Acórdão nº 11502/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelHELENA CANELAS
Data da Resolução15 de Janeiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: 1. RELATÓRIO Sérgio ……………..

(devidamente identificado nos autos), Autor na Ação Administrativa Comum sob a forma de processo ordinário (Proc. nº 226/11.1BEBRG) que instaurou contra o Ministério da Defesa Nacional – Exército Português no qual pedia a condenação deste a pagar-lhe a quantia total de 245.402,19 € a título de indemnização por danos corporais, patrimoniais e não patrimoniais, que peticionou, inconformado com a decisão proferida no despacho-saneador de 20/05/2013 pela Mmª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria pela qual, julgando-se procedentes as exceções dilatórias de falta de personalidade judiciária e de ilegitimidade passiva do demandado, foi o mesmo absolvido da instância, vem dela interpor recurso, pugnando pela revogação da decisão recorrida, por dever considerar-se deter o demandado Ministério da Defesa legitimidade passiva para a ação, com ele prosseguindo-se os demais termos, ou caso assim não se entender ser o réu na ação o Estado Português, sanando-se a irregularidade e processando-se a ratificação do processado.

Nas suas alegações o aqui Recorrente formula as seguintes conclusões nos seguintes termos: “A. A sentença recorrida julgou injustamente e sem fundamento válido, improcedente por falta de personalidade judiciária e ilegitimidade passiva do Réu, a presente ação intentada pelo aqui Recorrente, absolvendo o Réu, aqui Recorrido, Ministério da Defesa Nacional – Exército Português dos pedidos contra ele formulados.

  1. O artigo 10º nº 2 foi, assim, erroneamente interpretado visto não ter sido considerado no nº 1 do mesmo artigo, que amplia a legitimidade passiva a entidades com interesses contrapostos aos do autor, como acontece com o Ministério da Defesa Nacional no caso sub judice.

  2. Pelo que não pode nem deve ser levada a efeito qualquer interpretação restritiva da norma constante do art. 10º nº 2 do CPTA.

  3. Tem de entender-se ao ser intentada a presente ação contra o Ministério da Defesa Nacional como intentada contra o Estado Português.

  4. Pois, o Ministério da Defesa Nacional é o órgão que incumbe a prática do ato que está aqui em causa na presente ação.

  5. Ao não decidir assim, a sentença recorrida violou o que se dispõe no nº 2 e 4 do art. 10º,, nº 2 do art. 11º, ambos do CPTA, nº 1 do art. 20º do CPC.

  6. Na situação em apreço, o Ministério da Defesa Nacional, e em concreto o Exército Português, ao decidir praticar, ou não, os atos, objeto do pedido, atua no exercício do ius autorictatis que impõe aquele um dever especial de proteção dos cidadãos que prestam serviço militar.

  7. Assim, os factos fundamento do pedido levam o próprio Ministério do Exército Nacional à necessidade imperiosa da prática de um ato administrativo.

    I. E conjugando a aplicação do art. 10º nº 2 e o art. 11º nº 2 conclui-se que a legitimidade passiva na ação comum cabe em princípio aos ministérios.

  8. Excetuando-se as ações de contratos e ações de responsabilidade pura, em que a legitimidade passiva pertence ao Estado, representado pelo Ministério Público.

  9. Ora, no caso em apreço, a responsabilidade pelo pagamento das quantias peticionadas está intimamente relacionado com a prática de um ato administrativo (no caso com omissão do mesmo) por parte da entidade administrativa demandada originariamente.

    L. Pelo que o Ministério da Defesa Nacional tem legitimidade passiva para ser demandado na presente ação.

  10. Por outro lado, como é jurisprudência assente, a personalidade judiciária pode existir sem que a entidade que a detém goze de personalidade jurídica (cfr. Acórdão do STJ de 3 de Outubro de 1991, BMJ, nº 410/634).

  11. Acresce que, ao não permitir a sanação da falta de personalidade judiciária do Estado, a sentença recorrida violou o disposto no nº 2 do art. 265º do CPC, com prejuízo dos interesses do aqui Recorrente e, pondo em causa os direitos deste, o qual os pode ver prescritos a manter-se tal errónea decisão.

  12. E tal como é sabido, demandado numa ação sobre responsabilidade, o Ministério em vez do Estado, não deve, tendo em conta o princípio da prevalência das decisões de fundo sobre as decisões de forma, ser proferida decisão de absolvição da instância, antes devendo ser convidado o autor a corrigir a petição inicial, por força do princípio da economia processual – artigos 7º, 11º nº 2 do CPTA.

  13. Seria excessivamente formalista e contrário ao princípio “pro actione” consagrado no artigo 7º do CPTA de acordo com o qual o Tribunal deve interpretar as normas processuais num sentido que favoreça a emissão de uma pronuncia de mérito das pretensões formuladas, proferir uma decisão de absolvição da instância quando a falha da petição inicial se traduz, eventual e unicamente, na errada identificação do sujeito processual.

  14. E, no caso em apreço, deve concluir-se que a única e eventual irregularidade que a Petição Inicial pode apresentar consiste numa errada identificação do réu.” Notificado o Recorrido não contra-alegou.

    O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA emitiu Parecer (fls. 115) no sentido de ser negado provimento ao recurso.

    Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

    * 2. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO (das questões a decidir) Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho), ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA, a questão a decidir é a de saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, ao julgar procedentes as exceções dilatórias de falta de personalidade judiciária e de ilegitimidade passiva do demandado, com violação do disposto nos nº 2 e 4 do artigo 10º e no nº 2 do artigo 11º do CPTA, ou se, a entender-se ocorrerem, por dever ter sido demandado o Estado Português e não o Ministério da Defesa, deveria ter-se promovido a sua sanação, convidado o autor a corrigir a petição inicial, ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 265º do CPC e dos artigos 7º e 11º nº 2 do CPTA.

    * 3. FUNDAMENTAÇÃO~ Da decisão recorrida No despacho-saneador de 20/05/2013 a Mmª Juiz do Tribunal a quo julgou procedentes as exceções dilatórias de falta de personalidade judiciária e de ilegitimidade passiva do demandado Ministério da Defesa Nacional – Exército Português, absolveu-o em consequência da instância. Decisão que se suportou na seguinte fundamentação, ali assim vertida, que se transcreve: “Da ilegitimidade/falta de personalidade judiciária do R.

    O A. veio intentar contra o Ministério da Defesa Nacional — Exército Português a presente ação administrativa comum de responsabilidade civil, peticionando o pagamento de indemnização por danos sofridos, decorrentes de saltos de para-quedas por si realizados em Abril de 2006.

    Alegou que no seguimento de três saltos realizados no mesmo dia sofreu diversas lesões físicas e que, perante o insucesso de tratamento cirúrgico posteriormente realizado e os riscos de realização de segunda intervenção cirúrgica, a que não se submeteu, foi considerado incapaz para todo o serviço militar em final de Setembro de 2009, deixando de auferir o seu vencimento desde Outubro de 2009 até Março de 2010, data em que o seu contrato terminaria, não tendo o mesmo sido renovado em virtude da incapacidade sofrida.

    Assim, peticiona desde logo o valor correspondente aos vencimentos que deixou de auferir desde Outubro de 2009, acrescido do valor que auferiria até 2012, em caso de renovação de contrato, mais o subsídio de Natal de 2009, proporcionais de subsídios de Férias e de Natal de 2010, num montante global de €23.282,91.

    Mais peticiona o valor de €147.119,28 referente a danos corporais, contabilizando a quantia de €30,00 por cada dia em que esteve internado, €2.265,00 pelo dano biológico, €4.000,00 pelo dano estético, €5.200,00 referente ao quantum doloris, €100.000,00 pela incapacidade permanente absoluta para a prática da sua profissão habitual (soldado para-quedista) e €35.594,28 pela incapacidade permanente parcial.

    Finalmente, peticionou o valor de €75.000,00 relativamente aos danos não patrimoniais sofridos, consubstanciados em «grande dor, desgosto, angústia e ansiedade, uma vez que aquela era a vida profissional que tinha escolhido e tinha a perspetiva profissional de fazer “carreira militar”, vendo, assim, de um momento para o outro o seu sonho destruído (...) o réu “atirou” o autor para uma situação de carência deixando-o sem trabalho, impedindo-o de arranjar outra ocupação labora! remunerada de igual nível, o que lhe provocou, igualmente, um sentimento de frustração, sofrimento e incerteza do futuro».

    O Exército Português, representado pelo Chefe do seu Estado-Maior, veio desde logo suscitar a sua falta de personalidade judiciária e ilegitimidade, na medida em que, estando-se perante uma ação de responsabilidade civil, apenas o Estado deveria figurar como demandado, porquanto apenas este goza de personalidade judiciária, atento o disposto no artigo 11º, n.° 2 do CPTA.

    O A. replicou, alegando que tal exceção não foi invocada na providência cautelar intentada, e que o Tribunal julgou então as partes legítimas, não assistindo razão ao R. demandado.

    Vejamos.

    De acordo com o disposto no artigo 10º n.°1 do CPTA, cada ação “deve ser proposta contra a outra parte na relação material controvertida e, quando for caso disso, contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor”, prevendo o n.° 2 do mesmo artigo que, quando os autos tenham “por objeto a ação ou omissão de uma entidade pública, parte demandada é a pessoa coletiva de direito público ou, no caso do Estado, o ministério a cujos órgãos seja imputável o ato jurídico impugnado ou sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os atos...

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