Acórdão nº 08002/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 28 de Fevereiro de 2018
Magistrado Responsável | ANA CELESTE CARVALHO |
Data da Resolução | 28 de Fevereiro de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO João ……………….., devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada ação administrativa comum, sob forma ordinária, para efetivação de responsabilidade civil, contra a EP – Estradas de Portugal, EPE, na qual pediu a sua condenação no pagamento da quantia de € 4.434,31, a título de danos não patrimoniais, do montante de € 8.978,36, corresponde aos prejuízos sofridos em decorrência «da impossibilidade de […] exercer a sua actividade como arquitecto paisagista liberal, devido à sua transferência para Coimbra e à depressão que sofreu», e do valor de € 55.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, no valor global de € 68.412,67.
Por sentença daquele Tribunal datada de 28/02/2011, tal ação foi julgada parcialmente procedente e a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de € 15.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, no mais, absolvendo a Ré dos pedidos contra ela formulados.
Inconformado o aqui Recorrente apelou para este Tribunal Central Administrativo, tendo terminado as suas alegações (cfr. fls. 394 – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), com as seguintes conclusões, que infra se reproduzem: “Matéria de facto A - O referido no quesito 4 b) constitui uma mera concretização, e conclusão por cálculo aritmético, daquilo que já se encontrava adquirido nos factos N) e O) (nos quais se somam precisamente 20 semanas em que o Autor se deslocou efectivamente a Coimbra para trabalhar) e nas respostas positivas aos quesitos 2° e 3° (que relatam as deslocações do Autor a Coimbra na sua viatura em cada semana e a posterior volta a casa no final de semana, bem como a distância - 220 km - entre a casa do Autor e a DSREC), pelo que, a não ser por padecer de erro de cálculo, sempre seria contraditório dar essa matéria como não provada, como acabou por acontecer.
B - A resposta ao quesito 4 b) deverá, portanto, ser alterada para “Provado”.
C - Também o esclarecimento da resposta ao quesito 11 (“Provado com o esclarecimento de que não ficou provado que o Autor tenha estado efectivamente 4 meses em Coimbra”) é contraditório com o já dado como assente nos factos M), N) e O) da matéria assente, principalmente os factos M) e N), nos quais se constata que o Autor esteve em Coimbra, numa primeira fase, antes da baixa psiquiátrica, durante precisamente 4 meses (de l de Outubro de 1997 até ao final de Janeiro de 1998), sendo a estes quatro meses que se reporta o fragmento do quesito 11 onde se refere: “logo nos primeiros 4 meses”.
D - A referência aos 4 meses em causa diz respeito apenas ao período em que o Autor esteve colocado em Coimbra, não pretendendo significar que o Autor trabalhou durante todos os dias desses 4 meses.
E - Pelo que deverá ser eliminado o esclarecimento da resposta ao quesito 11.
Danos patrimoniais F - Demonstrado que foi que o Autor se deslocou de casa a Coimbra e volta no seu veículo por 20 vezes, num total de 8800 km, conforme resulta dos factos N), O), e das respostas aos quesitos 2° e 3° e ainda da alteração da resposta ao quesito 4 b) acima preconizada, e que pernoitou em Coimbra e trabalhou efectivamente nessa cidade durante 63 dias - cfr. facto Q), e respostas aos quesitos 2° e 3° - não procede a afirmação de que as despesas resultantes dessas deslocações e estadias não foram causadas pelo acto administrativo em causa.
G - Nem procede a afirmação de que o Autor teria recebido todas as ajudas de custo a que tinha direito, pois não só isso não é correcto, atento o disposto no art.6° do D.L. n° 519-M/79, como, em rigor, o que o Autor peticiona não é a atribuição de ajudas de custo a que teria direito, mas apenas que a indemnização pela violação do seu direito tenha em conta, no mínimo - e porque os recibos que o Autor tinha guardado foram destruídos por uma inundação - os montantes que o próprio legislador reputa de justos para casos de deslocação extraordinária dos funcionários públicos.
H - Se o direito violado no caso em apreço foi o direito do Autor a só ser transferido para Coimbra com respeito pela condição por este imposta para dar o seu acordo, e se essa condição foi a de a JAE providenciar e custear alojamento em Coimbra para o seu agregado familiar (que o Autor não conseguia suportar como sempre disse à JAE), o que permitiria que este vivesse em casa com a sua mulher e filhos, sem ter que pernoitar fora nem deslocar-se para fora de Coimbra para voltar a casa, então a indemnização pela violação desse direito há de incluir, ao nível dos danos patrimoniais, as despesas com deslocações e pernoitas que não teriam sido necessárias se o direito do Autor tivesse sido respeitado (isto é, se tivesse sido deslocado para Coimbra com cumprimento das condições por si impostas ou se pura e simplesmente não tivesse sido deslocado, por não se pretender cumprir a sua condição).
I - Pelo que a decisão recorrida, ao negar ao Autor a indemnização peticionada em 1) da Petição Inicial, viola o direito do Autor ao ressarcimento dos danos que sofreu, e, em concreto, o art. 22° da CRP, o art.2° do D.L. n° 48051, e os arts. 562° e 563° do Código Civil.
J - Não procede a afirmação, na p. 27 da Sentença recorrida, de que o Autor não teve qualquer prejuízo atendível ao nível da perda de rendimentos da sua actividade liberal por ter dado o seu consentimento, ainda que condicionado, à sua transferência para Coimbra, e de que não auferiria, por isso, quaisquer rendimentos desse tipo mesmo que tivessem sido respeitadas as suas condições.
L - Tal afirmação - na qual se fundamentou o indeferimento do peticionado em 2) da PI. - não tem em devida conta a condição imposta pelo Autor e violada pela JAE, e o valor, inclusivamente monetário, que o cumprimento dessa condição tinha para o Autor.
M - É que, precisamente, o Autor só estaria disposto a abdicar temporariamente dos rendimentos da sua actividade liberal caso a Entidade Demandada lhe tivesse proporcionado a habitação de que necessitava cm Coimbra: só nesse caso se julgaria suficientemente compensado para aceitar abdicar da referida actividade.
N - Por outro lado, a averiguação do que devem considerar-se como danos ou prejuízos acrescidos e atendíveis, isto é, prejuízos causados pelo acto administrativo ilegal e ilícito, tem forçosamente que passar por um juízo de prognose póstuma que abstraia do referido acto administrativo, sem adição de quaisquer outros cursos causais virtuais, e determine qual a situação que ocorreria caso esse acto não tivesse sito praticado, isto é, como se o acto pura e simplesmente não tivesse existido.
O - E a verdade é que se o acto administrativo em causa não tivesse existido, o Autor não teria deixado a sua actividade liberal com os respectivos rendimentos.
P - Por outro lado, se o acto administrativo tivesse sido praticado com respeito pelas condições do Autor, este teria ficado compensado pela perda temporária dessa actividade através do cumprimento das referidas condições.
Q - Como não aconteceu nem uma coisa nem outra, a perda de rendimentos do Autor pelo seu trabalho a título liberal não poderá deixar de ser considerada como um dano (lucro cessante) efectivamente causado pelo acto administrativo em causa.
R - Tendo ficado clara e expressamente demonstrada a existência (cfr. as respostas aos quesitos 23°, 24°, 25°, 26°, 27°, 28° e 30°), mas não o quantitativo exacto desse prejuízo (tendo em conta as respostas negativas aos quesitos 31° e 32°), deveria a Entidade Demandada ter sido condenada, quanto ao peticionado em 2) da P.I., a pagar ao Autor uma indemnização de valor a liquidar em momento ulterior, ou, quando muito, a pagar ao Autor uma indemnização fixada equitativamente, pelo que ao não o fazer a Sentença recorrida violou o artigo 22° da CRP, o artigo 2° do D.L. n° 48051, o artigo 564°, n°s l de 2 do Código Civil, o art. 661°, n 2 do CPC e ainda o art. 566°, n° 3 do Código Civil.
Danos não patrimoniais S - O quantitativo indemnizatório fixado a título de danos não patrimoniais é claramente insuficiente para compensar o Autor devidamente pelos danos não patrimoniais que este sofreu, pecando a decisão recorrida por ter aderido à já ultrapassada, e crescentemente condenada pela doutrina, tendência minimalista na fixação de quantitativos indemnizatórios por danos não patrimoniais.
T - Os danos sofridos pelo Autor não se resumiram a uma “grande instabilidade psicológica" e à ''perturbação que o Autor sofreu, conjuntamente com o seu agregado familiar”, U - E nem sequer constituem um único tipo de dano não patrimonial.
V - Por um lado, o Autor sofreu danos morais em sentido estrito, no sentido em que ficou afectado na sua integridade moral, na sua dignidade e na sua honra, a saber, concretamente: profunda tristeza e angústia pela solidão e o afastamento da sua numerosa família; forte instabilidade emocional; humilhação pela desconsideração que todas as tentativas que fez junto da JAE para evitar o apartamento da sua família, e por se ter sentido desprezado pela sua entidade empregadora; permanente contrariedade; frustração pela noção da perturbação, tristeza e transtorno que a sua ausência criou na sua mulher e nos seus nove filhos, habituados à constante presença da figura paterna e ao acompanhamento e auxílio do pai; nervosismo; acabrunhamento; debilitação psíquica, irascibilidade crescente, tudo conforme resulta das respostas aos quesitos 1°, 6°, 7°, 8°, 11°, 12°, 13°, 14°, 15°, 16°, 17° e 18°, constantes da fundamentação de facto, nas quais ficou patente e expresso cada um dos concretos danos morais acima enumerados.
X - Por outro lado, o Autor sofreu o chamado dano biológico (dano na saúde, é dizer, na integridade física e psíquica), porquanto toda a situação que viveu o deixou efectivamente doente, tendo-lhe sido diagnosticada ansiedade e depressão, com prescrição médica de psicofármacos e...
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