Acórdão nº 12443/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO SILVESTRE
Data da Resolução17 de Setembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: RELATÓRIO ALFREDO ………………………………………..

instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa processo de intimação para a prestação de informações e passagem de certidões contra a ORDEM DOS ADVOGADOS com vista a obter a sua intimação “a facultar ao requerente a consulta do processo disciplinar n.º 1377/2013L/D - 3ª Secção”.

Por sentença proferida em 12/06/2015, o TAC de Lisboa julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

Inconformado, o requerente apresentou recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões: “

  1. Nos presentes autos está em causa um direito de consulta dum processo disciplinar em que o interessado na consulta é o queixoso.

  2. O Tribunal a quo considerou, por ter sido indeferida a pretensão formulada junto do processo disciplinar que tramita na recorrida, na pendência dos presentes autos, e cuja causa de pedir se sustentava na omissão de pronúncia, haver inutilidade superveniente da lide e, consequentemente, ordenou a extinção da instância. Ora, c) O recorrente entende que, salvo melhor e douto entendimento contrário, o Tribunal errou.

  3. Não se põem em crise os factos dados como provados, antes, com base nos mesmos é que a decisão deveria ser diferente. Com efeito, e) Consagra-se na Lei Fundamental, Constituição da República Portuguesa, o princípio da liberdade de informação, que integra o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos, censura ou discriminações, art. 37º, n.ºs 1 e 2, sendo que nos termos do n.º 2 do artigo 48º, todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos sobre os actos das entidades públicas, designadamente das associações públicas.

  4. O aludido direito à informação dos administrados, in casu invocado pelo, concomitantemente, participante disciplinar e ora recorrente tem ainda assento constitucional no artigo 268º, n.ºs 1 e 2, o qual assume natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, consagrados na Lei Fundamental. Nesse sentido cf. Prof. Gomes Canotilho in: “Direito Constitucional”, 7ª edição, pág. 404 e ainda os Acs. do STA de 10/07/1997 - Proc. n.º 42.448, de 23/07/1997 - Proc. n.º 42.546 e o Ac. do TCA Norte de 23/08/2005 - Proc. n.º 00554/05.8BEPRT, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

  5. Tal direito dos administrados engloba um número alargado de direitos “instrumentais”, nomeadamente a consulta do processo, a transcrição de documentos e a passagem de certidões, estando intimamente ligado com o direito de participação em procedimentos/processos e, ainda, serem informados pela Administração sempre que o requeiram sobre o andamento de processos em que sejam directamente interessados, bem como o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas (cf. n.º 1 - direito à informação procedimental) e, bem assim, o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, sem prejuízo do disposto na lei em matérias referentes à segurança interna e externa, à intimidade das pessoas e à investigação criminal (cf. n.º 2 - direito à informação não procedimental).

  6. Como corolário do disposto na CRP, o CPTA, sob o Título IV, referente aos Processos Urgentes, Capítulo II, Das Intimações, Consulta de Processos ou Passagem de Certidões, vem, nos artigos 104º a 108º, dar cabal materialização dos mencionados preceitos constitucionais e, também, o próprio CPA, na redacção do DL n.º 442/91 de 15 de Novembro, com as subsequentes alterações, designadamente no capítulo referente ao direito à informação, consagra também tal preocupação constitucional nos seus artigos 82º a 84º, sem esquecer que os arts. 3º e 5º da Lei n.º 46/07 de 24 de Agosto também foram beber à preocupação do legislador constituinte. Ora, i) Conforme sapientemente nos ensina Mário Aroso de Almeida, in “O Novo Regime de Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 235, a intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões é um meio principal porque “… o campo de intervenção deste processo compreende a tutela do direito à informação procedimental, fundado nos arts. 61º a 64º do CPA e do direito à informação extra-procedimental, consagrado no art. 268º, n.º 2 da CRP e na Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto”. Ora, j) Foi com base neste meio processual, previsto no CPTA, que o ora recorrente formulou a sua pretensão jurídica.

  7. Nesse sentido não podemos minimamente concordar com o exposto na decisão recorrida, máxime quando esta vem alicerçar-se, exclusivamente, na redacção do art. 120º, n.º 1 do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) ou seja que “O processo é de natureza secreta até ao despacho de acusação”.

  8. A decisão do Tribunal a quo erra ao não perfilhar da base legal invocada pelo ora recorrente, designadamente dos preceitos anteriormente enunciados, da CRP e a sua respectiva afloração e concretização em sede do CPA e da Lei 46/07 de 24 de Agosto, os quais são de aplicação imediata e necessariamente prevalecem sobre o disposto no EOA, nomeadamente sobre o disposto no seu art. 120º, n.º 1, sob pena de inconstitucionalidade, pelo que alicerçando-se no vertido no art. 120º, no 1 do EOA violou o Tribunal a quo o disposto nos referidos preceitos legais e, consequentemente, padece de notório erro de julgamento de direito.

  9. Efectivamente, o direito à consulta do ora recorrente enquadra-se no domínio da CRP, à qual o demais ordenamento jurídico português, mormente o EOA e o seu art. 120º, n.º 1, deve estrita obediência, pelo que terá assim de cair por terra, por erro de julgamento, o argumento da decisão recorrida de que “… o direito à informação procedimental, o acesso por consulta de um processo, cede ao direito à reserva, ao segredo, para instrução de um processo disciplinar de forma reservada, sem interferências, designadamente por parte do participante da infracção disciplinar.

  10. Não descurando o princípio da independência entre a responsabilidade disciplinar, criminal e civil a que alude o art. 111º do EOA, será sempre de concluir que a responsabilidade disciplinar necessariamente tem um menor grau de censurabilidade.

  11. Nesta lógica afigurasse-nos contraditório e anacrónico, por desfasamento jurídico quanto à evolução legislativa patente no Código de Processo Penal, que o processo disciplinar in foco possa ter carácter secreto até à prolação do despacho de acusação, enquanto a regra geral no processo penal, nos termos do art. 86º, n.º 1 do CPP, é que este é, sob pena de nulidade, público.

  12. Impendia sobre o Tribunal a quo, nos termos do artigo 9º, n.º 1 do CC, ex vi art. 1º do CPTA, na interpretação do disposto no artigo 120º, n.º 1 o EOA, não cingir-se à letra da lei mas, antes, reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico e as condições específicas do...

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