Acórdão nº 12541/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelNUNO COUTINHO
Data da Resolução29 de Outubro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – Relatório Marco ……………….. requereu contra o Município de Lisboa providência cautelar de suspensão de eficácia de acto proferido por Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, em 16 de Dezembro de 2014, nos termos do qual foram fixados os horários de funcionamento dos estabelecimentos de venda ao público e de prestação de serviços no concelho de Lisboa, por força do qual foi limitado o horário de funcionamento do bar de que é proprietário o requerente.

Por decisão proferida em 24 de Julho de 2015, o T.A.C. de Lisboa indeferiu a pretensão cautelar formulada.

Inconformado com o decidido, o requerente recorreu para este TCA Sul, tendo formulado as seguintes conclusões: “1. A Recorrente explora um estabelecimento comercial cuja actividade se desenvolve na zona do Cais do Sodré, em Lisboa.

  1. Foi publicado o despacho 140/P/2014, em 18 de Dezembro de 2014, pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, publicado em Boletim Municipal, que determinou o fecho do estabelecimento do Recorrente às 02h00 de segunda a quinta-feira e às 03h00 às sextas, sábados e vésperas de feriado domingos 00h00.

  2. O fecho do estabelecimento determinou a perda de clientela e receitas, e consequente impossibilidade de pagamento dos encargos mensais fixos e variáveis, pondo em risco a viabilidade de funcionamento do estabelecimento.

  3. A douta sentença julgou improcedente a providência cautelar, alegando que deverá prevalecer o direito ao repouso dos ali residentes que, com base em censos de 2011, se cifram em 2728 habitantes integrados na freguesia de São Paulo, onde o estabelecimento do requerente se situa; 5. Isto apesar de considerar a existência de fumus boni iuris, pretensão do requerente poderá ser viável nomeadamente no que concerne aos vícios imputados ao despacho 140/P/2014 de Bem como de periculum in mora, entendendo que os mesmos são de difícil reparação, senão mesmo irreversíveis, pela perda de clientela e pela significativa quebra de facturação, indiciariamente provada; 6. Ora, a quase totalidade dos bares situados na Rua Cor-de-Rosa, onde se verifica a maior afluência de pessoas e concentração nocturna e que concentra as queixas dos moradores desde a sua inauguração em 2013, continuam a funcionar normalmente dentro do horário inicialmente atribuído, uma vez que não são afectados pelo despacho impugnado.

  4. Contudo, no caso do requerente, ele em nada contribui para essa afectação uma vez que é absolutamente marginal a sua actividade em relação àquela que é desenvolvida pelos demais bares existentes na zona, esses sim que poriam em causa, o interesse público alegadamente defendido pelo acto suspendendo e que, por diversas excepções constantes do mesmo, têm permanecido em normal funcionamento, ao contrário do recorrente.

  5. Tais bares, possuem, na sua grande maioria, esplanadas, pelo que, uma vez mais, a referida concentração de transeuntes continuará a existir, já que a proibição de venda de bebidas alcoólicas ou não alcoólicas para o exterior não se aplica às esplanadas dos estabelecimentos.

  6. O estabelecimento do requerente situa-se numa artéria secundária, num edifício sem moradores, conforme factos provados; 10. Pelo que o interesse do requerente deve prevalecer, no caso, sobre o interesse público invocado, tendo por base, não queixas de moradores relativamente à actividade do estabelecimento do requerente, mas o número de residentes registados nos censos de 2011.

  7. Porquanto os danos que advirão para o requerente são em muito superiores aos que poderão advir para tais residentes, decorrentes da actividade do estabelecimento e da suspensão do acto.

  8. Os contra interessados potencialmente afectados pelo deferimento da providência, como a Junta de Freguesia da misericórdia- Polo de São Paulo, A Associação de moradores a Voz do Bairro e a Associação de moradores da freguesia de Santos o velho, não se pronunciaram no processo; 13. Isto apesar de ter sido concedido apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, e dispensa de taxas de justiça e demais encargos com o processo à associação de moradores da zona, a Voz do Bairro; 14. Sendo certo que as queixas dos moradores e que estão na base da adopção do acto suspendendo, existem desde a designada inauguração da Rua Cor de Rosa, em 2013, e apenas cerca de 13 dos bares existentes na zona viram o seu horário reduzido, toma-se evidente não ter existido uma acertada ponderação dos interesses em conflito, nomeadamente no que respeita aos prejuízos decorrentes da execução do acto para o requerente.

  9. Mas ainda que, por mera hipótese académica, se equacione tal prevalência do direito ao descanso dos moradores recenseados em 2011, sobre o interesse económico do requerente, certo é que o meritíssimo juiz deveria ter adoptado a providência mais adequada ao caso em concreto, nomeadamente permitindo o funcionamento do estabelecimento do bar do requerente dentro do horário que lhe foi atribuído, proibindo contudo a venda de bebidas para o exterior, 16. Isto na medida em que a motivação constante da douta sentença parece assentar sobretudo, não no ruído produzido pelo estabelecimento (atente-se o facto de o estabelecimento apenas possuir uma pequena aparelhagem de características domésticas) mas na sua exígua dimensão, que potenciaria a venda de bebidas para o exterior.

  10. Ora, assim sendo, deveria ter sido decretada a providência requerida, condicionada à proibição de venda de bebidas para o exterior, o que permitiria ao requerente manter, ainda que com a inerente quebra de facturação, um volume de vendas superior ao que actualmente factura e que não suporta sequer a renda do locado.

    Contra-alegou o Recorrido, formulando as seguintes conclusões: “1. O Recorrente apoia-se em factos que o Mmo Juiz a quo não considerou provados para concluir que o seu interesse "(...) deve prevalecer sobre o interesse público, nomeadamente o direito ao repouso dos residentes recenseados na freguesia de São Paulo em 2011, porquanto os danos que advirão para o requerente são em muito superiores aos que poderão advir para tais residentes, decorrentes da actividade do estabelecimento e da suspensão do acto", sem contudo comprovar a superioridade dos seus interesses. Na verdade, 2. Se é verdade que o normal funcionamento do estabelecimento do Recorrente, como o mesmo alega, não afecta os moradores, já o modo como esse funcionamento tem sido levado a cabo, e que não é normal, afecta o descanso, o repouso, a segurança a saúde dos mesmos; 3. Conforme foi referido pela Entidade Recorrida, e não foi posto em causa pela Recorrente, a determinação de restrição horária veio dar resposta às diversas queixas e participações dirigidas aos serviços do Requerido, relativamente ao ruído nocturno, ao sentimento de insegurança provocados por frequentadores e pela música proveniente dos estabelecimentos sitos na área circunscrita pelo Cais do Sodré, Santos e Bica, e 4. Tal ruído e insegurança provêm igualmente do estabelecimento propriedade do aqui Recorrente denominado "……………..", sito na Rua de São Paulo ….., não só dentro do horário de funcionamento, como também para além do horário exibido, ou seja, depois das 04h00. Até porque, 5. Atenta a reduzida dimensão do referido estabelecimento, com capacidade apenas para 10 pessoas, torna-se impossível o consumo no interior do estabelecimento, 6. Daí o consumo na via pública com todas as consequências que daí advêm - o ruído excessivo na via pública, abandono de garrafas, copos de vidro e outros materiais na via pública, nos vãos de escadas e nas janelas dos estabelecimentos, de habitações particulares.

  11. O que está em causa é o confronto entre os interesses do Recorrente - direito à livre iniciativa económica (art. 61.º da CRP) consubstanciada na comercialização de bebidas, mormente alcoólicas, em período nocturno, concorrendo, de forma irregular e prejudicial para a segurança e saúde pública, mediante a oferta destes produtos a preços perniciosamente acessíveis à camada mais jovem, em áreas onde esta oferta é já particularmente diversificada e abundante - e os interesses defendidos pelo Recorrido - aqui consubstanciados na salvaguarda dos direitos a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, ao repouso, à segurança, à saúde pública e à qualidade de vida (arts. 25º, 27.º e 66.º da CRP) prevalecerão, obviamente, hoje e sempre, os interesses por este último defendidos em detrimento dos daquela.

  12. O artigo 25º, n.º 1, da CRP prevê o direito à integridade pessoal que incorpora o direito ao descanso, à tranquilidade e ao sono - neste sentido, vide Acórdão do Tribunal de...

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