Acórdão nº 94/17.0BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelHELENA CANELAS
Data da Resolução04 de Outubro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO A FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL (devidamente identificada nos autos) interpõe o presente recurso do acórdão proferido em 12-05-2017 pelo Tribunal Arbitral do Desporto (Proc. nº 2/2017) que julgando procedente a impugnação ali dirigida pelo V………… ………………………… SAD (igualmente devidamente identificada nos autos) da decisão do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol (Secção Profissional) de 06-12-2016 que lhe aplicou a pena de multa no montante de 7.650,00€, anulou a mesma.

Formula o recorrente as seguintes conclusões do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos: 1. O presente recurso tem por objeto o Acórdão Arbitral proferido pelo Colégio Arbitral constituído junto do Tribunal Arbitral do Desporto, proferido em 12 de maio de 2017, designadamente a decisão do Colégio Arbitral em revogar o acórdão proferido pelo Conselho de Disciplina e, consequentemente, não condenar o V…………. ……………. pela prática da infração p. e p. no artigo 186.º-2, do Regulamento Disciplinar da FPF de 2016 em multa de 7.650,00€ e ainda o segmento decisório que versa sobre a rejeição do pedido de isenção de custas apresentado pela ora Recorrente; 2. O acórdão recorrido padece desde logo de nulidade, porquanto não logra demonstrar porque razão entende o Tribunal Arbitral do Desporto, que não se encontram preenchidos três elementos objetivos do tipo de infração do artigo 186.º do RDLPFP, tanto mais que ficou supra demonstrado que existiu arremesso de um objeto (isqueiro), pois atendendo a critérios de razoabilidade e senso comum, a presença de um isqueiro junto ao 4º árbitro, terá de fazer deduzir que tal foi arremessado (primeiro elemento) e que o foi por adeptos da bancada mais próxima do 4º árbitro, onde se encontravam adeptos do Vitória Sport Clube (segundo elemento); 3. Relativamente ao terceiro elemento objetivo do tipo de infração que o acórdão recorrido entende não estar preenchido, trata-se da suscetibilidade de o referido objeto provocar lesão de especial gravidade, nos termos do artigo 4 .º-1, 1) do RDLPFP, sendo que, o Tribunal a quo não valorou nem examinou a prova produzida pela Recorrente que, com recurso a imagens televisivas, demonstrou de forma cara que um isqueiro pode causar lesão de especial gravidade, bastando para tal que atinja uma pessoa na vista ou na zona da têmpora, devendo a referida prova ser examinada e relevada, por se tratar de prova essencial para a descoberta da verdade material, sendo que, não o tendo sido, deverá o acórdão ser revogado, por preterição de formalidade essencial, consubstanciada na não apreciação da prova produzida; 4. O presente recurso versa ainda sobre outras matérias, que apesar de não terem sido objeto de discussão nos autos, o acórdão de que ora se recorre decide aflorar, como sendo o elemento preponderante subjacente aos artigos 186.º e 187.º do RDLPFP, tendo ficado demonstrado que a diferença é o arremesso para o terreno de jogo e para fora do terreno de jogo, respetivamente e não a perigosidade e o resultado de determinada conduta, respetivamente, como conclui o acórdão recorrido sem demonstrar como chega a tal posição, concluindo assim com base em erro notório que influencia toda a decisão e deve concorrer para a revogação da mesma; 5. Andou mal o Tribunal Arbitral do Desporto ao pronunciar-se sobre a ilegalidade e/ou inconstitucionalidade dos artigos 186.º e 187.º do RDLPFP, porquanto idêntica norma já foi algo de análise do Tribunal Constitucional, havendo que concluir-se pela não inconstitucionalidade das normas supra mencionadas, de acordo com Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 730/95, não se verificando assim qualquer violação do princípio da culpa como plasmado no acórdão recorrido e que levou a uma decisão errónea que assim deve ser revogada; 6. O Tribunal Arbitral do Desporto excedeu clara e largamente os seus poderes de pronúncia, tendo entrado em campo reservado por lei à Administração (no caso, à Recorrente), tendo valorado a opção tomada pela Recorrente no seu Regulamento Disciplinar no âmbito da sua margem de livre decisão administrativa ao invés de se cingir a apreciar a legalidade de tal opção; 7. Os poderes de regulamentação, organização, direção e disciplina no âmbito da modalidade para que detém estatuto de utilidade pública são prerrogativas públicas exclusivas da Recorrente, o que decorre da lei e do referido estatuto, pelo que apenas por si podem ser exercidos, no território nacional, o que abarca designadamente a definição das normas disciplinares aplicáveis à modalidade; 8. O Supremo Tribunal Administrativo em Acórdão de 30.09.2009 entendeu que não é possível a desaplicação de normas regulamentares com fundamento na violação de princípios ordenadores da atividade administrativa, tal como o princípio da proporcionalidade, pelo que o Acórdão recorrido não podia ter decidido como fez; 9. No Acórdão recorrido o Colégio de Árbitros não se limita a aferir a legalidade da norma regulamentar, mas também a exprimir uma valoração sobre a opção tomada pela Administração, o que é notório pelas expressões usadas e pela total ausência de justificação que permita demonstrar que a norma que prevê a sanção de multa é desnecessária, desadequada ou excessiva; 10. O Tribunal recorrido não solicitou nem tinha em seu poder nenhum dado objetivo que permitisse chegar à conclusão a que chegou, pelo que simplesmente decidiu substituir-se à Federação Desportiva que rege esta modalidade e determinar que a sanção devia ser outra; 11. Apenas à entidade com poderes regulamentares exclusivos cabe fazer a ponderação entre o interesse público e os interesses dos administrados pois tem em seu poder os elementos de facto para decidir. Caímos, portanto, na análise do mérito da decisão, a qual se encontra dentro da margem de livre decisão da administração e não é sindicável perante os tribunais, sejam eles arbitrais ou não; 12. Claramente, no Acórdão recorrido, o que o Colégio Arbitral fez foi entrar no campo reservado, pela Constituição e por Lei, à Federação Portuguesa de Futebol e determinar a desaplicação de uma norma por razões de mérito, conveniência ou oportunidade e não por razões de legalidade; 13. O Colégio Arbitral acabou por formular o seu juízo de valoração quanto à solução adotada no Regulamento Disciplinar, o que, a abrir-se este precedente, em particular no que toca a Regulamentos Desportivos e em sede arbitral, pode trazer consequências bastante graves; 14. Ao formular valorações próprias da função administrativa, o Acórdão Arbitral violou o princípio da separação de poderes, ínsito nas normas constitucionais do artigo 2.º e 202.º, n.º1 da CRP, pelo que deve ser revogado; 15. Andou mal o Colégio Arbitral, porque se excedeu nos seus poderes de pronúncia, ao optar por se pronunciar sobre normas do RDLPFP, no lugar de aplicá-las, o que viola igualmente o princípio da separação de poderes, ínsito nas normas constitucionais do artigo 2.º e 202.º, n.º 1 da CRP; 16. Para além do exposto, sempre se dirá que esta é uma decisão-surpresa, porquanto não foi uma questão trazida ao conhecimento da ora Recorrente durante a pendência do processo arbitral, não foi arguida pela Recorrida e a Recorrente não teve sobre ela a hipótese de se pronunciar; 17. Também com este fundamento, o Acórdão arbitral é nulo por violação do princípio do contraditório, previsto no artigo 34.º, al. c) da Lei do TAD, 95.º, n.º 1, 2 e 3 do CPTA, aplicável por via do artigo 61.º da Lei do TAD e 3.º, n.º 3 do CPC aplicável por via do artigo 1.º do CPTA; 18. O Acórdão recorrido decide ainda rejeitar o pedido de isenção de custas apresentado pela Recorrente, pelo que também neste segmento decidiram mal os Exmos. Árbitros que compuseram o Colégio Arbitral; 19. A negação de tal direito é violador de normas constitucionais, designada mente o artigo 13.º e 20.º, n.º 1 e 2 e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, uma vez que introduz uma desigualdade no acesso à justiça face aos demais intervenientes e agrava a situação da FPF face ao enquadramento legal que existia antes da existência de uma instância arbitral obrigatória; 20. Ao rejeitar o pedido de isenção da taxa de arbitragem apresentada pela ora Recorrente, o Colégio de Árbitros aplicou, assim, uma norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo; 21. Isto significa que se este Douto Tribunal Superior entender igualmente não ser de reconhecer a isenção da Recorrente das taxas previstas na LTAD e na Portaria acima referida, estará também aplicar norma reportada como inconstitucional e a violar o artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais, e os artigos 13.º e 20.º, n .º 1 e 2 e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.

Contra-alegou o recorrido, pugnando pela improcedência do presente recurso jurisdicional, com manutenção do acórdão arbitral recorrido.

Remetidos os autos em recurso a este Tribunal, neste notificada nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146.º e 147.º do CPTA, a Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu Parecer no sentido de dever ser rejeitado o recurso.

Sendo que dele notificadas as partes apresentou-se a responder a recorrente, pugnando nada obstar ao conhecimento do recurso, por, em suma, o processo arbitral ser necessário e não voluntário, não havendo lugar à aplicação da Lei de Arbitragem Voluntária (LAV) mas sim das normas relativas a recursos que constam da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto.

Sem vistos, em face do disposto no artigo 36º nº 1 alínea e) e nº 2 do CPTA, ex vi do artigo 8º nº 2 da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto, aprovada pela Lei n.º 74/2013, de 06 de Setembro, na redação dada pela Lei nº 33/2014, de 16 de Junho.

* II. FUNDAMENTAÇÃO A – De facto O acórdão arbitral recorrido considerou, no seu ponto V, sob o epíteto «enquadramento», a seguinte factualidade, nos seguintes termos...

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