Acórdão nº 07507/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução17 de Março de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

D.

e P.

, inconformados com a decisão de indeferimento liminar da impugnação judicial por si deduzida à liquidação de IRS do ano de 2009, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, interpuseram o presente recurso jurisdicional.

Tendo alegado, aí concluíram nos seguintes termos: «I - O direito à tutela jurisdicional efectiva, exposto nos artigos 20°, nºs 1 e 4, e 202°, nºs1 e 2, da CRP 1976, exigem, em matéria tributária, que se proceda a uma análise cuidada das lides, impostos nos artigos 67°, n°2, alínea f), e 103° e 104°, da CRP 1976, logrando-se obter decisões justas, equitativas, legais e constitucionalmente não desconformes e amigas da "juridicidade".

II - A presente decisão judicial padece de nulidade visto que, muito estranhamente, não especifica, de modo compreensível e suficientemente desenvolvido, os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão -Artigo 668°, n°1, alínea b), do CPC 1961 = artigo 615°, alínea b), do NCPC - assim atentando contra o dever de fundamentar todas as decisões.

III - A presente decisão configura uma ofensa ao princípio do Estado de Direito Democrático e da tutela jurisdicional efectiva e não discriminatória - artigos 1°, 2°, 9°, alínea b), 13°, 18°, nºs 2 e 3, 20°, nºs 1 e 4, 202° a 205°, 266° a 268°, da CRP 1976. Ademais, IV - Não é verdade que, atenta a factualidade relatada, os demais pedidos fossem «não (...) enquadráveis na forma de processo de impugnação...», já que, a proceder a mesma, não se vê como não tivessem que cessar penhoras ou suster-se processos executivos! V - A Mmª Juiz a quo ao ter deixado de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento - Artigo 668°, n°1, alínea d), do CPC 1961. = artigo 615°, alínea d), do NCPC - provocou a NULIDADE da sua decisão .

VI - A decisão afrontou o direito dos recorrentes à proibição de denegação de justiça ("non liquet “- artigo 8°, do Código Civil) ou tutela jurisdicional efectiva.

VII - Quedaram-se violadas várias normas jurídicas que se passam a identificar - artigo 685°-A, n°2, alínea a), do CPC 1961 = artigo 639°, n°2, alínea a), do NCPC -, 99° e 102°, do CPPT.

VIII- Há alguma confusão na mente da julgadora, já que a liquidação que é efectuada, em 2011, de natureza oficiosa, essa é que já havia caducado o direito à sua liquidação, pelo que, naturalmente, sendo um acto NULO, poderia ser atacado a todo o tempo, já que choca que uma obrigação tributária, transformada pelo decurso do tempo ("caducidade do direito de liquidar tributo - 2 anos) em "OBRIGAÇÃO NATURAL", não judicialmente exigível (vide artigos 402° e seguintes do Código Civil), possa estar na base ou valer como título executivo tributário.

IX - Age de forma desleal e intelectualmente desonesto a Mmª Juiz a quo quando invoca, com carácter genérico, o artigo 102°, do CPPT, para efeitos de contagem do prazo de impugnação, quando, na verdade, tal preceito tem várias hipóteses e situações diferenciadas.

X- No entender do recorrente, o artigo 102°, n°1, alíneas a), b) e d), e 280°, do CPPT, que constituem fundamento jurídico da decisão, deviam ter sido interpretadas e aplicadas em sentido distinto daquele em que o foram -artigo 685°-A, n°2, alínea b), do CPC 1961 = artigo 639°, n°2, alínea B), do NCPC - ou seja, deveria ter-se entendido que o recorrente estava e está em tempo para atacar o acto tributário oficioso de liquidação de IRS para além do prazo de caducidade.

XII - Na verdade, vejamos cada uma das hipóteses para concluirmos pela TEMPESTIVIDADE DA IMPUGNAÇÃO.

XIII - Indo pela alínea a), e que se refere que a contagem do prazo de três meses é contado a partir do «Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte», logo se verifica que esse prazo, atenta a notificação tardia e oficiosa, à data da apresentação da impugnação, não havia ainda integralmente decorrido.

XIV - Também a contagem, a partir do facto ou critério exposto na alínea b) («Notificação dos restantes actos tributários, mesmo quando não dêem origem a qualquer liquidação»), do mencionado artigo 102°, n°1, do CPPT, ao longo da relação obrigacional tributária, em que foi necessário corrigir, por diversas vezes, relativamente ao impugnante e seu cônjuge, vários dados de carácter pessoal, também não se vê como seja possível não considerar tempestivo o recurso, já que, nos três meses antecedentes da apresentação da impugnação, vários actos tributários, relativamente ao mesmo "pedaço de vida com relevância tributária", foram notificados, mormente em sede de dados de carácter pessoal, tal qual antecedentemente se referenciou, tendo sido uma das últimas notificações a 28 de Agosto de 2013 (doc.1), muito ANTES DE PERFAZER O PRAZO LEGAL invocado XV- Face às pretensões do impugnante, em sede de reclamação hierárquica e graciosa, sempre se poderia "alongar" o inicial prazo por meio da «formação da presunção de indeferimento tácito», ex vi alínea d), do n°1, do artigo 102°, do CPPT.

XVI - O vício do acto tributário é de tal forma gravoso que a sua invocação, para além dos três meses, é possível, já que é um acto que restringe, lesa ou atinge um direito fundamental do impugnante e, por isso, sempre seria de combate a todo o tempo, mormente por meio da acção para o reconhecimento de um direito fundamental: o da tributação de acordo com o paradigma ponderado e codificado em sede dos artigos 67°, n.

XVII- Sempre se exigiria, havendo qualquer incorrecção na petição de impugnação apresentada, que o Tribunal a quo suscitasse o seu aperfeiçoamento ou, ainda, antes de proferir decisão, disso desse conta ao recorrente, com vista a acautelar os seus direitos, já que não se pode ignorar que o artigo 202°, nºs 1 e 2, da CRP 1976.

XXII - Há, por isso, igualmente, um erro no julgamento dos concretos pontos de facto que estão subjacentes à presente impugnação tributária - artigo 685°-B, n°1, alínea a), do CPC = artigo 640°, n°1, alínea a), do NCPC -, mormente no que tange à identificação precisa do ano em que os tributos eram devidos, do ano em que eles foram oficiosamente liquidados e do ano em que caducava o direito à sua oficiosa liquidação.

XXIII - A liquidação oficiosa ocorreu de modo ilegal, para além do prazo de caducidade, de tal modo que, tendo assim sido, nada mais resta do que julgar que a obrigação tributária de IRS, relativamente ao ano de 2009, se transformou em obrigação natural.

XXIV - Afigura-se materialmente inconstitucional o entendimento de que, impugnado um acto tributário, por liquidação oficiosa fora do prazo de caducidade, se afigura válida a sua cobrança coerciva, para além do dito prazo.

XXV- Submetida uma questão a juízo, o juiz está impedido de, ainda que em despacho liminar, evitar o seu efectivo conhecimento, pois tal viola o princípio da tutela jurisdicional efectiva.

NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVE O PRESENTE RECURSO SER RECEBIDO E CONSIDERADO PROCEDENTE, REVOGANDO-SE A DECISÃO RECORRIDA E SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE CONHEÇA DA CADUCIDADE DO DIREITO DE LIQUIDAÇÃO OFICIOSA EM SEDE DE IRS E, SUBEQUENTEMENTE, DECRETE SEM "FUNDAMENTO " O PROCESSO DE EXECUÇÃO E LEVANTE A RESPECTIVA PENHORA DE BEM IMÓVEL EFECTUADO NO CONTEXTO DA DITA COBRANÇA COERCIVA».

Admitido o recurso e notificada a Fazenda Pública, por esta não foram apresentadas contra-alegações.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal Central suscitou a questão da incompetência em razão da hierarquia deste Tribunal para conhecer do presente recurso, defendendo que o mesmo se circunscreve à apreciação de questão de direito.

Notificadas as partes para se pronunciarem, responderam os Recorrentes discordando do referido parecer, requerendo a manutenção do recurso nos termos admitidos.

Foram colhidos os “vistos” dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos.

II – Objecto do recurso Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 635°, n°2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (n°3 do mesmo art. 635°), razão pela qual todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT