Acórdão nº 09984/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução23 de Novembro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório O MUNICÍPIO DE SETÚBAL, R.

neste processo e a P............... CONSTRUÇÕES,LDA., que neles assume a qualidade de Contra-interessada, não se conformando com o acórdão neles proferido, interpõem recurso jurisdicional para este Tribunal Central Administrativo Sul.

As alegações de recurso que apresentaram culminam com as seguintes conclusões: As do Município de Setúbal: “a) O que está em causa, nos presentes autos, é a imposição à construção licenciada pelo ato impugnado da exigência do afastamento de 3 metros, prevista na alínea b), do nº 2 do artº 69° do Regulamento do P.D.M. de Setúbal. b) Tal disposição regulamentar ressalva, expressamente, a sua aplicação "às situações existentes", pelo que haverá, para aplicação do direito, de determinar se o caso dos autos se integra ou não nas referidas "situações existentes", que a disposição regulamentar salvaguarda da sua aplicação. c) Atendendo a que o intérprete tem de presumir que o legislador não cria comandos ou injunções ou prevê soluções absolutamente desnecessárias e redundantes, ter-se-á de entender que a referência à ressalva das "situações existentes", expressa na disposição legal, abrange algo diferente e mais amplo do que as situações que já se encontrassem definidas ou edificadas antes da entrada em vigor do P.D.M., que, no entendimento - que, respeitosamente, se julga incorreto - do Digníssimo Magistrado A., acolhido no douto acórdão recorrido, seriam, com exclusividade, aquelas que estariam cobertas por aquela ressalva, pois estas situações já estavam ressalvadas por força do princípio geral da não retroatividade da lei, do princípio do "tempus regist actum" e do princípio da "garantia do edificado". d) A imposição, por um regulamento urbanístico, de afastamentos mínimos de uma construção em relação a um lote vizinho, tem a natureza da imposição de um ónus num lote a favor do outro, sendo, no entanto, tal ónus e benefício recíprocos, já que igual imposição impende sobre o lote vizinho. e) Tendo necessariamente de entender-se que a existência de tal reciprocidade está sempre presente e é pressuposto da imposição, numa dada urbanização, de afastamentos mínimos das construções ao lote ou lotes confinantes. f) No presente caso, no lote vizinho ao lote onde foi licenciada a construção pela decisão administrativa impugnada, encontra-se já construída uma moradia que não cumpre os afastamentos previstos no nº 2 do artº 69° do Regulamento do P.D.M., eventualmente licenciada antes da sua entrada em vigor. g) Desse modo, na situação em causa nos autos, é já impossível garantir a reciprocidade que é pressuposto necessário da imposição de afastamentos do tipo dos fixados na norma regulamentar aqui em causa. h) Assim, estando já constituída uma situação em que não é possível garantir a referida reciprocidade, ter-se-á de considerar tal situação consolidada como uma "situação existente", abrangida pela ressalva da sua aplicação, expressa na disposição regulamentar aqui em causa. i) Por outro lado, a definição de afastamentos mínimos - tal como de alinhamentos das fachadas e de perímetros de implantação - tem sempre como finalidade a obtenção de uma coerência arquitetónica e equilíbrio urbanístico, indispensável à qualidade e harmonia das urbanizações. j) No presente caso, tratando-se de um alvará de loteamento de 1979, grande parte, se não mesmo a maioria, das construções, já estavam efetuadas à data da entrada em vigor do P.D.M. (15 anos depois) e, obviamente, nenhum afastamento, idêntico àquele que está definido na disposição regulamentar em causa, lhes foi exigido. k) Assim, a situação existente não possibilita já a prossecução da referida "ratio" de garantir a coerência arquitetónica e equilíbrio urbanístico, que está na base da imposição de afastamentos mínimos uniformes. l) Pelo que se terá de considerar que a consolidação do loteamento em data anterior à entrada em vigor do P.D.M., integra já uma "situação existente" em que, de acordo com a "ratio" da lei, já não se justifica ou exige a imposição do afastamento previsto naquela disposição legal, pelo que se deverá considerar uma situação desse tipo abrangida pela ressalva que a lei expressa. m) Por outro lado, no âmbito de um loteamento, na definição das áreas dos lotes, ter-se-á, forçosamente, de ter em conta não só a área de construção prevista/visada, mas também, necessariamente, os afastamentos às extremas e/ou polígono de implantação previstos/visados. n) Os lotes em causa nos presentes autos foram constituídos, com determinadas áreas e para determinadas áreas de construção, sem quaisquer limitações resultantes da imposição de afastamentos aos lotes vizinhos. o) Pelo que a imposição de limites mínimos de afastamento, mantendo os lotes, obviamente, as áreas anteriormente previstas, frustraria, necessariamente, as expetativas e possibilidades de construção que para eles estavam definidas. p) Devendo, assim, considerar-se a existência anterior de um loteamento, sem que estivessem fixados quaisquer afastamentos mínimos das construções aos lotes vizinhos, como uma "situação existente" que justifica a aplicação da salvaguarda prevista na disposição Regulamentar em causa. q) Interpretação que, assim, é também imposta, por elementares exigências de certeza do direito. r) Desse modo, a situação em causa nos autos dever-se-á considerar abrangida pela ressalva das "situações existentes", não lhe sendo, consequentemente, aplicável a exigência de afastamento da construção ao lote vizinho, fixada na referida alínea b) do nº 2 do artº 69° do Regulamento do P.D.M.. s) Em consequência, a decisão impugnada, que aprovou a construção em causa, é plenamente legal, não merecendo qualquer censura, respeitando, nomeadamente, a alínea b) do nº 2 do artº 69° do P.D.M., não padecendo, assim, da nulidade que lhe é assacada pelo A.. t) A assim não decidir o douto acórdão recorrido, fez uma errada interpretação de tal disposição do P.D.M. e, em consequência, uma errada aplicação do disposto no artº 68°, alínea a) do R.J.U.E., devendo, por tal, ser revogado. Termos em que, Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, declarando-se a plena legalidade da decisão impugnada e absolvendo-se o R. do pedido, como é de JUSTIÇA”. Já a Contra-Interessada P............... CONSTRUÇÕES, LDA.

conclui assim: “a) Tendo sido emitido alvará de loteamento em 1979 a sua aprovação estava sujeito à legislação em vigor à data, atento o princípio tempus regit actum. b) As prescrições a que aludem as alíneas c), d) e f) do Dec-Lei 3780/99, de 22 de Setembro, só posteriormente foram introduzidas nos alvarás de loteamento, definindo os afastamentos das estremas dos prédios através de polígonos de implantação. c) O alvará do loteamento manteve-se e não foi sujeito a qualquer alteração, pelo que o mesmo não consagra quaisquer condições de afastamento de prédios confinantes por nele não se indicar polígonos de implantação ou fazer-se referência a condições que condicionem ou venham a impedir que os edifícios fiquem geminados. d) O Regulamento do PDM vem apontar para um critério de gestão urbanística das áreas urbanas consolidadas: nas malhas urbanas habitacionais devem manter-se as características morfológicas do tecido urbano existente. e) Em todas as informações técnicas constantes no processo de licenciamento consta que o arruamento em causa é caracterizado por moradias com um piso e aproveitamento de cobertura, algumas com 2 pisos, contemplando da sua maioria "encostos" aos limites laterais ao nível do piso térreo (geminadas). f) Sendo essa a caracterização estamos no âmbito da exceção prevista na alínea b) do nº2 do Artº 69º do regulamento: "(...) salvo nas situações existentes (...)". g) Tanto mais que as empenas laterais dos edifícios em causa são empenas cegas, ao nível do piso térreo e ao nível do segundo piso do prédio dos contra-interessados existe um afastamento de 3 metros sendo essa área garantida como de não visitação. h) Também aqui está garantido o disposto no Artº 1360º do Cód. Civil e garante-se a salvaguarda de direitos de segurança e privacidade dos reclamantes. Em nossa opinião mal interpretou o Tribunal recorrido a norma contida no Artº 69 nº 2 alínea b) do Reg. do PDM de Setúbal, sendo os atos praticados pelo Senhor Vereador da área do Urbanismo da Câmara Municipal de Setúbal, datados de 3/12/2009; 14/6/2010 e 24/1/2010 relativos ao processo administrativo nº 152/09, de licenciamento da construção de uma moradia bifamiliar no lote 130, Pinhal de Negreiros, Freguesia de S. Lourenço, Concelho de Setúbal, válidos. Decidindo, assim, deverão V. Exas revogar a decisão recorrida, substituindo por outra que reconheça a validade dos atos. Assim Fazendo Inteira e Sã Justiça.” Contra-alegou o Ministério Público, concluindo como segue: “1 - Atenta a matéria de facto dada como assente no acórdão recorrido - que o Réu, ora recorrente, não impugna - o mesmo fez correcta aplicação do direito ao caso "sub-judice" e não é merecedor de qualquer reparo. 2 - O lote 130, no qual foi erigida a edificação que constitui o objecto da presente acção, foi constituído ao abrigo do alvará de loteamento nº 21/79, o qual, por ter sido emitido no domínio da legislação então em vigor, apenas definia a área do lote e o uso a que se destinava (e não quaisquer outras expectativas ou possibilidades de construção), não contendo a menção de outros parâmetros urbanísticos. 3 - Porém, à data da prolação das decisões administrativas impugnadas, já se encontrava em vigor o Plano Director Municipal de Setúbal ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 65/94, designadamente - já vigorava a al. b) do n.º 2 do artigo 69.º - razão pela qual, todas as operações urbanísticas licenciadas desde a data dessa entrada em vigor devem obedecer-lhe, segundo o princípio «tempus regit actum). 4 - De acordo com esta...

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