Acórdão nº 09524/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução19 de Maio de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por Nuno… e Marta … contra a liquidação oficiosa de IRS, do ano de 1998, dela veio interpor o presente recurso.

Tendo alegado, aí conclui nos seguintes termos: «I.

O presente recurso visa a decisão proferida no processo em referência, que julgou procedente a presente impugnação judicial apresentada pelos Impugnantes Nuno… e Marta… (doravante designados por Recorridos), ao determinar a emissão de liquidação correctiva respeitante ao IRS do exercício de 1998, que considere os Donativos como abatimentos, nos termos do art°56°, n°2, alínea a) do CIRS.

II.

A predita liquidação em crise teve na sua génese acção inspectiva efectuada pela 1ª Direcção de Finanças de … - Serviços de Inspecção Tributária, com incidência na Declaração Anual de Rendimentos dos Recorridos respeitante ao exercício de 1998, no âmbito da qual foram concretizadas correcções meramente aritméticas à matéria tributável em sede de IRS, no valor de Esc.: 2.171.000$00.

As correcções tiveram por base a rubrica "Donativos Concedidos a Outras Entidades", correspondente ao campo 218 do Quadro de Abatimentos e Donativos, onde foi aposto o valor de 2.171.000$00 (já com a inclusão da majoração), decorrente de um donativo no valor de 1.670.000$00 concedido à Fundação … (doravante designada por Fundação).

III.

Os Serviços de Inspecção Tributária entenderam que o valor aposto na rubrica "Donativos Concedidos a Outras Entidades", na Declaração de Rendimentos dos Recorridos, não revestia uma verdadeira liberalidade, pelo facto do Colégio … (estabelecimento de ensino frequentado pelos filhos dos Recorridos) estar integrado na dita Fundação.

IV.

Tendo sido solicitado um pedido de esclarecimento à …, no sentido de justificar se existem quaisquer relações de tutela, dependência ou natureza similar, entre a donatária (Fundação) e o colégio frequentado pelos seus descendentes, foi apresentada uma declaração do colégio segundo a qual "não há qualquer relação de dependência ou tutela entre a Fundação …, sendo que qualquer destas é gerida por órgãos distintos".

Porém, o Relatório da Inspecção constatou que "no rodapé dessa declaração passada em papel timbrado do colégio, lê-se na primeira linha: Fundação …".

V.

Donde resulta, logicamente, que os termos "tutela" e "dependência" foram interpretados muito literalmente, e que se ignorou a expressão "ou relações de natureza similar".

VI.

Embora, no plano teórico, nada obsta a que, tendo o sujeito passivo pago as propinas inerentes à frequência do estabelecimento de ensino, também efectua um donativo à fundação, é certamente aceitável a tese de que a ligação entre as instituições retire às importâncias doadas o carácter de mera liberalidade e ponha em crise o interesse público que condiciona a sua relevância fiscal, nos termos do art°56° do CIRS.

VII.

No caso em apreço, e face aos factos relatados, somos levados a concluir que existe uma relação de tutela ou independência entre o colégio frequentado pelos dependentes dos Recorridos e a Fundação beneficiária, o que lhe retira o carácter de doação, de verdadeira liberalidade, e nos leva a concluir pela existência de uma intenção "de enriquecimento" ou benefício.

VIII.

Da análise dos documentos constantes dos autos, designadamente, os Estatutos da Fundação, dúvidas se levantam quanto ao carácter de liberalidade, quando se refere no art°5°, n°2, "A fundação pode abrir e manter estabelecimentos de ensino não gratuitos como forma de ocorrer às despesas e encargos necessários para a prossecução dos seus fins (...)".

IX.

Apesar de no art°12, alíneas a) e c) dos Estatutos, seja feita referência a que "constituem património da Fundação ... donativos ...a título gratuito", também, logo a seguir refere que "o produto de subscrições ou de actividades da Fundação, e no art.° 13°, e) "Abrir estabelecimentos de ensino, nos termos do n°2 do artº5 dos presentes Estatutos".

X.

Conclusão, aliás que se retira da leitura integral do Regulamento Interno do … onde refere expressamente no n°3 que este é explorado pela Fundação e as suas receitas, para além das necessárias à satisfação das despesas ao seu funcionamento normal, são afectas à prossecução dos fins da Fundação.

XI.

Acresce ainda ao supra exposto, mais alguns factos que evidenciam dúvidas, no que concerne aos montantes pagos pelos Recorridos a título de propinas, pois da consulta de todos os documentos existentes, nomeadamente facturas e recibos, não conseguimos atingir os resultados que serviram de base para o preenchimento do campo 211 da declaração de IRS do ano de 1998.

XII.

Acresce ainda ao supra exposto, mais alguns factos que evidenciam dúvidas, no que concerne aos montantes pagos pelos Recorridos a título de propinas, pois da consulta de todos os documentos existentes, nomeadamente facturas e recibos, não conseguimos atingir os resultados que serviram de base para o preenchimento do campo 211 da declaração de IRS do ano de 1998.

XIII.

Portanto, nos autos, não está demonstrada a natureza de donativo das quantias pagas à instituição religiosa dona do Colégio frequentado pelos dois filhos dos ora Recorridos.

E sendo os ora Recorridos quem vem alegar o direito de que se trata de um donativo, recairá sobre eles o ónus de fazer prova disso mesmo; ónus esse que, entende a Recorrente, não foi provado, de acordo com o disposto no art°74° da LGT.

XIV.

Dito isto, não poderá ser absolutamente irrelevante, do ponto de vista do âmbito de aplicação da norma, que a doação tenha por destinatário estabelecimento de ensino onde os filhos dos Recorridos prosseguem ou desenvolvem a sua aprendizagem escolar.

XV.

Assim, e pelos factos supra expostos, afigura-se-nos que, as correcções à matéria tributável em sede de IRS do exercício de 1998, deverão ser mantidas na esfera jurídica dos Recorridos.

Nestes termos, em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se, em consequência a douta sentença ora recorrida, com as legais consequências, assim se fazendo por Vossas Excelências a costumada JUSTIÇA».

Os Recorridos, notificados da admissão do recurso, contra-alegaram defendendo, em conclusão, que: « (i) A decisão recorrida não merece qualquer censura.

(ii) A recorrente limita-se a insistir, no seu recurso, com o facto dos filhos dos decorridos se terem encontrado, à data dos factos, a prosseguir os seus estudos num estabelecimento de ensino relacionado com a Fundação beneficiária do donativo em...

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