Acórdão nº 06459/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO SILVESTRE
Data da Resolução11 de Junho de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: RELATÓRIO ANTÓNIO ………………, MARIA …………….

e A………. & S………….., LDA instauraram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria acção administrativa especial contra o MUNICÍPIO DA ………….

, indicando como contra-interessados SARA …………………….

, PEDRO ………………………… e ANA …………………….

, com vista a obter a condenação do Presidente da Câmara Municipal da N.................

“a ordenar, no prazo máximo de 20 dias, a demolição total das obras feitas pelos antepassados dos contra-interessados descritas no artigo 9º da petição inicial” e subsidiariamente a condenação do mesmo “a ordenar, no mesmo prazo de 20 dias, a demolição de parte das [mesmas] obras”.

Em 10/03/2010 foi proferido despacho saneador que julgou procedente a excepção da “inadmissibilidade da acção” e, em consequência absolveu o réu da instância.

Inconformados, os autores interpuseram recurso jurisdicional, concluindo as respectivas alegações do seguinte modo: “I a) Na acção administrativa especial de condenação à prática de acto devido, prevista no artigo 66º do CPTA, o objecto do processo traduz-se na imposição à Administração do dever de realizar uma prestação de facto: a prática de um determinado acto administrativo, que o autor considera ter sido ilegalmente omitido ou recusado - no caso, o acto de ordenar a demolição das construções realizadas sem licença que não sejam susceptíveis de serem licenciadas; b) Ao utilizar a expressão “pode”, o artigo 106º, n.º 1 do RJUE (redacção do DL n.º 177/2001, de 4/6, doravante apenas RJUE) não está a conferir ao Presidente da Câmara Municipal um poder administrativo discricionário de escolha entre o ordenar ou não ordenar a demolição das obras levadas a cabo sem licença ou autorização, mas a instituir uma regra de competência administrativa para a prática do acto administrativo; c) Constatada a ofensa da legalidade urbanística, traduzida na realização de obra sem licenciamento ou autorização municipal, o presidente da câmara tem de elaborar um projecto de decisão no sentido da demolição da obra, ouvindo previamente sobre o sentido dessa sua decisão os interessados por 15 dias (art. 106º, n.º 3 do RJUE).

d) A falta de impugnação, no prazo de 90 dias, por parte dos contra-interessados, do despacho a que alude a alínea C) do probatório converteu o despacho do Presidente da Câmara do Município R. que considerou feitas sem licenciamento as obras cuja demolição lhe foi requerida em caso resolvido ou caso decidido; e) A demolição apenas pode ser evitada se o Presidente da Câmara decidir, depois de feita a audição dos particulares, que a obra é susceptível de ser licenciada ou autorizada ou que é possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correcção ou de alteração, de acordo com o n.º 2 do art. 106º do RJUE, sendo o juízo sobre esta última situação se afigura de realização imediata, por se traduzir num juízo de subsunção às normas legais e regulamentares; f) Porque a decisão tem de ser tomada imediatamente, a lei contenta-se com um juízo, não definitivo, feito pelo Presidente da Câmara, de subsunção das obras concretamente realizadas (natureza, tipo, extensão e fim) com o regime legal aplicável.

g) A decisão referida nas alíneas e) e f), imediatamente antecedentes, é já um acto cuja prática é devida, devendo o R. ser condenado nele, e porque os contra-interessados também não apresentaram, segundo o probatório, pedido de legalização das obras realizadas sem licença, dentro do prazo de 15 dias, devido é também o acto de ordenar a demolição das obras e o R. condenado à sua prática.

h) Mesmo admitindo, sem conceder, que o Presidente da Câmara possa fixar um prazo de 60 dias para os contra-interessados apresentarem um projecto de arquitectura que permita à Administração decidir-se pela demolição ou legalização das obras realizadas, ainda que numa parte delas, de acordo com uma interpretação generosa do artigo 11º, n.º 1 do RJUE, tal prazo é um prazo preclusivo porque a reposição da legalidade urbanística é um interesse público que reclama a sua urgente satisfação.

i) Não tendo os contra-interessados apresentado o pedido de legalização das obras realizadas sem licenciamento, acompanhado do projecto de arquitectura e demais elementos instrutórios, dentro desse prazo de 60 dias, o Presidente da Câmara só poderia proferir um despacho de rejeição liminar de qualquer pedido e ordenar a demolição das obras, de acordo com as disposições conjugadas dos artigos 11º, n.º 2 e 106º, n.º 4 do RJUE, sendo esse acto também devido; j) A concessão, pelo Presidente da Câmara do Município R., de um novo prazo de 60 dias para os contra-interessados apresentarem projecto de legalização das obras realizadas sem licenciamento, e contados desde a data do deferimento do requerimento, é um acto ilegal por falta de lei previsora habilitante, na medida em que não cabe no regime constante dos artigos 11º e 18º e segs. do RJUE; k) E atenta contra a natureza urgente do processo de reposição da legalidade urbanística e os fins de um procedimento orientado necessariamente para essa reposição em prazo adequado segundo o princípio da proporcionalidade a que a Administração se encontra vinculada (artigo 266º, n.º 2 da CRP); l) E é ainda ilegal porque sofre de desvio de poder, porque é praticado, não porque tenha em conta as dificuldades da actividade da administração na reposição urgente da legalidade urbanística, mas apenas atendendo aos interesses dos contra-interessados em deferir para quanto mais tarde melhor a reposição da legalidade urbanística; m) Esse fim ilegítimo do acto a que alude a alínea F) do probatório é evidente na situação a que se reportam os autos: não obstante a demolição tenha sido requerida pelos AA em 8/11/2005 (alínea A) do probatório), ainda hoje, em meados de 2010, as obras nem estão legalizadas, nem estão demolidas! n) Deste modo, tem de considerar-se haver caducado o direito de os contra-interessados obstarem à demolição das obras por as mesmas serem licenciáveis; Deste modo, a acção é legalmente admissível e o tribunal ad quem deve revogar a decisão recorrida e ordenar ao tribunal a quo que conheça do pedido.

II Sem conceder, n) A lei não estabelece prazo especial para a Administração se pronunciar definitivamente sobre o pedido dos AA efectuado em 8/11/2005, de demolição das obras realizadas pelos contra-interessados sem licenciamento municipal; o) Sendo assim, o prazo para a administração se pronunciar é o que decorre dos artigos 72º e 109º, n.º 3 do Código de Procedimento Administrativo, de 90 dias úteis; p) A exigência de um prazo para a decisão, para mais num processo urgente de reposição da legalidade urbanística violada, impõe-se por razões de justiça, proporcionalidade, boa fé, segurança jurídica, prossecução do interesse público e concessão de uma tutela plena e efectiva dos direitos dos administrados (artigo 266º, n.º 2 da CRP); q) A inexistência de um prazo legal para a reposição da legalidade urbanística inviabiliza a eficácia da acção administrativa especial de prática de actos devidos quando se esteja perante um acto discricionário quanto “ao quando”; r) Assim, só faz sentido, neste domínio, o estipulado no n.º 1 do artigo 69º do CPTA quando se aceite que a administração não é livre de praticar o acto de legalização das obras ilegalmente efectuadas ou de ordenar a sua demolição em prazo curto; s) Quando os AA propuseram a acção já tinha decorrido um ano e três meses sobre a data de apresentação do pedido de demolição; t) período mais que adequado, justo, proporcionado para o R. agir e cumprir a lei, pelo que a prática do acto a ordenar a demolição era devido.

Também sobre esta óptica a acção é legalmente admissível e o tribunal ad quem deve revogar a decisão recorrida e ordenar que o tribunal a quo conheça do pedido.

III Igualmente sem conceder, u) Mesmo que não procedam as razões antes alegadas, sempre a acção tem de proceder em face do facto constante da alínea L) do probatório, da desistência dos contra-interessados do procedimento de legalização das obras feitas sem licenciamento; w) Na verdade, o procedimento a pedir a legalização das obras feitas sem licenciamento municipal só pode funcionar, no máximo, com os efeitos de uma condição jurídica positiva da não demolição das obras nos termos do artigo 106º do RJUE, logo que feita a audição dos interessados, prevista no seu n.º 3; x) A não satisfação dessa condição faz retroagir os efeitos jurídicos decorrentes da ilegalidade das obras ao momento em que a mesma devia operar ou seja, ao momento imediatamente a seguir à audição dos interessados nos termos deste preceito, pois só através da possibilidade de legalização das obras em juízo a fazer-se nessa altura, a sua demolição deixou de poder ser efectuada; z) Nesta linha, o R. deveria imediatamente após a desistência do pedido de licenciamento ordenar a demolição das obras, por estar constituído caso resolvido sobre a sua realização sem licenciamento municipal, sendo certo que já lá vai mais do que o decurso do tempo adequado para o efeito; aa)...

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