Acórdão nº 01840/07 de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelJOSÉ CORREIA
Data da Resolução23 de Junho de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: A. - O relatório 1.

M........................., identificada nos autos, veio deduzir a presente acção administrativa especial contra o Ministro de Estado e das Finanças, tendo em vista obter a anulação do acto de indeferimento tácito do recurso hierárquico para si interposto do indeferimento expresso da reclamação graciosa da liquidação de imposto de selo.

Citada a entidade demandada veio a mesma contestar e juntar o processo administrativo.

O Exmº Procurador Geral Adjunto (EPGA), junto deste Tribunal, a quem foi feita entrega de cópia da p.i. e dos documentos que a instruem nos termos e para os efeitos do disposto no artº 85º do CPTA.

Pelo relator foi proferido o despacho saneador, no qual se decidiram as excepções suscitadas pela entidade demandada e pela inexistência de outras questões que obstem ao conhecimento do objecto do processo, havendo que as partes fossem notificadas para alegarem por escrito, havendo aí sustentado o seguinte: A AUTORA: 1 - A liquidação de imposto de selo deve ser objecto de anulação, atento o erro de interpretação aplicação, do disposto nos arts. 5°, al. r) e 6° al. e) do Código do Imposto de Selo, devendo ao contrário do entendido, (ou omitido) declarar-se a isenção do imposto de selo erroneamente liquidado, porquanto estamos perante uma transmissão gratuita, na qual a A. tem a qualidade de descendente, e é inequivocamente beneficiária.

II - A. e Réu concordam - por razões diferentes - que estamos perante uma transmissão gratuita, pelo que tendo a A. (beneficiária) a qualidade de descendente, está isenta de imposto de selo nos termos do artigo 6°, al. e) do CIS, que dispõe que," São isentos de imposto de selo, quando este constitua seu encargo: (...) e) O cônjuge, descendentes e ascendentes, nas transmissões gratuitas de que forem beneficiários." III -A escritura de justificação, constitui apenas e tão só, um instrumento destinado a suprir a falta de documento bastante, para a prova do direito do interessado na primeira inscrição no registo. (cfr. AC. da Relação do Porto de 24.11.05).

IV -A transmissão operada para a A., ocorreu na data da partilha verbal, por morte do seu pai, e não apenas, com a realização da escritura de justificação, desta forma tendo o pai da A. falecido há mais de 20 anos, o direito à liquidação de qualquer imposto que fosse devido, já caducou, acrescendo que lhe são inaplicáveis as disposições do CIS, em respeito ao principio da irretroactividade das leis fiscais.

NESTES TERMOS, NOS MELHORES DE DIREITO, DOUTAMENTE SUPRIDOS POR V. EXCIA. REQUER-SE A ULTERIOR TRAMITAÇÃO DA INSTÂNCIA, RECONHECENDO-SE A FINAL QUE A A., BENEFICIA DA ISENÇÃO DE IMPOSTO DE SELO CONSAGRADA NO ARTIGO 6°, AL. E) DO CIS.

A ENTIDADE DEMANDADA: 1. - Dá-se aqui por integralmente reproduzida toda a cronologia fáctica constante de "l" a "10'' da contestação.

2 - Tendo em consideração que o julgamento das excepções prévias e das excepções deduzidas pela R. foi no sentido da sua total não aceitação, passa a tratar-se da questão de fundo.

3 - Como é ainda habitual, existem inúmeros imóveis não registados nas respectivas Conservatórias Prediais ou, se registados, figurando em nome de outrem que, ao longo do tempo, foi praticando actos possessórios sobre esses bens sem, contudo, ser titular de qualquer direito de propriedade.

4 - Ou seja, os possuidores enquadram-se nas previsões contidas nos art.s 1251° e 1253° do Código Civil (doravante, CC) pois têm o animus e o corpus da coisa, podendo em consequência defender a respectiva posse (art.s 1276° a 1286° do CC), bem como socorrer-se do instituto da usucapião (art. 1287° do mesmo Código). Mas, nada mais.

5 - Por causa disso, a justificação notarial, que constitui o alvo principal destes autos, permite somente estabelecer e reatar o trato sucessivo em sede de registo predial, como aquisição originária, nunca uma aquisição derivada, assente numa transmissão de bens operada por escritura pública de compra e venda ou de doação (art.s 875° e 947°, do CC).

6 - Isto porque, atento o seu carácter originário, as aquisições por usucapião nunca são verdadeiras transmissões, pois o usucapiente não sucede nos direitos dum qualquer anterior titular do direito de propriedade (bem como de qualquer outro direito real do gozo) sobre o bem adquirido por usucapião.

7 - Daí que a aquisição por usucapião nunca seja considerada como gratuita nem como onerosa, como decorrência do seu carácter originário e não derivado, dado não lhe subjazer qualquer fonte contratual.

8 - E, mesmo que porventura tivessem sido realizadas benfeitorias úteis (art. 216° n° 3, do CC) sobre o prédio em causa, ainda assim o possuidor não adquiriria a sua propriedade, antes teria direito a ser ressarcido com base em enriquecimento sem causa. Esta situação só cessaria por contusão jurídica e com base na escritura de justificação, caso em que o credor e o devedor se reuniriam na mesma pessoa.

9 - Ora, a partir da entrada em vigor do CIS, as aquisições por usucapião passaram a ser tributadas, porque incluídas nas respectivas regras de incidência objectiva (n° l do art. 1° conjugado com a parte final da alínea a) do n" 3 do mesmo preceito, do Código em causa) e, com base na alínea r) do art. 5° do mesmo Código, o momento do nascimento da obrigação de Imposto ocorreu, in casu, na data da escritura de justificação ou seja, em 20/08/2004.

10 - Ou seja, o legislador "ficcionou" a aquisição por usucapião como transmissão gratuita de bem, pois incluiu-a nesta categoria jurídica, ideia que é reforçada com o disposto na verba 1.2 da Tabela Geral do Imposto do Selo. Disto decorre que, subsequentemente, há que cumprir as obrigações acessórias previstas na lei que, n o caso, consistem na apresentação das declarações previstas no art. 26° do CIS e no art. 15° do Dec.-Lei n° 287/2003, de 12/11.

11 - E, em complemento, convém dizer-se que a aquisição por usucapião só pode reportar-se aos direitos reais constantes da matriz, à data da celebração da escritura de justificação.

Em face do exposto, deverá: Negar-se total provimento à impugnação porque totalmente carente de qualquer apoio legal.

Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.

*B. A fundamentação.

  1. A questão decidenda.

    São as seguintes as questões a decidir: Se para efeitos fiscais a aquisição por usucapião é uma aquisição originária que só ocorre no momento em que o documento que a titula se torna definitivo, devendo o usucapiente solicitar a liquidação do Imposto do Selo nos termos dos art.s 23°, 25° e 26° a 28° do CIS, apresentando para o efeito no Serviço de Finanças da área da residência a declaração de modelo oficial.

  2. A matéria de facto.

    Com relevo para a apreciação do mérito da acção, pelos documentos e processo administrativo juntos e articulação das partes, encontra-se provada a seguinte factualidade: 1 - Em 07/08/2006 a Impugnante apresentou no Serviço de Finanças do S...... uma reclamação graciosa autuada com o n° .................. e referente ao Imposto do Selo de que tinha sido notificada para pagar, na quantia de 2.552,00€.

    2 - Tal liquidação teve como origem uma escritura de justificação celebrada em 20 de Agosto de 2004, no Cartório Notarial do mesmo Concelho, através da qual os prédios referidos nessa escritura foram adquiridos por usucapião, tendo um resultado de compra verbal em 1972 e o outro de partilha verbal subsequente ao óbito dos seus pais.

    3 - Em despacho de 24/10/2006, o Chefe do Serviço de Finanças do S...... entendeu que o pedido não merecia provimento, ordenando a notificação da interessada para, querendo, exercer por escrito o respectivo direito de audição prévia.

    4 - Exercido o direito de audiência prévia, o referido Chefe do Serviço de Finanças indeferiu a reclamação socorrendo-se dum Despacho do Subdirector -Geral dos Impostos de 28/09/2004, segundo o qual "-para efeitos fiscais a aquisição por usucapião é uma aquisição originária que só ocorre no momento em que o documento que a titula se torna definitivo, devendo o usucapiente solicitar a liquidação do Imposto do Selo nos termos dos art.s 23°, 25° e 26° a 28° do CIS, apresentando para o efeito no Serviço de Finanças da área da residência a declaração de modelo oficial", o que o contribuinte cumpriu.

    5 - Em 08 de Novembro de 2006 a A. foi notificada daquele despacho e ainda de que poderia, querendo, interpor recurso hierárquico e deduzir impugnação judicial.

    6 - A A. optou por apresentar, em 14 de Novembro de 2006, recurso hierárquico, dirigindo-o ao Senhor Ministro das Finanças, mas havendo sido ordenada a remessa dos autos ao Director de Finanças da .......

    7 - Naquela Direcção de Finanças foi elaborada uma informação em 30/11/2006, de que se destaca, com relevância para os autos, o seguinte: a) Os prédios justificados constam da relação de bens apresentada por óbito do pai da aqui A. (P° Imposto Sucessório n° ......, do Serviço de Finanças do S......; b) Quando se encontrava em vigor o Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, a aquisição por usucapião não era tributada neste Imposto; c) Todavia, da interpretação conjugada do n° 1 do art. 1° com a parte final da alínea a) do n° 3 do mesmo preceito, do Código do Imposto do Selo (doravante, CIS) que revogou, entre outros, aquele Código, resulta que as aquisições por...

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