Acórdão nº 09021/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelCATARINA ALMEIDA E SOUSA
Data da Resolução19 de Setembro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul 1 – RELATÓRIO A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a oposição deduzida por S...

ao processo de execução fiscal nº ... e apensos, instaurado no Serviço de Finanças de ..., por reversão de dívidas de IVA, IRC e coimas da devedora originária A..., LDA.

, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional.

Formula, para tanto, as seguintes conclusões: “1º- A douta decisão de que se recorre não traduz uma correcta valoração e interpretação da matéria fáctica dada como provada, nem tão pouco uma correcta interpretação e aplicação da lei e do direito atinentes, em prejuízo da apelante. Na verdade, 2º- Face aos factos assentes entendeu o tribunal "a quo" que não se provou a gerência de facto do ora oponente.

  1. - No seguimento do que vai dito retro, concluiu o tribunal “a quo" pela procedência da oposição, com as consequências legais daí advientes.

  2. - Ora, relativamente à questão controvertida, a prova do exercício da gerência de facto, entendeu o respeitoso tribunal a quo que o Oponente se limitou a outorgar uma procuração a favor da sociedade de advogados, com vista à constituição de uma sociedade comercial sediada em Portugal, constituiu um acto isolado e não reiterado de exercício da gerência de facto, 5º- Discordamos frontalmente da asserção retro transcrita e expendida pelo respeitoso tribunal a quo.

  3. - Efectivamente, de acordo com os elementos probatórios juntos aos autos e conforme firmado no ponto n°64 da douta p.i., o oponente para além de passar procuração à sociedade de advogados para constituição da sociedade devedora originária, emitiu em nome da antedita sociedade uma procuração em 13.12.2000 a favor do referido Sr. S... para movimentação de conta bancária no Banco ... no Luxemburgo, tendo inclusive, procedido à abertura da mencionada conta.

  4. - Ora, resulta de forma clara e notória dos autos que o Oponente integrava a gerência da sociedade devedora originária no período relevante, encontrando-se tal facto devidamente demonstrado no pacto social e na certidão da Conservatória do Registo Comercial.

  5. - Tendo em conta a procuração emitida, tal facto essencial deve ser compaginado no sentido de que os poderes que o Sr. S... exerceu lhe foram conferidos Oponente, mediante mandato.

  6. - Com efeito, conforme ensinamento de Almeida Costa (in Noções Direito Civil, ed. de 1980 pag, 273), o mandato é o contrato mediante o qual um dos contraentes (o mandatário) se obriga a realizar um dos diversos actos jurídicos por conta do outro (mandante) considerando Mota Pinto que (in Teoria Geral de Direito Civil, 3ª ed. pag. 537), por força desse negócio jurídico, o mandatário pratica os actos em nome, no interesse e por conta da mandante (veja-se ainda Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, 1°-114).

  7. - Na mesma esteira e nos termos do disposto no art.405° do Código Civil e reiterado no entendimento vertido pelos Profs. A, Varela e P. Lima (in Código Civil Anotado, 1, 4ª ed, pag. 355), bem como pelo Prof. A. Costa (in Direito das Obrigações, 4ª ed,, pags. 153 e 157), "contractos" provém de "negotium contrahere", reflectindo precisamente aquilo a que actualmente se pode chamar o auto - governo jurídico inter-individual, na medida em que a lei constituída permite e estimula o exercício da liberdade da regulamentação da esfera jurídica privada, ressalvados que sejam princípios de interesse geral, 11º- Neste pendor, o mandato é, assim, o contrato estabelecido entre quem encarrega outrem de praticar um ou mais actos jurídicos «por conta» do mandante, e quem aceita essa obrigação é o mandatário (art. 1157° do Código Civil).

  8. - Nessa óptica, o Oponente tendo passado procuração ao Sr. S... para o representar na gestão da sociedade e no movimento da conta bancária, juridicamente, tudo se passa como se fosse o próprio mandante a realizar o acto ou actos jurídicos para cuja prática o mandato fora outorgado (veja-se a este propósito o Acórdão proferido peio TCAS referente ao Proc. n°00081/04 datado de 12.10.2004).

  9. - Neste pendor, conforme sufragado pelo Acórdão do TCAS de 19,04.2005 Proc. n°0041/04 aos gerentes nomeados que, voluntariamente, consentem que outrem em seu nome pratique a generalidade dos actos necessários ao giro comercial da sociedade e a quem o terceiro presta contas, tais actos praticados pelo representante repercutem-se na esfera jurídica dos representados, como se por estes fossem praticados; Neste caso e no âmbito desses poderes, gerente são os representados e não o representante que exerce de facto tais poderes." 14º- Assim, dúvidas não restam, de que a procuração emitida para a representação do oponente na gestão da sociedade e na movimentação da conta bancária, traduzem o acordo juridicamente qualificável como de mandato com representação assumido e com base o Sr. S... agiu em nome e no interesse do Oponente.

  10. - Ou seja, foi pelo Oponente transferido voluntariamente, poderes de gerência que o pacto lhe atribuía à luz da lei, para a esfera de outrem, o qual exerceu a gerência em nome e no interesse daquele, tendo no período em que vigorou tal situação, sido praticados actos de gerência produtores de efeitos na esfera jurídica do representado, subsumindo-se a um mandato com representação, nos termos do qual os actos do representante produzem os seus efeitos na esfera jurídica do representado - gerente (arte. 258° e 1178°, n° 1 C. Civil).

  11. - Face ao que vai dito, o Oponente é responsável pela dívida por ter exercido no ano em causa, nos termos fixados, a gerência de facto, subsistindo o pressuposto de culpa funcional em que assenta a sua pretendida responsabilização por tais dívidas.

  12. - Sem prescindir, ainda que não se relevem os argumentos invocados, o que somente por mera hipótese académica se admite, cumpre reiterar que no âmbito dos elementos probatórios juntos aos autos, consta-se que pela Declaração de Início de actividade, a qual foi assinada na qualidade de sujeito passivo ou de seu representante legal.

  13. - Na mesma esteira, e no que contende às declarações periódicas do IVA, resulta inequivocamente que atento à assinatura aposta na Declaração de início de actividades é, manifestamente, idêntica com a assinatura constante nas declarações periódicas de IVA (v.d. declarações periódicas de IVA junto aos autos de doc. 2 a doc. 9), reiterando-se desta forma que assinadas foram, na qualidade de representante legal do Oponente, dando-nos indícios sérios da prática de actos de gerência na antedita sociedade pelo Oponente, através do seu representante legal.

  14. - No entanto, tais documentos não foram alvo de análise crítica da prova, pelo que tal consubstancia nulidade que aqui expressamente para todos os efeitos legais.

  15. - Mais, quanto à gerência, visualizando a certidão da Conservatória do Registo Comercial, junta aos autos, verifica-se que o gerente designado foi única e exclusivamente o Oponente, sendo que, no que contende à forma de obrigar da sociedade, esta obrigava-se mediante a assinatura do gerente ou procurador.

  16. - Assim, tal facto deve ser acrescido aos factos provados, máxime que resulta do pacto social que o oponente é o único gerente nomeado, sendo a forma de obrigar a sociedade a assinatura do único gerente, 22º- Ora, no âmbito do pacto social resulta inequivocamente que a sociedade se obriga com a assinatura única e exclusiva do Oponente ou de um procurador, resultando tal facto de igual forma da Declaração de Inicio de actividade.

  17. - Importa chamar à colação o Acórdão do TCA Sul, n°06732/13, de 31-10-2013: "(…) levando em consideração que o oponente era o único gerente da empresa e que a sua assinatura obrigava a mesma, legítimo será presumir (presunção judicial baseada nas regras da experiência - artº.351, do C.Civil) o exercício continuado dos poderes de administração e representação de que era titular face à mesma sociedade (cfr..ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção,18/6/2013, proc.6565/13)." 24º- Continuando: "Aqui chegados, deve concluir-se que, no caso concreto, a Fazenda Pública estava legitimada para operar o mecanismo de reversão por responsabilidade subsidiária do opoente, ao abrigo do artº.24, nº1, da L.G.T., perante a verificação da gerência de facto, ou seja, do exercício real e efectivo do cargo por parte do mesmo (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 11/3/2009, rec.709/08; ac.T.C.A.Sul -2ªSecção,27/11/2012, proc.5979/12".

  18. - Destarte, a quanto alegado se deixa reiterado, claro e inequívoco resulta, que sendo o ora oponente o única gerente, e no seguimento do entendimento dos nossos Tribunais Superiores, é legítima a reversão, 26º- Face a tudo quanto vai dito, as vicissitudes elencadas, estão comprovadas, e referenciadas, não tendo sido devidamente relevadas pelo Tribunal a quo, pois que, a tê-lo sido, o itinerário decisório a implementar pelo respectivo areópago de certo que teria sido outro.

  19. - Outrossim, decidindo como decidiu, o Tribunal a quo não apreciou correctamente a prova produzida e que faz parte do processo, fazendo, por isso, errada aplicação das normas legais supra vazadas.

  20. - Por conseguinte, salvo o devido respeito, que muito é, o Tribunal a quo, lavrou em erro de interpretação e aplicação do direito e dos factos, nos termos supra explanados, assim como não considerou nem valorizou como se impunha a prova documental que faz parte dos autos em apreço.

  21. - Com o devido respeito, que muito é, decidindo como decidiu, o Tribunal a quo não apreciou correctamente a prova produzida e que faz parte do processo, fazendo, por isso, errada aplicação das normas legais supra vazadas, 30º- Não o entendendo assim, a douta sentença em recurso violou os preceitos legais invocados na mesma, peio que, deverá ser revogada, com todas as legais consequências devidas.

TERMOS EM QUE, Deve ser admitido o presente recurso e revogada a douta decisão da primeira instância, substituindo-a por outra que...

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