Acórdão nº 07455/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCHÃO MARQUES
Data da Resolução12 de Março de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório António ……………………. (Recorrente), inconformado com o acórdão do TAC de Lisboa que julgou improcedente a acção administrativa especial por aquele intentada contra o Município de Odivelas (Recorrido), na qual peticionou a anulação da deliberação da Câmara Municipal de Odivelas, de 8.08.2007, que lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva, dele recorreu para este Tribunal.

As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões: I- O Tribunal a quo errou ao considerar por não provados os vícios invocados de violação de lei, forma e de procedimento; II- Da análise das transcrições do Relatório Final constata-se que a Recorrida considerou os factos constantes da nota de culpa como verdadeiros, não pelos depoimentos do participante e das testemunhas por este indicadas, mas sim pela não realização de prova por parte do Recorrente e da testemunha Arq. José …………que tais factos não seriam verídicos.

III- Assim, a Recorrida violou as regras do ónus probatório e do princípio da presunção da inocência; IV- O princípio da livre apreciação da prova não contende nem colide nem se sobrepõe quer às regras do ónus probatório quer ao princípio da presunção de inocência.

V- A prova que consta dos autos não permite um juízo de certeza que o Recorrente cometeu tais factos; VI- O douto Ministério Público não só entendeu não existir indícios da prática daqueles factos como afirma que a versão dada pelo Recorrente é a que ganha maior sustentabilidade; VII- Assim, demonstrado a violação dos princípios supra aludidos, também se encontram os princípios com aqueles conexos ofendidos, nomeadamente o princípio da justiça e da imparcialidade, o da legalidade e da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos e do erro sobre os pressupostos de facto; VIII- Em relação ao vício de procedimento, claramente a Recorrida ao mencionar no seu Relatório Final a conclusão que retirou de um telefonema não só que não foi presenciado pelo Recorrente ou um seu defensor, como também o Sr. Instrutor só conseguiu ouvir um interveniente, o participante, violou os princípios da lealdade processual, do direito a um processo equitativo, da legalidade, do contraditório e da igualdade entre as partes.

IX- Em relação ao princípio da boa fé, nitidamente o Recorrente demonstrou que a situação atrás exposta violou este princípio na vertente da tutela da confiança legítima.

X- Face ao exposto nas presentes alegações e conclusões deverá ser dado provimento ao presente recurso e deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue procedente os vícios de lei, forma e de procedimento.

Assim, se fará JUSTIÇA O Recorrido contra-alegou, produzindo as seguintes conclusões: 1ª - O documento junto agora ao processo pelo Recorrente é um "despacho de arquivamento" proferido pelo Ministério Público do Tribunal Judicial de Loures, na sequência da notícia que a Recorrida lhe deu em cumprimento do disposto no art. 8° do Estatuto Disciplinar do Trabalhadores da Administração Pública; 2ª Apenas os factos dados por provados em sentença penal condenatória são incontestáveis em sede de procedimento disciplinar.

3º No caso em apreço, não foi proferida qualquer sentença penal - nem condenatória nem absolutória - pelo que o Recorrido não estava impedido de em sede disciplinar considerar, como considerou, provados os factos que levaram à aplicação ao Recorrente da pena de aposentação compulsiva.

4ª O Recorrido acolhe e acompanha todos os fundamentos de facto e de direito constantes da douta decisão recorrida Deverá, pois, manter-se a decisão recorrida, por a mesma não sofrer dos vícios que o Recorrente lhe imputa.

• Neste Tribunal Central Administrativo, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do disposto nos artigos 146.º e 147.º do CPTA, nada disse.

• Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

• I.1.

Questão Prévia (da junção de documentos) O Recorrente, juntamente com as alegações de recurso, apresentou um documento – cópia do despacho de arquivamento proferido no Inquérito n.º …/07.2TALRS –, pretendendo com o mesmo fazer prova de que a matéria que consta dos autos não permite um juízo de certeza acerca de ter cometido os factos que ficaram provados na acusação em que se sustentou a decisão disciplinar impugnada.

Dúvida não há em que este documento foi comunicado ao Mandatário do ora Recorrente por ofício de 12.08.2010 (cfr. fls. 279), em data, portanto, posterior à prolação da sentença (de 1.07.2010), não sendo objectivamente possível a sua junção em momento anterior.

Apreciando, para decisão da presente questão prévia importa atentar no art.

693º-B, do CPC (na redacção aplicável), nos termos do qual: “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o art. 524º, no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância e nos casos previstos nas alíneas a) a g) e i) a n) do nº 2 do artigo 691º.

”. Sendo que o actual art. 651.º do CPC aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, dispõe com igual sentido normativo que: “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância”.

Ou seja, a regra é a de que depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância (v.g. quando a decisão proferida não era de todo expectável, tendo-se ancorado em regra de direito cuja aplicação ou interpretação as partes, justificadamente, não contavam).

Da conjugação dos art.s. 651.

º e 425.

º do Código de Processo Civil (antigos art.s. 693.

º-B e 524.

º), resulta assim que o recorrente só pode juntar documentos com as suas alegações se a apresentação daqueles não tiver sido possível até esse momento (art.

425.

º do CPC – antigo art. 524.

º, n.º 1 ) ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância (art.

651.

º, n.

º 1, do CPC – antigo art.

693.

º-B, 2.

ª parte).

Na primeira das hipóteses, compreendem-se os casos de a parte não ter conhecimento da existência do documento, ou conhecendo-a, não lhe ter sido possível fazer uso dele, bem como quando o documento se formou ulteriormente, sendo necessário, para que a junção se considere lícita, que a parte que apresenta o documento demonstre que não lhe foi possível juntar os documentos até ao encerramento da discussão na 1ª instância.

Em síntese, como se concluiu no ac. do STJ de 1.02.2011, proc. n.º 133/04.4TBCBT: “a junção de documentos na fase de recurso só colhe justificação – só não é impertinente e desnecessária – quando os mesmos visem a modificação da fundamentação de facto da decisão recorrida ou quando o objecto da decisão coloque ‘ex novo’ a necessidade de fazer a prova de factos com cuja utilização pelo julgador a parte não podia anteriormente contar”.

Na presente situação, como já se disse, o Recorrente pretende com o documento em causa infirmar o decidido pelo Tribunal a quo, com o sentido de demonstrar, por um lado, que não existem indícios da prática do ilícito disciplinar em questão e, por outro lado, que a sua versão é a que ganha maior sustentabilidade (cfr. conclusão VI. do recurso). Trata-se, por outro lado, de documento produzido noutro processo (inquérito criminal) e que, de acordo com a justificação que se retira da alegação do Recorrente, visa a prova efectuada em 1.ª Instância.

Sucede que o Recorrente no recurso interposto não vem impugnar a matéria de facto fixada. Na verdade, compulsada a alegação e as conclusões de recurso verifica-se que de nenhum passo vem questionada a matéria de facto, muito menos de modo a permitir descortinar as razões e os concretos pontos da matéria de facto que o Recorrente afinal considera terem sido incorrectamente julgados.

E nos termos do artigo 685.

º-B do CPC (actualmente o art. 640.º), incumbe ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto o ónus de especificar, sob pena de rejeição: a) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; e c) no “caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no nº 2 do artigo 522º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição”.

Resulta pois do citado artigo 685.

º-B do CPC a consagração de um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, o qual impende sobre o aqui Recorrente e que o mesmo, de forma manifesta, não satisfez.

Serve este excurso para afirmar que visto o alegado pelo Recorrente neste recurso, bem pode dizer-se que a apreciação da sua pretensão quanto à junção do documento em causa é completamente inútil.

Com efeito, não só a matéria de facto fixada pelo Tribunal a quo não vem...

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