Acórdão nº 13406/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelNUNO COUTINHO
Data da Resolução14 de Julho de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – Relatório Ana ………………. requereu contra a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários providência cautelar na qual formulou as seguintes pretensões cautelares: a) ser “reconhecida provisoriamente pelo Tribunal a manifesta ilegalidade praticada pela requerida CMVM e contra-interessada ao recusar a alienação potestativa das acções remanescentes da ESS, de que é titular a requerente”; b) ser a contra-interessada F.................. condenada a reparar provisoriamente a Requerida no montante de 35.000,00 € (trinta e cinco mil euros) a título de contrapartida relativa à alienação potestativa das 90.786 acções de que é titular ou, em alternativa, a título de reparação de danos morais e materiais que toda esta situação vem provocando à Requerente.

Por decisão proferida em 15 de Março de 2016, o T.A.F. de Loulé indeferiu a pretensão cautelar formulada.

Inconformado com o decidido, a requerente recorreu para este TCA Sul, tendo formulado as seguintes conclusões: “1) A alínea a) da douta decisão proferida, que se impugnada desde já, julgou improcedente o presente processo cautelar e, consequentemente recusou as providências cautelares requeridas.

2) A ora Recorrente não concorda com tal parte da decisão - a alínea a) da douta Sentença proferida - por entender que a mesma faz uma errónea apreciação da matéria de direito, por violação do disposto nos artigos conjugados números 112.º/1, 118.º, 119.º e 120.º/1 alínea a, c), n.º 2, todos do CPTA., artigo 196.º do Cód. V. M. e artigo 607.º/3/4 do CPC.

3) Logo da mesma recorre, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 149.º do CPTA e 639.º do CPC.

4) O Tribunal a quo para proferir tal decisão, baseou-se no seguinte: a) não preenchimento do disposto na alínea a) do artigo 120.º/1 do CPTA., ou seja, em sede de juízo meramente perfunctório, ter resultado alegadamente não se apurar que a ilegalidade invocada se revele ''flagrante", ''palmar" e "capaz de convencer primo conspecto, e sem necessidade de um laborioso discurso coadjuvante, da procedência da acção principal" e b) no alegado não preenchimento do requisito do periculum in mora, que se traduz na existência de um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que um determinado Requerente visa assegurar no processo principal, presente da alínea c) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 120.º do CPTA.

5) Sucede que, ao contrário do decidido pelo douto Tribunal a quo, entende a ora Recorrente estarem preenchidos ambos os pressupostos.

6) Quanto à alínea a) do artigo 120.º/1 do CPTA. é ostensivo e evidente o direito da ora Recorrente à alienação potestativa das 90.786 ações remanescentes da ESS. que detém na OPA. lançada sobre a F...................

7) Pois que cumpriu a mesma, os formalismos exigidos para a alienação potestativa, constantes no artigo 196.º do Código de Valores Mobiliários, o que aliás resultou como factos assentes nos pontos k) a t) da matéria de facto constante na douta Sentença que ora se recorre.

8) O artigo 196.º do Cód V. M. teve até hoje sempre a mesma interpretação, sendo o seu conteúdo literal e o seu espirito de fácil apreensão.

9) A Recorrida CMVM e a Contra Interessada F.................. apenas nesta data colocaram em causa a interpretação da presente norma, de modo a restringir o exercício do direito de alienação potestativa apenas a acionistas que à data do apuramento dos resultados da OPA., mantivessem a titularidade das acções da sociedade visada.

10) Entendimento que tais entidades não sufragavam anteriormente, e que vai contra normas equivalentes no direito estrangeiro, bem como contra a larga doutrina estrangeira, assim como jutisprudência supra nacional sobre a matéria.

11) Tal manifestação de opinião ou entendimento, agora levado a cabo pela ora Recorrida e Contra Interessada, não pode só por si servir de base para ser colocada em causa interpretação de uma norma jurídica, que possui já trilhado uso nos mercados financeiros.

12) Tal opinião sufragada viola ostensivamente o princípio da igualdade de tratamento e o princípio da segurança jurídica entre os acionistas minoritários, que pelas mais diversas causas (p.e. morte, partilha, compensação, dação em pagamento, doação, etc.) poderiam transmitir a titularidade das ações e segundo tal entendimento também não teriam direito à alineação potestativa.

13) Bem como, tal posição é contrária ao espírito da lei e manifestamente ilegítima porque perante situações análogas, opera diferente tratamento, designadamente privilegiando-se determinados acionistas relativamente a outros, pese embora se encontrem em condições equivalentes.

14) O princípio geral de igualdade de tratamento exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, exceto se esse tratamento for objetivamente justificado, o que é manifestamente o caso.

15) Qualquer operação nos mercados de valores [mobiliários] implicará o respeito, não apenas pela letra, mas igualmente pelo espírito das disposições legais ou regulamentares em vigor em cada Estado, bem como pelos princípios de boa conduta, em uso nos ditos mercados ou os recomendados para esse efeito.

16) Se determinadas normas apontam para uma única interpretação como possível, a mesma não pode ser posta em causa, por simples oposição a essa mesma interpretação, como pretende a ora Recorrida CMVM. nos autos fazer.

17) As diversas normas, designadamente os art.º 15.º e 16.º da Diretiva 2004/25/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho de 21 de Abril de 2004, o art.º 194.º do Cód.V.M., assim como o número 24 dos Considerandos da Diretiva das OPA's apontam o direito de alienação potestativa como um direito simétrico da aquisição potestativa.

18) Até porque tal análise, sumariamente, se pode estruturar em quatro rápidos e inequívocos pontos.

19) Nomeadamente, 1. Se for reconhecido à Oferente numa Oferta Pública de Aquisição o direito a exercer a aquisição potestativa sobre os titulares das ações remanescentes adquiridas depois de concluída a dita Oferta Pública de Aquisição e ao mesmo tempo recusado o reconhecimento do direito simétrico a exercer a alienação potestativa a esses mesmos titulares das ações remanescentes adquiridas depois de concluída a dita Oferta Pública de Aquisição, coloca-se em causa os princípios constitucionais na perspetiva da necessidade e adequação e, especialmente, na perspetiva do equilíbrio/igualdade e proporcionalidade o que ditaria a inconstitucionalidade da norma de aquisição potestativa, tanto na vertente jus-mobiliária, como jus-societária.

20) 2. Por outro lado, se o direito de alienação potestativa for recusado aos titulares das ações remanescentes adquiridas depois de concluída uma Oferta Pública de Aquisição e, simetricamente, de forma a garantir os princípios constitucionalmente consagrados de proporcionalidade, equilibro/igualdade, adequação e necessidade, fosse também recusado à Oferente numa Oferta Pública de Aquisição deitar mão ao direito de aquisição potestativa sobre as mesmas ações remanescentes adquiridas pelos seus titulares depois de concluída uma Oferta Pública, então ambas as normas seriam também deitadas à inconstitucionalidade, simplesmente porque deixariam de cumprir objetivo que a constitucionalidade das mesmas lhe atraca.

21)3. É inequívoco que o exercício do direito de alienação potestativa é inerente aos valores mobiliários, titulados ao portador, e que nos termos do artigo 104.º, n.º1 do Cód.VM, goza da presunção juris et de jure decorrente da existência do registo da titularidade dos valores mobiliários a favor dos titulares das mesmas, independentemente da data da respetiva aquisição (Cfr. artigo 78.º, n.º 2 do Cód.VM), sendo que o normativo em apreço constitui uma norma incontroversa, pois resulta claro "que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados" (cfr. artigo 9.º, n.º 3 do CC), prova disso é o facto de no prospeto da OPA nenhuma informação constar sobre tal direito, pelo que qualquer interpretação diversa ao expresso perfeitamente na norma acarretaria uma deturpação sobre o risco económico-jurídico propiciado pelo investimento em valores mobiliário.

22) 4. E a eventual oportunidade dos investidores que comprem as ações remanescentes depois de finda a Oferta Pública de Aquisição e possam exercer nesses termos a alienação potestativa é exatamente igual (proporcional e equilibrada) à oportunidade que a Oferente que lançou a Oferta Pública de Aquisição comprar exactamente as mesmas acções remanescentes a igual preço, evitando assim os efeitos da alienação potestativa.

23) Ou seja, se por um lado os investidores podem comprar as ações remanescentes no mercado de valores mobiliários depois de finda a Oferta Pública de Aquisição e conhecendo a nova relação de forças societária e a obrigação e direito da Oferente aceitar a alienação potestativa e lançar a aquisição potestativa respetivamente, eventualmente, beneficiando de desconto face ao preço obrigatório para as ditas operações, também a Oferente pode comprar as mesmas ações remanescentes no mercado de valores mobiliários depois mobiliários depois de finda a Oferta Pública de Aquisição e conhecendo a nova relação de forças societária e a obrigação e direito a aceitar a alienação potestativa e lançar a aquisição potestativa respetivamente, beneficiando de igual modo do eventual desconto face ao preço que teria de pagar nas ditas operações.

24) Aliás se apenas o direito de alienação potestativa for cerceado, então vai-se assistir a um verdadeiro desequilibro no mercado de valores mobiliários e nas relações jurídicas, onde a oportunidade de comprar as ações remanescentes no mercado de valores mobiliários depois de finda a Oferta Pública de Aquisição é apenas conferida à Oferente.

25) Logo, não...

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