Acórdão nº 01278/05 de Tribunal Central Administrativo Sul, 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelJosé Correia
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, no 2º Juízo da 1ª Secção (Contencioso Administrativo) do Tribunal Central Administrativo Sul.

1 - RELATÓRIO A..., aposentado, m.id. a fls. 2 dos autos intentou no TAF de Sintra, acção administrativa especial de impugnação contra a Universidade Técnica de Lisboa pedindo a declaração de nulidade ou a anulação da deliberação de 29.04.2004 da Subsecção dos Assuntos Disciplinares do Senado da Universidade Técnica de Lisboa que lhe aplicou a pena disciplinar de um ano de inactividade, substituída pela perda de pensão por igual período.

Por acórdão de 13.06.2005, o Tribunal “a quo” julgou a acção procedente, e declarou a nulidade da Nota de Culpa do processo disciplinar ao ora recorrido.

Inconformado com a decisão, o Réu interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões: I- A douta Sentença recorrida não fez uma correcta interpretação e aplicação da lei, violando o disposto no n.°1 do artigo 42.° e do n.º 4 do 59º, do Estatuto Disciplinar.

II - Com efeito, na Acusação não só se identificam os factos que constituem as respectivas infracções disciplinares, se referem os deveres violados, bem como, ainda, se menciona a pena disciplinar a aplicar em relação às mesmas.

III- Os artigos 42.° e 59.° citados não impedem que a pena disciplinar a aplicar seja referida, para os diversos factos que constituem a Acusação, na parte final desta Acusação, em vez ser indicada artigo a artigo.

IV - Ora, no final da Acusação, objecto de apreciação nos autos, refere-se que todos os factos da Acusação, embora de natureza diversa, mas todos de elevado grau de gravidade, e de que resultaram prejuízos para a Faculdade de Arquitectura, verificados ao longo de um período de um ano e nove meses, revelam um comportamento que inviabiliza a manutenção da relação funcional, integrando a infracção prevista e punida com as penas expulsivas de demissão ou aposentação compulsiva, nos termos do artigo 26.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários da Administração Central Regional e Local, aprovado por DL n°24/84, de 16 de Janeiro.

V - Com tal afirmação o Instrutor pretende dizer que cada um dos factos quer analisados isoladamente quer em conjunto enquadram-se na previsão do artigo 26.° do Estatuto Disciplinar, cumprindo-se, assim, a discriminação exigida pelos citados artigo do Estatuto Disciplinar.

VI - De qualquer modo, o Arguido compreendeu perfeitamente o sentido da Acusação pela que a sua redacção em nada prejudicou o direito de defesa do Arguido.

VII- Por outro lado, todos os factos imputados ao Arguido ocorreram num mesmo contexto exterior de grande anormalidade de funcionamento da Faculdade, em que existiam várias facções, sendo toda a actuação do Arguido movida pela mesma finalidade pelo que, por este facto, se justificaria, de qualquer modo, o enquadramento sancionatório em conjunto da matéria da Acusação.

VIII- Assim, a Acusação não viola o disposto nos artigos 42.° e 59.° de Estatuto Disciplinar, pelo que a deliberação da Subsecção de Assuntos Disciplinares do Senado, relativa a docentes e funcionários não docentes, da Universidade Técnica de Lisboa, de 29 de Abril de 2004, pela qual foi aplicada ao A., a sanção disciplinar de um ano de inactividade, não padece de nenhuma ilegalidade.

IX- Também não se verificam as restantes ilegalidades invocadas de falta de quorum, dado que o número de membros da Subsecção de Assuntos Disciplinares do Senado é de 24 membros e estavam presentes 14 membros, logo a maioria, no momento em que a decisão foi tomada, nem a alegada inconstitucionalidade do artigo 15.° do Estatuto Disciplinar, como tem sido decidido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, nem, ainda, a alegada prescrição.

X- O enquadramento sancionatório efectuado no Relatório Final, em que se baseou a deliberação da Subsecção de Assuntos Disciplinares do Senado, de 29 de Abril de 2004, pela qual foi aplicada a respectiva sanção disciplinar, está de acordo com a lei.

XI- Por um lado, está comprovado no Processo Disciplinar que o Arguido, ora A., actuou, no mínimo, com culpa grave no exercício das suas funções, praticando vários actos que prejudicaram gravemente o normal funcionamento da Faculdade de Arquitectura quando lhe era exigido ponderação e imparcialidade tendo em conta o período conturbado que ali se vivia.

XII- A qualificação jurídica das faltas disciplinares feita no Relatório Final, e sancionadas com a pena de inactividade, encontra-se de acordo com o Estatuto Disciplinar, não merecendo qualquer censura, como decorre do Relatório Final do Instrutor.

XIII- Assim, com o devido respeito, a douta Sentença recorrida deve ser revogada por violar, por errada interpretação e aplicação, o disposto no n.°1 do artigo 42.° e o n.°4 do artigo 59.°, do Estatuto Disciplinar.

O Recorrido contra alegou, concluindo como segue: 1. Muito bem andou o Tribunal aqui recorrido ao analisar e laboriosamente desmontar, com irrepreensível clareza, a acusação deduzida e impugnada, sendo forçoso concluir, como este, que "a acusação limita-se pois a conter apenas, juízos de valor sobre factos e comportamentos, sem referência às infracções cometidas e correspondente indicação de artigos, limitando, de modo manifesto, a defesa eficaz do arguido, equivalendo essa falta à insuprível falta da sua audiência (no nº 1 do art. 42.° e n.º 4 do art. 59.°do ED" (pág.45, fls. 457).

  1. Com efeito, é jurisprudência unânime dos Tribunais Administrativos, que "resulta do citado artigo 59°/4 do E.D., que o direito de defesa, consubstanciado na audiência do arguido (vide artigo 269.º/3 da Constituição), não se satisfaz apenas com a descrição dos factos constantes da acusação, exigindo também que ao arguido seja dado conhecimento da qualificação jurídica que a entidade acusadora faz desses factos, com especificação dos preceitos legais e de eventuais instruções que se considerem violados e com o anúncio da pena disciplinar que se prevê adequada à gravidade da infracção " (Acórdão do TCA sul de 04-02-99).

  2. Refere inclusivamente um recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que "viola o art, 42º, nº1 do E.D. a acusação em procedimento disciplinar em que não hajam sido individualizados os preceitos legais punitivos em relação a cada tipo de infracção" (Acórdão de 22-05-2003).

  3. É de concordar com o Tribunal recorrido quando diz que "a cada comportamento qualificado como faltoso, terá de corresponder uma infracção, e a cada uma destas, uma pena aplicável. Não é possível, indicar uma pena aplicável em termos globais, sendo, aliás, crível que nem a todos os comportamentos descritos correspondam a aplicação da pena descrita no art. 26º do Estatuto Disciplinar, sem prejuízo do que, em concreto seja aplicado, em função de acumulação de infracções, que enquanto agravante, não consta sequer da nota de culpa... o que será equiparável, nos termos do n.º1 do art. 42.°do mesmo diploma, à nulidade insuprível resultante da falia de audiência do arguido em artigos de acusação nos quais as infracções sejam suficientemente individualizadas e referidas aos correspondentes preceitos legais" (pág. 45-46, fls. 457-458).

  4. É de concluir pela violação do art. 42." do Estatuto Disciplinar quando "não foi feita a subsunção individualizada dos comportamentos tidos como violadores das normas legais que, por tais comportamentos terão sido infringidas, sendo certo que a referência final única e em bloco não pode suprir as deficiências apontadas, impossibilitando a dedução de adequada defesa. A jurisprudência deste STA tem sido firme na exigência de que a acusação deduzida em processo disciplinar tenha de ser elaborada de forma clara e precisa, habilitando o arguido a exercer com eficácia o seu direito de defesa (Neste sentido, por elucidativos e a título de mero exemplo, cf. os acs. STA de 6-11-97- rec. 28566; de 3-6-98- rec. 41503; de 17-10-96 - rec.27403)” (Acórdão do STA de 22-05-2003).

  5. De facto, em nenhum artigo da Nota de Culpa se faz menção dos preceitos legais violados e da correspondente pena, e apenas no termo do art. 1.° e 11.° se fala em violação dos deveres de isenção, zelo e lealdade, sendo que também em nenhum deles é efectuado o "juízo de integração ou inclusão dos factos apurados na previsão do normativo aplicável e consequente concretização dos referidas conceitos normativos" a que bem se refere a sentença recorrida (pág. 39, fls. 451).

  6. Em boa verdade, "o direito sancionatório disciplinar pune os comportamentos que, consubstanciados no caso concreto pela factualidade apurada e definida no procedimento disciplinar, em juízo subsuntivo não integrem as qualidades abstractamente elencadas nos deveres gerais", implicando o dito "Juízo de integração ou inclusão" (Acórdão do TCA Sul de 12-05-2005).

  7. Ora, na Nota de Culpa, não se conhece sequer a violação disciplinar imputada, muito menos o referido juízo subsuntivo, sendo que é há muito incessantemente repetido por toda a jurisprudência que "é necessário que para o arguido não se torne impossível ou especialmente difícil estabelecer a relação entre cada conduta fáctica descrita e a violação disciplinar imputada (cfr. Acs. do STA. de 4/2/93 in BMJ 424.°-713 e de 20/1/99 - Rec. n.°36654" (Acórdão TCA Sul de 03-02-2005).

  8. Não interessa e é de resto irrelevante se a invocação dos preceitos legais, das infracções, das respectivas penas e do juízo subsuntivo é feita no final de cada artigo ou no final da Nota de Culpa; o que é importante e não sucedeu é que tal conste da Nota de Culpa.

  9. Não constam também da Nota de Culpa os motivos da inviabilidade da manutenção da relação funcional pelo que também por aqui não pôde o arguido exercer efectiva e cabalmente o seu direito de defesa.

  10. Exigia-se, no mínimo, que uma Nota de Culpa dirigida a um Professor Catedrático aposentado, de um currículo ímpar de dedicação à Arquitectura, História e Cultura e, em especial, à Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, a indicação dos motivos que levaram a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT