Acórdão nº 02303/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 03 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelANA PINHOL
Data da Resolução03 de Março de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: I.

RELATÓRIO "T.- P. E., S.A..” vem interpor recurso da sentença do então 2º Juízo do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação adicional de IRC do exercício fiscal de 1999, através da qual foi feita a correcção do montante do prejuízo fiscal de Esc:1.457.358.524$000 para Esc:1.299.866.905$00.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões (reformuladas após convite): «

  1. Ao decidir prescindir da inquirição das testemunhas arroladas pela impugnante, invocando que os autos conteriam a factualidade necessária à sua decisão conscienciosa, o Senhor Juiz a quo fez uso indevido, por injustificado, da faculdade prevista no artº113° do CPPT, que assim foi violado.

  2. O Senhor Juiz não só fez uso indevido, por injustificado, da faculdade permitida pelo artº113° do CPPT, como o fez de forma processualmente errada, porque proferiu despacho sobre a dispensa de produção de prova autónomo da sentença onde conheceu do pedido. A lei processual permite ao juiz conhecer logo o pedido (se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários) ou, como descreve a epígrafe, conhecer imediatamente do pedido, o que inculca quo não há lugar ao despacho que nos presentes autos foi proferido.

  3. A sentença recorrida não contém discriminação da matéria provada e não provada, limitando-se a enunciar os factos provados - apenas os que considerou relevantes para a decisão que arquitectou, dispensando a produção de prova sobre a demais matéria de facto - sem indicar quais de entre os outros factos articulados considerou não provados. Tendo a sentença dado como provados apenas os factos que discriminou poderia concluir-se que toda a restante matéria de facto deveria ser considerada não provada. Mas a verdade é que sobre essa matéria não foi produzida toda a prova admissível, já que o Senhor Juiz a "dispensou", pelo que não se pode concluir se foi ou não provada.

  4. A fundamentação apresentada para a decisão tomada quanto à matéria de facto é manifestamente insuficiente. A sentença diz, por junto, que se baseou "no exame dos documentos e informações constantes dos autos". Fundamentar desta forma é o mesmo que nada dizer. Ao exigir que o juiz fundamente as suas decisões em matéria de facto, a lei processual comete-lhe a obrigação de tomar posição sobre os factos que foram trazidos aos autos e justificar através da remissão para os respectivos meios de prova. Comete-lhe também a obrigação de dizer em concreto quais os elementos probatórios que estiveram na base da formação da sua convicção.

  5. A falta de discriminação da matéria de facto, provada e não provada, relevante para a decisão da causa e a falta de fundamentação configuram, por um lado, omissão de julgamento sobre a matéria de facto, de conhecimento oficioso, nos termos do artº729°, n°3, do CPCv, aplicável por força do artº2°, e) do CPPT, e nulidade da sentença, prevista no art.125°, n°1 do CPPT.

  6. Não existe disposição legal que imponha que a prova da realidade e indispensabilidade das despesas e custos tenha de ser feita exclusivamente através de facturas. Atente-se, neste ponto, no acórdão de 26.09.2000, do Tribunal Central Administrativo (in CTF, 400, 510), onde foi decidido que "os custos terão que ser comprovados por documentos válidos ou outro meio de prova admissível”.

  7. A sentença contradiz-se na fundamentação ao não se pronunciar no julgamento da matéria de facto sobre estes factos atinentes às despesas, sua documentação e indispensabilidade, mas já deles faz uso, sem se poder concluir se os aceita ou não como provados, para afirmar que "a maioria deles respeita a despesas debitadas à S. AG, a qual já facturou as despesas à ora impugnante" (fls.10 da sentença). Quanto aos outros documentos de outras despesas os mesmos "não estão facturados à impugnante, nem são susceptíveis de comprovar de forma clara reportarem-se a custos da impugnante, indispensáveis à sua actividade".

  8. Os documentos juntos aos autos provam a realidade das despesas e sua indispensabilidade.

  9. A sentença fez, assim, errada interpretação e aplicação da lei, designadamente o disposto no art.º23° do CIRC, ao não aceitar como custos as despesas reconhecidas na escritura.

  10. As condições de contratação dos suprimentos entre a sociedade e os accionistas é matéria sujeita à liberdade contratual, desde que respeitadas as normas da legislação das sociedades comerciais. Se os accionistas e a sociedade em dado momento fixaram as condições de contratação dos suprimentos nada os impede de em momento ulterior as alterar, por acordo expresso ou por acordo tácito.

    I) Não se diga que a indispensabilidade das despesas depende do cumprimento pela sociedade das condições de remuneração e reembolso dos empréstimos.

  11. Os reembolsos de capital foram sendo feitos, bem como o pagamento dos juros, relativamente a empréstimos concedidos à sociedade e cuja realidade e indispensabilidade não foi posta em causa. O facto de terem sido praticadas condições em certa medida diferentes às acordadas em nada releva que justifique as correcções impostas pela Administração Fiscal.

  12. O reembolso dos empréstimos aos accionistas foi feito sempre que as condições de tesouraria o permitiam, fazendo com que a sociedade apenas fosse devedora aos accionistas dos montantes estritamente necessários, o que lhe permitia reduzir os encargos financeiros e, consequentemente os custos.

  13. O absurdo da tese da Administração Fiscal, que a sentença acolheu, vai ao ponto de não ter entendido que se a recorrente não tivesse "violado" a deliberação da assembleia geral teria pago mais juros e logo os custos teriam sido muito maiores, retirando qualquer expressão às correcções que foram erradamente efectuadas.

  14. Quanto à taxa de juro aplicada, a forma como os juros foram calculados respeitou a deliberação, já que a mesma não explicitava se era taxa efectiva ou nominal, pelo que, atendendo à sua formulação, a deliberação contemplaria até o pagamento de montante de juros superior ao que foi pago e que a Administração Fiscal não poderia deixar de aceitar como correctos.

  15. Padece, por conseguinte, a sentença recorrida do já aludido vício de errada interpretação da lei e, consequentemente, sua violação, da norma contida no artº23° do CIRC.» Não foram apresentadas contra-alegações.

    * A EXMA. PROCURADORA - GERAL ADJUNTA junto deste Tribunal emitiu parecer, a fls.455 e 456 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.

    * Foram colhidos os vistos dos EXMOS JUÍZES ADJUNTOS, pelo que vem o processo submetido à Secção do Contencioso Tributário para julgamento do recurso já que a tal nada obsta.

    * II.

    DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Novo Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do Recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

    Com este pano de fundo, as questões a apreciar e decidir consistem em saber: (i) se a sentença sob recurso padece dos vícios formais de falta de discriminação da matéria de facto, provada e não provada, relevante para a decisão da causa e de falta de fundamentação conducentes à declaração da sua nulidade; e não padecendo; [Conclusões c), d) e e)]; (ii) se a mesma enferma do vício de défice instrutório conducente à sua anulação; e não padecendo; [Conclusões a) e b)]; (iii) se incorre em erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do artigo 23º do CIRC; [Conclusões i) e q)].

    *III.

    FUNDAMENTAÇÃO A.DOS FACTOS Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a fundamentação respectiva que nos seguintes termos: «1. A impugnante foi sujeita a uma acção de inspecção, na sequência da Ordem de Serviço n°5..., de 10.08.2000, relativa ao exercício de 1999, tendo sido efectuadas correcções técnicas ao IRC daquele exercício, no valor de 157.491.619$00 (€ 785.564,88), conforme identificadas no ponto III do relatório de inspecção, a fls. 111 a 115 do PA apenso aos autos - cfr. cópia do relatório de inspecção junta a fls. 99 a 122 do PA apenso aos presentes autos e respectivos anexos (fls. 123 a 312), o que se dá por integralmente reproduzido.

    1. Conforme resulta do relatório de inspecção, as referidas correcções técnicas resultam de não terem sido aceites como custos fiscais encargos de juros incorridos com empréstimos (suprimentos) concedidos por sócios à impugnante, no...

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