Acórdão nº 12740/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO SILVESTRE
Data da Resolução14 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: O MINISTÉRIO PÚBLICO vem interpor recurso jurisdicional da sentença de 14/04/2015 do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou improcedente a oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa que instaurou contra LOURENÇO ………………….

As alegações de recurso culminam com as seguintes conclusões: “1 - O recorrido requereu e invocou o direito à nacionalidade, por estar casado com cidadã portuguesa. No entanto, está indiciado como autor material da prática de um crime de ofensa à integridade física, desconhecendo-se se corresponde ou não ao p. e p. pelo art.º 143 do C. Penal, por falta de apresentação do Certificado do Registo Criminal da Inglaterra, país onde reside, o que constitui fundamento de oposição de aquisição da nacionalidade, previsto na al. b), do art. 9º da Lei n.º 37/81, de 03.10 2 - Compete-lhe, por isso, fazer prova da ligação efectiva com base em factos pessoais, nos termos do preceituado nos artigos 341.º e 342.º, n.º 1, do Código Civil. A acção destinada à declaração de inexistência de ligação à comunidade nacional configura-se como uma acção de simples apreciação negativa, competindo ao demandado a prova dos factos constitutivos e impeditivos do direito que se arroga. 3 - O recorrido pretende integrar-se na comunidade portuguesa, mas não comprovou o seu passado criminal, na Inglaterra. Também não comprovou que tem ligação efectiva necessária para adquirir a nacionalidade portuguesa. 4 - Com efeito, tratando-se de uma acção de simples apreciação negativa, impunha-se que o recorrido trouxesse ao processo os elementos que pudessem fundar o direito à aquisição de nacionalidade portuguesa, afirmado nas declarações prestadas na Conservatória dos Registos Centrais. 5 - O sistema judicial e policial inglês só permite a prestação de informação ou emissão de certidões das decisões a pedido do próprio. Daí que, a Conservatória solicitou, então, ao Requerido a junção do certificado do Registo Criminal. 6 - Por isso, na indicação da prova, o Ministério Público resolveu "Requer a notificação do réu para juntar aos autos documento, emitido pela competente autoridade do Reino Unido, que comprove a existência ou não a inexistência de condenação efectiva pela prática dos factos que determinaram a sua detenção a 29.04.2012 (art. 37º, da Lei 37/81, de 3.Out.)". 7 - Requerimento que, em sede de sentença mereceu a seguinte observação e decisão "(...) o M.P. não fez prova documental do imputado crime pelo ora R., prova que lhe competia, e importa o decaimento de fundamento de oposição a aquisição da nacionalidade portuguesa fundamentada na prática e condenação por crime punido com pena igual ou superior a três anos segundo a lei portuguesa ". 8 - Em sede de julgamento, não foi observado o disposto no art. 602º, n.º 2, al. d), do CPC. 9 - Em sede de sentença, também não foi observado o dever de fundamentação da decisão previsto no n.º 1, do art. 145º, nem foi observado o disposto no art. 607º, n.º 4, 1ª parte, do CPC. O juiz deixou de pronunciar-se sobre questões que deveria apreciar, nulidade que se arguiu, nos termos da al. d), do n.º 1, do art. 615º, do novo CPC. 10 - Dos factos provados nada vem referido quanto ao documento a que se refere a Conservatória e a p.i., factos relacionados com os documentos de fls. 31 a 38 da certidão, dos quais se alcança que há indícios da prática de crime, tendo o recorrido sido detido, em 29.04.2012, por agressão ocasionando danos corporais, o que deu origem ao fundamento da al. b), do art. 9º e ao que o Requerido refere na contestação. No entanto, tal não comprova o passado criminal do recorrido. 11 - Desconhece-se se se trata ou não de indivíduo violento, desprovido de regras e de desrespeito pelos demais, ou melhor indesejável. 12 - Por outro lado, a matéria dada como provada não resulta da análise crítica dos documentos constantes dos autos. Ou melhor, não foi feita nenhuma análise crítica dos documentos juntos aos autos, nem da prova testemunhal, nos termos do art. 607º, n.º 4, do novo CPC. 13 - Assim, não foi apreciado o fundamento de indesejabilidade, previsto na al. b), do art. 9º da Lei n.º 31/87. 14 - O princípio do inquisitório impõe ao juiz a realização de todas as diligências e a determinação da prática de todos os actos necessários ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, determinando oficiosamente a junção do documento aos autos, nos termos dos arts. 411º e 436º, n.º 1 e 2, do actual CPC. 15 - A filosofia do actual Código Processo Civil é no sentido de haver uma maior intervenção do juiz, o qual até pode substituir-se à parte na realização de determinados actos, de acordo com o princípio da oficialidade consagrado no n.º 1, do art. 265º do actual CPC, não se tratando de prática de acto inútil, impertinente ou dilatório, mas necessário para o esclarecimento da verdade. Neste caso, para considerar-se verificado ou não o fundamento de oposição invocado. 16 - O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, ao julgar improcedente a oposição deduzida pelo Ministério Público à aquisição da nacionalidade do recorrido e ao ordenar o prosseguimento do processo conducente ao registo respectivo, não decidiu em conformidade. 17 - Face aos factos dados como provados dever-se-ia concluir pela inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional. 18 - Por outro lado, a prova do fundamento da oposição compete ao recorrido, que foi quem invocou o direito à nacionalidade portuguesa, tal como se infere do disposto nos arts. 57º, n.º 1 do DL 237/A, 2006, de 14/12 e 343º, n.º 1, do CC. Caso contrário, estar-se-ia a exigir a demonstração de factos que só aquele que se arroga o direito conhece e pode provar. 20 - Impunha-se, pois, que o recorrido, apresentasse elementos que pudessem fundar o direito à aquisição da nacionalidade portuguesa, tratando-se de uma acção de simples apreciação negativa. Ainda segundo a jurisprudência, "(...) VIII - Sendo a acção de oposição à aquisição de nacionalidade, de simples apreciação negativa, competiria ao Recorrido fazer a prova da sua ligação efectiva à comunidade portuguesa (...) IX - A prova da ligação efectiva à comunidade nacional é necessariamente feita com base em factos pessoais. Logo, a prova tem de ser feita através de factos próprios do Requerente do pedido de aquisição de nacionalidade, que foi quem invocou o direito à nacionalidade portuguesa. Ao Estado, caberá depois, apenas, a contraprova daqueles factos." (Neste sentido, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo. 10952/14, Secção: CA- 2º Juízo, de 02-04-2014, Relatora Sofia David). 21 - Não assiste, assim, razão ao Mmo. Juiz ao concluir pela improcedência da oposição, visto os autos não conterem elementos que evidenciem a existência de firmes e persistentes elos que possam corporizar um sentimento de pertença à comunidade nacional. 22 -Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida violou o disposto no artigo 9.º, alíneas a) e b), da Lei n.º 37/81, na redacção dada pela Lei n.º 2/2006, de 17 de Abril e 43/2013, artigo 56.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 837- A/2006, de 14 de Dezembro, o art. 343.º, n.º 1, do Código Civil, n.º 1, do art. 265º, 411º, 424º e segs., 436º, n.º 1 e 2, 602º, n.º 2, al. d), art. 607º, n.º 4, do actual CPC. 23 - Termos em que, deve ser revogada e substituída por outra que julgue procedente a acção de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa, a que se reportam os autos, com as demais consequências legais, por se considerar haver erro de julgamento e necessidade de haver ampliação da matéria de facto, na medida em que não foi atendida a pretensão do Ministério Público, não foi apreciada toda a prova documental, nem a prova testemunhal, nem foram narrados os factos relevantes constantes da contestação. Dessa forma, assim, será feita a acostumada Justiça.” O recorrido não apresentou contra-alegações.

* As questões que cumpre apreciar e decidir - delimitadas pelas conclusões do recurso - são as de saber se a sentença recorrida (i) é nula nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. b) do CPC [cfr. conclusões 9) e 12) das alegações de recurso] e se (ii) padece de erro de julgamento ao considerar como não verificados os fundamentos de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa previstos no artigo 9.º, als. a) e b) da Lei da Nacionalidade [cfr. conclusões 1) a 8), 10), 11), 13) a 21) das alegações de recurso].

*Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

FUNDAMENTAÇÃO 1.

Matéria de facto 1.1.

O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos: 1 - O R. ………………….., de nacionalidade guineense, nasceu a 12.01.1971, em Bissau, República da Guiné-Bissau, filho de pais de nacionalidade guineense (cfr. doc. nos autos).

2 - O R. contraiu casamento civil, em 10.01.2009, na CRC de Oeiras, com a cidadã portuguesa Nzinga ………………….

(cfr. doc. nos autos).

3 - No dia 19.04.2013, o R. apresentou requerimento na Conservatória dos Registos Centrais, no qual prestou declaração para aquisição da nacionalidade portuguesa, ao abrigo do artº. 3º/Lei 37/81, com fundamento no celebrado casamento, na sequência do que foi instaurado o processo nº. ……………, na Conservatória dos Registos Centrais (cfr. docs. nos autos).

4 - O R. reside em Inglaterra desde 2011, onde reside com a sua esposa e filhos, e onde trabalha.

5 - O R., bem como a sua esposa, foi para Inglaterra por não ter conseguido emprego em Portugal, e de que antes de emigrar para Inglaterra viveu em Portugal, onde já vivia antes do casamento.

6 - Os filhos do R. têm a nacionalidade portuguesa (cfr. docs. nos autos, e admissão por acordo).

1.2.

Considerou o Tribunal a quo que “nada mais logrou-se provar com interesse ou relevância para a decisão da presente causa, designadamente não logrou o M.P. provar que o R. tenha sido condenado pela prática de crime punido com pena igual ou superior a três anos segundo a lei portuguesa, prova...

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