Acórdão nº 2035/09.9BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelJOAQUIM CONDESSO
Data da Resolução29 de Junho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO X RELATÓRIO X “P..., S.A.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal, na parcela em que não obteve ganho de causa, visando sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.548 a 566 do presente processo, através da qual julgou parcialmente procedente a impugnação intentada pela sociedade recorrente, tendo por objecto actos de liquidação adicional de I.R.C., relativos aos anos de 2004, 2005 e 2006 e no montante total de € 372.174,00.

X O recorrente termina as alegações (cfr.fls.585 a 596 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões: 1-O Tribunal a quo ao considerar que o que está em causa nos autos é a existência de um custo, de um gasto económico, que considera não se poder encarar-se como efectivamente suportado pela impugnante, e não a demonstração da indispensabilidade desse custo para a realização dos proveitos da empresa, conforme sempre alegou a AT, viola o Tribunal o princípio da proibição da decisão surpresa previsto no artigo 3 n.3 do CPC; 2-Esta solução de direito nunca foi alegada nem vislumbrada pelas partes; 3-Pois a Administração Tributária nunca colocou em causa que as reintegrações não aceites das benfeitorias constituíssem um custo da impugnante, colocou sim em causa que as mesmas fossem indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora; 4-Tal violação constitui uma nulidade processual que afecta a boa decisão da causa (art. 201, n. 1 do Cód. de Processo Civil) e uma nulidade da própria sentença, dado que o Mmo. Juiz a quo pronunciou-se sobre matérias sobre as quais não se podia pronunciar sem antes ouvir as partes (art.668, n.1, al.d) do Cód. de Processo Civil); 5-Deve, assim, a sentença ser declarada nula, com todos os legais efeitos; 6-Ainda que assim não fosse, o que só por mera hipótese académica se admite, face dos factos dados como provados a decisão do Tribunal à quo deveria ter sido diversa daquela que proferiu quanto às reintegrações das benfeitorias; 7-O artigo 23 do CIRC define gasto fiscal e usa a terminologia contabilística de gastos e proveitos, sem dar sequer qualquer definição ou determinar a relação entre estes dois conceitos e outros conceitos; 8-Não há dúvida de que existe uma relação clara entre gastos e proveitos, que tem precisamente a ver com o facto de os gastos se reflectirem, direta ou indiretamente, nos proveitos, sempre que uma empresa tem que suportar gastos para obter proveitos; 9-Regra geral, ao proveito está associado um gasto ou perda, mas, um custo (gasto), raramente, corresponderá a pura perda, poderá, em certa ocasião, consubstanciar-se em valores activos, isto enquanto não for recuperado (por transformação em proveito), ou perdido (transformação em perda); 10-No caso do artigo 23 do CIRC, em vez de a norma definir o conceito de gasto fiscal, remete antes para aspectos económicos, considerando gastos "os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora"; 11-O legislador optou assim por enunciar, exemplificadamente, e não exaustivamente, várias categorias concretas de gastos susceptíveis de serem admitidos como gastos dedutíveis; 12-Para saber se um determinado gasto pode ou não ser dedutível em sede de IRC, é necessário averiguar se os gastos correspondem à realidade dos factos tributários e se os factos fiscalmente relevantes são indispensáveis à atividade empresarial, sob pena de não poderem ser dedutíveis ao lucro tributável; 13-O contribuinte tem que fazer a prova da materialidade das operações efectuadas e demonstrar que os gastos correspondem à realidade dos factos; 14-Quanto ao critério da indispensabilidade tem sido definido pela jurisprudência e a doutrina como um dos requisitos fundamentais para que os gastos reais sejam aceites fiscalmente, trata-se de um critério, aparentemente indeterminado e complexo, que pode ser adaptado a qualquer situação, sobretudo aos casos mais complexos em matéria fiscal; 15-Devem ser aceites os gastos essenciais ao processo produtivo e à obtenção de proveitos. São considerados gastos indispensáveis os que são realizados no interesse da empresa e que contribuem para a obtenção do lucro de forma direta ou indireta; 16-Em termos gerais, só podem ser deduzidos fiscalmente os gastos em relação aos quais seja possível estabelecer uma conexão direta ou indireta com os proveitos e ganhos; 17-No caso em apreço a administração tributária desconsiderou a reintegração das benfeitorias efectuadas pela M... no imóvel da P... por considerar que as mesmas não eram indispensáveis para realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora; 18-E o Tribunal a quo, de forma completamente inusitada, foi mais longe que a própria A.T. e considerou que o que estava em causa não era a indispensabilidade do custo mas sim a existência do próprio custo, de um gasto económico, que entende não poder considerar-se suportado pela própria impugnante; 19-Sucede porem que atenta a factualidade dada como provada, foi devidamente comprovada a existência de um gasto efectuado pela impugnante, quanto mais não fosse de forma indirecta por via dos aumentos de capital; 20-Encontrando-se igualmente provado que o custo foi essencial para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora; 21-Relativamente à existência do custo, o mesmo existiu porquanto as benfeitorias foram realizadas e o próprio Tribunal a quo admite que verificou a existência das mesmas aquando da sua deslocação ao local, tendo-se tornado um activo da empresa; 22-Contudo entende o douto Tribunal que as reintegrações das benfeitorias realizadas e não aceites fiscalmente, reportam-se única e exclusivamente, a obras realizadas nas instalações da M..., pelo que tais encargos não concorreram para o aumento de capital social da ora impugnante, pelo que inexiste qualquer custo que foi por si suportado e como tal não podem ser objecto de reintegração; 23-Labora o douto Tribunal em erro; 24-Dos factos dados como provados verifica-se precisamente o contrário, conforme se pode retirar da factualidade constante do nº.3 do probatório, para onde se remete; 25-Donde se conclui que as benfeitorias efectuadas não foram efectuadas apenas no espaço ocupado pela M..., pois incluíram acessos, vedações e arranjos exteriores na parte do terreno que foi cedida pela M... para ser arrendada a terceiros; 26-Acresce que deveria ter sido dado como provados os seguintes factos alegados na PI: a) inicialmente a impugnante arrendou à M... um total de 71.492 m2 pelo preço de 1500,00 €, ou seja pelo preço de 0,020 € por m2 (1.500 € /71.942m2= 0.020 € m2) - cfr fls 47 a 56 do processo administrativo; b) posteriormente a M..., Lda. concordou com o destaque de três parcelas cuja área total perfaz 8.536 m2, os quais foram, depois, arrendados à E... Sistemas de Lavagem Auto (1400 m2), à M... (2500 m2) e a T... agora P... (4636 m2) (cfr.doc. de fls. 82, 65 a 74, 60 a 64 e 75 a 80 dos autos); c) houve assim uma redução da área inicialmente arrendada à M... de 71.492 m2 para 62.992 m2, mantendo-se a renda no mesmo montante, 1.500,00 €, ou seja o preço por m2 passou a ser de 0,024 € (1.500,00 € / 62.992 m2 = 0,024 € m2); 27-Porquanto se foi dado como provado os factos constantes dos nºs.3, 8, 14 e 20, teriam de ser dado com provado também os factos acima enunciados no nº.26 das presentes conclusões; 28-Pelo que deveria o Tribunal à quo ter concluído que muito embora o valor da renda inicialmente contratado com a M... se tivesse mantido, o espaço arrendado a esta diminuiu, o que significa que o preço do arrendamento por m2 aumentou; 29-Ora tendo em conta a redução da área arrendada, menos 8536 m2, e a manutenção do valor da renda em 1.500,00 €, verifica-se que houve um aumento implícito da renda paga pela M... em cerca de 19%; 30- Pelo que está devidamente demonstrado que para além de não se poder dizer que as reintegrações correspondem a obras realizadas, tão só, num espaço ocupado pela M..., mas e ainda que o fossem, também não se pode dizer que a impugnante não obteve qualquer proveito, dado o valor do arrendamento celebrado com a M... se manter, pois o valor da renda não se manteve, aumentou.

X Não foram produzidas contra-alegações.

X O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se negar provimento ao presente recurso (cfr.fls.611 e 612 dos autos).

X Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.

X FUNDAMENTAÇÃO X DE FACTO X A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.549 a 560 dos autos - numeração nossa): 1-Em 23-10-1998, no processo n.º 208/96 da 2.ª Secção do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Torres Novas foi proferida sentença de homologação da medida de gestão controlada da empresa Metalúrgica C..., S.A., da qual consta, designadamente, o seguinte: “(…) 5.3.7 - Constituição de uma nova sociedade, a N... - Investimentos, S.A., para a qual será transferido livre de ónus ou encargos, o imóvel da M..., com o valor de balanço igual ao valor de avaliação encontrado pela ... (…) O capital social poderá ser subsequentemente aumentado, mediante a subscrição de novas ações pela M..., S.A. pelo valor das benfeitorias feitas por esta última no imóvel da M..., corrigindo-se em consequência o valor do ativo da sociedade N... Investimentos, S.A.

O processo de avaliação de novas benfeitorias e aumento de capital depois de realizado inicialmente com base em avaliação a solicitar à ... - Consultores será renovado anualmente. (…) Celebração de contrato de arrendamento entre a sociedade referida em 7 e a Metalúrgica C..., S.A. por 10 anos renovável por sucessivos períodos com a mesma duração (…) podendo a Metalúrgica C..., S.A. ceder a sua posição no arrendamento à M..., S.A.”...

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