Acórdão nº 09049/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Maio de 2015
Magistrado Responsável | HELENA CANELAS |
Data da Resolução | 14 de Maio de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO N…………- Técnicas ……………., S.A.
(devidamente identificada nos autos), autora na ação administrativa comum sob a forma de processo sumário (Proc. nº 637/11.2BECTB) tendo como réu o Município de Almeida (igualmente devidamente identificado nos autos), na qual peticionou a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 12.097,58 €, correspondente ao valor total de faturas, não pagas, referentes a serviços de gestão de resíduos (designadamente de Recolha Seletiva de Vidro, Papel e Cartão e Embalagens e ainda de Recolha de “Monstros”) e respetivos juros de mora vencidos (que quantifica em 9.909,39 €) e vincendos, inconformada com a sentença (saneador-sentença) de 27/01/2012 (fls. 176 ss.) do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco pela qual foi o réu absolvido do pedido, vem dela interpor o presente recurso.
Nas suas alegações a recorrente, formula as seguintes conclusões nos seguintes termos: A - O Meritíssimo Juiz a quo não ordenou a realização de audiência preliminar, não elaborou base instrutória e, mais do que isso, não permitiu às partes a produção da prova testemunhal que tempestivamente arrolaram nos articulados.
B - O Tribunal circunscreveu o objeto da ação à questão de saber se foi ou não firmado um contrato escrito entre a Autora e o Réu cujo objeto fosse a prestação da autora ao Réu de determinados serviços de gestão de resíduos a que se referem os documentos n.05 4 a 23 da Petição Inicial.
C - Mas a questão a resolver não é "apenas" a de saber se o acordo que a Autora alega ter sido celebrado com o Réu foi ou não reduzido a escrito, num único documento, que haja sido "firmado" pelas partes, antes importa, desde logo, saber e demonstrar se os serviços foram prestados e se o Réu deles beneficiou.
D - Ora, sobre essa matéria, alegou a Autora abundante matéria de facto quer na Petição Inicial quer na Petição Aperfeiçoada que o Tribunal erradamente não considerou assente, nem levou à base instrutória, tendo essa alegação da Autora e ora Recorrente sido acompanhada da respetiva prova documental e testemunhal.
E - O Tribunal impediu a Autora de produzir cabalmente prova do quanto alegara relativamente quer à prestação do serviço em si, quer à redução a escrito dos termos do acordo para os prestar.
F - Por outro lado, também não constam nos autos nem declarações das partes produzidas nos articulados, nem documentos, que permitam ao Tribunal fixar como matéria de facto provada que a Autora não contratou com o Réu a prestação de serviços a que se reportam as faturas referidas na petição inicial ou que inexiste qualquer contrato escritos e firmados entre a Autora e o Réu com esse objeto.
G - Os concretos pontos de facto que se consideram incorretamente julgados são, por errada inclusão na matéria assente, o Facto n. 2 da douta sentença recorrida, e, por errada não inclusão da matéria de facto assente, os alegados nos artigos nos artigos 1.º a 18.º da PI aperfeiçoada a fls. 237 a 264, já supra transcritos e que, por economia processual aqui se dão igualmente reproduzidos.
H - Sendo que os concretos meios probatórios que impõem uma decisão, sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida são, quanto à errada inclusão do Facto n.º 2, a inexistência do efeito cominatório atribuído pela sentença à falta de resposta da Autora à contestação do Réu (relativamente, à inexistência de um acordo escrito), e, quanto à errada não inclusão dos factos alegados nos artigos 1.º a 18.º da PI aperfeiçoada, os documentos juntos à PI e à PI aperfeiçoada - que evidenciam não apenas que os serviços foram prestados, mas também que a proposta foi apresentada e os termos do acordo foram reduzidos a escrito.
I - Sendo certo que, na eventualidade de o Tribunal entender que não existem elementos suficientes para dar como provada tal matéria, sempre deverá ordenar a baixa dos autos para elaboração da Base Instrutória, à qual deve ser levada aquela matéria de facto, e para subsequentemente ser ordenada a abertura de um período de produção de prova, designadamente a testemunhal.
J - Tendo em conta o modo como a Autora e aqui Recorrente configura a ação e sustenta a sua pretensão não há dúvida que o acordo que entende ter celebrado com e que vincula o Réu aqui Recorrido não configura um acordo de vontades pelo qual se teria constituído uma relação jurídica administrativa e, como tal, não lhe é aplicável a regra da necessidade de forma escrita prevista no artigo 184.º do CPA.
K - O acordo que a Autora e aqui Recorrente alega ter celebrado com o Réu foi realizado após discussão e negociação da sua proposta com o Réu e não prevê quaisquer poderes exorbitantes do contraente público, como sejam o de modificar unilateralmente as prestações objeto do contrato ou o modo como seriam executadas, ou o de resolver o contrato com fundamento no interesse público, nem do acordo deriva, em geral, qualquer supremacia jurídica do Réu sobre a Autora.
L - De acordo com as conclusões "D" a "H" parece à Autora que os elementos probatórios documentais permitem incluir na matéria de facto assente os factos que demonstram o alegado na conclusão "J".
M - Todavia, ainda que assim não se entenda, haverá quer ter em consideração que o Tribunal se limita a partir do principio de que a forma escrita é exigível à celebração do acordo em causa sem realmente fundamentar por que motivo qualifica o acordo como um contrato administrativo, que devesse revestir forma escrita.
N - Sendo certo que, impugnado que está o Facto n.º 2 da matéria assente, é manifesto que o facto n.º 1 é insuficiente para a qualificação da natureza do acordo.
O - A questão de saber se o acordo reveste a natureza de contrato administrativo ou a de contrato de direito privado é, por sua vez, da maior relevância porquanto, como é sabido, nestes últimos vigora o principio da consensualidade ou da liberdade de forma.
P - Pelo que. ainda que não se entenda que ao acordo não é aplicável o disposto no artigo 184.º do CPA, designadamente por o estado do processo não permitir com segurança estabelecer a natureza jurídica do acordo, sempre haveria que anular a decisão recorrida e ordenar a produção da demais prova indicada pelas partes.
Q - Até porque, se a autora alega que prestou os serviços em causa ao Réu e que este os aceitou e deles beneficiou, mas se o Réu alega o contrário e se os elementos documentais juntos aos autos se não consideram suficientes para decidir a questão e, ainda, se, como se referiu nas conclusões "D" a "H" a falta de resposta à contestação do Réu, na parte relativa à inexistência de acordo escrito, não tem o efeito cominatório que lhe foi atribuído na sentença, é manifesta a necessidade dessa produção de prova.
R - Nesta parte, a douta sentença recorrida comete erro de julgamento e viola o disposto nos artigos 217º e 219.º do Código Civil e 178.º e 184.º do CPA, devendo ser anulada e substituída por outra que face aos documentos juntos aos autos julgue validamente celebrado o acordo em causa e condene o Réu no pedido ou que ordene a baixa dos autos para produção de prova sobre essa matéria.
S - Independentemente da existência de um acordo escrito nesse sentido, resulta claro que existiu um enriquecimento do Recorrido, à custa da Recorrente que prestou os serviços e não recebeu qualquer remuneração pelos mesmos, enriquecimento esse consistente na recolha seletiva dos resíduos de vidro, papel/cartão e embalagens e na recolha de "Monstros" que, de outra forma, não seriam recolhidos ou seriam recolhidos por entidade terceira a quem o Réu teria de pagar os respetivos serviços.
T - O enriquecimento sem causa na administração pública carece normalmente do "assentimento" da entidade pública que Alexandra Leitão, todavia, caracteriza como um "consentimento que pode traduzir se numa aquiescência expressa, mas tem-se como verificado sempre que a Administração não se oponha à conduta do particular, valendo o silêncio como aceitação tácita da sua utilidade (in, O Enriquecimento sem Causa na Administração Pública, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1998, pág. 81.) U - No caso, sempre haveria que reconhecer à Autora o direito ao recebimento do valor correspondente ao enriquecimento do Réu porquanto é inequívoco que:
-
A Autora prestou os serviços; b) O Réu negociou com a Autora os termos em que os iria prestar; c) O Réu assentiu ou, pelo menos, não se opôs á prestação dos serviços iniciados em Agosto de 2002, tanto mais que por eles já pagou mais do que o que deve; d) Os serviços têm utilidade para o interesse público, enquanto serviços de recolha de resíduos; V - O que, claramente, não é de aceitar é que não seja pago ao particular um serviço tão importante como é o da Recolha de Resíduos e dos "Monstros", que inequivocamente prestou, e que o próprio Município aqui Réu e Recorrido não nega ter sido prestado.
W - Ao contrário do sustentado na douta sentença recorrida, a causa de pedir na presente ação não são "uns contratos que teriam sido incumpridos ".
X - A causa de pedir radica na realização de Serviços de Recolha Seletiva de Vidro, Papel/Cartão e Embalagens e de Serviços de Recolha de "Monstros" (cfr. o alegado na PI e na PI aperfeiçoada).
Y - O Tribunal não está vinculado ao enquadramento jurídico que as partes dão á sua pretensão e, no caso, não só a causa de pedir não é "uns contratos que teriam sido incumpridos", como, além do mais, na subsunção dos factos ao direito e na averiguação das normas aplicáveis não está de modo nenhum o Tribunal limitado à fundamentação jurídica que as partes hajam dado à sua pretensão, antes deve, pelo contrário, em função da situação de facto que...
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