Acórdão nº 2749/16.7BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelHELENA CANELAS
Data da Resolução19 de Abril de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO V...

    , nacional da Rússia (devidamente identificado nos autos) instaurou em 28-11-2016 no Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa a presente ação urgente (prevista no artigo 22º da Lei nº 27/2008) contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA visando a impugnação da decisão da Diretora Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) de 08-09-2016, de que resultou a recusa na concessão de proteção internacional que havia sido por ele requerido em 27-07-2016, cuja anulação peticionou, bem como a condenação da Entidade Demandada na prática do ato devido de concessão do direito de asilo, ou, caso assim não se entenda, de concessão de autorização de residência por proteção subsidiária, inconformado com a sentença de 13-12-2017 do Tribunal a quo que julgou totalmente improcedente a ação, absolvendo o réu do pedido, vem dela interpor o presente recurso.

    Formula as seguintes conclusões, nos seguintes termos: I. Da análise das declarações do Autor, que não foram postas em causa e do depoimento da testemunha, não se pode dar como provado “Que o A. alguma vez tenha sido perseguido pelas autoridades russas ou pela polícia russa, direta ou indiretamente, por ser homossexual”, pelo que deve o mesmo ser removido daquele item, e II. E a contrario, acrescentar este ponto ao elenco dos factos provados que “18. O A. foi perseguido indiretamente, pelas autoridades russas ou pela polícia russa, por ser homossexual”, isto também e porque, III. O A. é um homem avisado, com formação superior, se entendesse que era apenas uma ameaça social sem fundamento, isto é, se a Federação Russa por algum motivo conhecesse a sua orientação sexual nada faria contra si, teria medo e abandonava a sua profissão, ou negaria a sua orientação sexual à polícia apenas por causa de um património que já se encontrava destruído? Não.

  2. Por outro lado, a Douta sentença refere que “A orientação sexual das pessoas não as insere automaticamente num grupo social (Mesmo nos casos em que existem lobbies de homossexuais – o que não é o caso dos autos – os mesmos não configuram grupos sociais). - Assim, o caso configurado pelo A. não tem enquadramento no artigo 3º da Lei nº 27/08, de 30.06, que, portanto, não tem aplicação ao caso” o que é um erro jurídico, dado que por grupo social, (e porque não nos bastamos com a Lei Nacional nomeadamente no que diz respeito a refugiados e à ACNUR) - nomeadamente devido à orientação sexual - os homossexuais são considerados como grupo de risco, tal como considerado na obra “Minorias sexuais enquanto “grupo social” e o reconhecimento do status de refugiado no Brasil”, de THIAGO DIAS OLIVA, SÃO PAULO, 2012.

  3. O que só por si, levaria e conduziria a uma decisão procedente quanto ao pedido de asilo por via da orientação sexual.

  4. Já quanto ao pedido de residência por razões humanitárias, a perseguição objetiva deveria ter sido dada como provada considerando toda a prova documental carreada para os autos.

    E a que se acrescenta, por ser superveniente à data de entrada da PI, a 23 de outubro de 2017, pode ler-se no http://observador.pt/2017/10/23/ativistas-alegam-que-cantor-russo-foi-torturado-e-morto-em-campo-de-concentracao-anti-gay-na-chechenia/ O cantor russo Zelimkhan Bakaev terá sido preso, torturado e morto em setembro num campo de concentração na República da Chechénia — um território que pertence à Federação Russa e que é conhecido por perseguir homossexuais. O caso está a correr os media um pouco por todo o mundo, mas a denúncia foi feita por ativistas e organizações de defesa da comunidade LGBT — Lésbicas Gays Bisexuais e Transexuais.” E VII. https://g1.globo.com/mundo/noticia/ativista-russo-revela-que-foi-vitima-de- perseguicao-e-tortura-contra-gays-na-chechenia.ghtml «O ativista russo Maxim Lapunov fala à imprensa nesta segunda-feira (16) em Moscou, sobre como foi perseguido e sofreu agressões na Chechênia por ser gay (…) O ativista russo Maxim Lapunov é o primeiro homossexual que desafiou as ameaças de morte das forças de segurança da Chechênia para denunciar publicamente as torturas e a perseguição em massa dos gays nessa república do Cáucaso na Rússia.

  5. O que há na Chechénia é um campo de concentração para homossexuais, por isso as ofensas físicas apenas naquele campo se verificam. Estes são levados para aquele campo de concentração.

  6. Como se sabe a Chechénia pertence à Federação Russa, sob a alçada e domínio total da Rússia (que até a ocupa!), pois nenhum Estado reconheceu a independência da Chechénia.

  7. Por definição, um campo de concentração para homossexuais, implica que as agressões sejam infligidas apenas naquele espaço, de forma generalizada.

  8. Tais provas são de conhecimento oficioso, por se tratar de notícias consideradas sérias e válidas, de resto prova não impugnada pelo requerido SEF e portanto admitida por acordo, (o mesmo valendo quanto ao pedido de asilo), pelo que, também põe em causa a informação 1860/GAR/2016.

    Assim como prova o que se alega quanto à ausência de associações de defesa dos direitos dos homossexuais XII. Estamos assim, salvo melhor opinião, perante uma nulidade de sentença porquanto os fundamentos estão em oposição com a decisão.

  9. Acresce a este erro de valoração de prova que o Tribunal a quo, desvirtua a impugnação especificada pelo Autor quando na sua sentença diz exatamente o contrário.

  10. Não atendeu, nem deu como facto assente as notícias indicadas pelo Autor, e perfeitamente identificadas, podendo ser consultadas na rede informática (internet) em que demonstram inequivocamente o alegado pelo mesmo, como sejam os atropelos sistemáticos e reiterados dos Direitos Humanos, como sejam a perseguição aos homossexuais, e não apenas um qualquer episódio isolado pela sociedade civil, estribado em convicções pessoais, desvalorizando o “CAMPO DE CONCENTRAÇÃO” XV. Não atendeu nem entendeu que o recurso às autoridades iria agravar a sua situação perante a sua família, nomeadamente o cunhado do seu companheiro, agente de autoridade (FSB – Serviços Secretos sucedâneo do KGB, do qual era funcionário o Presidente Putin, a quem o A. faz contra propaganda politica – social, facto provado, n.º 7).

  11. A ACNUR emitiu em Novembro de 1994 um parecer sobre os procedimentos de asilo justos e céleres cujos princípios básicos se enquadram perfeitamente no processo do A. e que se transcrevem: “No interesse dos A.s de asilo e dos estados envolvidos, os procedimentos para a determinação do estatuto de refugiado devem ser justos e céleres. Procedimentos justos, em conformidade com os requisitos da proteção internacional, requerem uma análise cuidada do pedido, por um órgão de decisão devidamente identificado, qualificado, conhecedor e imparcial. Dadas as dificuldades que os legítimos refugiados frequentemente enfrentam na apresentação de provas documentais, e outras, para suporte dos seus pedidos, os A.s de asilo que, na generalidade, são credíveis e cujas declarações são coerentes e plausíveis, devem ter direito ao benefício da dúvida nesses procedimentos. É também essencial que haja uma revisão independente das decisões negativas. Estas garantias são de importância crucial, dado que uma decisão errónea, conduzindo ao reenvio involuntário de um refugiado para uma situação de perigo, pode ter consequências trágicas. A inexistência de garantias suficientes contra o reenvio de refugiados para países onde existe risco de perseguição pode resultar numa quebra do princípio de non- refoulement.” XVII. Ora, à luz do disposto no art.º 14.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, “em caso de perseguição, toda a pessoa tem o direito de buscar asilo e de receber o benefício dele em qualquer país”.

  12. Veja-se o que refere nas “Diretrizes sobre proteção internacional n.º 9 Solicitações de Refúgio baseadas na Orientação Sexual e/ou Identidade Género no contesto do artigo 1A(2) da Convenção de 1951 e/ou Protocolo de 1967 relativo ao Estatuto dos Refugiados (http://www.acnur.org/t3/fileadmin/Documentos/BDL/2014/9748.pdf?view=1): “39. Os agentes de perseguição podem justificar a violência contra indivíduos LGBTI fazendo referência às suas intenções de “corrigir”, “curar” ou “tratar” a pessoa78. A intenção ou o motivo de agente perseguidor pode ser um fator relevante no estabelecimento do “nexo causal”, mas não é um pré-requisito79. Não é preciso que o agente perseguidor tenha a intenção de aplicar uma punição para que o nexo causal seja estabelecido80. O foco deve se manter nas razões que o solicitante tem para sentir um fundado temor, conforme as circunstâncias do caso, e em como ele ou ela lidariam com aquela violência, independentemente do que se passa na consciência do agente de perseguição. No entanto, quando for possível demonstrar que o agente de perseguição atribui ou imputa ao solicitante uma das razões trazidas pela Convenção, isso será suficiente para satisfazer o nexo causal81. Se o agente de perseguição é um ator não-estatal, o nexo causal estará presente se o ator não-estatal tem a capacidade de violentar uma pessoa LGBTI por uma das razões da Convenção ou se o Estado provavelmente não irá proteger essa pessoa por uma das razões da Convenção82.

  13. Dispõe o artº 7º da Lei nº 27/2008, de 30 de Junho que será concedida autorização de residência por razões humanitárias “aos estrangeiros e aos apátridas a quem não sejam aplicáveis as disposições do artigo 3.º e que sejam impedidos ou se sintam impossibilitados de regressar ao país da sua nacionalidade ou da sua residência habitual, quer atendendo à sistemática violação dos direitos humanos que aí se verifiqu e, quer por correrem o risco de sofre r ofensa grave.” XX. Como o Tribunal a quo entendeu não atender a todas as notícias apresentadas pelo A. – a sua prova – decidiu não conceder a autorização de residência por razões humanitárias com base na sua supra citada Lei ao abrigo da “sistemática violação dos direitos humanos que aí se verifiqu e” nestes caso não passa pelo perigo direto ou risco pessoal, mas antes pela referida...

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