Acórdão nº 708/16.9BEBJA-B de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelHELENA CANELAS
Data da Resolução22 de Junho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO A SOCIEDADE ……………….., LDA.

(devidamente identificada nos autos), requerente no Processo Cautelar que instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja contra o IFAP– INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, IP (igualmente devidamente identificado nos autos) – no qual requereu, na pendência da respetiva ação principal, que fosse decretada providência cautelar do ato administrativo que lhe determinou a reposição das ajudas ASA (ajudas agro e silvo ambientais) no montante de 138.287,48 € – inconformada com a sentença de 17/03/2017 do Tribunal a quo pela qual foi indeferido o pedido cautelar formulado, dela interpõe o presente recurso, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos: I. A utilidade económica ou «valor do prejuízo que se pretende evitar» da providência cautelar não é nem pode ser igual à do valor do processo principal: é reconhecido e aceite pela ER que está a proceder em cada situação em que haja lugar a pagamentos, a compensação de créditos da Recorrente com a obrigação pecuniária que lhe criou, tendo neste momento compensado já mais de 50.000,00 € de ajudas devidas à Recorrente, razão pela qual o valor da Providência requerida não pode nem deve exceder o valor passível de retenção em cada ano que se contem dentro do limite de 30.001,00 € que a Recorrente apontou.

  1. Na acção principal está em causa a criação de uma obrigação pecuniária de 138.287,48 €; na providência requerida está em causa evitar em cada ano a compensação das ajudas a pagar nesse ano.

  2. Por esta razão, viola o artigo 32º, 6 do CPTA, a decisão impugnada de fixar como valor do processo cautelar o valor da acção principal.

  3. O que está em causa no presente recurso é uma decisão da 1ª instância em relação a um requerimento de providência cautelar de suspensão da eficácia de acto que se arguiu de nulidade a vários títulos.

    O Mmº Juiz a quo entendeu que à providência falecia desde logo o fumus boni juris, condição essencial para a procedência da providência, considerando que «os vícios invocados pela requerente não se verificam como procedentes e, em consequência, não sendo provável a procedência da acção principal, é forçoso concluir pelo não preenchimento do pressuposto do fumus boni juris».

    Por assim ter entendido, a sentença recorrida não se pronuncia sobre o periculum in mora.

  4. A Recorrente não pode aceitar a argumentação constante da sentença porque entende que os vícios de que padece o referido acto são de molde a determinar a sua nulidade, designadamente face à nova redacção do artigo 161º do CPA e designadamente a alínea k) do nº 2 desse artigo – actos que criem obrigações pecuniárias não previstas na lei.

    A recorrente não tem dúvidas de que o acto impugnado lhe cria uma obrigação pecuniária sem qualquer previsão legal que a acolha, razão pela qual entende que o acto é nulo.

  5. A sentença recorrida não dá como indiciariamente provados, mas devia ter dado, por serem relevantes para a decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito enunciadas, os seguintes factos, que devem ser aditados a «3.1 Fundamentação de facto» da sentença recorrida: e) A requerente explicou no seu articulado que – artº 14º PI - «a A. candidatou-se às ajudas ASA nos anos de 2008 a 2013 (2008-2009, 2009- 2010, 2010-2011, 2011-2012 e 2012-2013), num período de cinco anos abrangidos pelos compromissos agro-ambientais assumidos com a 1ª candidatura».

    f) Que este este período de cinco anos que decorreu entre a campanha de 2008/2009 e 2012/2013, terminou em 30 de Setembro de 2013 (artº 17º PI); g) Que em conformidade com o Regulamento 1310/2013 de 17 de Dezembro e Portaria 19/2014 de 29 de Janeiro, a Requerente apresentou em 30 de Abril de 2014 – dentro do prazo legalmente previsto – o seu pedido único para 2014, que instruiu com todos os documentos exigíveis, como se pode verificar pela análise da página 18 da “Certidão” que contém a cópia do Pedido Único, junta com certidão do IFAP a requerimento da Requerente (artº 20º da PI); h) Que era pressuposto da possibilidade de apresentar o pedido de ajudas ASA para 2013/2014, nos termos da Portaria 19/2014 de 29 de Janeiro, que (artº 24º, 2, da Portaria) a Requerente tivesse terminado os seus compromissos ASA a 30 de Setembro de 2013 (o que era o caso) e que tivesse mantido os compromissos anteriormente assumidos (ou seja, o modo de produção biológico) a partir de 1 de Outubro de 2013 (o que era igualmente o caso) – artigo 19º da PI.

    i) Que os «anos» de compromisso não correspondem a um ano civil (2008, etc até 2012), mas antes a um ano de calendário: 2008-2009, 2009-2010, 2010-2011, 2011-2012 e 2012-2013 – ver artº 14º da PI; e que a época agrícola correspondente a este «ano» vai de 1 de Outubro de um ano até 30 de Setembro do ano seguinte.

    j) A epígrafe do ofício correspondente ao documento melhor identificado na alínea I) do probatório, ou seja, o ofício enviado à requerente pelo requerido em 17 de Maio de 2016 é a seguinte: «audiência prévia --- medidas agro e silvo florestais – ano 2014».

    k) Em lado nenhum deste ofício está dito que o ano de 2014 (2013/2014) ao qual a epígrafe faz referência expressa não está incluído na lista de anos elencada: na verdade, a requerente olhando para a epígrafe do ofício e para a lista interpretou-a como sendo «2009/2010 a 2013/2014».

    l) A entidade requerida, na sua oposição ao Requerimento Inicial não afirmou (veja-se a oposição a partir de 21º) que o montante respeitante ao ano de 2014 não integrava a listagem dos anos a «devolver», ou seja, a requerente alegou que o ano de 2013/2014 integrava o elenco dos anos cuja restituição era ordenada, e na sua oposição a entidade requerida não contestou tal facto.

    m) Considera-se indiciariamente provado, por ter sido articulado pela Requerente em 48 e 87 do seu RI e não ter sido contestado pela Entidade Requerida, que esta não pagou à Requerente os montantes ASA respeitantes à época agrícola 2008/2009.

    Consequentemente, a exigência de reposição de verbas respeitantes a cinco anos, quer diga respeito ao ano de 2013/2014, quer diga respeito ao ano de 2008/2009, é uma exigência de reposição de uma verba que nunca foi recebida, e consequentemente, corresponde a um acto nulo por falta de lei que o habilite.

  6. Há portanto nulidade do acto por criação de uma obrigação pecuniária não prevista na lei - a intimação para devolver um montante que não foi pago – porque não pode haver dúvidas de que a ER procedeu através do acto impugnado à criação à Recorrente de uma obrigação pecuniária antes inexistente.

  7. O acto suspendendo é nulo por carecer de base legal que permita ordenar a restituição de montantes relativos a compromissos referentes ao ciclo 2008/2013, que já foi encerrado e que, como tal, é uma determinação que visa criar uma obrigação pecuniária não prevista na lei e que ofende o conteúdo essencial do direito de propriedade da requerente.

  8. A Portaria nº 229-B/2008, alterada pela Portaria 19/2014, de 29 de Janeiro, na sequência da entrada em vigor a 1 de Janeiro de 2014 do Regulamento n 1310/2013, no seu artigo 24º previu expressamente que só se poderiam candidatar a um ano suplementar de ajudas os beneficiários que em 30 de Setembro de 2013 tivessem terminado os seus compromissos.

  9. Tendo terminado os seus compromissos a 30 de Setembro de 2013, a Recorrente integrou as ajudas respectivas no seu património e beneficiando da legislação posterior a esse facto, de Janeiro de 2014, candidatou-se em Abril de 2014 a um ano suplementar de compromissos.

  10. O Regulamento 1698/2005 e o seu regulamento de execução 65/2011, da Comissão, de 27-01-2011, cujo artigo 18º prevê que «no caso de compromissos plurianuais, as reduções de ajudas, as exclusões e as recuperações são também aplicáveis aos montantes já pagos nos anos anteriores por esses compromissos» conjugados com o regulamento 1310/2013, que estabelece certas disposições transitórias relativas ao apoio ao desenvolvimento rural, não podem ser interpretados no sentido de que permitam a ablação das ajudas pagas no ciclo de compromissos 2008/2013 por causa imputável ao ano de prolongamento de 2013/2014.

  11. O artigo 18º do Regulamento 65/2011 supra citado, não permite nem constitui base legal apropriada a determinar a ablação das ajudas pagas no ciclo de compromissos terminado em 30 de setembro de 2013.

    Se dúvidas houver sobre esta matéria, o Tribunal ad quem deve remeter a questão pela via do reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça da União – artigo 267º do TFUE.

    O acto suspendendo é portanto nulo por carecer de base legal que permita ordenar a restituição de montantes relativos a compromissos referentes ao ciclo 2008/2013, que foi encerrado antes da publicação da legislação que permitiu adicionar mais um ano e que, como tal, é uma determinação que visa criar uma obrigação pecuniária não prevista na lei e que ofende o conteúdo essencial do direito de propriedade da requerente.

  12. Não podendo deixar de ser dado como indiciariamente provado que o ciclo de compromissos da requerente terminou a 30 de Setembro de 2013 e que os actos legislativos que lhe permitiram pedir em 2013/2014 o pagamento de mais um ano de medidas ASA, são posteriores, não pode deixar de se concluir que os montantes das ajudas recebidas sem qualquer vício intrínseco entre 2008 e 30 de Setembro de 2013, ficaram definitivamente integradas na esfera patrimonial da Requerente, não podendo ser postas em crise por facto superveniente respeitante a outros anos e que, portanto, a ordem de restituição de montantes respeitantes a este ciclo encerrado ofende o conteúdo essencial de direito fundamental: o direito de propriedade ou equiparado e nos termos do artigo 161º do CPA são nulos os actos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental.

  13. Ao contrário do que afirma a sentença recorrida, o acto impugnado, além disto, revoga um acto válido...

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