Acórdão nº 13549/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Agosto de 2016

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCHÃO MARQUES
Data da Resolução19 de Agosto de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório Ministério da Administração Interna – Serviço de estrangeiros e Fronteiras (Recorrente), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que julgou procedente a acção administrativa especial urgente (pedido de asilo) contra si proposta por A…, cidadão nacional do Senegal, anulando a decisão de 18.02.2016 da Directora Nacional daquele Serviço.

As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões: A. Para proferir a Sentença ora recorrida o douto Tribunal "a quo" estabeleceu que, "A questão que cabe apreciar e decidir é a de saber se deve ser declarada a nulidade, por falta de fundamentação e de notificação da decisão da Directora nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de 18 de Fevereiro de 2016 de recusa do pedido de asilo ou de autorização de residência formulado pelo ora autor, em língua que este compreendesse, se tal decisão é anulável por violação do princípio do benefício da dúvida.

Por fim cabe aferir se a entidade demandada deve ser condenada a conceder ao ora autor, nos termos do artigo 3°, nº 2 ou do artigo 7° da Lei nº 2612014, de 5 de Maio, o direito de asilo ou subsidiariamente, autorização de residência por razões humanitárias." B. Quanto à alegada nulidade por falta de fundamentação e de notificação em língua que o autor compreendesse, julgou o douto tribunal pela improcedência, sustentando que, "Não se vê que nenhum direito do autor tenha ficado comprimido com a notificação que teve lugar, pois que o autor detinha mandatário no procedimento. Foi notificado da decisão e reagiu contenciosamente como é manifesto atentos os presentes autos." C. Relativamente à questão de aferir se a entidade demandada deve ser condenada a conceder ao ora autor, nos termos do art. 3°, nº 2 ou do artigo 7° da lei nº 26/2014, de 5 de maio, o direito de asilo ou subsidiariamente, autorização de residência por razões humanitárias, não proferiu o douto Tribunal qualquer juízo, presumindo-se que o mesmo terá na sua base o facto de ter sido julgada anulada a decisão da Directora Nacional do Serviço de Estrangeiros Fronteiras de 18 de Fevereiro de 2016.

D. Entende assim a entidade demanda que a douta Sentença apenas anulou a decisão proferida pela Directora Nacional do SEF em 18 de Fevereiro de 2016, não a tendo condenado na execução de qualquer acto administrativo, consubstanciado na admissibilidade do pedido de protecção internacional, sob pena de a sentença ser considerada nula, por falta de motivação nos termos do art. 615° nº 1 b) do CPC.

E. Porém, o que motivou a anulação da decisão da entidade demanda não foi nem a «falta de fundamentação», nem a «notificação da mesma em língua que o autor compreendesse», argumentos aduzidos pelo Recorrido, mas antes a questão suscitada por esse douto Tribunal que alega que foi preterida a audiência dos interessados no Processo desencadeado pelo Pedido de Protecção Internacional, referindo o que aqui integralmente se reproduz, mormente que, "...no caso dos autos e atendendo ao teor do auto das declarações que A… prestou ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras em 15 de Fevereiro de 2016 constata-se que apenas ao primeiro daqueles quatro pontos objectivos foi dado cumprimento. Mas não lhe foi dado a conhecer o projecto de decisão de indeferimento, nem os respectivos fundamentos, nem lhe foi dada a possibilidade de efectiva e utilmente no procedimento se pronunciar sobre os mesmos. Ou seja, não se afigura que as declarações prestadas pelo requerente ora autor possam assim ser considerados como audiência prévia do interessado (entendida esta com a exigência e o alcance que o Tribunal de justiça da União Europeia e o direito da União Europeia impõem).

Assim, a decisão da Directora Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de 18 de Fevereiro de 2016 viola o artigo 24°, nº 2 da lei nº 2712006, de 30 de Junho, com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 2612014, de 5 de Maio, interpretado em conformidade com o que dispõe designadamente o artigo 41.º, nº 2 alínea a) da carta dos direitos fundamentais da união Europeia, sendo por isso anulável nos termos do artigo 163°, nº 1 do CPA." F. Não pode o ora Recorrente concordar com a douta Sentença, a qual procedeu num incorrecto enquadramento e interpretação das normas internas constantes da Lei nº 27/2008, de 30 de Junho, com a redacção que lhe foi dada pela Lei 26/2014 de 5 de maio, quer das normas constantes na Directiva 2004/83/CE do Conselho, de 29 de Abril de 2004 (revogada pela Directiva 2011/95/EU do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de Dezembro de 2011, relativamente aos Estados-Membros por ela vinculados com efeitos a partir de 21 de Dezembro de 2013), da Carta do Direitos Fundamentais da União Europeia, da Directiva 2013/32/EU do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de Junho de 2013 relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de protecção internacional, bem como das normas constitucionais invocadas, bem assim como do invocado Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

G. A Lei nº 26/2014 de 5 de Maio " ...estabelece as condições e procedimentos de concessão de asilo ou protecção subsidiária e os estatutos de requerentes de asilo, de refugiado e de protecção subsidiária..." H. Transpostas as directivas comunitárias para o ordenamento jurídico nacional, no que tange à matéria em causa estabelece a ai. s) do nº 1 do art.º 2º da Lei 27/2008 de 30 de Junho, alterada pela Lei 26/2014 de 5 de Maio, que para efeitos da presente lei entende-se por «Pedido de protecção internacional», pedido de protecção apresentado por estrangeiro ou apátrida que pretenda beneficiar do estatuto de refugiado ou protecção subsidiária e não solicite expressamente outra forma de protecção susceptível de ser objecto de um pedido separado.(Sublinhado nosso) I. Por sua vez o art. 10° da referida lei, sob a epígrafe «Pedido de protecção internacional» estabelece que: 1- Presume-se que qualquer pedido de protecção, ainda que implícito, é um pedido de protecção internacional conforme o disposto na alínea s) do nº 1 do artigo 2° 2- Na apreciação dos pedidos de protecção internacional deve ser determinado, em primeiro lugar, se o requerente preenche as condições para beneficiar do estatuto de refugiado e, caso não preencha, se é elegível para protecção subsidiária. (sublinhado nosso) J. A definição de «Pedido de protecção Internacional», bem como a recepção e tratamento do mesmo, leva-nos a concluir que quando às autoridades competentes, o requerimento de protecção internacional compreende em simultâneo o pedido de protecção para beneficiar do estatuto de refugiado e o pedido de protecção subsidiária, sendo que ambos são analisados num único procedimento.

K. Aliás este foi o entendimento do legislador comunitário quando procedeu à revogação da Directiva 2004/83/CE do Conselho de 29 de Abril, passando então a vigorar a Directiva 2011/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de Dezembro de 2011.

L. Na pendência da Directiva 2004/83/CE fazia-se a distinção entre pedido de asilo ou de estatuto de refugiado e pedido de protecção subsidiária, correspondendo a cada pedido um procedimento distinto, situação que se alterou com a entrada em vigor da Directiva 2011/95/UE que com o intuito de uniformizar e tornar mais célere, procedeu à inovação da figura do Pedido de Protecção Internacional, considerando que qualquer pedido de Protecção internacional encerra em si quer o pedido de estatuto de refugiado, quer o pedido de protecção subsidiária.

M. Refira-se que em Portugal sempre vigorou o sistema de procedimento único, ao contrário do que sucedia noutros Estados da união Europeia.

N. Efectivamente, a Directiva 2011/95/EU do Parlamento de 13 de Novembro veio introduzir um sistema uniforme de Protecção internacional, no qual se considera que a partir do momento em que um cidadão de país terceiro ou apátrida solicita Protecção internacional a um Estado Membro, o mesmo é recebido como Pedido de Protecção Internacional quer para efeitos de estatuto de refugiado, quer para efeitos de protecção subsidiária, sendo que naquele Pedido de Protecção Internacional são analisados em simultâneo os pressupostos quer para o estatuto de refugiado, quer para a protecção subsidiária.

O. O invocado Acórdão do Tribunal de Justiça tem por objecto a questão aí suscitada de sucessão de procedimentos, que ao tempo vigorava na Irlanda, nada tendo que ver com o caso dos autos, e muito menos com o quadro legal que actualmente vigora na União Europeia.

P. Aliás contrariamente ao que vem defendido na Sentença em crise, a legislação comunitária apenas exige que o requerente de protecção internacional seja ouvido antes de proferida decisão sobre o seu pedido de protecção internacional, o qual como já foi dito, encerra tanto o estatuto de refugiado, como a protecção subsidiária, sendo que após a sua audição, inexiste obrigação de notificar para mais uma vez intervir no procedimento.

Q. Com interesse remete-se para o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça - Procº 61/11.YFLSB de 27-09-2011, que é parte integrante das presentes alegações.

R. Ora a invocação por esse douto Tribunal do que entendeu o Tribunal de Justiça da União Europeia, no Acórdão de 22 de Novembro de 2012, proferido no processo C-277/11, falece, s.m.o., na equiparação ao caso dos autos, porque se tratou de uma questão suscitada na pendência da Directiva revogada que distinguia o pedido de estatuto de refugiado e o pedido de protecção subsidiária, não estando os Estados obrigados a analisar em simultâneo os dois pedidos, uma vez que à data se tratavam efectivamente de pedidos diferentes.

S. No sistema jurídico actualmente em vigor, o Pedido de Protecção Internacional, tal como foi referido, reúne os dois pedidos num único procedimento, sendo que o requerente é ouvido para prestar...

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