Acórdão nº 13297/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução12 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO MINISTÉRIO PÚBLICO intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de LEIRIA ação administrativa especial contra MUNICIPIO DA MARINHA GRANDE e CONTRA-INTERESSADA L…………….— INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS

O pedido formulado foi o seguinte: - Declaração de nulidade das deliberações da Câmara Municipal da Marinha Grande datadas de 05 .12.2002 e de 04.09.2003, referentes a licenciamento de um projeto de loteamento e de um bloco de apartamentos, no âmbito do Proc. de Loteamento nº 576/2002. Por acórdão de 28-01-2016, o referido tribunal veio a prolatar decisão, onde absolveu o réu do pedido

* Inconformado com tal decisão, o autor interpôs o presente recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: 1. É legalmente inadmissível a constituição de um lote e de uma parcela remanescente autónoma num prédio que havia sido objeto de destaque e sobre o qual impendia um ónus de não fracionamento

  1. Por força do conceito consagrado no art. 2º/i do DL nº 555/99, de 16/12, na redação dada pelo DL nº 177/01, de 4/6 (RJUE), vigente à data dos atos impugnados, um loteamento só pode ocorrer em função de uma divisão de um ou vários prédios ou de um emparcelamento

  2. Ora, a situação dos autos não se enquadra nesse dispositivo legal, porque o loteamento constituído na parcela destacada não resultou da sua divisão nem de emparcelamento

  3. Não se questiona, desse modo, a admissibilidade legal de uma operação de loteamento, mesmo que parcial, numa parcela destacada, mas sim a possibilidade desse loteamento resultar, tão só, na constituição de um lote, sem que tivesse a suportá-lo um emparcelamento, como sucedeu no caso em apreço

  4. Depois, definindo-se o destaque como um loteamento em sentido restrito, ou simples, que dá origem a 2 lotes para efeitos de registo predial e de futura edificação , significa que os fins que presidem a esse instituto foram beliscados com a vertente operação urbanística na parte destacada, já que não só resultou uma divisão fundiária dela, mas a real divisão/constituição jurídica de dois (2) prédios autónomos, sendo que a denominada parte sobrante do lote foi vendida em 10/2/2005 a Francisco da Rocha

  5. Posto isto, se a operação urbanística em análise, ao configurar a constituição de um lote, é ilegal por, no caso, ser legalmente inadmissível/impossível, face ao disposto nos art.s 2º/i e 41º do RJUE, ao considerar-se como uma desanexação é, de igual forma, ilegal por contrariar o prescrito nos art.s 5º/3 do DL nº 448/91, de 29/11 e 6º/6 do RJUE, sendo, sempre, por isso, nula por força do art. 133º, nºs 1 e 2/c) do art. 133º do CPA

  6. Pelo que, ao decidir como decidiu, o acórdão recorrido fez, a nosso ver, errada interpretação e aplicação desses dispositivos legais, pelo que deve anular-se o mesmo e substituído por outro que declare nula a operação urbanística em apreço

    * O recorrido município contra-alegou, concluindo: 1. O acórdão proferido nos presentes autos enquadra devidamente os factos e o Direito aplicável, não merecendo, por isso, qualquer censura

  7. No que concerne à violação do regime legal dos loteamentos, refere o Recorrente que o terreno sobre o qual incidiu a operação urbanística em discussão nestes autos tinha um ónus de não fraccionamento, pelo prazo de 10 anos a contar de 23.05.2001, acto registado em 12.06.2001

  8. Essa operação consistiu num Destaque, operado ao abrigo do n.º 1 do art. 5. do DL n. 448/91 de 29.11, com a redacção dada pelo DL n.º 334/95 de 28.12, sendo que, nos termos do n. 3 do mesmo preceito legal, o ónus de não fraccionamento apenas impede, durante 10 anos, a realização de outro destaque e não a de qualquer outra operação urbanística, como seja, o loteamento

  9. Nesse conspecto, conclui-se que na sequência de um destaque, mesmo que ainda não ultrapassado o período de não fraccionamento, é admissível realizar/autorizar uma operação de loteamento na parcela sobrante, não restando ao Recorrente, quanto a este concreto ponto, quaisquer dúvidas

  10. Agora, em sede de recurso, a questão que é levantada prende-se com a possibilidade de (como defende ter sucedido no caso em apreço) do loteamento resultar, tão só, na constituição de um lote, sem que tivesse a suportá-lo um emparcelamento

  11. O douto Acórdão proferido, e bem, responde à questão suscitada nesta sede de recurso pelo Recorrente, pois que, contrariamente ao que o mesmo pretende defender, não é necessário verificar-se um emparcelamento para que possa resultar a constituição de um lote

  12. Nem, salvo melhor e douta opinião, tem o Parecer invocado pelo Recorrente qualquer aplicação ao caso concreto, pois trata de matéria totalmente distinta, assente em versões da Lei inaplicáveis (porque posteriores) ao presente e, mais importante, não se debruça sobre a questão nesta sede em crise

  13. Em sentido favorável a loteamentos parciais, afirma expressamente José Miguel Sardinha que não existe obrigatoriedade legal de a área a lotear ser totalmente coincidente com a área total do prédio originário. É, pois, a este propósito que se fala, segundo o mesmo, em parcelas sobrantes ou remanescentes. Tal entendimento tem igualmente sido acolhido nos pareceres da CCDR Centro e Alentejo

  14. O mesmo se diga, agora de forma mais sucinta no que tange ao argumento da violação do disposto no art. 41. do RJUE, dado que o Acórdão recorrido adaptou o que veio a ser jurisprudencialmente determinado - e que, no entendimento do aqui Réu, com excepção do entendimento do Recorrente ainda se vem mantendo unânime - designadamente o Ac. do STA de 09.06.2010, proc. n. 0227/10, anexo à decisão em crise e dela fazendo parte integrante

  15. Inexiste qualquer violação do RJUE, pelo que as deliberações em crise não padecem de qualquer invalidade, devendo improceder o Recurso apresentado pelo Ministério Público

    * Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência. * Para decidir, este tribunal tem omnipresente a nossa Constituição, como (i) síntese da ideia-valor de Direito vigente, cujo (ii) modelo político é de natureza ético-humanista e cujo (iii) modelo económico é o da economia social de mercado, amparado no Direito. Consideramos as três dimensões do Direito como ciência do conhecimento prático - por referência à ação humana e ao dever-ser inspirador das leis -, quais sejam, (i) a dimensão factual social - que influencia muito e continuamente o direito legislado através das janelas de um sistema jurídico uno e real, (ii) a dimensão ética e seus princípios práticos - que influenciam o direito objetivo também através das janelas do sistema jurídico - e, a jusante, (iii) a dimensão normativa e seus princípios prático-jurídicos. * DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO...

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