Acórdão nº 13662/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO ELSA …………………… intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa ação administrativa especial contra MINISTÉRIO DA JUSTIÇA

O pedido formulado foi o seguinte: - Anulação do despacho da Ministra da Justiça que indeferiu o pedido de concessão de nacionalidade portuguesa por naturalização efetuado pela A. nos termos do nº 6 do Art.° 6° da Lei nº 37/81, de 3 de outubro, na redação da Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de abril. Por sentença de 03-11-2015, o referido tribunal veio a prolatar decisão, onde absolveu o réu do pedido

* Inconformada com tal decisão, a autora interpôs o presente recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: A. A presente reclamação é interposta como manifestação da insatisfação e não concordância, por parte da ora Reclamante, perante a sentença que julgou improcedente a presente ação administrativa especial

B. A Reclamante formulou pedido de nacionalidade por naturalização, ao abrigo do artigo 6.º, n.º 6 da Lei da Nacionalidade

  1. O juiz relator secundou a decisão de indeferimento da Exma. Ministra da Justiça

D. Entendeu assim que enquanto que nos casos previstos na n.º 1 do Art.º 6º da Lei da Nacionalidade, estamos perante o exercício de um poder vinculado, desde que cumulativamente verificados os requisitos aí elencados, nos casos previstos no n.º 6 do Art.º 6º da Lei da Nacionalidade, a lei utiliza a formulação “pode conceder”. Pelo que, a norma não vincula o órgão competente à atribuição da nacionalidade, antes lhe confere uma (ampla) margem de discricionariedade na apreciação dos pressupostos da concessão da nacionalidade por naturalização

E

Que a Reclamante apesar de ter nascido em Angola em 1970, quando este território ainda era português, perdeu a nacionalidade portuguesa aquando da independência de Angola em 11 de novembro de 1975, por não reunir os requisitos exigidos pelo Decreto-Lei n.º 308-A/75, de 24 de junho e nos termos do art.º 4.º deste diploma

F

Bem como que apesar da Reclamante ter nascido em 1970, apenas foi registada em 1977, após a independência de Angola, pelo que perdeu, nos termos do Art.º 4º do Decreto-Lei n.º 308-A/75, de 24 de junho, a nacionalidade portuguesa

G. Alegou ainda que o Art.º 14.º da Lei da Nacionalidade estabelece que “Só a filiação estabelecida durante a menoridade produz efeitos relativamente à nacionalidade.” e que no caso em apreço, ainda que a Reclamante tivesse sido registada ainda durante a sua menoridade, nada constava quanto ao estabelecimento da sua filiação paterna, pois o registo de nascimento foi lavrado por declarações da sua mãe, Balbina ……………, sem a intervenção do Roque ……………………, que a Reclamante identifica como seu pai

H

Por outro lado, alega ainda que à data do seu nascimento, Balbina ……………. e Roque ………….. ainda não haviam contraído matrimónio, o que viria a acontecer em 26 de junho de 1971 e ainda ao facto de Roque ……………. não ter participado no ato de registo da Reclamante, e bem ainda que dos autos não consta qualquer documento pelo qual Roque de Jesus Sequeira reconheça a paternidade da mesma, não se encontrando provado que a esta seja descendente de cidadão nacional

I. Conclui ainda que não constava evidência nos autos que alguma vez a Reclamante tenha residido habitualmente em Portugal, que não constava nos autos quaisquer outros elementos relevantes de ligação a Portugal que não sejam a sua ligação familiar aos seus irmãos, cidadãos nacionais portugueses, naturais de Angola, bem como que o tribunal não vislumbrou qualquer erro na subsunção da situação fáctica às normas de direito aplicáveis, que conduzisse a que a decisão da Ministra da Justiça padecesse de uma notória falta de consideração de qualquer elemento que seja essencialmente relevante que justificasse a derrogação do requisito exigido pelas alínea b) do n.º 1 do Art.º 6 da Lei da Nacionalidade, e, consequentemente, a atribuição da nacionalidade portuguesa por naturalização nos termos do n.º 6 do mesmo artigo

J. A Reclamante, salvo o devido respeito, não poderia estar mais em desacordo com a fundamentação em que se ancorou o juiz relator

K. Contrariamente ao alegado, a Reclamante entende preencher todos os requisitos legalmente estabelecidos para a aquisição da nacionalidade por naturalização, ao abrigo do artigo 6.º, n.º 6 da Lei da Nacionalidade, bem como ter feito prova suficiente da sua efetiva ligação à comunidade portuguesa. Veja-se, L

A Reclamante é maior

M

Não tem qualquer condenação criminal

N

É filha e neta de cidadão nacional

O. Efetivamente, nasceu em Angola em 23 de novembro de 1970, em território, então, português, pelo que, a Autora teve, inegavelmente, nacionalidade portuguesa durante um período de aproximadamente 5 (cinco) anos

P. Apesar de só ter sido registada no ano de 1977, pela sua mãe, Balbina …………………, ainda na sua menoridade, à data já os seus pais já haviam contraído matrimónio

Q. Ainda que a Autora não tenha certidão de nascimento lavrada antes da independência de Angola, a verdade é que tem uma certidão de nascimento lavrada na sua menoridade

R. Acresce que é oriunda de um país de ascendência portuguesa (PALOP), in casu, Angola

S. Tendo formado a sua personalidade quando Angola ainda tinha fortemente enrizadas as tradições e costumes portugueses

T

Ora, é facto notório e, por isso, de conhecimento público, que a língua oficial da Angola é a língua portuguesa

U

A Reclamante sempre frequentou o ensino escolar lecionado em Português

V. Sendo que diariamente fala e escreve em português

W. Contactando ainda com frequência com cidadãos portugueses com quem fala única e exclusivamente em português

X. Sendo assim manifesto o domínio da língua portuguesa

Y

Aliás, sendo filha de cidadão nacional, foram-lhe incutidos hábitos relacionados com a cultura portuguesa

Z. Ademais, é conhecedora da geografia portuguesa, história de Portugal, interessa-se pelos usos, costumes e pela sociedade portuguesa

AA

A Reclamante conhece ainda os símbolos nacionais, designadamente, a Bandeira Nacional e A Portuguesa, bem como os monumentos mais emblemáticos

BB. Conhecendo e sendo apreciadora da gastronomia tipicamente portuguesa

CC

A Reclamante tem um forte sentimento de pertença à Comunidade Portuguesa

DD

Até porque os seus familiares mais próximos, inclusivamente a sua filha, são portugueses

EE. Resultando, pois, à saciedade que a Reclamante tem um forte sentimento de pertença perene à comunidade portuguesa

FF. Sendo ainda de referir que a Reclamante padece de vários problemas de saúde, nomeadamente, a hepatite C, bem como sofre de algumas limitações por ser cega de um olho e surda

GG. Contudo, a sua inserção na comunidade portuguesa só será plena caso lhe seja concedida a nacionalidade que tanto almeja

HH. Dispõe o artigo 6.º n.º 6 da Lei da Nacionalidade que: «O Governo pode conceder a naturalização, com dispensa dos requisitos previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1, aos indivíduos que, não sendo apátridas, tenham tido a nacionalidade portuguesa, aos que forem havidos como descendentes de portugueses, aos membros de comunidades de ascendência portuguesa e aos estrangeiros que tenham prestado ou sejam chamados a prestar serviços relevantes ao Estado Português ou à comunidade nacional.» II

Na verdade, não resulta da lei qualquer limitação à concessão da dispensa do requisito constante na alínea b) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei da Nacionalidade, em virtude do estabelecimento da filiação na maioridade

JJ

A Lei da Nacionalidade não dispõe de qualquer exigência, na naturalização, relativamente ao estabelecimento da filiação na menoridade quanto à ascendência portuguesa, tão-somente refere que «O Governo pode conceder a naturalização com dispensa dos requisitos previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1 (…) aos que forem havidos como descendentes de português (…)» e KK

Bem assim, o Regulamento da Nacionalidade, no seu artigo 24.º n.º 1 quando apenas refere que «O Governo pode conceder a nacionalidade portuguesa (…) aos que forem havidos como descendentes de portugueses (…)». LL. Como resulta – e bem, a nosso ver – da sentença proferida, a 22 de Novembro de 2008, no âmbito do processo n.º 709/08.0BESNT, que correu termos junto da 1.ª Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra: «A lei não distingue, sendo certo que a interpretação conferida pela Administração traduz-se numa interpretação restritiva da lei, já que pelo menos quanto ao elemento literal da norma jurídica basta que sejam descendentes de portugueses – (…) – para poder ser concedida a naturalização.» MM

De facto, a epígrafe do artigo é «Casos especiais em que pode ser concedida a naturalização». NN

Mas este regime excecional pretende, justamente, beneficiar e salvaguardar a possibilidade dos que, não sendo apátridas, tenham tido a nacionalidade portuguesa, aos que forem havidos como descendentes de portugueses, aos membros de comunidades de ascendência portuguesa e aos estrangeiros que tenham prestado ou sejam chamados a prestar serviços relevantes ao Estado português ou à comunidade nacional, requererem a nacionalidade portuguesa por naturalização, com base nesses mesmos fundamentos

OO

Se, in casu, não se aplica a mencionada disposição, então em que...

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