Acórdão nº 10242/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelHELENA CANELAS
Data da Resolução24 de Novembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO Domingos ………………… e Maria ………………… (devidamente identificados nos autos), autores na Ação Administrativa Comum que instauraram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (Proc. nº 609/10.4BELLE) em que é réu o ESTADO PORTUGUÊS – na qual peticionaram a condenação no pagamento de 59.321,96 € a título de danos patrimoniais, imputando ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que havia sido nomeado depositário por via judicial da Vivenda ………………….., sita em ……….., freguesia de …….., Olhão, e de que são proprietários, os danos alegados – inconformados com a sentença de 26/12/2012 (fls. 298 ss.

) do Tribunal a quo que julgando a ação improcedente, absolveu o Estado Português do pedido, vêm dela interpor o presente recurso, pugnando pela sua revogação.

Formulam as seguintes conclusões, nos seguintes termos: 1. A matéria dos n.ºs 27.º, 28.º, 29.º, 35.º, 36.º, 37.º, 38.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º e 46.º da petição deve acrescer à que vem dada por adquirida, visto a declaração da réplica do desconhecimento da sua existência implicar a sua aceitação, nos termos do disposto no art.º 490.º, n.º 3, do Código de Processo Civil; 2. A culpa do réu presume-se “de juris”, à luz do disposto nos art.ºs 342.º e 483.º, n.º 1 do Código Civil; 3. Ao efectuar a colocação de selos no prédio, vedando, automaticamente, aos autores a entrada e a disponibilidade dos móveis apreendidos no seu interior, o réu constituiu-se guardião desses bens e responsável pela sua manutenção e integridade; 4. O réu não provou (nem alegou) que tinha o portão, permanentemente, trancado, sendo de admitir o contrário pela frequência e sem cerimónia com que estranhos entravam nele para roubar e pernoitar; 5. O réu não efectuou o inventário dos bens que apreendeu ao proceder à diligência de aposição de selos, como lhe impunha o disposto nos art.ºs 184.º e 172.º, n.º 2 do Código de Processo Penal; 6. Os roubos de móveis e depredações do imóvel foram extensos, repetidos, demorados, estrepitosos e ostensivos, pelo que teriam sido evitados por qualquer detentor desses bens minimamente zeloso; 7. Com as limitações inerentes à impossibilidade de entrada no prédio, ainda foi o autor quem procurou minimizar os danos, convocando a GNR, numa conjuntura em que se apercebeu da destruição dos selos da porta exterior; 8. O réu sabia, por ser a sua actuação que implicou a saída da inquilina, que esta (pelo menos) detinha as chaves do prédio, pelo que, se demonstrasse algum zelo, teria mudado as fechaduras, o que não fez — nem, aliás, alegou que o tivesse feito, sem embargo da presunção legal da sua culpa; 9. Pela prática de acto ilícito (omissão da relação dos bens apreendidos na diligência de aposição de selos), pela inópia de zelo e pela culpa “in vigilando”, presumida no n.º 3 do art.º 10.º da Lei n.º 67/2007, pode ser afirmada a culpa do réu; 10. Pela infracção de regras técnicas e falta aos deveres objectivos de cuidados, dos quais advieram prejuízos para os autores, infere-se a ilicitude configurada no art.º 9.º, n.º 1, seta Lei; 11. Os autores sofreram os prejuízos enormes que enformam a matéria dos factos provados e dos que deveriam ter sido dados por assentes (pela falta de impugnação) e não foram; 12. Estes prejuízos constituem efeito da acção ilegal e negligente do réu que ficou referida, sem a qual não teriam ocorrido.

O recorrido ESTADO PORTUGUÊS contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da sentença recorrida, concluindo formulando o seguinte quadro conclusivo: I. Os pretensos factos constantes dos n.º 27.º, 28.º, 29.º, 35.º, 36.º, 37.º, 38.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º e 46.º da petição inicial não podem ser levados à matéria de facto assente; II. Quer porque muito do ali alegado não se traduz em factos, mas sim em meras opiniões, juízos de valor ou conclusões; III. Quer porque tais factos apenas podem ser tidos por factos pessoais ou de que deva ter conhecimento na perspectiva dos AA., pois que os mesmos se traduzem em afirmações de ciência dos próprios AA..

  1. O depositário tomou todas e quaisquer cautelas que um diligente pai de família tomaria para assegurar a segurança do imóvel, nomeadamente, procedendo ao encerramento de todas as portas, janelas e portões, com as respectivas trancas e fechaduras e, ainda, com aposição de correntes e cadeados e selos de apreensão.

  2. Os actos de vandalismo verificados no imóvel dos AA. foram perpetrados por terceiros desconhecidos, com arrombamento das correntes e cadeados apostos, bem como das fechaduras e trincos das portas, janelas e portões e violação dos selos apostos.

  3. Pelo que inexiste facto ilícito culposo e, consequentemente, fica impossibilitada a verificação de outro pressuposto da obrigação de indemnizar que é o nexo de causalidade entre o facto (ilícito e culposo) e o dano.

  4. O Réu não pode ser responsabilizado pelos estragos praticados por terceiros, pois que, a ser assim, tal mais não seria que uma espécie de responsabilidade objectiva, sendo que da lei decorre apenas a responsabilidade do Estado por factos ilícitos e culposos praticados pelos seus órgãos ou agentes.

    Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

  5. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 660º nº 2, 664º, 684º nºs 3 e 4 e 690º do CPC antigo (correspondentes aos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo, aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.

    No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pelos recorrentes as conclusões de recurso, vêm colocadas a este Tribunal as seguintes questões essenciais: - saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto, em termos que a matéria elencada pelos autores nos artigos 27.º, 28.º, 29.º, 35.º, 36.º, 37.º, 38.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º e 46.º da Petição Inicial devem ser dados como assentes – (conclusão 1ª das alegações de recurso); - saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, quanto à solução jurídica da causa, em termos que ao invés de ter sido decidida a improcedência da ação, devia a mesma ter procedido, com condenação do ESTADO PORTUGUÊS a pagar aos autores a indemnização peticionada – (conclusões 2ª a 12ª das alegações de recurso).

    * III. FUNDAMENTAÇÃO A – De facto O Tribunal a quo assentou a decisão recorrida na seguinte factualidade, vertida na sentença recorrida nos seguintes termos, ipsis verbis: aa) Da Matéria de Facto Assente A) Os Autores são donos do prédio urbano, sito em ……….., freguesia de …….., concelho de Olhão, inscrito na respectiva matriz sob o artigo urbano . e descrito na Conservatória do Registo Predial de Olhão sob o n° …………. (cfr doc nº 1 da pi); B) Na sequência dos Serviços do Ministério Público do Tribunal Judicial da Comarca de Olhão da Restauração terem determinado “a substituição do fiel depositário SEF para os proprietários do referido imóvel – Domingos ………………..e esposa”, em 2008.11.19, procedeu-se à entrega das chaves do referido prédio urbano, sito em ............., freguesia de ............., concelho de Olhão, a estes depositários (cfr doc° n° 4 da pi); C) Rutilea …………………. foi alvo de uma acção inspectiva pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e detida com outras pessoas, em flagrante delito, pela prática dos crimes de lenocínio e imigração ilegal (por acordo); D) O prédio dos Autores foi então confiado ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (por acordo); E) Que ficou incumbido de selar o imóvel (por acordo); F) De proceder ao seu encerramento, conservação, administração e vigilância e de todo o seu recheio (por acordo); G) O referido prédio era vedado por um gradeamento alto e de ferro (por acordo); H) Ao qual se podia aceder através de dois portões altos em ferro (por acordo); I) Um deles destinado à entrada de pessoas (por acordo); J) O outro destinado à entrada de veículos automóveis (por acordo); K) Ambos os portões possuíam fechaduras em bom estado de funcionamento (por acordo); L) A moradia possuía várias portas de acesso, todas em ferro com fechaduras em bom estado de funcionamento (por acordo); M) As janelas da moradia possuíam fechos em bom estado de funcionamento (por acordo); N) Fotografia da moradia dos Autores na qual se pode ver designadamente o portão de acesso à garagem e um porta mais pequeno (cfr doc º 2 da pi); O) Fotografia da moradia dos Autores na qual se pode ver designadamente o portão de acesso à garagem e um porta mais pequeno (cfr doc nº 3 da pi); P) Nos termos da Certidão emitida em 2011.10.03 pelos Serviços do Ministério Público de Olhão, pode ler-se designadamente no Auto de Notícia lavrado em 2008.09.20 que nessa data foi “comunicado via rádio para nos deslocarmos ao Caminho das ……, ,…………. ............. – Olhão, em virtude de o proprietário da casa …………… se encontrar à porta da sua propriedade e a mesma ter o portão de entrada com o cadeado cortado. (…) Já dentro do quintal junto à piscina nas traseiras, foi verificado uma porta aberta que dava acesso à cozinha e que tinha os selos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras cortados, foi então que verifiquei que encontravam-se dois indivíduos no interior da casa, nomeadamente num dos quartos” (cfr doc nº 1 junto com a contestação); Q) Na casa foram perpetrados furtos por indivíduos cuja identidade se desconhece (por acordo); R) A Factura de 2008.11.27 emitida por ‘…………………, em nome do 1º Autor, é de 1.719.91€ (cfr doc° n° 6 da pi); S) O Orçamento emitido por ‘…………….’, em 2009.02.06, é de 1.698.25€ (doc nº 7 da pi); T) O Orçamento emitido por ‘…………’, em 2008.03.08, é de 2.198,40€ (doc nº 8 da pi); U) A Venda a Dinheiro nº 11467 emitida por ‘………………’, em 2008.12,27, é de 11,65€...

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