Acórdão nº 02832/07 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelJosé Correia
Data da Resolução05 de Novembro de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, no 2º Juízo, 1ª Secção (Contencioso Administrativo) do Tribunal Central Administrativo: 1 – RELATÓRIO O presente recurso vem interposto da sentença proferida a fls. dos autos, datada de 06/03/2007, que absolveu da instância réu, Município de Pinhel e contra -interessada, P...-Comércio de Peixe e Marisco, Ldª, por falta de legitimidade da autora/ recorrente, Pardal Peixe – Comércio de Peixe Ldª, na Acção Administrativa Especial de Pretensão Conexa com Actos Administrativos intentada no TAF Castelo Branco, com vista à a "declaração de anulação da licença de utilização n° 40/2006, emitida pela Câmara Municipal de Pinhel em 31.05.2006, por despacho da Sra. Vereadora da dita Câmara Municipal de Pinhel, e ao ressarcimento dos danos derivados da actividade desenvolvida em consequência da emissão da mesma", formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: 7.1) - No caso dos autos, e atendendo à decisão proferida a final, não foi dado cumprimento ao disposto no artº 87°, n° 1, alínea a), CPTA, o que, salvo o devido respeito e melhor opinião, significa haver sido cometida nulidade insanável (por violação objectiva de lei), a qual afecta a validade da sentença revidenda - o que se alega para todos os devidos e legais efeitos; 7.2) - A legitimidade da autora para os termos do presente processo, atendendo a tudo quanto foi oportunamente alegado na petição inicial (aqui considerada para efeitos do presente expediente recursivo integralmente reproduzida), encontra-se objectivamente prevista no disposto nos arts. 9°, n° 2 e 55°, nº 1, alíneas a), c) e f), CPTA; 7.3) - A sentença revidenda violou, entre outras, as normas dos arts. 9°, nº 2 e 55°, n° l, alíneas a), c) e f), CPTA; e, ainda, art. 268°, n° 4, CRP; Termos em que, e nos melhores de direito cujo suprimento antecipadamente se pede, deve a sentença revidenda ser substituída por outras que contemple tudo quanto vem de alegar-se, assim se fazendo justiça.” O Réu e a Contra Interessado contra -alegaram, sustentando que o recurso não merece provimento, porque não foram violados quaisquer preceitos legais, nomeadamente os invocados pela Autora.

O Meritíssimo Juiz a quo manteve a decisão recorrida pronunciando-se pela não verificação de qualquer nulidade da sentença.

Notificado o Ministério Público nos termos e para os efeitos do nº 1 do artigo 146.º do CPTA, nada disse.

Foram colhidos os Vistos legais, cumpre decidir.

*2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DOS FACTOS Ao abrigo do nº 6 do art. 713º do CPC, ex vi do art. 140.º do CPTA, remete-se para a factualidade dada por assente em fls. (não numeradas do Volume I), sob números n.º 1 a 10 do despacho saneador/sentença recorrido, cuja selecção não vem posta em causa e que se dá aqui por integralmente reproduzida.

*2.2 DO DIREITO Face à matéria de facto dada como assente, a questão a decidir é, segundo as alegações do recorrente e respectivas conclusões, a de saber se a decisão proferida violou ou não os artigos 87°, n.º1, al. a), os artigos 9° n.º 2 e 55°, n° l, al. a), c) e f) do CPTA e, ainda, o artigo 268°, n° 4 da CRP.

Começa a recorrente por afirmar que no caso dos autos, e atendendo à decisão proferida a final, não foi dado cumprimento ao disposto no artº 87°, n° 1, alínea a), CPTA, o que, salvo o devido respeito e melhor opinião, significa haver sido cometida nulidade insanável (por violação objectiva de lei), a qual afecta a validade da sentença recorrida.

E, na verdade, decorre dos autos que, após a apresentação das contestações pela entidade demandada (Município de Pinhel) a fls. 55 e da contra -interessada a fls. 238 e ss, em que fora suscitada a excepção da ilegitimidade da Autora, foi proferida sentença em que se conheceu dessa excepcionalidade.

O regime processual da acção administrativa especial passou a prever no artº 87º do CPTA uma fase de saneamento do processo à semelhança do que se prevê no artº 508º do CPC para o processo civil declaratório.

Na verdade, o nº 1 do artº 87º do CPTA prescreve que “findos os articulados, o processo é concluso ao juiz ou relator, que profere despacho saneador” e, caso necessite de apreciar excepções dilatórias, cumpre-lhe ouvir o autor sobre as questões que obstem ao conhecimento do objecto do pedido e que poderão conduzir à absolvição da instância (cfr. al. a) do mesmo preceito legal).

Assim, o legislador quer que seja exercido o contraditório quanto às excepções suscitadas e o mesmo processa-se apenas quando o processo seja concluso ao juiz para despacho, no prazo de 10 dias expressamente previsto no artº 87º nº 1 al. a) do CPTA, o que vale por dizer que o autor não pode, nem deve, apresentar réplica, antes devendo esperar a notificação que, para o efeito, lhe seja feita pelo juiz, exercendo essa audição a função que, no artº 502º do CPC, equivale à réplica.

In casu

, o Mº Juiz «a quo» postergou o comando ínsito no artº 87º nº 1 al. a) do CPTA, conhecendo da excepção da ilegitimidade activa para decretar a absolvição da instância réu e contra -interessada.

É certo que o Mº Juiz consignou na decisão recorrida que “Réu e contra -interessado excepcionaram a ilegitimidade da autora…” e que “Sobre a sua legitimidade, já a autora se pronunciou em p.i.”.

Todavia, como se disse e reafirma, o Julgador apenas podia conhecer daquela questão prévia que obstava ao conhecimento do objecto do processo mediante prévia audição da autora, devendo, para esse efeito, ordenar a sua notificação para responder em dez dias.

Tal formalidade destina-se a cumprir o contraditório quanto à ilegitimidade da autora determinante da extinção da instância e leva pressuposta a ideia de que o processo está, em regra, circunscrito a dois articulados.

Se é certo que o tribunal deveria ouvir a autora quanto à falta daquele pressuposto processual suscitado pelo réu e pela contra -interessada, dando-lhe oportunidade de aduzir considerações que arredem a existência de qualquer obstáculo ao prosseguimento do processo, também o é que o Mº juiz, justificou o conhecimento, sem mais, da referida excepção pelo facto de “Sobre a sua legitimidade, já a autora se pronunciou em p.i.”.

Sucede que a ajuizada formalidade, como salientam Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, “Comentário ao Código de processo nos Tribunais Administrativos”, 2ª ed., pág. 517, nota 3 ao artº 87º,”carece de ser considerada no quadro geral da actividade de saneamento e pré -saneamento do juiz e em conjugação com o disposto nos artºs. 88º e 89º”.

O Tribunal deve ouvir o autor quanto à falta de pressupostos processuais que tenha detectado oficiosamente ou tenha sido suscitado pelo réu, dando-lhe oportunidade de deduzir as considerações que afastem a existência de qualquer obstáculo ao prosseguimento do processo ou sequer a necessidade de suprimento de quaisquer deficiências ou irregularidades. Na sequência dessa formalidade, ao juiz cabe ainda providenciar pelo suprimento de excepções dilatórias e convidar as partes ao aperfeiçoamento dos articulados quando considere necessária a regularização da instância (artigo 88º), e só quando se depare com uma excepção dilatória por natureza insuprível é que poderá decretar, sem mais, a absolvição da instância”.

Em nosso entender e pelo que vem dito, o Mº Juiz cumpriu todos esses ditames quando considerou que “Sobre a sua legitimidade, já a autora se pronunciou em p.i.”. e, sendo a excepção dilatória da ilegitimidade activa por natureza insuprível, poderia decretar, sem mais, a absolvição da instância do réu e da contra –interessada.

Com efeito, se a formalidade preterida se destina a cumprir o contraditório, dúvidas não sobram de que nos artigos 30º a 37º, a autora substanciou as razões das quais, em seu entender, resulta a sua legitimidade para a presente acção cfr. o artº 55º nº 1, alíneas a), c) e f) do CPTA, tendo sido por haverem as partes tomado posição sobre a mesma por isso que o tribunal recorrido conheceu, sem mais, dessa questão prévia.

Na verdade, só quando as partes não hajam tomado posição é que se justifica que sejam ouvidas sobre as questões de que se vai conhecer.

É que, tendo-se já pronunciado sobre o fundamento porque considerava ser parte legitima, o que agora, em face da alegação da autora, e aqui recorrente tem de ser solucionado, é se podia a decisão ter sido proferida com preterição da audição da recorrente e se esta preterição é atentatória do princípio do contraditório e do fair trial, existindo “decisão surpresa”.

Ora, ao decidir sobre a ilegitimidade da autora fundado nos elementos que se encontram nos autos, o Mº Juiz «a quo» não o fez, sem que às partes, maxime, a autora, fosse dada oportunidade de sobre ela se pronunciar.

O artigo 3°, n° 3, do Código de Processo Civil é aqui plenamente aplicável (cfr. artº 1º do CPTA) e tem como finalidade declarada evitar, proibindo-as, as denominadas decisões - surpresa, sendo que a decisão na decisão recorrida da questão da legitimidade da autora, tendo em conta o que ela própria sobre a mesma afirmou na p.i., não constitui, propriamente, uma decisão - surpresa.

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