Acórdão nº 12566/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelHELENA CANELAS
Data da Resolução29 de Outubro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO ……………………………………………., SA (devidamente identificada nos autos), requerida no Processo Cautelar (Procº nº 20/15.0BELLE) em que é requerente Carlos ……………………………………………… (igualmente devidamente identificado nos autos), inconformada com a sentença 29/04/2015 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que decretou a providência cautelar de suspensão a eficácia do ato administrativo consubstanciado na deliberação do Conselho de Administração da …………………………………………, S.A., datada de 14 de Novembro de 2014, que determinou a demolição da edificação identificada, a sua desocupação e a respetiva posse administrativa, vem dela interpor o presente recurso, pugnando pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que indefira a providência requerida, absolvendo o requerido do pedido.

Nas suas alegações a Recorrente formula as seguintes conclusões nos seguintes termos:

  1. A sentença recorrida identificou correctamente os únicos vícios suscitados pelo Requerente no requerimento inicial, fundamentalmente, relacionadas com o invocado «erro sobre os pressupostos, quando considera que a edificação em causa não era a sua primeira e única habitação». – p. 17 da sentença.

  2. A sentença recorrida, apreciando os únicos vícios invocados, decidiu julgá-los manifestamente improcedentes, tão claras e contundentes as razões aduzidas na sentença – v. págs. 23 a 25 da sentença.

  3. Salvo o devido respeito, acontece que sofre de grave e evidente erro de julgamento a decisão sobre o concreto pondo da matéria de facto, relativo ao requisito de primeira (e única) residência do Requerente, para efeitos do artigo 37º do POOC, que é a questão central do processo.

  4. É que, além da matéria das alíneas d) a i) do probatório, foi feita prova, por confissão, dos factos alegados nos artigos 50º, 51º, 53º e 54º da contestação.

  5. A Recorrente, não prescinde da prova por confissão, no intróito do requerimento inicial, especificamente aceite nos artigos 50º, 51º e 54º da contestação, de que: «o Requerente reside Rua Castilho, nº20, 3º andar, 8000 – Faro».

  6. Confissão irretractável, com o valor probatório de confissão judicial espontânea, nos termos e para os efeitos do artigo 356º, nº1 do Código Civil e do artigo 46º do Código de Processo Civil.

  7. Pelo que, com a devida vénia, a Recorrente considera incorrectamente seleccionada e julgada a matéria de facto, por omissão de selecção e decisão sobre facto manifestamente relevante para boa decisão da causa, através de confissão especificamente aceite nos artigo 50º, 51º e 54º da contestação, de que: ««o Requerente reside na Rua……………, nº20, 3º andar, 8000-Faro»»., comprovativa de que a construção em apreço não é a primeira (e única) habitação da Requerente.

  8. Os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida são: a prova por confissão judicial espontânea aceite no artigo 50º, 51º e 54º da contestação, (arts. 356º, nº1 do Cód. Civ e 46º do CPC), bem como os docs. 138 e 139 do R.I.), constante do “recibo de renda” por ele enviado (anexo ao doc. 138 do R.I., datado de 08/04/2010), na “declaração de titularidade” por ele subscrita (cf. doc. 150 do R.I., de 18/11/2014), e na “declaração” por ele próprio invocada como título aquisitivo de direito (cf. doc. 148 do R.I., de 13/05/1997), e o escrito de 29/07/2010 (cf. doc. 138 junto com o R.I.).

  9. Por outro lado, determinante para a decisão da sentença recorrida foi o suscitar uma questão nova (novo vício) – que não foi alegado, nem estava em discussão, relacionado com a mera hipótese de poder verificar, apenas na acção principal, se a Requerida está ou não legitimada a exercer (todos) os poderes que invoca e em que fundamenta e parametriza juridicamente a sua actuação.

  10. Foi com base em novo vício (não alegado) que o Tribunal “a quo” acabou por preferir sentença por julgar verificado o requisito do fumus boni iuris.

  11. O Tribunal “a quo” suscitou e conheceu oficiosamente aqueles novos vícios (não alegado), mas sem antes ter ouvido a entidade Requerida, ora Recorrente, como era imposto e obrigatório por força do elementar princípio do contraditório, nos termos dos artigos 3º, nº3 do CPC, 95º, nº2, e 120º, nº3 do CPTA.

  12. A sentença recorrida é, pois, uma verdadeira decisão-surpresa, com a qual a entidade Requerida não podia razoavelmente contar, nem se defender.

  13. O que configura a omissão de uma formalidade essencial que a lei prevê, na tramitação típica do processo – e também aplicável aos processos cautelares apesar do seu carácter urgente - em clara violação do princípio do contraditório, nos termos dos artigos 3º, nº3 do CPC ex vi artigo 1º do CPTA e artigo 95º, nº2 do mesmo Código.

  14. Em consequência, a sentença também deve ser anulada e expurgada de toda a parte nula, isto é, de todo o discurso fundamentador e decisório relativo àqueles novos vícios (não alegados), na parte da p. 26 em diante, pelo simples motivo de que os mesmos não são cognoscíveis nesta sede cautelar.

  15. É que as enunciadas características da instrumentalidade, da sumariedade, e da urgência são incompatíveis com o suscitar novos vícios (não alegados) ao abrigo do artigo 95.º, n.º 2, do CPTA (só previsto e próprio das acções principais), P) Pelo que, a sentença recorrida, ao julgar verificado o fumus boni iuris, com base apenas em evidente erro de julgamento da matéria de facto (acima referido) em novos vícios (não alegados) – que a Mmª Juíza “a quo” suscitou oficiosamente – mas sem sequer os concretizar –, invocando para o efeito os poderes de cognição dispostos no artigo 95.º, n.º 2, do CPTA (não aplicável aos processos cautelares), excedeu manifestamente aquilo que lhe era lícito conhecer nesta sede cautelar, sendo parcialmente nula.

  16. Face ao exposto, temos que a sentença recorrida violou a característica da sumariedade da apreciação jurisdicional nesta espécie processual urgente, assim como violou o princípio do dispositivo, tendo conhecido de questões (novos vícios) de que não podia tomar conhecimento, em violação dos arts. 95.º, n.º 2, 112º, 113º, 114º, nºs 3, al.ª g) e 4, 120º, nº1, al.ª b) do CPTA e dos artigos 5º, 608º, 2 e 615º, nº1, alínea d) do C.P.C., aplicável ex vi art. 1º do CPTA.

  17. Como se pode verificar a pags. 23 a 24 da sentença, diante deste juízo – tão claro, simples e contundente – seria de esperar que a sentença terminasse concluindo pela manifesta falta de fundamento da pretensão – atento o fumus malus iuris evidenciado por ela própria na análise dos vícios objecto de alegação.

  18. Consequentemente, tendo em conta o juízo tão claro, simples e contundente da sentença recorrida que, no seu discurso fundamentador, considerou manifestamente improcedentes as únicos vícios objecto de alegação, T) É forçoso concluir que a sentença enferma de erro de julgamento, por violação do artigo 120º, nº1, al.ª b) do CPTA, ao considerar preenchido o requisito do fumus boni iuris e do periculuim in mora, posto que o que se verifica, na realidade, é o fumus malus iuris.

  19. Ao contrário da sentença recorrida, não se verifica o requisito do periculum in mora, desde logo, porque não se provou, que a construção em apreço é a primeira (e única) residência do Requerente, sendo que a construção ilegalmente edificada, a descoberto de uso privativo, não tem qualquer valor comercial (art. 202º, nº2, C.C), V) Tão-pouco se pode considerar atendível um fundado receio nestas circunstâncias, onde o prejuízo invocado é apenas indemnizatório; e não existe qualquer legítimo direito privado a tutelar, mas antes o bem público protegido e até mesmo criminalmente relevante, nos termos da Lei nº 32/2010, de 02/09, que aditou o crime de Violação de regras urbanísticas, no artigo 278º-A, nº1 do Código Penal.

  20. Sem conceder, a douta sentença recorrida também operou uma errada ponderação dos interesses em presença, tendo violado o requisito previsto no artigo 120º, nº2 do CPTA, já que os danos que resultariam para o interesse público da hipotética concessão se mostram desproporcionais e muito superiores àqueles que poderiam resultar para o Requerente da sua recusam, conforme parecer que se junta.

  21. Deve ser revogada a decisão quanto a custas, e as mesmas ficarem a cargo do recorrido, por se considerar que às mesmas deu causa, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 527.º e 539.º do Código de Processo Civil.

  22. Ao não ter julgado de acordo com as antecedentes conclusões, a douta sentença recorrida violou as sobrecitadas disposições legais.

Notificado o requerido não contra-alegou (cfr. fls. 820 ss.

).

Notificado(a) nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA o(

  1. Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal não emitiu Parecer (cfr. fls. 834).

    * Sem vistos, em face do disposto no artigo 36º nº 1 alínea e) e nº 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

    * II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/ das questões a decidir O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.

    Assim, são as seguintes, e pela seguinte ordem, as questões a decidir no presente recurso: 1. - saber se a sentença recorrida deve ser anulada por verificação de nulidade processual consubstanciada na violação do princípio do contraditório - (conclusões I) a M) das alegações de recurso); 2. - saber se a sentença recorrida deve ser anulada com fundamento em nulidade por excesso de pronuncia e violação dos artigos 95º nº2, 112º, 113º, 114º nº 3 alínea g) e 4, 120º nº 1 alínea b) do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2 e 615º nº 1 alínea d) do CPC - (conclusões N) a Q) das alegações de recurso); 3. - saber se a sentença recorrida errou no julgamento que fez quanto à matéria de facto - (conclusões A) a...

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