Acórdão nº 12099/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelCATARINA JARMELA
Data da Resolução11 de Junho de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

* I - RELATÓRIOA………. S………, SA, intentou no TAC de Lisboa acção administrativa comum contra B……. – Concessão ……………., SA, na qual peticionou a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 3548,68, acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento.

Por decisão de 17 de Outubro de 2014 do referido tribunal foi decidido declarar a incompetência em razão da matéria dos tribunais administrativos e, em consequência, a incompetência absoluta do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa para conhecer da presente acção administrativa comum e absolver a ré da instância.

Inconformada, a autora interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões: « (Imagem)» “ A recorrida, notificada, não apresentou contra-alegações.

A DMMP junto deste TCA Sul emitiu parecer no sentido da procedência do presente recurso jurisdicional, posicionamento esse que, objecto de contraditório, não mereceu qualquer resposta.

II - FUNDAMENTAÇÃO Com interesse para a decisão considera-se assente o seguinte facto: 1) A petição inicial da presente acção foi remetida por correio registado de 19 de Dezembro de 2013 e consta de fls. 3 a 18, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e onde se consignou designadamente o seguinte: “(…) «(Imagem)» (…)” (cfr. fls. 2 e 49, dos autos, no que respeita ao modo e data de apresentação da petição inicial).

*Presente a factualidade antecedente, cumpre analisar a questão suscitada, a qual se resume, em suma, em saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento ao considerar que os tribunais administrativos são incompetentes, em razão da matéria, para apreciar e decidir o pedido formulado na petição inicial.

É pacífico o entendimento que a competência em razão da matéria afere-se em função dos termos em que o processo é proposto, isto é, a mesma tem por subjacente a pretensão do autor (pedido formulado) e os fundamentos (respectiva causa de pedir) em que este a alicerça e fixa-se no momento da propositura da acção (cfr. art. 5º n.º 1, do ETAF, aprovado pela Lei 13/2002, de 19/2).

No caso sub judice a autora, ora recorrente, intentou a presente acção administrativa comum tendo em vista a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 3548,68, acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento.

Fundamenta tal pedido: - na outorga de um contrato de seguro de responsabilidade civil do ramo automóvel, com um plano de cobertura multi-protecção automóvel, respeitante ao veículo automóvel matrícula 47-71-US; - na circunstância de o veículo seguro, quando circulava, no dia 14 de Abril de 2013, na auto-estrada n.º 10 (A10), ao quilómetro 13, a cerca de 100 km/h, ter sofrido danos como resultado da colisão com uma raposa que surgiu, de forma súbita e inesperada e em corrida, na via em que circulava.

Este é o quadro fáctico, nos termos do qual se impõe determinar se a ordem jurisdicional administrativa é a competente para conhecer do litígio.

Sobre a presente questão passa-se a transcrever o Ac. do Tribunal de Conflitos de 12.3.2015, proferido no âmbito do proc. n.º 49/14, dado que, por um lado, o entendimento aí plasmado é plenamente aplicável ao caso sub judice e, por outro lado, concorda-se com o que aí se escreveu: “A questão não tem merecido resposta unânime por parte deste Tribunal: na verdade, não obstante a maioria da jurisprudência considerar, em situações análogas, que a competência é da jurisdição administrativa - cf., v.g., Acórdãos do Tribunal de Conflitos com os n.ºs 025/09, de 20-01-2010, 046/13, de 27-03-2014, 017/13, de 30-05-2013, e 048/13, de 27-02-2014 (este último com dois votos de vencido) - existe, pelo menos, um Acórdão do Tribunal dos Conflitos, de 18-12-2013 (Proc. n.º 028/13) que considerou, em caso similar, que a situação “não se enquadra juridicamente na previsão do art. 1.°, n.º 5, da Lei n.º 67/2007”, acabando por concluir pela competência dos tribunais comuns.

A delimitação das jurisdições, correspondentes aos tribunais judiciais, por um lado, e aos tribunais administrativos e fiscais, por outro lado, implica a apreciação das respectivas áreas de competência, constituindo um pressuposto processual que deve ser apreciado antes da questão (ou questões) de mérito, aferindo-se pela forma como o autor configura a acção, e definindo-se pelo pedido, pela causa de pedir e pela natureza das partes.

O poder jurisdicional, como se sabe, está repartido por categorias de tribunais, de acordo com as matérias das causas suscitadas perante eles – cf. arts. 209.º e segs. da Constituição da República Portuguesa –, consagrando a existência, a par do Tribunal Constitucional e do Tribunal de Contas, de uma dualidade de jurisdições: a jurisdição comum e a jurisdição administrativa – cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Anotada, Tomo III, 2007, p. 143. O art. 212.º, n.º 3, da CRP estabelece: “Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”. Por seu turno, de acordo com o art. 211.º, n.º 1, da CRP: “Os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais”. Consagra-se, na última parte deste preceito constitucional, o princípio da competência genérica ou residual dos tribunais comuns.

Em anotação ao disposto no art. 212.º, n.º 3, da CRP, Gomes Canotilho e Vital Moreira escrevem que “estão em causa apenas os litígios emergentes de relações jurídico-administrativas (ou fiscais) (n.º 3, in fine). Esta qualificação transporta duas dimensões caracterizadoras: (1) as acções e recursos incidem sobre relações jurídicas em que, pelo menos, um dos sujeitos é titular, funcionário ou agente de um órgão de poder público (especialmente da administração); (2) as relações jurídicas controvertidas são reguladas, sob o ponto de vista material, pelo direito administrativo ou fiscal. Em termos negativos, isto significa que não estão aqui em causa litígios de natureza «privada» ou «jurídico-civil». Em termos positivos, um litígio emergente de relações jurídico-administrativas e fiscais será uma controvérsia sobre relações jurídicas disciplinadas por normas de direito administrativo e/ou fiscal (cfr. ETAF, art. 4.º)” – CRP Anotada, Volume II, 4.ª edição, 2010, págs. 566/567.

(Decorre do art. 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22-02: “O âmbito da jurisdição administrativa e a competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria” – anotam Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3.ª edição, 2010, p. 125: “A atribuição de prioridade absoluta ao conhecimento da questão da competência justifica-se pela consideração de que a única questão para que o tribunal incompetente é competente é para apreciar...

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