Acórdão nº 846/09.4BELLE-A de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Novembro de 2017
Magistrado Responsável | PAULO PEREIRA GOUVEIA |
Data da Resolução | 09 de Novembro de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: I. RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Loulé processo de execução de sentença de anulação de ato administrativo contra MUNICÍPIO DE ALBUFEIRA, Sendo contra-interessados: - DORA ……………………………., CARLOS ………………………… e OUTROS, - BANCO ..........................................., S.A.
Por SENTENÇA de 19-01-2016, o referido tribunal veio a prolatar decisão, onde decidiu simplesmente “defiro o pedido”.
O PEDIDO DE EXECUÇÃO fora: - Cassação do alvará de utilização n° ……………..; - Demolição de todo o edificado ao abrigo do processo de licenciamento de construção n° ……………..; - Reposição do solo na situação anterior à realização das obras cujo licenciamento foi declarado nulo pela decisão proferida na ação administrativa especial 846/09.4BELLE (que declarou a nulidade da licença de construção e da autorização de utilização conferidas à Dora …….., por violação do artigo 18º nº 3.1 do RPDM de Albufeira e do artigo 26º/2 do PROT do Algarve); - Atendendo ao lapso de tempo já decorrido, consideramos ser suficiente, para execução das referidas ações, a fixação de um prazo não superior a 3 meses, o que se REQUER, nos termos do art.° 176°, n° 4 do Código de Procedimento nos Tribunais Administrativos; - Caso o Município não dê execução às referidas ações no prazo supra sugerido, REQUER-SE, desde já, a imposição de uma sanção pecuniária compulsória, nos termos previstos no artigo 169. °, ex vi artigo 176. °, n.º 4, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, por cada dia de incumprimento, após o prazo de 3 meses, acima referido, considerado razoável para executar.
E em 04-04-2016, a Sra. Juiza do TAC de Loulé emitiu o seguinte DESPACHO: “Antes de mais, nos termos do requerido a fls 225, pelo Exequente, que se defere, notifique, individualmente, por ofício registado com A/R, o Senhor Presidente da Câmara Municipal de Albufeira, Carlos …………. e os Senhores Vereadores, José ………….., Marlene ………, Ana ………… Rogério …………, Fernando ……….. e Célia …………, da sentença proferida em 19 de Janeiro de 2016 e da aplicação da sanção pecuniária compulsória que sobre eles impende, ao abrigo do disposto no artº 169º em conjugação com o nº 4 do artº 176º do CPTA, no montante diário de 5% do salário mínimo nacional”.
* RECURSO dos contrainteressados contra o despacho de 04-04-2016 Inconformados, os CONTRAINTERESSADOS DORA ……………. e OUTROS interpuseram o presente recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: 1) A decisão recorrida, que determina a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória, que liquida no valor diário de 5% do r.m.m.g, ancora-se na sentença proferida no presente apenso de execução, que determinou que o Município procedesse à demolição da moradia dos Contra-interessados no prazo de sessenta dias.
2) Para além dos vícios próprios que a informam, tal decisão padece de outros que afligem a sua base racional ou causa lógica, da qual é consequente, e, como tal, a maculam também.
3) Antes de mais, para que se consolide o dever de cumprir a sentença executiva, necessário se torna que o respetivo título tenha transitado em julgado; todavia, 4) Dos autos não decorre que o Contra-Interessado Carlos …………, cônjuge da também Contra-interessada Dora …………o, apesar de ter sido identificado logo na petição inicial como detentor dessa posição processual, tenha chegado a ser notificado do acórdão final proferido na ação administrativa especial de que a presente execução é tributária, adjetiva e ontologicamente.
5) Por outro lado, a sentença proferida na execução elege a demolição da moradia dos Contra-interessados como única solução de direito, para reposição da legalidade após a decisão prolatada na ação declarativa, quando assim não é, nem, ousamos dizê-lo, deverá ser; com efeito, 6) O título executivo – a sentença tirada no processo principal – apenas declarou a nulidade dos atos administrativos que licenciaram a construção e autorizaram a utilização daquela edificação, 7) Não podendo extrair-se dela a necessidade de demolir a moradia, ou sequer a inexistência de alternativa jurídica a essa demolição; 8) A jurisprudência e a doutrina vêm assinalando o especial cuidado no uso dessa sanção drástica e irreversível, que só deverá ter lugar quando nenhuma outra for viável para regularizar a situação de facto e de direito; 9) Impõem-se ao Julgador, neste quadro, critérios de proporcionalidade, e de necessidade estrita, de tal sorte que se pondere criticamente a possibilidade de se sanear a causa da ilegalidade dos atos administrativos que permitiram a construção, na perspetiva de vir a dar juridicidade à situação de facto decorrente daqueles atos, e de reintegrar a ordem jurídica que a sentença considerou violada.
10) Diversos Arestos do Supremo Tribunal Administrativo esclarecem que se deverá atender, neste conspecto, à causa concreta que motivou a declaração de nulidade do licenciamento, balizando a partir dela os limites e o conteúdo dos atos a empreender para restabelecer a legalidade; 11) No caso concreto em análise, o julgamento de nulidade – que nunca chegou a ser objeto de revisão de mérito, por razões puramente processuais – assentou na declaração de que os atos sindicados violavam o PDM, ao autorizarem a construção da moradia unifamiliar em zona agrícola, apesar de o procedimento administrativo cumprir os requisitos exigidos quer por aquele plano municipal, quer pelo regime jurídico da Reserva Agrícola (com parecer favorável prévio e expresso da tutela desta), e, mesmo, do PROT; 12) O apenso de execução recebeu, a instância do próprio Tribunal a quo, informação de que o processo de revisão do PDM de Albufeira se encontra em curso, e que, no âmbito das suas competências legais de planificação e ordenamento do território, o Município pretende dar solução a casos de edificação dispersa que cumpram os parâmetros legais de enquadramento sem desvirtuar as potencialidades do solo.
13) Não obstante, desconsiderando que a revisão do Plano não se atinge de um dia para o outro, e que, no recorte normativo que informa o respetivo procedimento, exige a formulação de estudos, propostas, consultas e pareceres de uma multiplicidade de entidades, a sentença proferida na execução limita-se a atestar que o PDM não foi revisto, logo, a moradia tem que ser demolida; 14) Antes de se apurar se a legalização daquela casa é, de todo, impossível, aquele postulado poderá significar, claramente, que se destrua o edificado e, num hiato de curto ou médio prazo, se venha a constatar que a sua manutenção se teria tornado conforme com o ordenamento jurídico.
15) Essa irreversibilidade de facto nada teria de mais não fosse dar-se o caso de estarmos a falar de uma casa de morada de família, construída com recurso a consideráveis sacrifícios materiais (e investida de legítimas e relevantes expectativas com tutela do Direito por parte dos seus proprietários), vistos na perspetiva do cidadão médio, e não de uma qualquer construção dedicada a mera função de especulação económica; 16) Para mais quando a própria sentença proferida na ação, que condiciona a pretensão executiva, ressalvou claramente, e com fundamentação expressa, os efeitos putativos dos atos que julgou inválidos, salvaguardando das consequências da declaração de nulidade as expectativas jurídicas de terceiros especialmente prejudicados com esta: no caso, os Contra-interessados proprietários e credor hipotecário com direitos inscritos no registo predial em momento muito anterior à declaração de nulidade.
17) Ao afirmar que a obra foi construída sem licença ou autorização administrativa, que não pode ser legalizada, e que a reposição da legalidade passa pela sua demolição, a sentença proferida na execução – que estriba a decisão ora recorrida – contém três patentes erros nos seus pressupostos; desde logo, porque, 18) Ao contrário do que ali se diz, a moradia não foi edificada sem licença ou autorização administrativa: bem pela inversa, os Contra-interessados louvaram-se, para o efeito, no deferimento expresso, e titulado, de licença de construção, e, a jusante, na autorização de utilização do edificado (tudo isto, assinale-se, anos antes do início da instância declarativa, sem qualquer indício ou afloramento de ilegalidade no procedimento administrativo); 19) Em segundo lugar, nada na sentença em referência permite concluir que a obra seja insuscetível de legalização, o que por si só já seria causa bastante de ilegalidade do julgado, por falta da fundamentação devida, e, 20) Como já aflorado, nem o ordenamento jurídico vigente nem a realidade dos factos, no aprumo do processo de revisão do PDM que ao Tribunal a quo foi oportunamente sinalizado, permitem extrair tal conclusão de inviabilidade de legalizar aquela construção, nas particulares condições em que a mesma se encontra edificada. Finalmente, 21) Neste específico âmbito e segmento da sentença executória, e como já aflorado, nada legitima a asserção, sufragada naquela decisão, de que a demolição é a solução devida a dar ao caso, quando o contrário emerge dos ensinamentos da jurisprudência, da doutrina, e dos contornos concretos em que o presente caso orbita.
22) O que fica exposto denuncia, salvo o respeito devido, que a decisão recorrida não só assenta em erros manifestos nos seus pressupostos, mas se mostra incursa também em violação de lei, designadamente, do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 615.º do C.P.C., no art. 102º-A do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, nos arts. 4.º, 6.º a 8.º e 10.º, todos do C.P.A., e no art. 173.º, nº 1 e 2, do C.P.T.A.
23) Ocorre, também, que o Tribunal a quo não procedeu à audiência prévia dos ora recorrentes, antes de lhes determinar a imposição de sanção pecuniária compulsória pelo pretenso incumprimento do julgado executivo proferido nos autos; 24) Esse direito dos ora recorrentes a serem ouvidos e a defender-se da...
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