Acórdão nº 06663/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelCRISTINA FLORA
Data da Resolução18 de Junho de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: PROCESSO N.º 06663/13 I. RELATÓRIO ................................., S.A., actualmente .................................., S.A., com os demais sinais nos autos, deduziu no Tribunal Tributário de Lisboa impugnação judicial do indeferimento da reclamação graciosa dos actos de apuramento de contribuições devidas à Caixa Geral de Aposentações, no montante global de €1.281.905,86.

Por sentença de fls. 704 e ss, o Tribunal “a quo” julgou a impugnação improcedente por não provada.

A Recorrente apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões: A. No âmbito da p.i. de Impugnação Judicial, a Recorrente alegou, essencialmente, que: i. os actos tributários objecto da presente Impugnação judicial são ilegais, por padecerem do vício de violação de lei, por violação do disposto no n.º 4 do artigo 6.º-A do Estatuto da Aposentação; ii. os actos tributários de liquidação impugnados padecem do vício de ilegalidade abstracta, decorrente da aplicação de norma inconstitucional – i.e., por o n.º 3 do artigo 6.º-A do Estatuto da Aposentação, quando aplicado à ora Recorrente, violar os princípios constitucionalmente consagrados da proporcionalidade e da igualdade; e, bem assim, que iii. a norma fundamentadora da prática dos actos impugnados consubstancia um acto administrativo sob a forma de lei, acto esse que é ilegal por padecer do vício de falta de fundamentação e de preterição da audiência prévia dos interessados.

B. Neste contexto, o Tribunal a quo veio declarar totalmente improcedentes os pedidos oportunamente formulados.

C. Porém, entende a Recorrente – conforme demonstrará de seguida – que a decisão recorrida: i. assentou em erro de julgamento na selecção da matéria de facto pertinente para a boa decisão da causa, ao desconsiderar os factos – não contestados – demonstrados pelo Doc. 8 junto à p.i. de Impugnação Judicial; ii. assentou em erro sobre os pressupostos de direito na apreciação do vício de vício de violação de lei invocado pela Recorrente e fundamentado na violação do n.º 4 do artigo 6.º-A do Estatuto da Aposentação; e, bem assim, iii. assentou em erro sobre os pressupostos de direito na apreciação do alcance dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da igualdade quando aplicados ao caso concreto da ora Recorrente.

D. Conforme alegado pela Recorrente no artigo 90.º da sua p.i. de Impugnação Judicial, em virtude do saldo permanentemente deficitário do Fundo de Pensões do Pessoal da ......./CGA, e para assegurar a sua existência e manutenção, a Recorrente contribuía directamente para o referido Fundo com um valor correspondente a uma média mensal de 25% da remuneração dos seus trabalhadores oriundos da ..........

, EP, tendo comprovado este facto através da junção aos Autos dos Relatórios anuais obrigatórios para as sociedades cotadas em bolsa, elaborados por auditores independentes (cf.

Doc. 8 da p.i. de Impugnação Judicial).

E. Alegou ainda a Recorrente, demonstrando-o igualmente através do referido Doc. 8, que contribuía para o mesmo Fundo de Pensões com contribuições extraordinárias para cobrir o défice de serviço passado e, bem assim, que realizava contribuições adicionais relativas a aposentações antecipadas.

F. Por fim, concluiu a Recorrente, no artigo 93.º da p.i. e à luz do cit.

Doc. 8 junto à p.i. de Impugnação Judicial, que a totalidade das contribuições para o mencionado Fundo de Pensões correspondeu a um esforço financeiro global médio de cerca de 87,6% da massa salarial dos trabalhadores em causa, relativamente ao período de 1993 a 2007.

G. Ora, os referidos factos revestem-se de inequívoca pertinência para a boa decisão da causa, na medida em que permitem quantificar o esforço financeiro exigido à Recorrente e, a essa luz, sindicar a exigência contributiva dos 3,75% à luz dos princípios constitucionalmente consagrados da proporcionalidade e da igualdade.

H. Todavia, o Tribunal a quo não considerou tais factos na matéria de facto assente, desconsiderando-os na apreciação judicativa subsequente.

I. Para o efeito, o Tribunal a quo referiu, singelamente, que “não se provaram quaisquer outros factos, com relevância para a decisão da causa”, acrescentando ainda que “A decisão da matéria de facto efetuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam”.

J. Do anterior resulta, consequentemente, que a decisão ora recorrida padece de manifesto erro de julgamento, devendo, por esse motivo, ser anulada.

K. De igual modo, até 2007 nunca fora exigido à Recorrente, na qualidade de entidade empregadora, o pagamento de quaisquer contribuições directas para a CGA em matéria de aposentação ou de sobrevivência relativamente aos seus trabalhadores oriundos da ..........., EP.

L. De facto, foi apenas através da Lei do Orçamento do Estado para 2007 (Lei n.º 53-A/2006), que se determinou – no seu artigo 19.º, n.º 2 – que, “para as entidades com pessoal relativamente ao qual a Caixa Geral de Aposentações seja responsável unicamente pelo encargo com pensões de sobrevivência, a contribuição é igual a 3,75% da remuneração do referido pessoal sujeita a desconto de quota”, tendo a mesma obrigação legal sido vertida – inalterada no seu conteúdo – no n.º 3 do artigo 6.º-A do Estatuto da Aposentação.

M. Por seu turno, a estatuição cominada pela previsão do n.º 4 do artigo 6.º-A do Estatuto da Aposentação para as entidades abrangidas por esta norma legal era, à data dos factos, a de que “o disposto nos números anteriores” não prevalece sobre disposições legais, gerais ou especiais, em contrário.

N. Com efeito, quando, em resultado da aplicação dos n.

os 1 a 3 do 6.º-A do Estatuto da Aposentação, fosse exigida, prima facie, a entidade cuja responsabilidade com pensões tenha sido transferida para a CGA, uma contribuição de montante igual (ou, por maioria de razão, superior) à que lhe competiria pagar, como entidade patronal, no âmbito do regime geral de segurança social, entendeu o legislador não ser tal acréscimo exigível.

O. Do anterior decorre, no caso concreto, que a exigibilidade das contribuições previstas no n.º 3 do artigo 6.º-A do Estatuto da Aposentação – e, assim, a própria legalidade das mesmas –, pressupunha a realização de um juízo prévio: o de saber se a Recorrente se encontrava, ou não, abrangida pelo âmbito objectivo e subjectivo da evidenciada excepção.

P. Ora, conforme demonstrado pela Recorrente na sua p.i. de Impugnação Judicial, a ratio legis subjacente à consagração da excepção então prevista no n.º 4 do artigo 6.º-A do Estatuto da Aposentação teve por propósito, precisamente, evitar que as entidades oneradas pelas contribuições especificamente previstas nos n.

os 1 a 3 do mesmo preceito legal sejam obrigadas a, globalmente, contribuir, para efeitos de protecção social dos seus trabalhadores, com um montante superior ao que resultaria da aplicação do regime geral de segurança social.

Q. Por outras palavras, pretendeu o legislador assegurar que estas entidades – em função das contribuições adicionais que foram chamadas a suportar – não contribuíssem com um montante superior, mas antes, no limite, idêntico àquele que é o montante-regra do regime geral de segurança social, com o qual, de resto, o regime de protecção social público visa convergir.

R. De resto, no âmbito do regime geral de segurança social é devida uma taxa contributiva global de 34,75% para a globalidade das eventualidades protegidas pelo mesmo, encontrando-se 11% a cargo do trabalhador, e 23,75% a cargo da entidade patronal (cf. artigos 2.º, e 3.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Decreto-Lei n.º 199/99, de 8 de Junho).

S. E, a este propósito, permite-se identificar, tanto no regime público como no regime privado de protecção/segurança social, a regra da determinação do montante da contribuição através de uma percentagem fixa e global, que abranja a generalidade das eventualidades cobertas em cada caso e que, por essa razão, leva em consideração e permite uma quantificação precisa do esforço financeiro máximo exigido às entidades patronais.

T. O anterior sucede, precisamente, porque é a própria lei que reconhece que os valores máximos exigidos – v.g., a taxa social única – são adequados e suficientes para assegurar o financiamento e a sustentação dos regimes de protecção em causa na sua globalidade – i.e.

, relativamente a todas as eventualidades por eles cobertas.

U. Em suma, à luz do anterior, a excepção prevista n.º 4 do artigo 6.º-A do Estatuto da Aposentação deixa bem clara a sua ratio legis e, consequentemente, o âmbito da tutela que o legislador lhe pretendeu imprimir: não permitir que a lei imponha, a qualquer agente – em homenagem ao princípio da convergência entre regimes de protecção social e com base num critério de justiça material –, uma contribuição global superior à taxa máxima prevista na lei para o regime geral de segurança social.

V. Por conseguinte, se o âmbito subjectivo do n.º 4 do artigo 6.º-A do Estatuto da Aposentação se recorta em torno das entidades que, não obstante de natureza privada, viram o seu regime previdencial integralmente avocado pela CGA (situação que vai além do escopo do mesmo preceito – dirigido a evitar situações de esforço contributivo excessivo em virtude, inter alia, da sujeição a ambos os regimes previdenciais), então, integrar-se-ão no mesmo âmbito subjectivo (a maiori ad minus) todas as entidades cuja responsabilidade da CGA se limite apenas a determinada eventualidade – como se verifica no caso da Recorrente.

W. De facto, a necessidade de adaptação e de convergência com o regime geral de segurança social não só é mais premente, como se impõe ainda mais nitidamente nestes últimos casos, ou seja, quando em causa estão empresas plenamente integradas no sector privado – como se verifica no caso da Recorrente – cuja estrutura não justificou, em dado momento, a avocação integral da responsabilidade por...

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