Acórdão nº 22/17.2BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelHELENA CANELAS
Data da Resolução23 de Novembro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO P……………..Clientes – Associação de Defesa dos Clientes do Banco (devidamente identificada nos autos), requerente no Processo Cautelar que instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa em que são requeridos o (1) Ministério das Finanças, o (2) Estado Português e, como contra-interessado o (3) Banco ……………….., S.A., em liquidação – no qual requereu, na pendência da ação principal Proc. nº 866/11.9BELSB, e com vista a acautelar o efeito útil daquele processo, a intimação da Comissão Liquidatária do Banco …………….. a abster-se de fazer qualquer pagamento ao Estado Português enquanto estiver pendente a ação principal de que a presente providência cautelar é instrumental – inconformada com a sentença de 15/06/2017 do Tribunal a quo pela qual foi julgado improcedente aquele pedido, dela interpõe o presente recurso, pugnando pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que decrete a providência cautelar requerida, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos: a) É inequívoca a relação de instrumentalidade entre o processo cautelar e a ação principal já instaurada.

b) É patente a verificação do requisito da existência de periculum in mora.

c) Estão, por conseguinte, verificados os requisitos de que depende o decretamento da providência requerida.

d) A sentença recorrida viola, pelo menos, os arts. 112.º/1, 113.º/1 e 120.ª/1 do CPTA.

Contra-alegaram o BANCO …………………., SA – EM LIQUIDAÇÃO (a fls. 2129 ss.

), o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS (a fls. 2140 ss.

), e o ESTADO PORTUGUÊS (a fls. 2161 ss.

).

O recorrido BANCO ………………, SA – EM LIQUIDAÇÃO pugna, nas suas contra-alegações, pela improcedência do recurso, com manutenção da sentença e recorrida, requerendo ainda a ampliação do objeto do recurso, formulando a final o seguinte quadro conclusivo: A. Vem o presente recurso interposto da douta Sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa ("Tribunal a quo") de 15 de Junho de 2017, que julgou totalmente improcedente a providência cautelar requerida pela Recorrente, com o fundamento de que a mesma não se revela necessária para assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo n.º 866/11.9BELSB.

B. Sustenta o Recorrente que a Sentença incorreu em erro na aplicação do direito, contudo, e conforme infra melhor se demonstrará, não assiste qualquer razão à Recorrente no que concerne aos vícios que pretende assacar à Sentença a quo, na medida em que não só esta não padece das deficiências que lhe pretende imputar como, por outro lado, a Recorrente limita-se a proferir um acervo de afirmações gerais e abstractas sobre a bondade daquela, que não podem merecer o acolhimento deste Venerando Tribunal ad quem.

C. Entende a Recorrente que o "importante efeito útil" decorrente da procedência da acção principal, se perderia caso, no processo de liquidação do B…….., a Comissão Liquidatária, uma fez feita a liquidação dos bens do insolvente, realizasse as operações de pagamento aos credores e, sobretudo, se pagasse ao Estado no pressuposto da validade da garantia, pois, criaria uma situação de facto consumado, traduzida na impossibilidade, pelos demais credores, de acederem à liquidez entretanto entregue ao Estado.

D. No entanto, a premissa de que Recorrente parte e da qual não fez qualquer prova, mesmo que indiciária, está errada, pois, não é correcto o pressuposto de que o Estado Português não terá, num futuro próximo, condições de devolver o montante recebido, caso (o que apenas em tese se admite) tal viesse a ser necessário por força de uma decisão judicial, transitada em julgado, que considerasse procedente a acção principal.

E. Caso fosse declarada a nulidade do acto de autorização de concessão de garantia, a consequência seria, logicamente, a nulidade de todos os actos consequentes, havendo sempre lugar à restituição pelo Estado Português do montante cujo pagamento a Recorrente pretende evitar, sendo certo que é do Estado Português que se trata e não uma qualquer sociedade comercial, pelo que o risco de Incumprimento não se coloca nos termos explanados pela Recorrente.

F. Assim, a realização de pagamentos pela Comissão Liquidatária, no âmbito do processo de liquidação do B..., não constitui um prejuízo de difícil reparação nem pode determinar a "constituição de facto consumado", de consequências irreparáveis, tanto mais que a situação seria sempre reversível, se fosse caso disso, como se deixou demonstrado G. Ademais, não tendo a Recorrente Invocado um único argumento que justifique uma situação de facto consumado, é forçoso concluir que não cumpriu com o ónus que sobre si impende de alegar e provar, ainda que indiciariamente, os factos que alega.

Por outro lado, H. A Recorrente alega que "(...) os direitos dos credores do B... aos valores adicionais que resultarem da extinção do crédito do Estado (...) só podem ser satisfeitos no processo de liquidação do B...

(...)". (Ponto 26 das Alegações) I. Todavia, e como referiu o Tribunal a quo, esses direitos poderão ser exercidos no quadro do processo de execução de sentença favorável, pois, e ao contrário do que pressupõe a Recorrente, integrariam sempre os efeitos repristinatórios e reconstitutivos da anulação da garantia concedida pelo Estado, nos termos do artigo 173.º do CPTA.

J. Do exposto decorre que não existe periculum in mora e, por isso, inexiste motivo para decretar a providência requerida, pelo que deve o presente Recurso ser julgado improcedente, o que se requer.

K. Na acção principal de que a providência cautelar em apreço depende, vem a Recorrente peticionar que se declare a nulidade do acto de autorização de concessão da garantia pessoal aos bancos aí contra-interessados, da autoria do Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, corporizado no Despacho n.º 31268-A/2008, de 1 de Dezembro; e de alguns actos dele consequentes, designadamente os actos de prestação e de preservação da referida garantia e do contrato de penhor celebrado entre o Estado Português e o B....

L. No presente processo cautelar vem a Recorrente peticionar que, sem prévia audição dos requeridos e do contra-interessado, seja a Comissão Liquidatária do B... intimada a abster-se de realizar quaisquer pagamentos ao Estado Português enquanto estiver pendente a acção principal de que este depende.

M. Sucede, porém, que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa não tem jurisdição para dirimir o objecto da presente providência cautelar, porquanto este, contrariamente ao propugnado na Sentença a quo, não surge compreendido no âmbito constitucional e legal da jurisdição administrativa.

N. Com efeito, a jurisdição administrativa intervém na apreciação dos litígios com origem na administração pública lato sensu e que envolvam a aplicação de normas de direito administrativo ou a prática de actos a coberto do direito admlnistrativo.

O. No presente processo cautelar não estamos perante um litígio emergente de uma relação jurídica administrativa, uma vez que o efeito cautelar visado pela Recorrente exorbita o âmbito material da respectiva jurisdição.

P. Contrariamente ao sustentado pelo Tribunal a quo, nenhum dos elementos subjectivos ou objectivos do litígio configurado em sede cautelar assume carácter jurídico-administrativo nem está relacionado com o exercício da função administrativa.

Q. Uma vez que tanto a Recorrente P................. Clientes como o B... são pessoas colectivas de direito P................., regidas por normas jurídicas de direito P................., tendo cada uma delas como objecto social um conjunto de actividades características daquela índole.

R. A isto cresce que caso a providência cautelar sub judice fosse julgada procedente, no que não se concede, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa estaria a proferir uma decisão que iria necessariamente bulir e comprometer, de forma irremediável, o exercício do poder jurisdicional por parte do Juízo de Comércio do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa - J2 no âmbito do Processo n.º 519/10.STYLSB, onde corre termos o processo de liquidação do B..., o que consubstanciaria uma violação do princípio da independência dos tribunais (artigo 203.º CRP) e da separação de jurisdições (artigo 209.° CRP).

S. Caso se admitisse a possibilidade de decretamento da referida intimação, tal seria frontalmente inconstitucional por violação dos referidos preceitos constitucionais, inconstitucionalidade esta que se invoca desde já para os devidos efeitos legais.

T. Termos em que deve, consequentemente, esta matéria ser decidida no âmbito do processo de insolvência do B..., porquanto todas as matérias e questões atinentes a pagamentos no âmbito de processos desta índole devem ser solucionadas apenas e tão-somente no próprio processo de insolvência.

U. Pelo exposto, é manifesto que a providência cautelar em análise não se subsume ao âmbito material da jurisdição administrativa, pelo que, nos termos das disposições conjugadas nos artigos 212.º, n.º 3, da CRP, 13.º, 37.º, n.º 3, do CPTA, e 91º do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas ("CRE"), deve a presente instância ser declarada extinta por falta de jurisdição do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, o que se requer.

O recorrido MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, nas suas contra-alegações, começa por invocar, a título de questão prévia, a deficiência das conclusões do recurso, aludindo ao artigo 639º CPC. Quanto ao seu mérito pugna pela improcedência do recurso, com manutenção da sentença recorrida, e subsidiariamente pela manutenção da decisão de indeferimento da providência cautelar requerida por falta de verificação dos requisitos enunciados no artigo 120º nºs 1 e 2 do CPTA (periculum in mora, fumus boni iuris e desproporcionalidade da providência face aos demais interesses) E requer ainda a ampliação do objeto do recurso à questão da ilegitimidade passiva, que suscita, por não ter sido demandada como requerida no processo...

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