Acórdão nº 09739/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Agosto de 2016

Magistrado ResponsávelBARBARA TAVARES TELES
Data da Resolução02 de Agosto de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I.RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA, inconformada com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a Reclamação de Actos do Órgão de Execução Fiscal interposta por S..., SA, contribuinte n.º …, contra o ato de compensação praticado pela Directora Geral da AT, no dia 29 de Janeiro de 2016, de aplicação de crédito no pagamento da dívida exequenda e acrescido relativa ao processo de execução fiscal n.º ..., veio dela interpor o presente recurso jurisdicional.

A Recorrente termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: “Conclusões A. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou totalmente procedente, a reclamação à margem epigrafada, apresentada no processo de execução fiscal nº ..., a correr no Serviço de Finanças de ...

.

B. Entendeu o Tribunal (cfr. IV- Decisão) anular o acto de compensação aqui posto em crise datado de 29 de Janeiro de 2016, por violação do princípio da boa fé, na interpretação e aplicação do artigo 195.º, n.º 1 do CPPT.

C. O que, desde já e salvo o devido respeito, não entendemos a aplicação a este caso da norma invocada, porque esta regulamenta a constituição de hipoteca legal pelo órgão de execução fiscal e aqui estamos perante a situação inversa, a constituição de hipoteca voluntária pelo executado, ou seja, não nos parece ter aplicação ao caso aqui em discussão.

D. Segundo o nosso entendimento, o problema aqui em causa é estabelecer se o acto de compensação já identificado nos autos, no momento em que teve lugar, será ou não compatível com o procedimento, ainda a decorrer, de constituição da hipoteca voluntária de um imóvel por parte do executado, porque o órgão de execução fiscal está impedido de promover diligências de cobrança coerciva porque se o fizer, como foi aqui o caso, violará o principio da boa fé a que toda a actividade administrativa se encontra sujeita.

E. Para já, na nossa opinião, toda a análise da situação aqui em causa apenas deverá ter em conta a situação como se apresentava no momento da decisão, como uma prognose póstuma do que realmente se verificou, em 29 de Janeiro de 2016, para uma melhor qualificação jurídica da situação nos exactos termos em que se apresentou aos sujeitos que praticaram os actos, na exacta altura da sua prática.

F. Seguindo esta via, parece-nos inquestionável que o Chefe de Finanças ainda não tinha em seu poder os elementos definitivos para declarar como garantida a dívida aqui em causa e, assim sendo, não poderia declarar formalmente como suspenso o processo executivo, conforma manda o artigo 52.º, n.º 2 da LGT.

G. Porque só mais tarde, em 05 de Fevereiro, teve lugar a constituição da hipoteca que constituiu essa garantia (Factos assentes: alínea j), fls. 6 da sentença).

H. E só em 11 de Fevereiro foi confirmada a situação (a idoneidade da garantia) pelo órgão de execução fiscal e, em consequência foi determinada a suspensão do processo executivo (Factos assentes: alínea l), fls. 6 da sentença).

I. Ou seja, no próprio dia do acto de compensação aqui em causa, o Chefe de Finanças não praticou, nem o poderia ter feito, um acto definitivo de aceitação de garantia.

J. Veja-se o Doc. n.º 1 da p.i. (Ofício datado de 2016.01.29 que remete o despacho do mesmo dia) onde se conclui da seguinte forma : Assim, e face ao caracter do bem indicado, o mesmo é suficiente e idóneo para garantir os presentes autos, pelo que deverá, tal como proposto pela executada na pessoa do seu mandatário, ser constituída hipoteca voluntária sobre o imóvel indicado.

Notifique-se a executada na pessoa do seu mandatário - Dr. M… - do presente despacho e de que deverá proceder à entrega dos documentos comprovativos da efectivação da hipoteca voluntária a favor da AT, bem como do seu registo junto da Conservatória do Registo Predial.

K. O conteúdo deste despacho é claramente uma aceitação condicional da garantia, porque esta ainda está no domínio das possibilidades, ou seja, o órgão de execução fiscal declarou que aceitaria aquela garantia se fosse concretizada nos exactos termos propostos, bastaria a sua efectivação através das formalidades legais exigidas como o seu registo na respectiva Conservatória do Registo Predial por se tratar de um imóvel, para se concretizar.

L. Mas na sentença (Factos assentes: alínea h), fls. 6 da sentença) qualifica-se a situação de um outro modo, como "(...) aceitar a garantia na modalidade de hipoteca voluntária" como se de um acto definitivo se tratasse, retirando daqui as respectivas consequências legais, o que, salvo o devido respeito, não nos parece que se tenha verificado, pelo que não podemos concordar com o que foi dado como demonstrado na factualidade da sentença sobre o despacho do Chefe de Finanças de 2016.01.29, nem as consequências que se extraíram daquele entendimento .

M. Pelo contrário, sublinhamos, parece-nos demonstrado que como não estava ainda efectivada a garantia, o processo executivo não se encontrava suspenso, nem assim poderia ser nos termos do artigo 52.º, n.º 2 da LGT.

N. E por isso, exactamente no mesmo dia, foi concretizada a compensação de créditos fiscais da agora reclamante, mas por órgão diferente da AT, formalmente pelo Director Geral dos Impostos.

O. Também é ponto assente que no direito fiscal a margem de actuação discricionária da Administração é limitadíssima, ou seja, o conteúdo dos actos praticados pela AT é quase totalmente vinculado à lei.

P. E também é verdade que a AT, cujas atribuições são basicamente a cobrança de impostos, tem deveres muito estritos nesta matéria, entre os quais o de promover todas as diligências legais de cobrança de tributos.

Q. Nesta caso concreto, não se encontrando o processo executivo suspenso e encontrando-se reunidas as condições legais para se proceder à compensação, segundo as competências irrenunciáveis que lhe foram conferidas, não restava qualquer alternativa de actuação ao seu Director-Geral da AT proceder em conformidade.

R. Ou seja, tanto pelo lado do Chefe de Finanças do S.F. de ...

como pelo lado do Director-Geral da AT, em 29 de janeiro de 2016, tudo foi feito de forma absolutamente legal e, mais ainda, em estrito cumprimento dos seus deveres funcionais. Decorrendo directamente da lei a actuação de cada um dos órgãos da AT, não nos parece possível ter-se verificado uma situação de má fé conforme foi aqui considerado.

S. O tribunal a quo considerou relevante a circunstância de se encontrar pendente "(...) o subprocedimento, oportunamente desencadeado pela Reclamante tendente à prestação de garantia adequada" (fls. 12 da sentença) e, conclui exactamente nesse sentido.

T. Mas, com todo o respeito, não nos podemos conformar com a posição adoptada.

U. Porque, na nossa opinião, embora possa fazer sentido à luz dos princípios, o que não se concede mas até se entende, choca absolutamente com regime expresso na lei em vigor, é de uma aplicação prática impossível e põe em causa a certeza jurídica pelas razões que passamos a expor.

V. Em primeiro lugar, em termos de ordem jurídica estamos em perante uma execução fiscal, ou seja, numa situação em que se encontra vencida mas não paga uma obrigação de pagamento de imposto, uma situação de incumprimento já em fase de cobrança coerciva, completamente distinta de uma situação ainda de promoção ou formação do procedimento anterior à liquidação de imposto, nem numa situação subsumível numa culpa in contraindo ou figura próxima como parece ser a qualificação da situação na presente sentença, mas, pelo contrário, estamos perante a prática de actos vinculados, ou seja, em aplicação estrita e directa do regime aplicável.

W. E não estamos numa fase preparatória, estamos já perante aquilo que alguns autores apelidam de uma "fase patológica da relação jurídica", numa resposta do sistema jurídico a uma situação estabelecida de incumprimento.

X. Por isso, não nos parece que a mera apresentação de um requerimento de prestação...

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