Acórdão nº 11862/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelNUNO COUTINHO
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – Relatório Ministério Público requereu contra o Ministério das Finanças, o Secretário de Estado da Cultura, a Direcção Geral do Património Cultural, P………, S.A., P…….., S.A. e Leiloeira Christies providência cautelar de intimação para abstenção de conduta tendo formulados os seguintes pedidos de intimação: “1-O Secretário de Estado da Cultura a exercer os poderes de tutela, nomeadamente determinando à Direcção-Geral do Património Cultural a abertura do devido procedimento de inventariação e classificação, já impulsionado, nos termos dos artigos 25º a 30º da LBPC.

2-A Direcção-Geral do Património Cultural a assegurar e coordenar a instrução do procedimento administrativo de classificação e inventariação das obras de arte de Joan Miró, incluindo a obrigatória audição dos órgãos consultivos competentes (art. 26, nº 3 da LBPC).

3-O Ministério das Finanças, accionista único da P............, SA e P............, SA, através da Direção-Geral do Tesouro e Finanças, a exercer os poderes de superintendência e de tutela, através de orientações e instruções no sentido de não serem executadas as anunciadas decisões de venda enquanto não se mostrar produzido despacho ordenando a abertura do referido procedimento, subsequente instrução e decisão, proferida no exercício de poderes vinculados.

4-As empresas públicas P............, SA e P............ SA a abster-se de colocar no mercado externo as obras de arte em causa enquanto não for produzido, pela administração do património cultural, despacho ordenando a abertura do procedimento administrativo anteriormente referido, e nesse âmbito, apreciado o pedido de expedição/exportação conforme expressamente impõe a LBPC.

5- A Leiloeira Christie’s a abster-se de colocar no mercado as mesmas obras de arte enquanto não for produzido, pela administração do património cultural, despacho ordenando a abertura do procedimento administrativo anteriormente referido, e nesse âmbito, apreciado o pedido de expedição/exportação conforme expressamente impõe a LBPC.

Terminando da seguinte forma: “Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, deve ser decretada providência cautelar de intimação dos requeridos a absterem-se de colocar no mercado externo as obras de Miró, que vieram à posse e titularidade do Estado após a nacionalização das acções do ……………… (B……..) de forma a permitir o cumprimento obrigatório dos requisitos impostos pela LBPC, nomeadamente inventariação e classificação das obras.” Por sentença proferida pelo T.A.C. de Lisboa foi julgada extinta a instância cautelar, por inutilidade superveniente da lide.

Inconformado com a referida decisão interpôs recurso o Ministério Público, tendo formulado as seguintes conclusões: “1. Na presente providência cautelar intentada pelo MºPº contra o Ministério das Finanças, Secretário de Estado da Cultura, DGPC, P............, SA, P………´s e Leiloeira Christie´s vem requerido a respectiva intimação de forma a permitir, no essencial, o cumprimento obrigatório dos requisitos impostos pela LBPC, nomeadamente a inventariação e classificação das obras de arte de J. Miró.

  1. Para tal é necessário obstar à colocação no mercado externo (para alienação) do acervo constituído pelas 85 obras de J. Miró, enquanto não estiverem cumpridas todas as fases do procedimento de classificação, incluindo a necessária audição dos órgãos consultivos previstos na LBPC.

  2. Só com a manutenção das medidas provisórias e o decretamento da providência cautelar de intimação dos RR a absterem-se de colocar no mercado as obras de arte de J. Miró se poderá retirar utilidade para os fins que se visa acautelar.

  3. As obras em causa vieram à posse e titularidade do Estado após a nacionalização das acções do B…. e com o decretamento da presente providência cautelar o requerente MºPº mais não pretende que zelar pelo cumprimento obrigatório dos requisitos impostos pela LBPC, respeitantes à inventariação e classificação das obras de arte de J. Miró.

  4. Pelos despachos do Director-Geral do Património Cultural, datados de 21/7/2014, em cumprimento do despacho do Secretário de Estado da Cultura, de 18 de Julho de 2014, publicitados nos anúncios nº 197/2014 e 198/2014 e publicados no DR nº 146, 2ª Série, de 31/7/2014, foi ordenada a abertura do procedimento administrativo de inventariação e classificação das 85 obras de Joan Miró constantes do catálogo da Christie´s Miró Seven Decades of His Art.

    6) A partir da publicação dos aludidos despachos do Director-Geral do Património Cultural os referidos bens culturais passaram a estar “em vias de classificação”, nos termos do número 1 do artº 25º da Lei nº 107/2001, de 8 de Setembro (LBPC), e, consequentemente, sujeitos a um regime especial de protecção, nomeadamente no que toca à sua exportação e expedição.

    7) Igualmente na pendência da presente providência foram proferidos dois despacho de arquivamento liminar dos procedimentos de classificação pelo Director Geral do Património Cultural, com base no artº 68º, nº 2 da Lei 107/2001, de 8 de Setembro considerando que as empresas P............ SA e P……..SA como “meros particulares” para efeitos de aplicação de LBPC.

    8) Foi requerida a suspensão de eficácia destes despachos de arquivamento liminar e proposta a respectiva acção administrativa especial, na qual se pede a declaração de anulabilidade dos referidos actos.

    9) Os despachos de arquivamento impugnados na referida acção administrativa especial incorrem em erro de interpretação de norma constante do artº 68º, nº 2 al. b) LBPC.

    10) As sociedades P............, SA e P………´s, SA não são “particulares” na acepção da LBPC: são entidades públicas reclassificadas no perímetro das contas públicas, integrantes do sector empresarial do Estado, detidas exclusivamente pelo Estado, instituídas para finalidades públicas.

    11) Não ocorre a invocada excepção da inutilidade superveniente da lide, causa de extinção da instância, nos termos do artº 277, nº 2 do CPC, aplicável “ex vi” artº 1º do CPTA.

    12) O facto de o Mº Pº ter intentado novo processo cautelar, onde requer a suspensão de eficácia dos despachos de arquivamento liminar proferidos pelo DGPC não determina supervenientemente, a perda de objecto do processo no que concerne à providência requerida.

    13) Pelo contrário, antes reforça a necessidade da manutenção das medidas provisórias e decretamento da providência requerida.

    14) E a coberto dos fundamentos utilizados na douta sentença ora recorrida e parte decisória desta podem os RR vir a colocar no mercado as referidas obras de arte.

    15) Só com o decretamento da providência requerida se poderá assegurar o fim visado, uma vez que apenas foi decretada a abertura e subsequente arquivamento liminar do procedimento de classificação, tendo sido ilegalmente inviabilizado o normal decurso da instrução do procedimento com a audição dos órgãos consultivos e subsequente decisão quanto ao valor cultural dos bens – artigo 26º, nº 3 da LBPC.

    16) A sentença de que ora se recorre é nula, nos termos do artº 615º, nº 1, alínea c) do C.P. Civil: os fundamentos de facto e de direito invocados conduziriam, logicamente, a um resultado oposto àquele que integra o respectivo segmento decisório encontrando-se em clara oposição com a decisão.

    17) Erra ainda a sentença quando considera, na parte decisória, que a pretensão do requerente não se pode manter, por perda de objecto do processo, ao considerar alcançado o fim visado com a presente providência, em virtude de, da mesma não poder o Requerente retirar qualquer utilidade.

    18) Todavia, como atrás se concluiu mantém-se o fundado receio de violação das normas de direito administrativo, v.g. Lei de Bases do Património Cultural.

    19) Receio esse que contrariamente ao decidido não pode ser acautelado através da providência cautelar de suspensão de eficácia.

    Deve a douta sentença recorrida ser revogada por violar designadamente o disposto nos artºs 16º, 18º, 26º a 29º da LBPC, e ainda os artºs 277º, nº 1 al. e) e 615º, nº 1 al. e ) do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” artº 1º do CPTA e substituída por outra que defira a providência cautelar requerida.

    Contra alegou a Presidência do Conselho de Ministros, concluindo da seguinte forma: “1.1. Recorre o MP da sentença da Senhora Juiz a quo, a fls. 1790 e ss., de 18 de novembro de 2014, que julgou extinta a instância cautelar acima identificada, por inutilidade superveniente da lide (não de uma sentença que indeferiu a presente providência cautelar pelo simples facto de que tal sentença não existe); 2.1 O Recorrente conclui mais do que alegou, isto é, conclui o que não expos anteriormente em alegações, sendo certo que as conclusões são proposições sintéticas que emanam do que se expôs e considerou ao longo das alegações (Ac. do STJ de 4 fev.-1993, in Ci do STJ 1993, 1, 1993, pág. 140); 2.2 As conclusões que versaram sobre matéria não tratada nas alegações do Recorrente são irrelevantes (Ac. da Relação de Coimbra de 3-mai.-1994, in BMJ n.9 437, 1994, pág. 591), devendo ser consideradas como inexistentes e não escritas (Ac. da Relação de Coimbra 4 jun.-1996, in BMJ n.9 458, 1996, pág. 405); 2.3 Assim sucede nas conclusões n.ºs 4), 5), 6), 11, 12, 13 e 14 do recurso do Recorrente; 2.4 Assim sucede também quanto ao pedido...

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