Acórdão nº 12989/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCHÃO MARQUES
Data da Resolução22 de Setembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório S……………….-serviços …………………., s.a., intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, ao abrigo do disposto nos artigos 100.º e ss. do CPTA, contra o ministério da economia e os contra-interessados, r…………. – ………….., lda, s…………- ………., s.a.

e s……….- s………., ……………., lda, uma acção administrativa especial de contencioso pré-contratual, requerendo a anulação dos actos de adjudicação praticados no âmbito do procedimento pré-contratual de Concurso Público n°4/SG/2014 -"Aquisição de Serviços de Vigilância e Segurança para os Organismos do Ministério da Economia", da autoria da Entidade Demandada, que identifica como sendo: “(i) Acto de adjudicação quanto ao Lote 1 - DIREÇÃO-GERAL DAS ACTIVIDADES ECONÓMICAS (DGAE), através da qual se seleccionou a proposta da concorrente R……., pelo valor de € 46.147,52, relativo a 34 meses de execução contratual; (ii) Acto de adjudicação quanto ao Lote 5 - AUTORIDADE DE SEGURANÇA ALIMENTAR E ECONÓMICA (ASAE), através da qual se seleccionou a proposta da concorrente S………….., pelo valor de € 552.230,04, relativo a 34 meses de execução contratual; (iii) Acto de adjudicação quanto ao Lote 11 - INSTITUTO DO TURISMO DE PORTUGAL, I.P. (ITP), através da qual se seleccionou a proposta da concorrente S………….., pelo valor de € 1.761.429,96, relativo a 34 meses de execução contratual.” O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por acórdão, julgou a acção improcedente e absolveu a Entidade Demandada de todos os pedidos.

Inconformada com o assim decidido, a Autora, ora Recorrente, interpôs recurso de revista (per saltum) para o Supremo Tribunal Administrativo, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: (A) A Revista e as questões de Direito em causa 1.ª A presente Revista é apresentada nos termos e para os efeitos do artigo 151° do CPTA, porquanto todos os seus pressupostos se acham preenchidos: (i) o fundamento do Recurso é a violação de lei substantiva, traduzida nos erros de julgamento de Direito cometidos pelo Tribunal a quo; (ii) o valor da causa é superior a €3M; (iii) incide o Recurso sobre uma decisão de mérito, (iv) não atinente a questões de funcionalismo público ou relacionadas com formas públicas ou privadas de proteção social.

  1. O fundamento da ação de contencioso pré-contratual trazida aos autos de 1.ª instância residiu, essencialmente, na circunstância de os preços propostos pelos contra-interessados R…………, S………. e S…………. nos respetivos Lotes l, 5 e 11 do procedimento tramitado pela SECRETARIA-GERAL DO MINISTÉRIO DA ECONOMIA se revelarem insuficientes para cobrir os custos legal e regularmente obrigatórios, associados à prestação dos serviços em causa naquele procedimento e no contrato entretanto celebrado, nomeadamente os custos resultantes de normas imperativas de natureza laboral e social.

  2. Numa palavra: a questão trazida aos autos pela S…………. foi a de saber se, por revelarem preços insuficientes para cobrir os custos implicados na prestação dos serviços em causa nos contratos a celebrar pelas entidades abrangidas pelo procedimento tramitado, maxime relativos aos custos laborais e sociais juridicamente obrigatórios, as propostas daqueles dois concorrentes deveriam, ao contrário do decidido pela SECRETÁRIA-GERAL DO MINISTÉRIO DA ECONOMIA, ter sido excluídas.

  3. No Acórdão recorrido, limitou-se o Tribunal a quo a (i) de um lado, identificar a questão sob tratamento como o "pedido de anulação dos atos de adjudicação - por «insuficiência» dos preços propostos pelas contra-interessadas para cobrir os, alegadamente, custos mínimos obrigatórios da prestação de serviços", (ii) de outro e consequentemente, citar jurisprudência alegadamente incidente sobre a mesma matéria para, (iii) por fim, concluir que "Pelos citados Acórdãos, tanto de primeira, como de segunda instância, se constata que a jurisprudência tem sido unânime nesta matéria, ou seja, considerar que inexiste uma matriz pré-determinada de formação de preço, inexistindo qualquer tipo de prática de preço mínimo para as prestações de serviços de vigilância. Termos em que, não colhem os argumentos expendidos pela Autora, devendo, em consequência, improceder a presente ação".

  4. Em concreto, o que resulta do Acórdão recorrido são duas teses jurídicas diferenciadas, situadas em dois diferentes planos de argumentação.

  5. O entendimento último do Tribunal a quo é o de que não existem custos mínimos obrigatórios a que, na prestação de serviços de segurança e vigilância, as empresas do sector tenham de assegurar na formação do preço que propõem em sede de procedimentos pré-contratuais - eis a primeira tese jurídica.

  6. Aceitando porém que os referidos custos mínimos obrigatórios pudessem ser determinados não haveria, em qualquer caso, qualquer amparo no Direito da Contratação Pública para que propostas que os não respeitassem viessem a ser excluídas - eis a segunda tese jurídica.

  7. O facto de o apuramento dos referidos custos mínimos e da insuficiência das propostas das contra-interessadas não resultar da matéria de facto assente não converte o exercício que se requer a este Supremo Tribunal Administrativo num exercício meramente condicional, sem que possa ser aplicado de forma definitiva aos autos.

  8. Com efeito, foi a assunção daquela primeira tese jurídica - segundo a qual tais custos mínimos não existem ou, pelo menos, não seriam juridicamente relevantes - que bloqueou o próprio Tribunal a quo ao seu apuramento e confronto in casu.

  9. O Acórdão recorrido não se limitou pois a simplesmente dispensar o apuramento desses custos mínimos; mais profundamente, o que o coletivo de juízes verteu na sua decisão foi a conclusão, logicamente anterior, segundo a qual "inexiste uma matriz pré-determinada de formação de preço, inexistindo qualquer tipo de prática de preço mínimo para as prestações de serviços de vigilância", sendo esta uma conclusão jurídica cuja apreciação cabe no âmbito desta Revista.

  10. Também cabe nesta Revista a apreciação da segunda tese jurídica enunciada no Acórdão recorrido, isto é, a tese segundo a qual inexistiriam mecanismos no Direito da Contratação Pública que imponham a exclusão de propostas abaixo do preço de custo.

  11. Assim, constituem objeto da presente revista duas questões de Direito: (1) Na formação de preços de propostas para a prestação de serviços de segurança e vigilância apresentadas em sede de procedimentos pré-contratuais, os concorrentes estão subordinados a um conjunto de custos mínimos obrigatórios de matriz laboral e social que resultam das normas legais, regulamentares e convencionais aplicáveis? (2) No Direito da Contratação Pública existem mecanismos que imponham ao Júri dos procedimentos a exclusão de propostas cujo preço não reflita o cumprimento desses custos mínimos obrigatórios! (B) O erro de julgamento de Direito do Tribunal a quo refletido na conclusão de que não existem «custos mínimos obrigatórios» aplicáveis ao setor da segurança e vigilância 13.ª A ser tomada em toda a sua extensão, a primeira tese jurídica do Tribunal a quo implicaria (i) esquecer que, para a prestação de serviços de segurança, as empresas do sector necessitam de recorrer a vigilantes, (ii) vinculados através de Contrato de Trabalho e que (iii) da normação (legal, regulamentar e convencional) que incide sobre essas relações laborais resulta, efetivamente, um conjunto - indisponível - de custos cujo cumprimento tais empresas têm pois de assegurar.

  12. Subsiste, porém, uma inarredável confusão quanto a essa tese: por influência do modo como foram decididas as adjudicações no procedimento pré-contratual em causa, o Tribunal a quo não compreendeu as diferenças entre custos variáveis e custos mínimos obrigatórios; os primeiros dependem, efetivamente, da própria conformação da liberdade empresarial de cada empresa, não lhes estando associada, pois, qualquer matriz pré-determinada; já os segundos são o resultado da incidência de normas de natureza legal, regulamentar e convencional inderrogáveis e aplicáveis a todo o setor da segurança e vigilância.

  13. No caso dos autos nunca esteve em causa apreciar a forma, mais ou menos livre, como os concorrentes incorporam no seu preço custos que, por definição, se apresentam como variáveis (isto é, os conhecidos no sector como outros custos relacionados com o trabalho e os custos de estrutura e serviços); antes, os custos sempre apontados pela ora Recorrente reconduziam-se, apenas e só, aos custos diretamente resultantes da normação laboral (de fonte legal, regulamentar e convencional) que incide sobre as relações estabelecidas entre qualquer empresa do sector e os seus trabalhadores, ou seja, os custos relacionados com a remuneração desses trabalhadores.

  14. A insuficiência do preço proposto pelos concorrentes graduados acima da S………… nos Lotes l, 5 e 11 revelou-se quanto aos "custos mínimos diretos com o trabalho", isto é, os custos necessariamente implicados na prestação do serviço dos vigilantes que executarão as prestações a contratar com a Administração, e nos quais se incluem: (i) o salário; (ii) a retribuição das férias; (iii) os subsídios de férias e de natal; (iv) a retribuição do trabalho noturno; (v) o trabalho em dias feriado; (v) a taxa social única e (vi) o subsídio de alimentação. Isto é, estão em causa custos a que toda e qualquer empresa se encontra, por lei (legislação do trabalho) e regulamento (convenções coletivas do trabalho aplicáveis), vinculada.

  15. Por controvertido que tenha sido o seu apuramento nos autos de primeira instância, nunca nenhuma das partes envolvidas logrou negar, como parece ter feito o Tribunal a quo, que tais custos mínimos obrigatórios efetivamente existem e são vinculativos para todo o sector.

  16. Está, assim, contrariada a primeira tese jurídica que fundou a decisão recorrida e, bem assim, resolvida a primeira das questões trazidas a esta Revista: há custos mínimos que todos os operadores do sector da...

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