Acórdão nº 03053/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelEugénio Sequeira
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: A. O Relatório.

  1. A...e Filhos, Lda, identificada nos autos, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo M. Juiz do então Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Coimbra, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: A) A decisão recorrida é nula nos termos do art° 668° n° 1 alínea d) do CPC por não ter conhecido da questão colocada nos artigos 83° e 84°da p.i.; B) O acto tributário é ilegal, ilegalidade de que o tribunal ad quem deve conhecer por substituição pois havendo o fisco feito uma fixação do volume de transacções derivadas de prestações de serviços em cada um dos anos e estando elas sujeitas à taxa de 16% ou 17% (depois da Lei n.º 2/92, de 9/03 ou antes), haveria de ter calculado o IVA relativo a elas a estas taxas e aplicar o critério do Despacho Normativo n.º 106/85, de 14 de Novembro apenas às restantes transacções de bens (de ouro ou prata), o que não fez; C) O acto tributário é ainda ilegal, por vício de falta de fundamentação; D) “O dever de fundamentação cumpre-se numa declaração de autoria da entidade decidente em que exprimam, de forma contextual ou contemporânea da decisão, ainda que pela apropriação de elementos de ponderação relevantes anteriores, - mas que, em tal hipótese, tem de ser expressa e inequívoca a referência aos elementos apropriados -, as razões de facto e de direito que consubstanciam os motivos e os pressupostos daquela" - Ac. de 14.1.2003, Proc. 3689/00, Senhor Juiz Desembargador Lucas Martins - o que no caso subjudice, não se verifica de todo.

    1. A matéria de facto dada como provada é em si mesma contraditória, bastando para isso atentar-se nos factos constantes dos nºs 23),24),29) e 32) do supra art° 35° com o facto de que o exercício de 1991 é o único (exercício) em que o inventário permite um controlo sobre a actividade; F) Por tal razão, a impugnação teria que proceder no mínimo quanto ao exercício de 1991, porquanto, neste exercício não estão indicados pressupostos de facto que sejam suficientes para sustentar a legalidade do exercício do poder, como não se verificam os pressupostos de facto correspondentes aos abstractamente exigíveis e enunciados nos referidos preceitos para que se possa considerar exercido legalmente o poder tributário de fixação de imposto por métodos indiciários e por presunções ou estimativas, por apenas se verificarem as incorrecções referidas nos supra artigos 41º e seguintes; G) Por outro lado, salvo o devido e muito respeito, o M.º Juiz a quo limitou-se a debitar para o probatório factos genéricos e indeterminados e a deixar por valorar outros que inequivocamente abonam a favor da recorrente, como sejam os referidos nos supra artigos 58° e 59°, importando pois corrigir o quadro factual; H) O mesmo se verificando quanto à matéria levada ao probatório de que os inventários impossibilitam a comprovação directa e exacta da contabilidade, pois tal facto tem de ser visto de uma forma integrada com o que se referiu nos supra artigos 47° e seguintes que aqui se dão por reproduzidos; I) A falta de idoneidade do invocado facto do valor dos serviços prestados contabilizados pela recorrente ter sido sempre inferior ao do custo dos trabalhos especializados executados no exterior para a sua obtenção (de razão de convincência, Cfr. O Dever de Fundamentação Expressa dos Actos Administrativos, J.

    Carlos Vieira de Andrade, págs. 231 (maxime), 236, 237, 243, 276 e 297) para legitimar a inferência feita de subtracção à tributação de receitas por cobrança de prestações de serviços está abertamente manifestada na sua atitude de aceitar o critério da impugnante relativamente ao ano de 1994; J) Sendo que o critério utilizado pela fiscalização se revela errado, citando-se a propósito a exemplar leitura constante do Acórdão desse Venerando Tribunal de 16.10.2001 tirado no processo n.º 4606/00 em que foi relator o Senhor Iuiz Desembargador J.C.

    Correia: "Tendo a impugnante invocado situações tais como vendas com desconto através de cartão de crédito, vendas com desconto a clientes habituais, ou em compras de valor elevado (...) que por apelo à experiência comum de vida e ao bom senso, se verificam na normalidade do comércio retalhista em causa e influenciam directamente a margem de lucro média, as mesmas deveriam ser consideradas, salvo no que tange à quantificação da influência dessas circunstâncias no cômputo da margem de lucro onde teria de haver sempre uma margem de apreciação discricionária. O que não era consentido à administração fiscal era que pura e simplesmente ignorasse factores relevantes e de verificação notória; ao fazê-lo inquinou de erro invalidante o cálculo da margem de lucro e as subsequentes operações daí decorrentes, designadamente o acto de liquidação do imposto”; K) A amostragem que a fiscalização realizou é, antes de mais injustificada, pois como escreveu o Senhor Juiz Desembargador João António Valente Torrão, no acórdão tirado no processo n° 3395/00, de 14.11.2000, "a utilização da amostragem para efeitos de determinação da matéria tributável para efeitos de IVA, por métodos indiciários, implica que as amostras utilizadas sejam reflexo da população donde são retiradas, devendo ser justificada a razão da escolha das amostras. Não pode aceitar-se como válida uma amostragem que pretende determinar a margem de lucro, utilizando amostras aleatoriamente escolhidas e sem que elas reflictam o preço e as quantidades dos produtos que constituem o volume de negócios do contribuinte, e se limita a somar o lucro obtido em cada uma dessas amostras, dividindo o total pelo número de amostras”; L) Ora, em primeiro lugar, a amostra foi feita com base nos preços com que os produtos estão marcados nos expositores de venda e toda a gente sabe, como aliás resulta do processo que a recorrente, cumprindo uma regra de estilo comercial deste sector de comércio tradicional, vendeu sempre os seus produtos aos clientes em geral com base numa negociação directa com eles em que entram sempre, com diferente ponderação, o valor do ouro no mercado, o valor do "feitio", a originalidade do produto, o estado da economia mormente quanto à classe média que é a sua principal cliente, a concorrência, a época do ano, etc. e tudo isto levando a margens de lucro muitíssimo inferiores e com relação a clientes especiais, como os portadores de cartão jovem, clientes mais assíduos e empresas emissoras de cartões de crédito ainda com margens de lucro muito inferior, sendo que foram utilizadas apenas uma lista de 30 produtos e, na sua grande expressão, de baixo valor e em que por uma razão de haver maior possibilidade de acesso ao mercado o preço é fixado com maior margem de lucro (basta notar que 7 em 30 produtos dos apontados por si estão abaixo do limiar dos 6 contos) e desvalorizou todos os elementos de facto de sinal contrário que existiam, como se eles fossem irrelevantes para a formação da margem de lucro bruta, como o facto de ser diferente a margem de lucro consoante os artigos sejam de ouro, prata, relógios e outros, mesmo quanto àqueles cuja existência não pode omitir (vendas a crédito ou com cartão jovem); M) Desconsiderando-se o elenco significativo de produtos com margens de lucro muito inferiores às consideradas, constante do documento junto à p.i. e bem assim a identificação do total das vendas a crédito e ainda as vendas a turistas, igualmente não consideradas como sendo de mais baixa margem de lucro; N) Factos que, incluindo a crise económica ocorrida nos anos de 1992 e seguintes cuja existência constitui um facto notório e devidamente provado, que deve ser levado ao probatório, e que afectou especialmente a classe média que é a sua cliente dominante e que a obrigou a baixar as margens de lucro para poder vender, e ainda que de depois de 1991 se ter implantado o Coimbra Shopping Center e outros concorrentes, um destes mesmo em frente do estabelecimento da recorrente (factos que devem ser dados como provados), fizeram com que os preços praticados e a respectiva margem de lucro bruta descessem; O) A progressiva descida da margem de lucro manifestada pela sua escrita tem esta razão de ser e o M.º Juiz a quo deveria ter constatado tal realidade factual e não pura e simplesmente consagrar singelamente que "As demonstrações de resultados comparados e os indicadores recolhidos, revelam um decréscimo na percentagem do lucro bruto sobre o preço de custo; P) Depois ainda, constata-se que o critério presuntivo utilizado se revela inadequado e ostensivamente errado, pois a margem de lucro foi determinada tomando como base valores existentes à data da visita inspectiva em 1995, quando o inventário do exercício de 1991 permitia um controlo sobre a actividade, de prática comercial regular e sem grandes alterações ao longo dos anos; Q) Em caso de dúvida fundada sobre essa existência dos factos deve anular-se o acto contenciosamente impugnado nos termos do artº 121º do CPT.

    Termos em que, com o douto suprimento de V.as Ex.as, se requer que seja dado provimento ao recurso, anulando-se a douta sentença recorrida e substituída por douto acórdão que julgue procedente a impugnação judicial, com todas as consequências legais, incluindo o pagamento de juros indemnizatórios.

    Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.

    O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer a fls 585, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por a sentença recorrida não padecer dos vícios imputados e encontrar-se fundamentado o recurso aos métodos indiciários.

    Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.

    Foi então por este Tribunal proferido o acórdão de fls 603/611 que, objecto de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, foi...

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