Acórdão nº 07929/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO 1. RELATÓRIO “....................................................., LDA”, recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a reclamação por si apresentada contra o acto praticado pelo órgão de execução fiscal pelo qual lhe foi indeferido o pedido de dispensa parcial da prestação de garantia com vista à suspensão da execução fiscal n.º.......................... e aps, que contra si foi insaturada para cobrança de dívidas provenientes de actos de liquidação adicional de IRC, dos exercícios de 2007, 2008 e 2009, no montante de 1.456.141,21.

Termina as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: «A) - A douta sentença recorrida julgou improcedente o pedido de anulação do despacho de indeferimento do pedido de dispensa parcial de garantia com fundamento na recorrente não ter feito prova de que não foi por culpa sua que o património é insuficiente para prestação de garantia.

  1. - Entendimento adotado na douta sentença recorrida da falta de prova de culpa da recorrente, por não ter sido demonstrada de forma inequívoca e direta uma relação necessária entre o montante das dívidas e o património do devedor.

  2. - Entendimento este, da forma de provar a falta de culpa do devedor na insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis, que torna inexequível o uso do direito à dispensa de garantia.

  3. - Com efeito, a exigência ao devedor fiscal de uma relação necessária entre o montante da dívida e o seu património e que demonstre que não tem culpa na insuficiência ou inexistência de património para prestação de garantia apenas é exigível quando se trate de dívidas por si declaradas e ou apuradas.

  4. - Tratando-se de dívidas que provêm de liquidações adicionais (como é o caso dos autos) não é possível nem exigível que o devedor prove a existência duma relação necessária entre o montante da dívida e o seu património para que não seja responsabilizado pela prestação de garantia.

  5. - Resultando o maior ou menor património do devedor da conjugação de diversos fatores, quer internos quer externos à própria empresa, aquele não conseguirá dar cumprimento ao requisito da prova de falta de culpa na insuficiência de património para prestação de garantia ao credor tributário na estrita medida em que ele próprio não controla os fatores do seu crescimento.

  6. - Atendendo a que a quantificação e valorização, em termos contabilísticos, do valor de uma empresa é dado pelo valor da sua situação líquida, significa que aquela que apresente anualmente valores de situação líquida positivos idênticos de uns anos para outros usufrui de estabilidade.

  7. - Usufruindo de estabilidade o devedor que apresenta uma situação líquida positiva, tal fato traduz que não é por culpa sua que o património é insuficiente para prestar garantia.

  8. - Encontrando-se provado nestes autos que o património da recorrente é igual antes e depois da instauração das execuções fiscais, a recorrente apenas vislumbra que lhe seja possível demonstrar que a insuficiência de bens para prestar garantia não é da sua responsabilidade mediante a invocação de fatos que não lhe permitiram que antes da prestação de garantia estivesse ao seu alcance ter aumentado o seu património, de modo a que este fosse suficiente para garantia da dívida.

  9. - Só que a invocação dos factos que não permitiram ao devedor ter obtido o património que fosse suficiente para garantia da dívida pressupõe uma condição que não é controlável nem previsível pelo próprio devedor.

  10. - O fato de competir ao devedor provar que não foi por culpa sua que o património não é insuficiente ou inexistente para prestar garantia, terá de ter em conta um grau de exigência menor e inferior na avaliação e julgamento da própria prova.

  11. - Encontrando-se penhorado e hipotecado todo o património da empresa de natureza móvel e imóvel, excepto os créditos de clientes e as contas bancárias, cujos valores são muito inferiores ao próprio valor a garantir de € 1.300.716,80, e não tendo a recorrente praticado atos destinados a colocá-la em condições de não ter meios para prestar garantia à Autoridade Tributária, tal circunstancialismo traduz uma situação de falta de responsabilidade do devedor pela insuficiência de bens penhoráveis para garantia da dívida.

  12. - A douta sentença recorrida violou a parte final do nº 4 do artigo 52º da LGT.

    Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências».

    A Fazenda Pública apresentou contra-alegações que encerrou com o seguinte quadro conclusivo: «I. A douta sentença recorrida julgou improcedente o pedido de anulação do despacho de indeferimento do pedido de dispensa parcial de garantia por não estar reunido o pressuposto a que alude a parte final do artigo 52º, nº4, da LGT; II.

    Se bem compreendemos, o ora R. alega apresentar uma situação económico financeira estável nos últimos anos para daí inferir a sua alegada irresponsabilidade pela insuficiência do património para garantir a dívida exequenda; III. O Mmº Juiz o quo concluiu o seu douto entendimento no sentido de que a reclamante não convocou factos que permitissem sustentar que a insuficiência de bens não era da sua responsabilidade, pois que se limitou a alegar que o património que existia antes da data limite de pagamento das dívidas em execução era o mesmo património que está penhorado e hipotecado pelas Finanças e a alegar que a situação anual económica e fiscal da reclamante, nos últimos exercícios, se teria mantido idêntica.

    IV. O facto do património ser o mesmo no momento anterior e posterior à instauração, não foi entendido pelo Mmº Juiz como permitindo evidenciar que a insuficiência de bens não foi da sua responsabilidade.

    V.

    Pois, ainda segundo o entendimento do Mmº Juiz, o legislador pretendeu estabelecer uma relação necessária entre o montante das dívidas tributárias e o património do devedor tributário.

    VI.

    Ora, com o devido respeito, o entendimento do ilustre julgador deve prevalecer na ordem jurídica.

    VII.

    Com efeito, a estabilidade da situação patrimonial da sociedade nos últimos anos não consubstancia um facto de onde se possa inferir, com o devido respeito, a irresponsabilidade da executada na insuficiência do património.

    VIII.

    Imagine-se, por mera hipótese académica, que a situação patrimonial da sociedade poderia inclusivamente ter sofrido uma diminuição considerável devido a ter cumprido com o pagamento da dívida exequenda de determinado processo de execução fiscal.

    IX.

    Outrossim, a situação financeira aparentemente estável da sociedade poderia, com o devido respeito, significar, tal como a FP pugnou em articulados anteriores, que a sociedade não apresenta uma situação de insuficiência patrimonial e que os montantes que constam das rubricas de capital próprio da sociedade poderiam ter sido relevados para esse efeito.

    X. Vem ainda a R., nesta sede, alegar não ser possível nem exigível ao devedor a prova com base na existência duma relação necessária entre o montante da dívida e o seu património, quando se está perante dívidas provenientes de liquidações adicionais.

    XI. Acontece, porém, que a informação sobre a proveniência das dívidas tributárias não consta da matéria dada como provada.

    XII. Nem tão pouco se tratou de matéria levada ao probatório, pois nem sequer foi indicada na petição inicial.

    XIII. Pelo que o Mmº Juiz a quo não poderia, inevitavelmente, valorar tal factualidade no seu douto juízo.

    XIV.

    Pelo exposto, entende a Fazenda Pública que a decisão sob recurso deve ser integralmente cumprida, porque de JUSTIÇA e de DIREITO».

    Por Acórdão de 19 de Novembro de 2014, o Supremo Tribunal Administrativo declarou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do mérito do recurso, atribuindo a competência para esse efeito a este Tribunal Central Administrativo.

    Recebidos os autos neste Tribunal Central, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer aí concluindo no sentido da improcedência do recurso.

    Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza do processo (artigo 707º do CPC e artigo 278º, nº5 do CPPT), cumpre agora apreciar e decidir, visto a tal nada obstar.

    1. Objecto do recurso Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 639°, n°1, do C.P.C.

      ) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

      Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 635°, n°2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (n°3 do mesmo art. 635°), pelo que, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

      Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

      Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que, o objecto do mesmo se esgota numa única questão: saber se, face aos factos que nos autos se mostram apurados, o Tribunal a quo errou ao julgar que a Reclamante não logrou provar que a insuficiência do património para solver os créditos exequendos não lhe era imputável e, consequentemente, ao declarar improcedente com...

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