Acórdão nº 11505/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelNUNO COUTINHO
Data da Resolução09 de Novembro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – Relatório Leonor ………………….. intentou contra o Estado Português acção administrativa comum peticionando a condenando do R. no pagamento da quantia de 185.281,76€, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, fundada em responsabilidade civil extracontratual por atraso na realização da justiça.

Por sentença proferida pelo T.A.C. de Lisboa a pretensão foi julgada improcedente.

Inconformado com o decidido, a A. recorreu para este TCA Sul, tendo formulado as seguintes conclusões: “1ª O que seja um prazo razoável não se obtém por uma definição em abstrato, a partir dos prazos fixados na lei, mas de uma análise do caso em concreto.

  1. A jurisprudência do STA (Ac. de 15/10/1998, recurso nº 036811) e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (decisão de 817/1987, caso Baraona v. Portugal) serve-se dos seguintes critérios: 1- a complexidade do processo; 2- o comportamento das partes; 3- a actuação das autoridades competentes no processo.

  2. Mais recentemente a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem acrescentou um outro critério: 4- a importância do objecto do litígio para o interessado.

  3. Quanto à complexidade da causa verifica-se que a mesma não teve qualquer incidência no âmbito do processo; 5ª Quanto ao comportamento do aparelho judiciário verifica-se que o mesmo funcionou de forma deficiente e ineficiente.

  4. A acção entrou em juízo em 1996 e até Maio de 2003, data do julgamento, que não se veio a realizar passaram mais de 6 anos, o que se entende ser por demais excessivo. Pois, 7ª Após a realização do julgamento, o processo passou a tramitar-se de forma célere. Porém, 8ª Até lá não houve qualquer celeridade e foram ultrapassados todos os prazos.

  5. Houve, com o devido respeito pela opinião em contrário falha ao nível de meios técnicos, materiais ou humanos ao serviço da justiça, o que nos leva a concluir que o Estado actuou com culpa no deficiente e ineficiente funcionamento judiciário.

  6. A delonga do processo causou danos patrimoniais e morais à A., pelo que, deveria o R. ter sido condenado a pagá-los à A..

  7. Pode, assim, concluir-se e face à interpretação que se faz do disposto no art. 6° nº 1 da CEDH e respectiva Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que à A. assiste o direito à indemnização peticionada, uma vez que a sua pretensão é enquadrável no disposto naquela norma e no art. 20º nº 4 da CRP, pelas mesmas razões.

  8. Por conseguinte ao não condenar o R. Estado Português não fez a Mma. Juiz "a quo" uma correcta aplicação dos factos ao direito, porquanto o Estado violou a sua obrigação de proferir uma decisão jurisdicional em prazo razoável, tal como estipula o art. 20º nº 4 da CRP, artigos 1°, 2°, 6° e 7º do D.L. nº 48051de21111/1967 e art. 6° nº 1 daCEDH.

  9. Termos em que deve de ser revogada a decisão sob recurso e substituída por outra na qual se condene o R. Estado Português.

O R. contra-alegou concluindo da seguinte forma: “1 - Na presente acção foi o R. - Estado Português absolvido dos pedidos formulados, quer a título de danos patrimoniais, quer a título de dano morais, por alegados danos causados pela violação do direito à decisão em prazo razoável.

2 - Foi correctamente tida em conta toda a vastíssima matéria constante nos factos assentes do despacho saneador, para desde logo se perceber o emaranhado de questões jurídicas levantadas, e a volumosa carga processual aí patente, a qual demonstra a inexistência de demora na administração da justiça.

3 - Para que haja responsabilidade civil por atraso no funcionamento da justiça torna-se necessário que os atrasos na prática de actos processuais, sendo injustificados, e venham a pesar no tempo de prolação da decisão final, com consequências para as partes.

4 - De acordo com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem são critérios para determinação do prazo razoável a natureza e complexidade do processo, o comportamento das partes e o comportamento dos órgãos do poderes judicial, executivo ou legislativo, critérios que, por sua vez, deverão ser aferidos, não em função da demora de um qualquer acto de sequência processual ou de prolação de decisão interlocutória, mas relativamente a todo o conjunto do processo.

5 - O R. - Estado Português não é susceptível de responsabilização pelas delongas do processo em resultado do eventual ilegítimo aproveitamento pelas partes das faculdades processuais, legalmente estabelecidas, em cumprimento do dever de garantir amplas garantias de defesa dos interesses daquelas, que sobre o primeiro impende.

6 - Concluindo-se pela ausência de nexo de causalidade, entre o excesso de tempo decorrido em dois momentos processuais distintos, e os prejuízos alegadamente sofridos pela A., é, obviamente, desnecessária a averiguação da existência dos restantes pressupostos e forçoso julgar improcedente o pedido.

7 - Não basta a simples ou mera violação dum prazo previsto na lei para a prática de certo acto judicial para concluir logo no sentido de que foi violado o direito à justiça em prazo razoável.

8 - Para aferir da ilicitude por violação do direito à justiça em prazo razoável, é necessário ter em conta as circunstâncias da causa e os critérios consagrados pela jurisprudência, em especial a complexidade do caso, o comportamento do requerente e o das autoridades competentes, bem como aquilo que está em causa no litígio para o interessado.

9 - A obrigação de indemnizar, por parte do Estado, relacionada com os atrasos injustificados na administração da justiça, só o poderá ser no respeitante aos danos que tenham com esse ilícito, consubstanciado na morosidade do processo, uma relação de causalidade adequada.

10 - E sendo assim, considerando que, como já se disse, os pressupostos de que depende a obrigação de indemnizar, conforme entendimento unânime da jurisprudência, são de verificação cumulativa, a não verificação do facto ilícito e culposo, desde logo afasta o direito à indemnização, ainda que exista o dano.

11 - Tendo sido feita uma correcta aplicação dos factos ao direito, não foi violado o nº 4 do artº 20° da Constituição da República Portuguesa.

12 - Igualmente não foram violados os artigos 1º, 2º, 6° e 7º do D.L. nº 48 051, de 21.11.1967.

13 -Bem como não foi violado o nº 1 do artigo 6° da CEDH.

14 - Pelo que deve manter-se a douta sentença em apreciação, negando-se provimento ao recurso dela interposto.

II) Na sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos:

  1. Em 29.05.1996 foi interposta por António …………….., Lda., acção especial de Restituição da Posse contra a ora A. e o seu marido [cf. fls. 2 dos autos do Proc. ………../1996 da 2.ª Secção da 8.1 Vara do Tribunal Civil de Lisboa].

  2. A acção foi distribuída em 30.05.1996 à 2.ª Secção da 8ª Vara do Tribunal Cível de Lisboa, tendo-lhe sido atribuído o nº ………/1996 [cf. fls. 2 dos autos do Proc. …..1996].

  3. Procedeu-se à sua autuação em 31.05.1996 [cf. fls. 1dos autos do Proc. …./1996].

  4. Foi aberta conclusão no dia 20.06.1996, e nesse dia proferido despacho de citação [cf. fls. 27 dos autos do Proc. ………../1996].

  5. A 01.07.1996 foram ambos os RR.1 citados para contestarem em dez dias [cf. fls. 28 dos autos do Proc. …………./1996].

  6. Em 11.07.1996 deu entrada a contestação dos RR. [cf. fls. 29 dos autos do Proc. ……../1996].

  7. A 20.09.1996 foi elaborada "cota", onde consta "(após ferias judiciais. Ac. serviço)", informando da expedição de carta registada à Mandatária da A., notificando-a da junção aos autos da contestação apresentada [d. fls. 32 dos autos do Proc. /1996].

  8. A 30.06.1997 (1) é aberta conclusão [d. fls. 34 dos autos do Proc. /1996].

  9. A 03,07.1997 é elaborado despacho saneador, especificação e questionário [cf. fls. 34 a 36 dos autos do Proc. /1996] J) A 26.09.1997 foram expedidas cartas registadas aos mandatários das partes notificando-os do despacho saneador, especificação e questionário [cf. fls. 34 a 36 dos autos do Proc. /1996].

  10. Em 01.10.1997 deu entrada requerimento por parte dos RR. onde consta, nomeadamente, que "( ...) RR nos autos acima identificados, vêm dizer que não consegue ler na integra o douto despacho saneador, especificação e questionário, por não perceber a letra, pelo que requer a V. Exa. se digne ordenar a sua transcrição à maquina ou por outros meios legíveis." [cf. fls. 38 dos autos do Proc. /1996].

  11. A 02.06.1998 é expedida carta registada ao Mandatário dos RR. remetendo cópia dactilografada do despacho saneador, especificação e questionário [cf. fls. 39 dos autos do Proc. /1996].

  12. Não houve reclamações [acordo].

  13. A 16.10.1998 os Mandatários das partes são notificados para os termos do art. 512.º do C.P.C. [cf. fls. 40 dos autos do Proc. /1996].

  14. Em 23.10.1998 os RR. apresentam o seu rol de testemunhas [cf. fls. 41 dos autos do Proc./1996].

  15. Em 03.11.1998 a A. apresenta o seu rol de testemunhas {cf.fls. 45 dos autos do Proc. /1996].

  16. Em 26.01.1999 é notificado ao mandatário dos RR. os documentos juntos pela A. com o rol [cf. fls. 64 dos autos do Proc. /1996].

  17. Em 04.02.1999 é apresentado requerimento pelos RR com a pronúncia sobre os documentos e sobre o requerimento de depoimento de parte [cf. fls. 70 dos autos do Proc. /1996].

  18. A 23.11.1999 é expedida carta à Mandatária da A. a notificá-la do requerimento apresentado pelos RR. [cf. fls. 73 dos autos do Proc. /1996].

  19. A 18.01.2000 é aberta conclusão com a indicação "ac. serviço". [cf. fls. 73 dos autos do Proc. /1996].

  20. Em 16.03.2000, é proferido despacho a admitir os requerimentos de prova [cf. fls. 74 dos autos do Proc. /1996].

  21. A 28.04.2000 é remetida notificação às partes do despacho de admissão dos requerimentos de prova, bem como da remessa de carta precatória para inquirição de testemunha na comarca de Pinhel [cf. fls. 74 (verso) dos autos do Proc. /1996].

  22. Em 28.04.2000 é expedida carta precatória à Comarca de Pinhel para inquirição de uma testemunha dos RR. [cf. fls. 74...

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