Acórdão nº 04594/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelCoelho da Cunha
Data da Resolução18 de Junho de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência no 2º Juízo do TCA - Sul 1.

RELATÓRIO Maria ..., id. nos autos, intentou no TAF de Almada, contra a Ordem dos Arquitectos, acção administrativa especial, pedindo a declaração de anulação da deliberação de 20.06.06, do Conselho Nacional de Disciplina daquela Ordem, que manteve a deliberação de 20.06.2006, do Conselho Regional da Disciplina do Sul, pela qual lhe foi aplicada a pena disciplinar de censura.

Por acórdão de 30.04.2008, o Tribunal " a quo" julgou o pedido improcedente, absolvendo o R. do pedido.

Inconformado com a decisão, dela veio a A. recorre para este TCAS, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:

  1. A nota de culpa deduzida contra a recorrente não satisfaz as exigências do acusatório, já que não especifica, minimamente e de forma perceptível para um destinatário, quais os actos que considera ter a arguida omitido, que fossem da sua competência e que lhe tosse exigível praticar, de que tivesse resultado a pretensa ilicitude que assaca aos actos de licenciamento praticados pelos órgãos do Município de Palmela.

  2. Por outro lado, também não indica quaisquer circunstâncias de tempo, lugar e modo, dessas pretensas omissões.

  3. Também a decisão punitiva proferida e a decisão do Conselho Nacional de Disciplina que a confirmou, motivam-se em factos, que elegem como fundamento, que não constam da nota de culpa.

  4. Desse modo, para além da nulidade de todo o processo disciplinar em consequência da violação do princípio do acusatório, também a decisão disciplinar seria nula por falta de audiência da arguida por se ter fundamentado em factos que não constavam da sua acusação.

  5. Acresce que a A. apenas interveio no processo aquando da elaboração da informação que foi junta por si aos autos, aquando da resposta à nota de culpa, não se vislumbrando como, dessa informação, possa ter resultado, por sua acção ou omissão, a prática pelos órgãos do Município de qualquer acto ilícito.

  6. E assim, sempre a sanção disciplinar seria injustificável por partir de pressupostos que não se encontram minimamente comprovados no processo.

  7. Sendo, consequentemente, nula a sanção disciplinar aplicada e nula a decisão do recurso hierárquico interposto, por violação do disposto no art.º59° do Estatuto Disciplinar da Ordem dos Arquitectos.

  8. Ao não declarar tal nulidade o Douto Acórdão recorrido fez uma errada interpretação dessa disposição, violando-a." A entidade recorrida, contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

A Digna Magistrada do Ministério Público, emitiu douto parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a decisão e " anulando-se o processo disciplinar desde a acusação inclusive, a qual deverá ser reformulada" Colhidos os vistos legais, cumpre decidir x x 2.

Matéria de Facto O Acórdão recorrido deu como assente a seguinte factualidade: "A - Em 2002-09-06 foi proferida contra a A., a seguinte acusação: "DESPACHO DE ACUSAÇÃO Nos termos e para os efeitos do art° 59º e segs, do Estatuto da Ordem dos Arquitectos, vem a Exma Senhora Arquitecta Maria Inês Núncio acusada, no âmbito da apreciação do processo de licenciamento do estabelecimento de bebidas denominada " Quinta do Lago Club", dos seguintes factos: 1. Não ter verificado que a área de construção da casa de habitação edificada excede a área permitida pelo P.D.M., tendo sido emitido o respectivo alvará de construção; 2. Não ter acautelado que toda a vedação da propriedade, construída por um muro de 2,5 m de altura, fosse licenciada, tendo-o sido apenas um dos seus troços, aquele que confina com a estrada.

  1. Não ter promovido a consulta aos Bombeiros e à JAE (ou organismo equiparado) aquando do pedido de alteração de uso de habitação para estabelecimento de bebidas; 4. E de não ter acautelado o cumprimento do disposto nas alíneas e) e f) do n.º1 do art.º8 do D.L. n.º13/71, de 23/01.

    De acordo com o disposto no n.º1 e alínea c) do n° 2 do art.º 49º do Estatuto da Ordem dos Arquitectos, devem os arquitectos exercer a sua profissão com eficácia e lealdade, aplicando nela todo o saber, criatividade e talento, devendo, em especial, assegurar a veracidade das informações que presta.

    Tais omissões consubstanciam a prática de uma infracção aos aludidos deveres, legalmente sancionáveis com pena de suspensão até seis meses, de acordo com o disposto no n.º2 do art.º 55º do Estatuto da Ordem dos Arquitectos.

    Em cumprimento do preceituado no art.º 60º do referido Estatuto, tem a Exma, Arquitecta Maria Inês Núncio 20 (vinte) dias úteis para a apresentar defesa, juntar documentos, arrolar testemunhas ou requerer as diligências que considere convenientes para o apuramento da verdade material.

    ....", cfr. fls. 26 dos autos e fls. 103 e 104 do PA.

    B - Em 2002-10-10, a A. apresentou resposta à acusação, com o seguinte teor: Exma Instrutora do Processo Disciplinar MARIA INÊS CAVALEIRO DE FERREIRA NÚNCIO PEREIRA, vem no processo disciplinar que contra si foi instaurado, contestar a acusação deduzida.com os seguintes termos: 1° Preliminarmente, cumpre referir que, nos termos do art.° 59° do Estaruto da Ordem dos Arquitectos, a notificação de uma acusação a um arguido deve ser feita pessoalmente ou por carta registada com aviso de recepção.

    1. No presente caso optou-se pela notificação por via postal tendo-se, contudo, dirigido a carta, a coberto da qual se remeteu a cópia da acusação, não para a residência da arguida, ora contestante, mas para a Câmara Municipal de Palmela, onde presta serviço.

    2. E, conforme se constata pela assinatura do talão do aviso de recepção, a mesma não foi recebida pela arguida, mas sim por uma funcionária daquele órgão autárquico que a fez seguir pelos canais próprios de distribuição de correspondência dos respectivos serviços.

    3. Desse modo, não está confirmada em processo a data da recepção da referida carta, consequentemente, a data da notificação da acusação à arguida.

    4. Antes ainda de responder, ponto por ponto, à matéria da acusação, cumpre referir que a mesma, em todos os seus aspectos, enferma de nulidade, vício que expressamente se invoca, por se limitar a referir meras conclusões de facto, sem minimamente concretizar, como é imposto pelo disposto no art.º 59° do Estatuto da Ordem dos Arquitectos e é exigência elementar de qualquer processo disciplinar informado pelo princípio do acusatório, os factos de onde tais conclusões se poderiam extrair, o que impede a percepção da efectiva convicção do acusador e da substância da acusação, nomeadamente quanto aos factos que foram considerados relevantes para se chegar às conclusões em que se sustenta a acusação da arguida.

    5. Assim, desconhece-se por que motivo considera a Ex.ma Instrutora que as diversas omissões que imputa à arguida (e, sublinhe-se, todos os pontos da acusação se referem a pretensas omissões - "não ter verificado", "não ter acautelado", "não ter promovido"), lhe são, a ela mesma, subjectiva e objectivamente imputáveis e não a outrem - inserido acima ou abaixo da sua cadeia hierárquica - nomeadamente ao órgão, ou titular do cargo público, com a competência e poder de decidir nos licenciamentos em causa.

    6. Pois, estando-se em face de uma imputação de omissões, ter-se-iam de especificar quais os actos em concreto que a arguida deveria ter praticado e não praticou e concretizarem-se quais as razões de facto e de direito pelos quais lhe era exigível a prática dos actos pretensamente omitidos.

    7. É assim, desde logo, a acusação deduzida manifestamente nula por não conter uma concretização dos factos e das suas circunstâncias que permitisse tornar perceptível o alcance da acusação e a sua motivação de facto e de direito, o que impede ou, pelo menos, seriamente dificulta o exercício do contraditório.

    8. No entanto, pela conjugação da acusação com a participação que deu origem ao processo, a que se teve acesso por consulta do mesmo, poder-se-á ter alguma percepção do sentido que se pretende atribuir às acusações vagas e abstractas que foram deduzidas.

    9. E, sem prescindir da invocada nulidade, cumpre desde já referir que a contestante nunca teve qualquer responsabilidade na tramitação do processo de licenciamento visado pela participação até Fevereiro de 2001, data em que assumiu a função de Chefe da Divisão de Obras Particulares da C. M. de Palmela, não tendo tido, até aí, qualquer função de supervisão hierárquica sobre os arquitectos a quem esteve distribuído o estudo e análise do processo de licenciamento em causa.

    10. Não tendo, até essa data, enquanto técnica da C. M. de Palmela, tido qualquer contacto com tal processo de licenciamento de obras particulares e não tendo emitido, até à sua tomada de posse como Chefe da Divisão de Obras Particulares, qualquer parecer ou informação sobre o mesmo já que, até àquela data, a supervisão hierárquica sobre a técnica de arquitectura a quem estava distribuída a análise do processo, pertencia ao Arquitecto Jorge Moura.

    11. Ora a licença de construção da habitação, a que se refere o n.° 1 da nota de culpa, data do ano de 1999, conforme, aliás, patentemente resulta do número da sua identificação aí referido.

    12. Desse modo, é claro que, ainda que se tivesse verificado, o que de nenhum modo se aceita, qualquer erro ou omissão, falta de cautela ou incúria na análise técnica no processo em causa, até à data da tomada de posse da arguida corno Chefe da E.O.P., nomeadamente no concernente à atribuição de licença de construção é evidente que nenhuma responsabilidade se lhe poderia imputar relativamente a tais factos.

    13. E, por outro lado, a licença de utilização da edificação para estabelecimento de bebidas, data de 6 de Junho de 2001 (doc. 1), tendo a arguida, desde que tomou posse de Chefe da D.O.P. até à emissão dessa licença, tido como única intervenção no processo de licenciamento aquela que se consubstancia na informação cuja cópia se anexa (doc 2), informação essa em que manifestamente demonstra o cuidado e a preocupação, excedendo até o que sob o ponto de vista...

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