Acórdão nº 12489/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução15 de Outubro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO · ..................................................., com os demais sinais nos autos, intentou no T.A.C. de Lisboa PROCESSO CAUTELAR contra · MUNICIPIO DE LISBOA.

Pediu o seguinte: suspensão de eficácia -do ato tácito de indeferimento de um recurso hierárquico necessário apresentado pela Requerente relativamente à decisão de desocupação de um espaço na Rua............................., n.º ........, Lisboa, no qual foi dado à Requerente o prazo para entrega do espaço até 30/04/2015 e, -do (ato administrativo contido no) ofício n.º 906/DMPRGU/DPSVP/15 do Departamento de Política de Solos e Valorização Patrimonial da Câmara Municipal de Lisboa, mediante o qual a Requerente foi informada que, no dia 30/04/2015, seria dado início à desocupação coerciva, com emparedamento de uma passagem.

* Por decisão cautelar (a que chama sentença) de 15-7-2015, o referido tribunal decidiu indeferir o pedido cautelar.

* Inconformado, o Requerente recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:

  1. O dever de fundamentação dos atos administrativos constitui um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias (art. 17 da CRP), pelo que o regime constitucional aplicável a estes é aqui de aplicabilidade direta.

  2. Resulta assim que um ato administrativo que viole o conteúdo essencial do direito à fundamentação, estará ferido de ostensiva ilegalidade, impondo-se-lhe o desvalor de nulidade nos termos do art. 133, n. 2, al. d) do CPA.

  3. A sentença recorrida, ao entender que a falta de fundamentação constitui mera anulabilidade, fez errada interpretação e aplicação da norma inscrita no art. 17º da CRP, d) E violou o disposto no art. 133º, nº 2, al. d) do CPA antigo, que comina a falta de fundamentação com a nulidade.

  4. A consagração do dever de fundamentação como garantia constitucional dos Administrados é reconhecida também no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte proferido em 09/06/2010, e por Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos, em “Direito Administrativo Geral”, Tomo I.

  5. O dever de fundamentar assume ainda maior relevância nas situações em que são postas em causa situações jurídico-subjetivas dos particulares, designadamente em sede de atos administrativos de segundo grau, em que a fundamentação se afigura decisiva para a apreensão das motivações subjacentes à reapreciação de um determinado ato e consequências ulteriores.

  6. Sobre a aplicação destes princípios ao ato tácito de indeferimento, pronunciou-se o Venerando Supremo Tribunal Administrativo em douto Acórdão de 20/03/2000, pugnando pela falta de fundamentação.

  7. O Recorrido enviou à Recorrente uma mensagem de correio eletrónico em que afirma que irá proceder a nova notificação em sede de Audiência Prévia de Interessados, acompanhada de documentos comprovativos da propriedade dos imóveis, mas nunca enviou essa notificação.

  8. Fazendo uma interpretação actualística do art. 363º do Código Civil, conjugado com a art. 3º da Lei dos Documentos Eletrónicos (Dec.-Lei nº 290 D/99, republicado pelo Dec.-Lei nº 88/2009, de 9/4), terá que se considerar uma mensagem de correio eletrónico como um documento particular.

  9. Nos termos do art. 3 n 5 da LDE, “o valor probatório dos documentos eletrónicos aos quais não seja aposta uma assinatura eletrónica qualificada certificada por entidade certificadora credenciada é apreciado nos termos gerais de direito.” k) Não tendo o Recorrido impugnado a autoria e emissão do documento, nem o seu conteúdo, terá o mesmo de se considerar provado.

  10. Ao desconsiderar o documento referido, a sentença recorrida violou o disposto no art. 3 ns 1 e 5 da LDE, bem com o os arts. 363 e 376, e o art. 342, todos do Código Civil.

  11. E ao não remeter nova notificação ao Recorrente, induzindo-o em erro e contrariando as expectativas que criou junto deste, não lhe deixando alternativa que não fosse recorrer hierarquicamente, o Recorrido violou o princípio da boa-fé estatuído no art. 226 n 2 da CRP, e art. 6A, do CPA anterior.

  12. Não tendo sido cumprido o dever de fundamentação, como supra definidos, e com isso causando a nulidade do ato, é manifesta a sua ilegalidade, pelo que se encontra preenchido o requisito de fumus boni iuris do art. 120 n 1 al b) do CPTA.

  13. O ato tácito de indeferimento é assim impugnável a todo o tempo, pelo que não se verifica a caducidade do direito de intentar a ação principal (art. 133 n. 1 al. d) do CPA, e art. 58. n. 1 do CPTA).

  14. O Recorrido invocou, doutro passo, a anulabilidade do segundo ato impugnado (Of. n.0 496/DMPRGU/DPSVP/15, de 26/02/2015), ato esse que consubstancia o único título legítimo dos atos de execução subsequentes e que, contrariamente, ao que é sustentado pelo Tribunal a quo, se trata de um ato impugnável nos termos do art. 51º CPTA, conforme é reconhecido pelo Tribunal a quo, que o classifica como ato exequendo (pp. 28).

  15. Ainda que se considerasse os atos impugnados meramente anuláveis, o que só por mera hipótese se admite, o direito de ação principal ainda não haveria caducado dado que o Recorrente foi notificado do Of. n.º 496/DMPRGU/DPSVP/15 em 04/03/2015, iniciando a contagem do prazo no dia seguinte, nos termos do art. 279.º do Código Civil, pelo que, em 05/06/2015, dia em que entrou no Tribunal competente a ação principal, a Recorrente estaria ainda em prazo para efeitos do art.º 58.º n.º 2 al. b) do CPTA.

  16. Também aqui andou mal o Mmo. Juiz a quo, pois fez incorreta aplicação dos art. 279º CC, e do art. 58º nº 2 al b) do CPTA, aos factos.

* O recorrido contra-alegou, concluindo: 1. A sentença proferida pelo Tribunal a quo não merece censura, tendo bem decidido, atentos os factos e o direito aplicável; 2. A exigência legal de fundamentação própria dos atos administrativos é incompatível com a figura do ato tácito de indeferimento, por natureza infundamentável (in TCA Sul num acórdão de 03/07/2003, proc. nº11053/01, 2ª subsecção); 3. Não merece censura a sentença proferida pela Mma Juiza a quo ao considerar que não se encontravam reunidos os pressupostos legais para o decretamento da providência, nomeadamente por se verificar a caducidade do direito de ação quanto ao ato tácito de indeferimento e a inimpugnabilidade do segundo ato suspendendo, porquanto 4. Tendo o recorrente em 23/10/2014 interposto recurso hierárquico da decisão que o intimou a desocupar o local, em 04/12/2014 o recurso considerou-se tacitamente indeferido, pelo que, descontando o período das férias judiciais, a ação deveria ter sido intentada até ao dia 16/03/2015. Contudo, 5. A recorrente deu entrada a ação em 05/06/2015, pelo que há muito que estavam esgotados os 3 meses previstos no art. 58º nº2 al. b) do CPTA para a propositura da ação; 6. No que respeita ao segundo ato (desocupação coerciva) também aqui não merece censura a decisão recorrida, pois, 7. Conforme defendido pelo recorrido na sua oposição, trata-se de um mero ato de execução destinado a desenvolver e a concretizar a determinação contida em ato administrativo anterior; 8. A lesão existe no despacho de 30/09/2014, esse sim suscetível de...

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