Acórdão nº 2957/16.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | PEDRO MARCH |
Data da Resolução | 22 de Junho de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório Bal ……………………. (Recorrente) veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que, no âmbito da presente intimação para defesa de direitos, liberdades e garantias, proposta contra o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras - Ministério da Administração Interna, convolou a mesma em acção administrativa e julgou o pedido de condenação do SEF a proceder à emissão do título de autorização de residência a favor do Autor improcedente.
As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões: A - Está provado clara e documentalmente que o ora Recorrente não tem qualquer tipo de estabilidade laboral. Antes pelo contrário.
B- Está devidamente comprovado documentalmente que o A. não revê a sua família à cerca de quatro (4) anos.
C- Não tendo sido a autorização de residência para o exercício de actividade profissional subordinada ainda emitida, o Recorrente mostra-se privado da possibilidade de beneficiar da aplicação do princípio da Equiparação ou do tratamento nacional, previsto no artigo 15º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.
D- O Autor vive atualmente com MEDO, medo de ficar sem trabalho, medo de ser alvo de um processo de expulsão e ser deportado para o Nepal, medo de nunca mais rever ou perder a sua familia, medo que não aguente a pressão a que está atualmente sujeito. Pelo que Urge Intimar o Réu a emitir o cartão de residência para não prolongar esta autêntica " a9onia", este autêntico ''pesadelo" em que o Autor vive.
E - Mais que uma questão legal, configura-se uma questão MORAL: o Estado Português e o Réu (porque recebe 50% destas receitas), Não podem exigir e receber taxas de centenas de cidadãos, a título de emissão e envio dos seus títulos de residência (bem como assim, a totalidade das taxas a título de deferimento dos seus pedidos); taxas essas de valor superior a um salário mínimo nacional; reter essas quantias por meses e até anos sem qualquer justificação, e, posteriormente, vir negar a emissão dos mesmos.
F - E, que dizer das expectativas geradas pelo Réu nos requerentes em geral; e, no Recorrente em particular, mediante o pagamento da totalidade das taxas de taxas/ emolumentos devidos pela análise e deferimento dos seus pedidos; e do artifício gerado pela recolha de fotos, impressões digitais e assinaturas? G - Considerando os limites internos inerentes ao poder discricionário, temos que, no caso sub judice a Administração; o Réu, não se revelou nem correcto, nem honesto, nem justo, nem tão pouco bom.
H - O Réu violou, em especial, os princípios da decisão (artigo 13º do CPA); da eficiência (artigo 5º do CPA); da celeridade (artigo 59º do CPA); da confiança, e da boa administração.
I- O n. º 1, do artigo 82º, da Lei 23/2007, estipula que "o pedido de concessão de autorização de residência deve ser decidido no prazo de 60 dias." .
J - O Réu nada decidiu nesse prazo, nem tão pouco nos dez meses subsequentes; pelo que omitiu claramente o seu dever de decisão consagrado no artigo 52º, n. º 1, in fine, da Constituição, e no artigo 13° do CPA sob a epígrafe "Princípio da Decisão" .
L - Com essa omissão, o Réu violou ainda o princípio da confiança, porque o Recorrente requereu a autorização de residência em apreço, instruiu o pedido com todos os documentos exigidos, pagou todas as taxas devidas inerentes ao seu pedido e não obteve decisão, decorridos dez meses.
M - Ademais: para além do Recorrente ter demonstrado possuir - naquele momento temporal - todos os requisitos legais exigidos, também é inquestionável que e o Réu admitiu - na mesma data - o uso do meio excepcional e oficioso constante do n.º 2 do artigo 88, da Lei 23/ 2007.
N - Ou seja, o Réu auto vinculou-se a decidir. E, não decidiu.
O - Não procede a alegação que a discricionariedade que cabia ao Réu ao abrigo do disposto no n.º 2, do artigo 88º, da Lei 23/ 2007, não está subordinada a prazos, ou está subtraída à observação e cumprimento dos princípios constitucionais da actividade administrativa.
P - Todo o cidadão é, perante a Administração, um sujeito jurídico de pleno direito, que, numa relação jurídica procedimental tem direito a uma decisão e NUNCA a uma "discricionariedade do silêncio", ou ao "silêncio incumprimento"; que corresponde, afinal, à violação do dever de decidir.
Q - Mesmo no caso das autorizações de residência emitidas as abrigo do chamado "regime excepcional' (para os cidadãos que não preencham os requisitos dos restantes tipos de autorização de residência), o SEF está adstrito a agir em conformidade com os princípios constitucionais da actividade administrativa, ou seja, os princípios da prossecução do interesse público, do respeito pelos direitos e interesses dos cidadãos, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé (cfr. artigo 266º da Constituição).
R - Citando António Francisco de Sousa: " não há discricionariedade sem limites" , sendo que "a discricionariedade administrativa é sempre limitada pela lei e pelo Direito" (in "Direito Administrativo em Geral, 4ª edição, Porto: FDUP, 2001, págs. 358 e 298).
S - A discricionariedade administrativa encontra-se limitada tanto pelas imposições do ordenamento jurídico (limites externos), como pelas exigências do bem comum, da ética administrativa, da boa administração e de todos os princípios que regem a Administração Pública (limites internos); limites que no caso sub judice não foram observados.
T - Se, como afirma Marcello Caetano " discricionário significa line dentro dos limites permitidos pela realização de certo fim visado pela lei" (in " Princípios Fundamentais do Direito Administrativo", Coimbra: Almedina, a l 996, pág. 129), temos então que, em termos temporais, muito depressa o Réu entrou no domínio da arbitrariedade.
U - A lei especial - artigo 82º, n.º 1, da Lei 23/ 2007 - determina o prazo de 60 dias para a decisão de concessão de autorização de residência. E, a Lei Geral - artigo 86º, n.º 1, do (novo) CPA - fixa o prazo de 10 dias.
V - Quer se considere o prazo geral, ou o prazo, especial, temos que ambos os prazos - no caso sub judice - se encontram extrapolados. Pelo que ocorreu deferimento tácito.
X- No actual CPA não existe previsão legal expressa em matéria de deferimento na concessão de regularizações extraordinárias.
Z- É de considerar que estamos perante uma "lacuna"; tanto mais que o anterior CPA previa expressamente para estas situações o deferimento tácito na sua alínea c), do n.º 3, do artigo 108º.
AA- Não será o facto de estamos perante um meio excepcional e oficioso, que permite e sua subtracção a este entendimento; em especial atentos os limites (externos e internos) do poder discricionário.
BB - O n.º 1, do artigo 10º do CC prevê: " Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável aos casos análogos." .
CC - Acrescenta o n.º 2, da mesma disposição que "há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei ." .
DD - O n.º 3, da mesma disposição, estipula por fim que: " Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segunda a norma que o próprio intérprete criaria , se hou ve de legislar dentro do sistema ." EE - Por sua vez, o artigo 11º do atual Código Civil estipula: "As normas excepcionais não comportam aplicação analógica, mas admitem interpretação extensiva." .
FF - Admitindo-se que o n.º 2, do artigo 88º, da Lei 23 /2007, consubstancia uma norma excepcional, a mesma é, como o diz a Lei, susceptível de interpretação extensiva.
GG - Atento o artigo 11º do CC, existe interpretação extensiva sempre que o intérprete ao reconstituir a parte do texto da lei segundo os critérios estabelecidos no artigo 9º conclua que o pensamento legislativo coincide com um dos sentidos contidos na lei, mas o legislador, ao formular a norma disse menos do que queria, sendo, por isso, necessário alargar o texto legal.
HH - Admitindo-se que o artigo 88º, n. º 2 é uma norma excepcional que admite sempre a interpretação extensiva, a sua lacuna em termos de deferimento tácito terá de ser obrigatoriamente colmatada com o previsto no nº 3 do artigo 10º do CC, "é resolvida de acordo com a própria norma que o intérprete criaria se hou vesse de legislar de dentro do espírito do sistema.".
II - O deferimento tácito está subjacente à Lei de Imigração, e porque o cidadão imigrante não pode tornar-se " um refém" da Administração Publica; e esta não pode condicionar, com a sua inércia, a sua vida; as suas expectativas; tudo porque precisamente estão em causa seres humanos.
JJ - E, até porque, vigora um princípio taxativo na lei de 60 dias para o Réu tomar uma decisão; previsto no artigo 82º, n.º 1 da atual Lei de Imigração.
LL - Ou, por interpretação extensiva, ou por analogia o certo é que existe uma lacuna em matéria de deferimento tácito.
MM - E, tal lacuna deverá ser integrada pelo intérprete (julgador) de acordo com o espírito da Lei.
NN - E, o Espírito da Lei, quer na atual Lei de Imigração, quer no CPA, é no sentido de existir deferimento tácito.
00 - Como se referiu ab initio, todo o Direito assenta em prazos legais, as partes têm as suas vidas, os seus planos, as suas expectativas, e a Administração Pública quer-se eficiente e cumpridora de prazos legais, artigo 10º do CPA.
PP - Pelo que se verifica deferimento tácito.
QQ- Este escritório tem Jurisprudência pacífica, unânime, firmada no STA em matéria da Idoneidade do presente Meio processual e na área de imigração.
TERMOS EM QUE SE CONCLUI NO SENTIDO DE E COM O MUI DOUTO PROVIMENTO DE VOSSAS EXAS:
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SER REVOGADA A SENTENÇA DO DOUTO TRIBUNAL A QUO.
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SER CONSIDERADO PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO.
-
SEJA CONFIRMADO COMO LIMITE TEMPORAL INSTRUTÓRIO OU DECISÓRIO PARA A CONCESSÃO DE RESIDÊNCIA POR VIA DO ARTIGO 82º, N.º 1, O PRAZO MÁXIMO DE SESSENTA DIAS.
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OU, O PRAZO DE DEZ DIAS; POR FORÇA DO DISPOSTO NO...
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