Acórdão nº 09484/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelCATARINA ALMEIDA E SOUSA
Data da Resolução09 de Junho de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Tatiana…, na qualidade de executada por reversão no processo de execução fiscal n.° … e apensos, a correr termos no Serviço de Finanças de …, instaurado originariamente contra a sociedade "N…, LDA.", nipc …, apresentou reclamação, nos termos do artigo 276.° e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), contra o despacho de 18.06.2015, proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de …, que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia.

Invocou, em suma, os seguintes fundamentos: • Violação do direito de audição prévia relativamente à decisão que recaiu sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia; • Violação do princípio do inquisitório, da eficiência, da celeridade e da investigação, por insuficiência de instrução do pedido de dispensa de prestação de garantia, tendo o órgão de execução fiscal indeferido a produção de prova testemunhal e, a final, concluído que não foi feita prova da verificação dos pressupostos para o deferimento do pedido; • Falta de fundamentação do despacho, em violação do disposto no artigo 77.º da Lei Geral Tributaria (LGT); • Erro quanto aos pressupostos de facto e de direito, porquanto se mostram verificados todos os requisitos dos quais a lei faz depender a isenção de prestação de garantia.

Terminou pedindo que a reclamação judicial fosse julgada procedente e, em consequência, fosse revogado o despacho reclamado.

* O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra julgou procedente a reclamação apresentada, anulando o despacho de 18.06.2015, proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Amadora 3, com fundamento em erro quanto aos pressupostos de facto e de direito em que assentou o acto sindicado.

Inconformada com tal sentença, a FAZENDA PÚBLICA, ora Recorrente, interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo (STA).

O STA declarou-se hierarquicamente incompetente para o conhecimento do recurso jurisdicional interposto e, conforme requerido, os autos foram remetidos a este TCA.

* No recurso interposto mostram-se formuladas as seguintes conclusões: I - Ressalvado o sempre devido respeito, com o desta forma decidido, não se conforma a Fazenda Publica, porquanto considera que o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, consubstanciado não só na incorrecta apreciação e valoração da matéria factual, como igualmente na errada interpretação dos preceitos legais convocados para sustentar a revogação do acto em crise nos autos.

II - Porquanto, o art. 52.°, n.° 4 da LGT, prevê que "a administração tributaria pode, a requerimento do executado, isenta-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência falta de bens penhoráveis para o pagamento da divida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.

III - Por sua vez, o art. 170.° n.° 3 do CPPT, regulamenta o procedimento de dispensa de prestação de garantia, consagrando que o pedido "deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária." IV - Por outro lado, o ónus da prova da verificação dos factos constitutivos dos direitos dos contribuintes recai sobre quem os invoque (art. 74.°, n.° 1 da LGT, art. 342.° do Código Civil), neste caso sobre a executada aqui recorrida.

V - Deste modo, o requerimento apresentado pela executada deveria estar devidamente fundamentado, tanto de facto como de direito, e instruído com toda a prova documental necessária para a apreciação da sua pretensão, ou seja, com todos os elementos documentais comprovativos da verificação dos pressupostos de que depende a concessão da dispensa (art. 170.°,n.°3 doCPPT).

VI - Com efeito, no que toca ao primeiro pressuposto alternativo para a concessão de dispensa de prestação de garantia ("no caso de a sua prestação causar prejuízo irreparável ao executado"), importa ter presente que a ponderação vertida na sentença recorrida julga verificado este pressuposto limitando-se a referir que "uma vez que não tendo bens ou créditos para dar de garantia, teria de recorrer a formas de garantia, tais como a garantia bancária, cujos custos seriam demasiado elevados considerando os seus parcos recursos económicos".

VII - Sucede, porém, que tal conclusão não é autorizada pela matéria factual dada como provada na sentença recorrida, pois que esta não só se baseia no rendimento de trabalho dependente da Reclamante e na sua propriedade de um imóvel para habitação onerado com uma hipoteca, omitindo toda e qualquer referência a outras componente normais do património de qualquer cidadão, designadamente a existência de depósitos bancários a prazo, mas também esta sentença não logra concretizar os custos que a prestação de garantia acarretaria.

VIII - Por outras palavras, a matéria factual dada como assente é parca com vista a fundamentar o prejuízo irreparável para a Reclamante da prestação de garantia, e tendo em atenção essa insuficiência de elementos que já era patente com a apresentação do requerimento para a dispensa de prestação de garantia junto do OEF, impôs-se que este concluísse: "De facto, não foi junto nenhum elemento onde conste alguma recusa por parte dos bancos em conceder tal garantia. [§] Inexistindo prova nos autos de que a executada tenha encetado diligências no sentido de obter uma garantia bancaria, ou de outra natureza, conducentes a fazer face aos mesmos. [§] Assim como inexiste prova nos autos de que as (eventuais) diligências encetadas pela executada, com vista a obter ou prestar garantia idónea, resultaram, sem responsabilidade da sua parte, infrutíferas. [§] Além do que, nada é dito em concreto sobre as despesas que acarretaria com a garantia bancária, pelo que não se pode avaliar o impacto que teria na sua situação económica e financeira. [§] Efetivamente, a executada deveria alegar e comprovar os eventuais prejuízos directamente decorrentes da prestação de garantia, designadamente o facto de os encargos a suportar com a sua constituição serem de tal forma avultados ao ponto de colocar em causa a sua capacidade de fazer face as suas obrigações, compromissos e subsistência. [§] Ora, não diligenciou no sentido de apurar e indicar, concretamente, qual o valor que teria de suportar com a emissão de uma garantia bancaria ou um financiamento, pelo que não se pode fazer corretamente um juízo de prognose sobre a existência de prejuízo irreparável".

IX - Mais ainda, quanto a este pressuposto, o despacho reclamado analisa a ocorrência de causalidade directa entre a prestação de garantia e o prejuízo irreparável, referindo que "deveria a executada indicar como e" que este se concretizaria, devendo, ainda, elencar as razoes que a levem a supor que existe uma séria probabilidade de tal prejuízo vir a ocorrer se não se vier a concretizar a dispensa de garantia", e por fim consta do mesmo despacho que "no caso em análise, a executada não se preocupa em diligenciar no sentido de apurar quais os efectivos prejuízos, que em termos de causalidade adequada, provavelmente lhe advirão da prestação de garantia, e que, sejam susceptíveis de serem qualificados como irreparáveis".

X - Tendo presente os factos dados como provados na sentença recorrida, a subsunção jurídica que deles faz o Juiz a quo, bem como o teor do despacho reclamado, fica patente que a sentença recorrida não esclarece o itinerário cognitivo que lhe permitiu dar por assente que aquele pressuposto se verificava no caso concreto, não sendo ainda capaz de contrariar de forma clara e perceptível a argumentação expendida pelo OEF no despacho de indeferimento. E não o fez porque a matéria de facto dada por assente não lhe permite concluir no sentido da verificação do prejuízo irreparável.

XI - Portanto, mal esteve o Tribunal a quo ao julgar verificado o pressuposto do "prejuízo irreparável” na medida em que não resulta dos autos qualquer facto provado que materialize a extensão dos prejuízos para a Reclamante na obtenção da garantia, e por outro lado, também não resultam dos autos elementos probatórios que possam justificar uma eventual irreparabilidade do prejuízo resultante da prestação de garantia.

XI - Por seu turno, o segundo pressuposto alternativo para a dispensa da prestação de garantia - a manifesta falta de meios económicos - não foi objecto de adequada ponderação pelo tribunal a quo., porquanto bastou-se com elementos probatórios escassos para justificar o seu preenchimento, designadamente o salario (915,00 € mensais/brutos), as despesas com o empréstimo a habitação (350,00 € mensais), com infantário, água, luz, gás, vestuário e alimentação da Reclamante e do filho menor.

XII - Limitou-se, assim, o Tribunal a quo a aceitar os referidos dados sem ponderar se, atenta a importância do interesse público na prossecução do processo de execução fiscal, a prova oferecida pela Reclamante nos autos seria bastante para justificar a prevalência do interesse do contribuinte sobre aquele outro.

XIII - Assim, o Tribunal a quo considerou que a ponderação do património da executada, ora Reclamante, bastar-se-ia com os documentos que atestavam o seu rendimento mensal e os seus encargos quotidianos, não cuidando que, para alem de elementos dinâmicos, aquele também pode comummente comportar elementos estáticos. E quanto a este aspecto merecem especial realce os elementos patrimoniais depositados no sistema bancário e que assumem especial relevo numa economia em que as instituições bancárias são agentes omnipresentes no quotidiano dos cidadãos.

XIV - Com efeito, no caso sub judice, sendo toda e qualquer investigação por parte da Administração Tributaria vedada com vista a averiguar da (in)existência de contas de depósito a ordem ou a prazo bem como de outras aplicações financeiras, não só pela urgência que exige o procedimento de dispensa de prestação de garantia como também pelo estrito regime legal para o levantamento do sigilo bancário...

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