Acórdão nº 08577/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução07 de Maio de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO I - Relatório “…………………, S.A.” (sociedade anteriormente denominada “………………………………., S.A), discordando do valor patrimonial tributário fixado em sede de 2.ª avaliação a 92 terrenos para construção que adquiriu, impugnou junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada o acto de fixação desse valor.

Tendo em vista a sua anulação, invocou, a então Impugnante, em síntese, que: - como reconhecido pelos peritos, o valor patrimonial tributário (VPT) fixado em segunda avaliação, mediante a aplicação do coeficiente de localização de 1,55 e um valor da área de implantação de 29% do valor das edificações autorizadas – de que resultou o valor de € 74,92/m2 –, excede em muito o valor de mercado dos terrenos, que, de acordo com um estudo efectuado por uma empresa especializada, não excedia, à data, € 60,10/m2; - as normas sobre o apuramento do VPT dos terrenos para construção, designadamente o art. 45.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), na medida em que não estabelecem um critério que permita distinguir entre os terrenos para construção já dotados de infraestruturas e os que delas ainda não dispõem e, bem assim considerar os diferentes graus ou estádios da infraestruturação, «não respeitam os princípios constitucionais da igualdade fiscal, da não discriminação fiscal e da capacidade contributiva», motivo por que os resultados das avaliações impugnadas devem ser considerados nulos; - por outro lado, a impossibilidade de sindicar os critérios de avaliação estabelecidos no art. 45.º do CIMI, designadamente o coeficiente de localização, também constituiria uma inconstitucionalidade por violação do art.268º, nº4, da Constituição da República Portuguesa.

Dando cumprimento ao disposto no nº3 do art.108.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), a Impugnante requereu, entre outras diligências de prova, a produção de prova pericial em ordem «a determinar o valor real dos referidos terrenos com referência ao ano de 2005».

A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada dispensou a produção da prova pericial, com o fundamento de que o valor de mercado dos imóveis pode ser provado através de prova testemunhal, não sendo necessária prova pericial.

A Impugnante recorreu desse despacho para o Supremo Tribunal Administrativo, apresentando com o requerimento de interposição do recurso, as respectivas alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor «A.

Está em causa nos autos de impugnação o valor patrimonial tributário de terrenos para construção, reportado a 2005.

B.

A ora Recorrente alegou na p.i. que o acto de fixação do valor patrimonial deveria ser anulado por vício de erro na determinação dos critérios de avaliação dos terrenos.

C.

A demonstração do erro existente na determinação dos critérios de avaliação dos terrenos está dependente da correcta avaliação do real valor dos terrenos com respeito a 2005.

D.

Desta forma, a Recorrente requereu a realização de perícia sobre os terrenos, por forma a determinar o valor real dos mesmos com referência ao ano de 2005.

E.

O Tribunal a quo indeferiu a requerida prova pericial, fundamentando tal decisão do seguinte modo: “No caso em análise nos termos do art.114º do Código de Procedimento e de Processo Tributário consideramos que a prova do valor de mercado dos terrenos não necessita ser efectuada por perícia podendo ser efectuada por prova testemunhal”.

F.

Não concordando com este despacho, recorre-se do mesmo para este Alto Tribunal.

G.

No entender da Recorrente, o valor de mercado de um terreno para construção é, precisamente, um dos factos cuja percepção requer, paradigmaticamente, conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, tal como dispõe o artigo 388.º do Código Civil.

H.

Tal é facilmente demonstrado pela astronómica quantidade de pessoas e empresas altamente especializadas na tarefa de aferir o valor de mercado de imóveis (os – precisamente designados – peritos avaliadores).

I.

Ao contrário do defendido pelo Tribunal a quo, o facto de ser possível demonstrar algo através da prova testemunhal não é fundamento para indeferir a realização de prova pericial.

J.

O iter cognitivo do Tribunal a quo parece ser o seguinte: o valor de mercado dos terrenos reportado a 2005 pode ser provado através de uma testemunha, logo não é necessário realizar a prova pericial sobre este facto.

K.

Uma vez que o facto em causa (valor de mercado dos terrenos) requer, conforme acima se demonstrou, conhecimentos especiais, o que o Tribunal a quo implicitamente afirma é que a pessoa com estes conhecimentos especiais pode/deve ser chamada pela Impugnante na qualidade de testemunha – sendo assim desnecessário chamá-la na qualidade de perito… decorrendo desta acepção que a prova pericial nunca será, por definição, necessária, já que todos os factos do mundo são susceptíveis de prova testemunhal (uma vez que as pessoas com conhecimentos especiais podem sempre ser chamadas como testemunhas).

L.

Ao contrário da tese defendida pelo Tribunal a quo, a prova pericial não está subordinada à impossibilidade (abstractamente considerada) de um facto ser insusceptível de prova testemunhal, nem tais meios de prova se confundem, conforme já decidiu o Supremo Tribunal de Justiça.

M.

A distinção, estabelecida na lei, entre prova testemunhal e prova pericial é a necessidade ou desnecessidade de conhecimentos especiais, sendo de indeferir o requerimento de prova pericial quando as questões suscitadas forem de apreensão simples, conforme decidiu o Tribunal da Relação do Porto.

N.

Uma vez que a percepção do valor de mercado de terrenos para construção não é, obviamente, de simples apreensão, o despacho de indeferimento sofre do vício de violação de lei.

O. O Tribunal a quo não considerou – e bem – que o pretendido apuramento do valor de mercado dos terrenos era inútil ou dilatório, pelo que não se poderá fazer apelo ao princípio do inquisitório para sustentar o despacho de indeferimento, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo.

P.

E mesmo que se entenda que o Tribunal a quo considerou, de forma implícita, que a realização da prova pericial era inútil porque o facto era susceptível de prova testemunhal, deverá tal decisão ser anulada porque da susceptibilidade de prova testemunhal sobre um facto não decorre a inutilidade da prova pericial sobre esse mesmo facto.

Q.

Resulta assim do exposto que o Tribunal a quo efectuou uma incorrecta interpretação do princípio do inquisitório, devendo o despacho recorrido ser anulado por vício de violação de lei, e a diligência requerida pela ora Recorrente ser realizada, porque útil ao apuramento da verdade.

Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, devendo, em consequência, ser anulado o despacho recorrido e deferido o requerimento de prova pericial, nos termos da p.i.».

Admitido este recurso a subir com o que da decisão final viesse a ser interposto e notificada desse despacho de admissão a Fazenda Pública não foram apresentadas contra-alegações.

Tendo os autos prosseguido foi, a final, a impugnação judicial julgada improcedente pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada.

Igualmente inconformada com a sentença, apresentou a Impugnante novo requerimento de interposição de recurso, também para o Supremo Tribunal Administrativo, tendo nas suas alegações, em que pede a subida conjunta do recurso do despacho interlocutório, concluído nos seguintes termos: «A.

Tendo ficado provado que o VPT dos Terrenos é superior em mais do que 15% do valor normal de [mercado], é forçoso concluir pela ilegalidade da actuação da Administração Fiscal na fixação do valor patrimonial aqui impugnado, conforme jurisprudência deste STA, por violação do artigo 77.º n.º 2 do Código do IMI e do n.º 2 do artigo 134.º do CPPT.

B.

Uma vez que os critérios específicos que levaram os peritos locais a propor um coeficiente de localização de 1,55 e uma percentagem do valor de terreno de 29% para a zona onde se situam os terrenos não foram dada a conhecer nem resultam do relatório de zonamento, a Recorrente viu-se impossibilitada de apontar razões técnicas que levaram à manifestamente excessiva fixação do VPT.

C.

No entanto, a Recorrente defende que a percentagem de 29% aplicada aos terrenos será manifestamente excessiva, tendo em conta o resultado atingido.

D.

Considera também a Recorrente, com a melhor doutrina, que não devia ser aplicado qualquer coeficiente de localização na fixação do VPT dos Terrenos, uma vez que isso configura uma duplicação de uma majoração já aplicada na fórmula por via do critério da percentagem aplicável à área de implementação, levando a um empolamento do resultado.

E.

O facto de a Recorrente pretender que o novo VPT a ser fixado tenha efeitos em sede de IMI não prejudica a procedência do presente recurso.

F.

É que a limitação constante do n.º 3 [actual n.º 4] do artigo 76.º do Código do IMI, que impõe a aplicação do novo VPT apenas em sede de IRS, IRC e IMT, não é aplicável ao presente caso, uma vez que esta limitação entrou em vigor posteriormente aos factos.

G.

Se a exigência de se considerar o valor de mercado na fixação do VPT já resultava de uma adequada interpretação da lei, mesmo antes da entrada em vigor do n.º3 [actual n.º 4] do artigo 76.º, o mesmo não sucede com a limitação para efeitos de IMI que consta desta norma, visto que tal limitação não resultava de parte alguma.

H.

Mas mesmo que se defenda que a limitação em sede de IMI prevista no n.º 3 [actual n.º 4] do artigo 76.º do Código do IMI é aplicável ao presente caso (embora não se veja de que forma), então cair-se-á numa clara inconstitucionalidade.

I.

O legislador não pode limitar, para efeitos de IMI, a possibilidade dos sujeitos passivos recorrerem a tribunal para demonstrar que o VPT fixado é iníquo, excessivo e injusto ab initio, sob pena de violação do princípio da igualdade e da proporcionalidade em especial, nas suas dimensões da adequação e da proibição do excesso, e dos artigos 266.º n.º 2 da CRP e 55.º da LGT.

J...

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