Acórdão nº 04839/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução17 de Setembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

O Município de Sintra, com os sinais nos autos, inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra dela vem recorrer, concluído como segue: A Por sentença proferida no dia 19 de Novembro de 2008 foi julgado procedente o pedido de condenação do Réu a efectuar o encerramento do depósito de sucata identificado em juízo e transferir a sucata para local adequado, repondo o terreno na situação em que se encontra anteriormente à ilegalidade detectada, fixando o prazo de 60 (sessenta) dias para o efeito, tendo igualmente julgado improcedentes as excepções de ilegitimidade activa e passiva.

B Verifica-se insuficiência da matéria de facto para habilitar o Tribunal a concluir como improcedente a arguida excepção de ilegitimidade activa.

C Apesar de o Ministério Publico alegar que litiga ao abrigo do art.° 9° 2. do CPTA e ao abrigo do art.° 51.° do ETAF, na sua petição, não sustenta factualmente, concretizando no espaço e no tempo, a lesão ambiental a que alude.

D O Ministério Público alega de forma insuficiente e imperfeita, de modo muito genérico, não concretiza a causa de pedir e por isso deveria ter o Tribunal concluído que a sua intervenção ao abrigo dos direitos elencados naquelas disposições legais, não se encontra legitimada e portanto, deveria ater considerado procedente a arguida ilegitimidade activa, com as legais consequências.

E Ao condenar o R. a proceder ao encerramento do depósito de sucata, a transferir essa sucata para local adequado, repondo o terreno na situação em que se encontrava anteriormente e fixando-lhe 60 dias para executar todas essas operações materiais, o Tribunal está a entra num espaço que lhe está vedado, porque exclusivo da autoridade administrativa.

F Existem várias soluções para o problema em apreço nos presentes autos (o que a sentença reconhece) não só a criação de um parque de sucatas, como a celebração de protocolos com terceiros, ou outras vias.

G O R. já manifestou o propósito de criar um parque que reúna as condições de resposta às necessidades de todos os sucateiros do concelho, com a dimensão que se impõe, existindo até um projecto municipal sobre licenciamento, instalação e ampliação dos depósitos de sucata, mas que cumpre alterar em virtude das alterações legislativas ocorridas nesta matéria.

H A entrada em vigor do PDM tornou impossível instalar aquele tipo de actividades em locais não previstos para o efeito e actualmente não existe local adequado para onde transportar os materiais a remover da sucata.

I Cumpre adequar a localização do futuro parque de sucatas àquele plano de ordenamento do território e aos outros municipais e intermunicipais, planos aos quais o Município de Sintra se encontra vinculado, pois que tudo o que for feito em desacordo com aquele, encontra-se ferido de nulidade.

J O terreno aqui em causa encontra-se inserido em AUGI (área urbana de génese ilegal) e nessa medida exige requalificação e reconversão urbanística, processo muito demorado, sendo que, na execução coerciva da remoção do parque de sucata tem de se atender aos princípios, designadamente de economia, interesse publico, protecção do ambiente, igualdade e proporcionalidade, justiça, imparcialidade e boa fé.

K O Município de Sintra não esteve parado face à situação de ilegalidade, respondeu às reclamações dos particulares, levantou vários autos de contra-ordenação aos infractores, e iniciou o procedimento coercivo de encerramento do parque.

L A criação de um parque de sucatas implica a verificação de factores de ordem vária, bem como o momento para essa criação, e nessa medida encontramo-nos no exercício de poderes discricionários do Município, onde, não é de todo possível ao Tribunal entrar, sob pena de violação do princípio da separação de poderes.

M E não bastará proceder à remoção da sucata para o local adequado, cumprirá ainda proceder à requalificação do terreno de onde se retira aquele material, o que se prende igualmente com critérios de conveniência e oportunidade, não sindicáveis pelo Tribunal, o que se aplica também quanto à eventualidade de optar por contratar com terceiros a resolução do problema.

N Quer o momento, quer a escolha da melhor solução com vista à resolução da remoção da sucata, ordenada pelo Tribunal, são decisões que envolvem discricionariedade técnica pelo que são insindicáveis pelo Tribunal.

O Os Tribunais julgam pelo cumprimento pela administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação, existindo uma área reservada ao juiz administrativo, uma fronteira entre jurisdicidade e conveniência, entre a integração da ordem jurídica e ponderações e juízos de valor em espaços da responsabilidade própria da administração.

P Tal como diz Mário Aroso de Almeida in "O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos" - pág 181-182. "... o Tribunal não se pode intrometer no espaço próprio que corresponde ao exercício de poderes discricionários por parte da Administração. Só assim se assegurando o respeito pelo principio da separação de poderes e interdependência de poderes, por força do qual aos Tribunais administrativos só cumpre dizer e aplicar o Direito, tal como ele resulta dos normas e princípios jurídicos que vinculam a Administração." Q E ainda Sofia David in "Das Intimações" que "... ao exercer o poder condenatório, o juiz não pode tocar no espaço de valoração próprio da actividade administrativa, sob pena de violação do principio de separação de poderes. Os Tribunais administrativos devem exercer a função jurisdicional na sua plenitude, sem reservas de jurisdição, mas também sem exceder os seus próprios limites. As pronúncias condenatórias só podem ter lugar desde que não se invada o campo da discricionariedade administrativa, entendida como poder-dever jurídico, concedido pelo legislador à Administração, a fim de que esta, dentro dos limites legalmente estabelecidos escolha, de entre as várias soluções possíveis, aquela que lhe parecer a melhor ou a mais adequada ao interesse publico. Os elementos ou as competências discricionárias encerram um juízo de mérito, essencialmente técnico, derivados dos especiais conhecimentos que só pode ser formulado pela própria administração, porquanto não está prescrito na lei. Tal juízo de mérito, não pode portanto, ser apreciado pelo Tribunal, pois extravasa o seu foro jurídico." (...) Mas dessa concretização não podem resultar quaisquer juízos valorativos, sob pena de o juiz invadir o campo da discricionariedade administrativa e, assim, violar o princípio da separação e interdependência de poderes".

R Ainda a este propósito escreve Sérvulo Correia in "Direito do Contencioso Administrativo", a pág. 776 o seguinte "... no tocante à condenação à prática de acto administrativo... quando a emissão do acto pretendido envolve a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa e a apreciação do caso concreto não permita identificar apenas uma solução como legalmente possível, não pode o Tribunal determinar o conteúdo do acto a praticar..." acrescentando muito a propósito que "... os critérios de valoração ou decisão de natureza extra-jurídica autodeterminados pelo órgão administrativo no âmbito de uma margem de liberdadeque lhe é deixada pela lei, constituem uma área que ao juiz não são permitidas injunções sobre o se ou o como do agir ou decisões substitutivas. Assim é, porquanto se trata de uma área de actuação que exige legitimidade democrática-eleitoral directa ou indirecta (e não mera legitimidade institucional) e origina responsabilidade política." (pág.777 ob cite supra).

S Ou seja, no caso vertido nos autos há insindicabilidade do mérito bem como da iniciativa, esta compreendida naquele, como livre escolha mínima na definição do momento do exercício da competência, estando assim interditas as medidas que se fundem em critérios de apreciação da oportunidade e da conveniência da iniciativa, ainda que motivado exclusivamente por razões de legalidade.

T O Tribunal ao fixar a actuação e o momento da actuação da autoridade administrativa, fixando-lhe um prazo para tal, está claramente a invadir o espaço de discricionariedade administrativa, verificando-se usurpação jurisdicional, sendo certo que a acção administrativa também se encontra dependente de opções de cariz marcadamente político, de discricionariedade quanto aos fins, e que tem implicações directas na escolha da actuação e, especialmente do momento entendido...

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