvo melhor opinião, a violação do disposto no artigo 18°, n.º 3 da Constituição, ao contrário do que se decidiu na douta sentença recorrida.

  9. A este propósito, deve entender-se que a nova lei impõe que as renovações dependem da circunstância do pessoal de vigilância preencher todos os requisitos do seu artigo 22°, nomeadamente, nunca ter sido condenado, por sentença transitada em julgado, pela prática de qualquer crime doloso, independentemente do tempo da prática do crime, uma vez que impõe a verificação permanente de todos os requisitos legais e não apenas da ausência de condenação por crime doloso.

  10. Também aqui, não se trata da aplicação retroactiva de uma norma restritiva de um direito profissional, mas da aplicação de normas impositivas de verificação de requisitos, a todo o tempo e, em concreto, no momento da verificação da ausência dos mesmos, o que, no caso dos autos, se verificou na data do pedido de renovação do cartão profissional.

  11. A esta luz, não poderia o tribunal ter decidido, como decidiu, pela não aplicação das normas da alínea d), do n.º 1 e n.º 2 do artigo 22° da Lei n.º 34/2013, no sentido que resulta do despacho sub iudicio, por violação do disposto no artigo 30°, n.º 4 da Constituição (e do seu art.º 18º, n.º 3), sendo certo, como se julga, não ser evidente a procedência da pretensão formulada no processo principal, incorrendo, consequentemente, a sentença em erro de julgamento na apreciação do critério plasmado no artigo 120°, n.º 1, al. a) do CPTA que, em consequência, violou.

  12. Assim, e tratando-se uma providência conservatória, ao não se verificar o critério da evidência previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 120° do CPTA, não deveria a mesma ter sido decretada, motivo por que deve o presente recurso ser julgado procedente, com revogação da sentença recorrida e indeferimento da providência requerida, Como se nos afigura de justiça!”.

O recorrido, notificado, não apresentou contra-alegações.

A DMMP junto deste TCA Sul emitiu parecer, no qual sustenta que o recurso não merece provimento, posicionamento esse que, objecto de contraditório, não mereceu qualquer resposta.

II - FUNDAMENTAÇÃO Na decisão recorrida foram dados como sumariamente provados os seguintes factos: a) O autor exerce, desde Agosto de 2008, a profissão de segurança privado, sob as ordens, direcção e fiscalização da "…………………………., Lda.", tendo-lhe sido atribuído, para o efeito, o cartão profissional n.º 82144, nas especialidades de vigilante e de assistente de recinto desportivo; b) Em 24 de Maio de 2013, foi apresentado, junto dos serviços da Direcção Nacional da Polícia de Segurança Pública, um pedido de renovação do cartão profissional do autor, nas especialidades de vigilante/segurança; c) O referido pedido foi instruído com um certificado de registo criminal do requerente, nas quais constavam averbadas as seguintes decisões condenatórias: i.

Sentença do 2.° Juízo de Competência Criminal do Tribunal Judicial de Loulé, no processo n.º 1319/08.8GTABF, transitada em julgado, pela qual o autor foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3°, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n°2/98, de 3 de Janeiro, praticado em 29 de Dezembro de 2008, na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de € 10,00, perfazendo a quantia total de € 600,00, a qual foi declarada extinta em 24 de Março de 2009; ii. Sentença do 2.° Juízo do Tribunal judicial de Olhão, no processo n.º 285/10.4GTABF, transitada em julgado, pela qual o autor foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3°, n.°s 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, praticado em 21 de Abril de 2010, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 8,00, perfazendo a quantia total de € 800,00, a qual foi declarada extinta em 7 de Fevereiro de 2011; iii.

Sentença do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Olhão, no processo n.º 303/09.9GTABF, transitada em julgado, pela qual o autor foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3°, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, praticado em 30 de Julho de 2009, na pena de 3 meses e 15 dias de prisão, suspensa por 1 ano, a qual foi declarada extinta em 24 de Maio de 2012; (cf. fls. 9 e 14 do processo administrativo), d) Em 26 de Setembro de 2014, após proposta emitida pelos serviços no procedimento, foi proferido despacho pelo Director-Nacional Adjunto da Polícia de Segurança Pública, que "cancelou" o referido cartão profissional, nos seguintes termos: «CANCELO o cartão profissional para o exercício da actividade de segurança privada, de CLÁUDIO ………………………… […] com o n.º 82144 para as especialidades de Vigilante/Segurança e...

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