Acórdão nº 10865/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO SILVESTRE
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: RELATÓRIO MARÍLIA ………… - SOCIEDADE ……………, LDA instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa acção administrativa comum contra o INFARMED - AUTORIDADE NACIONAL DO MEDICAMENTO E PRODUTOS DE SAÚDE, IP, para efectivação de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a importância de € 62.333,60 acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

Por sentença de 2/10/2013, o TAC de Lisboa julgou a acção parcialmente procedente e condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 30.382,66, acrescida de juros à taxa de 4%, vencidos e vincendos desde 11/09/2012 até integral pagamento, acrescida da quantia a liquidar.

Inconformado, o réu interpôs recurso jurisdicional, que culminou com as seguintes conclusões: “1.ª O INFARMED não praticou (omitiu) qualquer facto pelo qual possa ser civilmente responsável pelos danos que a Recorrida teve com abertura/encerramento do seu posto farmacêutico.

  1. Isto porque, o acto praticado pelo INFARMED que o douto Tribunal a quo considerou gerador de responsabilidade civil na esfera do INFARMED não é ilícito nem culposo, nem tão pouco se verifica qualquer nexo de causalidade entre o referido acto e os danos sofridos pela ora Recorrida.

  2. O referido acto não é ilícito uma vez que nos termos do artigo 10.º/3/c) da Deliberação 27/CD/2010 era à ora Recorrida que cabia fazer prova da distância entre o seu posto farmacêutico e a farmácia mais próxima.

  3. Sendo que, a Farmácia …………………… abriu em momento anterior do sorteio para o concurso ora em referência, e que ao abrigo do regime vigente não cabia ao INFARMED qualquer obrigação de publicar a transformação do posto farmacêutico dependente da Farmácia ......... em farmácia.

  4. Por outro lado, a Recorrida devia saber que nos termos do artigo 9.º/2 da Deliberação 27/CD/2007 os postos farmacêuticos têm uma vida precária, porquanto a qualquer momento podem ser encerrados, pelo que cabe sobre o proprietário de um posto farmacêutico verificar a necessidade e a "expectativa de duração de vida do seu posto farmacêutico.

  5. Sendo que, quando o INFARMED tomou conhecimento do sucedido não podia actuar de outra forma que não fosse encerrar o referido posto farmacêutico.

  6. O INFARMED também não praticou qualquer acto culposo, não operando in casu a presunção do artigo 10.º/2 da Lei 67/2007.

  7. Além disso, a Recorrida não actuou com a diligência adequada, já que sobre si impendia um ónus de verificar a necessidade e o "tempo útil de vida" do seu posto farmacêutico.

  8. Acresce que, para efeito do artigo 4.º da Lei 67/2007, a ora Recorrida não cumpriu também com o ónus de utilizar os meios tutelares adequados para defesa dos seus interesses.

  9. Por fim, refira-se que também não se verifica o requisito do nexo de causalidade, porquanto a ora Recorrida tinha perfeito conhecimento da abertura da Farmácia ………………….., e mesmo tendo presente o ónus que sobre si impendia, optou por avançar com as obras para abertura do seu posto farmacêutico.” A recorrida apresentou contra-alegações, as quais terminam com as seguintes conclusões: “1ª - O lnfarmed praticou actos pelos quais deve ser civilmente responsável pelos danos que a Recorrida teve com as obras realizadas no arrendado onde deveria abrir o estabelecimento de farmácia como posto farmacêutico móvel e a contratação do pessoal adequado ao efeito.

  10. - Pelo facto da notificação do sorteio ser considerado um dos actos geradores de responsabilidade civil na esfera do lnfarmed, como acto ilícito e culposo, verificando-se o nexo de causalidade entre o referido acto e os danos sofridos pela ora Recorrida.

  11. - O acto é ilícito porque o lnfarmed violou, designadamente, o disposto no artigo 3º, n.º 1 da Deliberação n.º 513/2010.

    1. - Tinha o lnfarmed o dever de confirmar os dados constantes da planta topográfica e da certidão, com os próprios registos do lnfarmed, de forma a não praticar actos, ou seja, admitir candidaturas em violação das normas legais, como efectivamente aconteceu no presente caso.

    2. - Tinha o lnfarmed o dever de se abster de praticar actos no concurso público porque conhecia e autorizou a deslocação/aproximação de um estabelecimento de farmácia que impunha restrições à Recorrida por contrariar a legislação em vigor e que só o lnfarmed era conhecedor de tal facto e muito menos depois de ter sido questionado por um terceiro, ignorando esta informação.

    6 ª - Sendo os actos administrativos praticados na mesma Direcção de Inspecção e Licenciamento tinha o lnfarmed o dever de tomar conhecimento dos mesmos e de imediato abster-se da prática de actos posteriores no que concerne à pretensão da Recorrida e assim deixar de a induzir em erro e incorrer em gastos desnecessários.

  12. - Não actuou, assim, a Recorrente com a diligência que lhe era exigível, agravado pelo facto dos actos serem praticados perante a mesma Direcção de Inspecção e Licenciamento da Recorrente.

  13. - Donde, tem de se concluir que o lnfarmed violou designadamente, o disposto no artigo 3º, n.º 1 da Deliberação n.º 513/2010, praticando assim um acto ilícito, resultante do funcionamento anormal da Direcção de Licenciamentos, nos termos conjugados dos artigos 9º n.º2 e 7º, n.ºs 3 e 4 da Lei 67/2007.

  14. - Tendo a Recorrida instruído um procedimento em obediência aos requisitos legais, foi admitida a concurso, foi sorteada, não seria expectável que o lnfarmed tivesse actuado em violação das normas legais vigentes, atentas as competências do mesmo, no que respeita à autorização do funcionamento de farmácias e postos farmacêuticos, pelo que a sua actuação é culposa.

  15. - Face aos actos praticados pelo lnfarmed verifica-se a existência do nexo de causalidade entre a notificação do resultado do sorteio e os danos invocados e peticionados pela Recorrida - constituiu, assim, condição directa e necessária dos danos sofridos.” O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer.

    * A questão a decidir no presente recurso – delimitadas pelas conclusões das alegações – consiste em saber se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento de direito na apreciação dos requisitos da ilicitude, da culpa e do nexo de causalidade, enquanto pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito.

    * Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

    FUNDAMENTAÇÃO 1.

    Matéria de facto O Tribunal a quo deu como provada a seguinte matéria de facto: 1) A Autora Marília ……….. - Sociedade ………., Lda., NIPC …….., exerce a actividade de Farmácia, instalada no rés-do-chão do prédio sito na Av. …….., n.º 63, freguesia de ……………, concelho de Torres Vedras (alínea A) dos Factos Assentes).

    2) Com data de 29 de Novembro de 2010 foi elaborada no INFARMED a Informação de fls. 155-157 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida e de que se extrai o seguinte: “(…) A instalação de Postos Farmacêuticos Móveis reveste carácter excepcional e transitório e visa dotar determinados locais de estruturas flexíveis que permitam garantir às populações mais isoladas uma assistência farmacêutica de qualidade.

    Nos termos do artigo 10.° da Deliberação n.º 27/CD/2010, de 24 de Fevereiro, o processo com vista à autorização da instalação de um posto inicia-se mediante requerimento dos interessados, ou proposta das administrações regionais de saúde ou das autarquias locais, dirigido ao Conselho Directivo do INFARMED, IP., ou por Iniciativa deste Instituto.

    Tendo sido recepcionados vários pedidos para Instalação de postos, foi elaborada uma listagem dos mesmos, de forma a apreciar do interesse público na abertura do posto, com indicação do Distrito, concelho, n.º de farmácias no concelho, postos de medicamentos existentes no concelho, estimativa de população residente, n.º de habitantes por farmácia, freguesia e localidade.

    Para apreciar do interesse público na abertura do posto, foram considerados os seguintes critérios, tendo em conta que o critério de distância não é suficiente para apreciação da necessidade de cobertura farmacêutica: 1. Número de Eleitores superior a 1700 habitantes na freguesia; 2. Distância em Km da Farmácia mais próxima superior a 2; Foram apreciados 72 pedidos de instalação de postos farmacêuticos móveis.

    Da avaliação efectuada resultou a decisão de abertura de 14 Postos Farmacêuticos Móveis, conforme Tabela 1 anexa à presente informação, nas seguintes localidades: (…) 13. Póvoa …………., freguesia de …………….., concelho de Loures, distrito de Lisboa; Foram indeferidos os pedidos constantes da Tabela 2, anexa à presente informação, com base nos seguintes critérios: 1. Distância em Km da farmácia mais próxima ser inferior a 2 ou; 2. Número de eleitores ser inferior a 1700 habitantes na freguesia.

    (…) Nestes termos, conforme o prescrito no artigo 10.º, n.º 2 da Deliberação n.º 27/CD/2010, de 24 de Fevereiro, propõe superiormente a publicação de Avisos na 2.ª Série do Diário da República, referentes a cada uma das localidades onde poderá ser Instalado um posto farmacêutico móvel, podendo as farmácias do mesmo município ou dos municípios limítrofes candidatar-se à instalação de posto no local, mediante requerimento a apresentar no prazo de 15 dias úteis após aquela publicação. (…)” (alínea B) dos Factos Assentes).

    3) Em Sessão de 9 de Dezembro de 2010 o Conselho Directivo do INFARMED aprovou a proposta referida na alínea antecedente (alínea C) dos Factos Assentes).

    4) Por Aviso de abertura n.º 1211/2011, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 8, de 12 de Janeiro de 2011, que foi objecto da Declaração de Rectificação n.º 370/2011, publicada em Diário da República, 2.ª Série, n.º 31, de 14 de Fevereiro de 2011, foi aberto um concurso público para instalação de um posto farmacêutico móvel na localidade de …………., freguesia de …………., concelho de Mafra, distrito...

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