Acórdão nº 12987/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução19 de Maio de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO · O MINISTÉRIO PÚBLICO intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa Ação administrativa de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa contra · IZILDA ……………………….., casada, de nacionalidade brasileira, nascida a 16 de setembro de 1953, em Vila Maria, Estado de São Paulo, República Federativa do Brasil, filha de Saturnino …………….. e de Anésia …………………., residente na Avenida ………………………. 775, 13930-000, São Paulo, Brasil

* Discutida a causa, sem contestação da ré, o referido tribunal decidiu julgar a ação improcedente

* Inconformado, o autor recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: 1. Da matéria factual apurada e documental carreada para os autos, não resulta a pertença ou ligação efectiva da Requerida à comunidade nacional; 2. Dessa prova, apenas, resulta que a Requerida é casada com um cidadão português, nascido no Brasil, que tem nacionalidade brasileira e que tem dois filhos nascidos no Brasil e com nacionalidade portuguesa; 3. Consequentemente, nada se provou que confira à Requerida ligação efectiva à comunidade nacional portuguesa, contrariamente do que se refere na sentença recorrida; 4. E o facto de ser casada com um cidadão português não pode, só por si, ser havido como elemento constitutivo e determinante da sua ligação à comunidade portuguesa pois, por força da lei, essa ligação não decorre automática e exclusivamente do facto de a Requerida ser casada com um cidadão português; 5. No que concerne aos dois filhos que adquiriram a nacionalidade portuguesa, já na maioridade, esse facto desprovido de outras provas não é meio suficiente para demonstrar a ligação da Requerida à comunidade nacional; 6. Sendo assim, não se verifica o requisito da ligação efectiva à comunidade nacional, essencial à concessão da nacionalidade portuguesa; 7. As acções de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa devem ser consideradas como acções de simples apreciação negativa, pois são destinadas à demonstração e consequente declaração judicial da inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional, nos termos do art. º 4º, n.1 e 2, al. a), do CPC

  1. Por conseguinte, a prova dos factos constitutivos do direito a que se arroga competia à Requerida, ora reclamada/recorrida, fazer, 9. Tratando-se de uma acção que é consequência de uma pretensão formulada junto da Conservatória dos Registos Centrais, sempre a esta caberia, de acordo com as regras do ónus da prova, demonstrar os factos constitutivos de tal pretensão

  2. Infere-se, do disposto no n. 1, do art.º 57º do RLN, que "quem requeira (...) deve pronunciar-se sobre a existência de ligação efectiva à comunidade nacional (...)”, pelo que, face ao comando ínsito no art. º 343, n.1, do CC, não pode a Requerida, ora reclamada/recorrida, pelas regras do ónus da prova, eximir-se a tal pronúncia

  3. Tendo decidido como decidiu, a douta sentença recorrida violo u o disposto no artigo 9.º, alínea a) da Lei n. º 37/81, na redacção da Lei n. º2/2006, de 17 de abril, artigo 56. °, n. 1, alínea a) do Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de dezembro e artigo 343. °, n.1, do Código Civil; 12. Pelo que, deve ser revogada e substituída por outra, que julgue procedente a acção de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa a que se reportam os autos

  4. Termos em que, deve ser dado provimento à reclamação/recurso, revogada a sentença recorrida e julgada procedente a acção de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, a que se reportam os autos, com as demais consequências legais, por forma a ser feita JUSTIÇA

    * A ré não contra-alegou

    * Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência. * QUESTÃO A RESOLVER Os recursos, seja para o TCA, seja para o STA, devem ser dirigidos contra a decisão do tribunal a quo e seus fundamentos. Têm o seu âmbito objetivo delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação de recurso, alegação que apenas pode incidir sobre as questões que tenham sido apreciadas pelo tribunal recorrido, ou que devessem ser aí oficiosamente conhecidas. Cabe-nos, assim, resolver a seguinte questão: -A factualidade provada demonstra ou não que a ré tem uma ligação efetiva à comunidade nacional portuguesa? * II. FUNDAMENTAÇÃO II.1. FACTOS PROVADOS Com interesse para a decisão a proferir, está provado o seguinte quadro factual: 1. A Ré Izilda ……………………….., nasceu a 16 de setembro de 1953, em Vila Maria, Estado de São Paulo, República Federativa do Brasil, é filha de Saturnino …………………. e de Anésia …………….., todos de nacionalidade brasileira - cfr. fls. 12 dos autos; 2. A Ré contraiu casamento civil a 26 de março de 1988, no Registo Civil do Jardim América, São Paulo, Brasil, com o cidadão português José ………………., natural de P……………………, São Paulo, Brasil, filho de António……………… e de Claudete ………………… - cfr. fls. 14 e 20-22 dos autos; (FACTO FUNDAMENTADOR/CONSTITUTIVO DO DIREITO EXERCITADO) 3. A Ré reside na Avenida Ana …………………… 775, 13930-000, São Paulo, Brasil - cfr. fls. 11-12 dos autos; 4. No dia 26/07/2013, a R. prestou a declaração para aquisição da nacionalidade portuguesa, nos termos do art. 3.º da Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro, com base no casamento que contraiu com cidadão português, tendo declarado pretender adquirir a nacionalidade portuguesa, nos termos da “Declaração para aquisição da nacionalidade portuguesa”, que aqui se considera integralmente reproduzida, na qual assinalou a opção “Sim” quanto ao item "Tem ligação efectiva à comunidade portuguesa" – cfr. 11-12 dos autos; 5. Marcelo ……………….., nascido em 13 de outubro de 1987, em São Paulo, Brasil, é filho de José António ………………… e de Izilda ……………., tendo o respetivo assento de nascimento sido lavrado na CRC em Lisboa, em 14 de fevereiro de 2013 - cfr. fls. 23 dos autos; 6. Mateus ……………, nascido em 14 de dezembro de 1992, em Campinas, São Paulo, Brasil é filho de José ………………… e de Izilda ……………………., tendo o respetivo assento de nascimento sido lavrado na CRC em Lisboa, em 14 de fevereiro de 2013 - cfr. fls. 24 dos autos; 7. Claudete ………………….., nascida em 26 de agosto de 1937, em Rancharia, Estado de São Paulo, Brasil, é filha de José …………….., natural de Safara, Moura e de Gracinda …………………… batalha, natural da freguesia de Santiago, Lisboa, tendo o respetivo assento de nascimento sido lavrado na CRC em 31 de agosto de 2010 - cfr. fls. 58 dos autos; 8. Com data de 02/01/2014, a Conservatória dos Registos Centrais remeteu à Requerida, o instrumento de fls. 26 dos autos, aqui se considera integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte: “(…) Constitui fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, “a inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional” (cfr. alínea a) do Art.º 9°, da Lei n.º 37/81 de 3 de outubro, na redação que lhe foi dada pela Lei Orgânica n.º 2/2006, de 17 de abril). Sempre que existe a suscetibilidade de tal facto se verificar, é obrigatória a participação ao Ministério Público, para uma eventual dedução de ação de oposição à aquisição da nacionalidade, a instaurar no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa. Se quiser, poderá V. Exª juntar mais e melhores provas de ligação à comunidade nacional portuguesa, as quais serão devidamente ponderadas na decisão de efetuar ou não a referida participação. (...)" – cfr. fls. 26 dos autos

  5. Com data de 7/02/2014, a Ré remeteu à CRC o instrumento de fls. 58 dos autos, que aqui se considera integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte: “(…) Meu marido, com quem sou casada há 25 anos e meus dois filhos já possuem a cidadania portuguesa. Além disso, tenho parentes próximos portugueses de nascimento (cunhada), a qual sempre viveu em Portugal, e, por essa razão de parentesco por afinidade, viajo com frequência com minha família a esse país, a última vez em abril de 2013, hospedando-me na casa dela e do marido. Da mesma forma, quando das visitas dos meus parentes portugueses, é em minha casa que ficam. Como arquiteta, formada no Brasil, gosto muito da história da arquitetura e urbanismo de todo o velho continente, mas tenho muito prazer em ler sobre a arquitetura portuguesa. Assim sendo, a concessão da cidadania portuguesa viria sem dúvida facilitar esse processo de conhecimento. Ainda no campo profissional, como design de interiores, tenho prestado assessoria a amigos portugueses que se dedicam à atividade comercial no ramo de restauração neste país. Conheci recentemente a “Casa de Portugal” sediada na cidade de Campinas. Em que pese o meu interesse em frequentar com mais assiduidade esta agremiação, tal não se concretiza na intensidade que desejo devido estar residindo na cidade de Serra Negra, que fica distante 80 km. Para finalizar, acho que a cidadania portuguesa me proporcionaria muitas oportunidades e, com certeza, ficaria mais estimulada para conhecer melhor esta cultura, além de poder realmente visitar Portugal com minha família, não como turista, mas na mesma situação que meu marido e filhos. Anexos: 14 (…)” - cfr. fls. 34-38 dos autos; 10. Isabel ………………………….. e Ricardo …………………….., são cunhados da Ré e têm residência na Figueira da Foz - cfr. fls. 37-39 e 41 dos autos; 11. Juventina …………………… e Sheila …………….. são amigas da Ré e exploram um restaurante em Setúbal - cfr. fls. 40 e 42-46 dos autos

    * Continuemos

    II.2. APRECIAÇÃO DO RECURSO Aqui chegados, há melhores condições para se compreender o recurso e apreciarmos o seu mérito de modo sindicável, com base em argumentos jurídicos explícitos e racionais, que respeitem o Direito e a Constituição, designadamente os direitos individuais ou de liberdade, o princípio fundamental da legalidade de todas as atividades de administração pública e, ainda, os corolários jurídicos do ideal de justiça. Isto quer dizer que o disposto nos artigos 2º, 13º, 17º, 18º/2, 112º, 266º, nº 2, e 268º, nº 4, da Constituição e nos artigos 6º a 10º do Código de...

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